chuva em são paulo. a chuva em são paulo é o caos, vocês sabem. acho que seria bom cenário pra qualquer tipo de filme futurista caótico: chuva, cinza, frio, carros se degladiando no asfalto, pedestres disputando os pedacinhos cobertos nos pontos de ônibus. ônibus, esses, que vão lotados, com os vidros embaçados e o vírus da suína se divertindo entre os passageiros úmidos.
estou eu no meio desse caos, capa de chuva, botas, malha de lã, cachecol, kit completo pra enfrentar esse átipico inverno paulistano desse ano, cheio de chuva. sim, nós estamos acostumados com a chuva – não somos como os cariocas, que se perdem como baratas tontas quando chove, batendo as sombrinhas e pisando nas poças. mas ninguém esperava tanta chuva no em julho, mês que costuma dar à cidade um ar europeu, com céu azul brilhante, sol amarelinho e morno, muito frio na sombra, pessoas de cashemeres vermelhos e sobretudos pretos caminhando sorridentes nas ruas.
encontro meu espaço coberto no ponto de ônibus e fico aguardando o coletivo. carrego a mochila, o guarda-chuva e, no bolso da capa que dificulta meus movimentos, o mp3 player cujos fones se enrolam no resto da roupa e se prendem precariamente aos meus ouvidos.
- ei!
aguardo o coletivo, a música toca.
- ei! ei!
- ?
olho pra trás e lá está ela. guarda-chuva numa mão, bebê na outra. um monte de sacolas penduradas nos dois braços. e o gorrinho da criança caído no chão.
- me ajuda aqui, moça!
a mãe, paralisada. não pode largar a criança, não pode largar o guarda-chuva. as sacolas, então, nem se fala.
- coloca na cabecinha dela?
ela sorri mas não agradece: vira as costas e vai embora. tudo bem, penso, não fiz mais que a obrigação mesmo.
o mp3 toca racionais: hey são paulo, terra de arranha-céu/ a garoa rasga a carne, é a torre de babel.
Sofia Amaral é roteirista, produtora, colunista do blog Rodapé e até jornalista se faltar trampo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Ofensas e a falta de identificação do leitor serão excluídos.