A PGV compreende os padrões de avaliação de imóveis, por metro quadrado, segundo fatores tais como localização, acabamento, antiguidade. A ideia de se criar uma planta de valores surgiu da óbvia incapacidade, por parte das prefeituras, de determinar, caso a caso, o valor venal dos imóveis.
Não é a primeira vez que a PGV causou furor em nossa cidade. No começo deste ano, a Câmara dos Vereadores instaurou uma CPI, presidida pelo vereador Aurélio Miguel (PR), para averiguar possíveis irregularidades na planta.
Na época, o presidente da comissão questionou ao diretor da Divisão de Mapas e Valores da Secretaria de Finanças, Ricardo Neves. “Como o valor do metro quadrado do Shopping Bourbon é diferente do valor do Parque Antártica se estão na mesma quadra? Não dá para entender porque em 2008 se cobrou R$ 684,00 o metro quadrado no Bourbon enquanto no Parque Antártica o valor lançando foi de R$1.017,00”.
Lembro de, naquela ocasião, ter lido muitos artigos colocando sob suspeita a avaliação da Planta Genérica e cobrando imediatas providências do Poder Público
Em São Paulo a última revisão da planta foi feita em 2001, na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy. Desde aquela época, os valores do IPTU sofreram as correções anuais da inflação.
O órgão responsável pela revisão da planta é a Comissão de Valores Imobiliários, conselho composto por 14 membros que, desde 2002 se reúnem a cada 40 dias. Dentre os membros da comissão estão representantes do Poder Público e da Sociedade Civil (inclusive da FIESP).
Para a sociedade, a Planta Genérica de Valores tem relevante importância, pois dá bases à definição do “valor venal” dos imóveis e, em consequência, ao montante devido de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), bem como do ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis) e das indenizações por desapropriações.
Aí é que começou a confusão. Reajustando-se a Planta Genérica, atualizou-se, compulsoriamente, também, o valor do IPTU. Pronto! Foi o estopim da discórdia! Enquanto a pimenta ardia nos olhos dos outros (leia-se Shopping Bourbon) estava tudo certo e o reajuste na Planta era plenamente válido. Agora, quando a “bala ricocheteou”, a história foi outra!
O artigo 33 do Código Tributário Nacional estabeleceu que o a base de cálculo do IPTU seria o valor venal do imóvel. Entretanto, ainda que o legislador tenha trazido à baila o instituto do valor venal, não teve o cuidado de definí-lo.
Em face desta lacuna, a doutrina buscou formas de definir o citado conceito. Houve um consenso de que o valor venal do imóvel seria o preço alcançado em uma operação de compra e venda à vista, em condições normais do mercado imobiliário, admitindo-se a diferença de até 10% para mais ou para menos (Cf. HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro-tributário, 17ª edição, Atlas, 2008, p. 423).
Ocorre que, no mundo do Direito Tributário tais lacunas não podem existir. Ainda que a doutrina tenha se aproximado de uma definição comum, no que tange ao “mundo dos tributos” é a Lei o instrumento apropriado para tal tarefa. É inclusive o que diz o Código Tributário Nacional, que, em seu artigo 97, IV, determina que a fixação de Base de Cálculo de tributos somente poderá ser estabelecida através de Lei.
Em consequência, e se tratando especificamente sobre a base de cálculo do IPTU, o município de São Paulo, por meio da Lei nº 10.235/86 (que aprovou a PGV), trouxe seis tabelas anexas contendo listagem de valores, possibilitando a apuração do valor unitário do metro quadrado de construção e do terreno.
Em outras palavras, a Lei 10.235/86 alcançou o denominador que, para fins da definição de valor venal, aproximou-se do valor de mercado. Determinou, por exemplo, que o valor venal seria apurado pela soma do valor do metro quadrado da região do imóvel com o valor do metro quadrado da construção.
Hipocrisias e choradeiras à parte, todo o proprietário de imóvel sabe que o valor venal corresponde a quantia muito abaixo do valor de mercado, muito inferior à margem de 10%. Em muitos casos, o valor venal equivale a 30% do efetivo valor de mercado. Nada mais justo que ocorra uma atualização para que essa discrepância seja minimizada.
Pode-se verificar que as maiores correções ocorrerão justamente nos bairros que tiveram as mais vultosas valorizações imobiliárias nos últimos anos, tais quais, Anália Franco, Pinheiros, Vila Leopoldina e a Vila Andrade (região da Giovanni Gronchi, Morumbi), além daquelas regiões que sofreram profundas revitalizações (Brás, Largo da Batata etc.).
Ora, não é cabível pretender que o bairro do Anália Franco tenha o valor do seu metro quadrado próximo ao valor do metro quadrado dos bairros de Carrão e da Penha. É justo que haja correção acompanhando a valorização da região.
Cabe lembrar que todo aquele que entender que tenha ocorrido um reajuste acima da valorização imobiliária tem em seu alcance medidas combativas, sejam elas administrativas ou judiciais.
Então, é justo que haja a correção do valor do metro do terreno, vez que, em 8 anos, muitas benfeitorias foram feitas no município de São Paulo. Por outro lado, verificando o texto da nova lei, constata-se que além da atualização sobre o valor do terreno, a municipalidade atualizou, em média, 74% do valor da área construída.
Em outras palavras, segundo a nova lei, todo e qualquer imóvel teve a sua área construída valorizada em 74% (média), independentemente do lugar em que está localizado.
Exemplificando. Uma residência de 3 dormitórios, sala, cozinha, banheiro e garagem (Classificação - 1C) que antes tinha seu metro quadrado construído valendo R$ 350,00, pela nova lei passará a valer R$ 635,00, seja ela erguida no Capão Redondo, seja na Vila Nova Conceição. Não me parece razoável. Não vejo expansão imobiliária que possa justificar tal reajuste.
Enfim, justo ou não, ressalta-se que o reajuste na PGV beneficiará aqueles que, por ventura, tenham seu imóvel desapropriado pela administração, visto que as indenizações também levarão por base o novo valor venal do imóvel.
Cumpre ressaltar, ainda, que muitos tributaristas, alguns deles auto intitulados “especialistas” defendem que o pretendido aumento no valor venal do imóvel, e consequentemente do IPTU, seria uma afronta ao principio da Capacidade Contributiva.
Pura ignorância. Tal princípio constitucional estabelece que, sempre que possível (leia-se sempre que não for impossível), os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.
Ora, diferenciar o valor do metro quadrado e a consequente tributação de bairros cuja valorização ocorreu de maneira distinta contribui com o respeito ao princípio. Ou seja, é a constatação de que aqueles que compraram um imóvel no Jardim Anália Franco tem mais capacidade de contribuir do que aqueles que compraram seu imóvel na Penha, ambos, atualmente, tributados de maneira bem semelhante.
Destaca-se que o IPTU é um tributo direto, que incide sobre o patrimônio, e é progressivo, por expressa determinação constitucional. Sendo assim, segundo estabelece a Constituição, os imóveis mais valorizados devem ser tributados de modo mais oneroso, a fim de que os mais modestos possam ter a tributação reduzida ou suprimida.
Complementando, como próprio nome diz, o IPTU se enquadra na espécie tributária “Imposto”, ou seja, trata-se de uma obrigação tributária que não está ligada a qualquer atividade estatal específica. Em outras palavras, o valor que os contribuintes pagam a título de imposto são remetidos diretamente para os cofres públicos, servindo para o pagamento das despesas da cidade de uma maneira geral.
No caso concreto, considerando a cidade de São Paulo temos que o valor de imposto arrecadado neste ano servirá para o custeio do orçamento do município. Em 2010, segundo a proposta orçamentária enviada pela Prefeitura à Câmara Municipal em setembro deste ano poderá ultrapassar R$ 28,1 bilhões. Deste valor, as áreas de Educação e Saúde foram as mais beneficiadas, respectivamente com R$ 7,3 bilhões e 5,5 bilhões (31% e 19% das receitas de impostos), cumprindo o que determina a Constituição Federal.
Portanto, analisando todos os argumentos veiculados pela imprensa, temos que frases do tipo “KASSAB vai aumentar o IPTU”, “O IPTU deveria reverter-se em benefícios. Mas na prática, o que vemos é mais impostos e menos serviços”, “As pessoas mais pobres estão sempre pagando mais tributos”, ou “Não há nenhum critério técnico dizendo que as regiões foram valorizadas porque houve uma intervenção do município...”, somente espelham a profunda ignorância daqueles que as propagam, ou, na melhor das hipóteses, a vontade incontrolável de criticar e criar polêmica.
Guilherme Ablas, advogado tributarista, jornalista e sócio do escritório Lins e Silva, Braghette, Bueno & Ablas. Mande suas perguntas e dúvidas para rodapejuridico@notaderodape.com.br
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