Então chegou a jovem profissional belga. Naquela disposição típica de quem acredita que vai contribuir decisivamente para elevar os índices de desenvolvimento. E aquela já vinha meio enturmada, pois estava morando com seu namorido, um legítimo representante das profundezas do Triângulo Mineiro. Estava aprendendo português na cama, um lugar com óbvias vantagens para o dia a dia, mas meio complicado para os ambientes oficiais. Já tínhamos tido algumas amostras de que o aprendizado ia por caminhos tortuosos.
Íamos para uma reunião com um senador das antigas, um daqueles senhores idosos de nobre estirpe paulistana. No táxi, eu rezava pra que nada de grave acontecesse, pois precisávamos muito do aval e da parceria do senador pra um grande evento que estávamos organizando em São Paulo. A moça belga, que de burra não tinha nada, me perguntou como deveria tratá-lo.
Dei aquela orientação básica e certeira: chame-o de senhor, cumprimente com cerimônia, mas não precisa muita reverência, ele é bastante informal. Aliás, trate sempre as pessoas por “senhor” e “senhora” no primeiro contato, isso evita muitos problemas. Use as palavras que você conhece, pois é o caminho mais seguro, e as pessoas aqui sempre ajudam. E ela com aquela cara concentrada, levando muito a sério as instruções.
A reunião correu bem. Eu expliquei o que queríamos, ele foi muito amável e receptivo, deu-nos algumas dicas valiosas e instruções sobre como resolver diversos nós institucionais. Lá pelas tantas, perguntou a ela, que até então estivera calada, quem eram as pessoas que estávamos convidando, que tipo de público esperávamos.
Ela, muito compenetrada, respondeu que eram mulheres dos movimentos sociais, líderes feministas, sindicalistas, representantes de organizações de base e das grandes redes nacionais e regionais. Respirei aliviada. E ela emendou: “vomos convidarr tombém umas muié bem fodidas, que vem lá do cu do mundo, nunca forram a Sompaulo”.
Silêncio. Ele sorria, estático. Nem tentei ajeitar nada. Em segundos, nos despedimos, agarrei-a pelo braço e saímos disparadas pelos corredores do Senado, enquanto eu mentalmente desancava todos os namorados jecas da face da terra.
Júnia Puglia, cronista, mantém a coluna semanal De um tudo no NR.
12 comentários:
Adoro essa história! Escrita, então, ficou mais engraçada ainda. Obrigada pela risada pra começar o dia.
Joana
Chorando de rir! Cena infame, melhor do que qualquer piada !!!
Demais essa, Júnia... um abraço!
Essa foi demaisss!!!! A maneira cmo você descreve a situação embaraçosa, a graça que você põe num momento quase cerimonioso fazem a gente rir mesmo. Ka!ká!ká!!!!!
Sério ... nunca tinha me contado essa -) Abraço, Flo
Demais!!!!! Amazinf!! Adore ler voce!!!
Beijos Helena ( UNICEF)
Junia, muito bem narrada a história, e tão engraçada quanto combustível para reflexão. Faz-me lembrar uma outra história que a gente deve ter ouvido apenas umas zil, menentas e sufenta e fix vezes, sobre o comentário de um distinto missionário estrangeiro a respeito de uma senhora que tinha uma "cozinha tão limpinha"...
Uy! que cosa mas divertida...seguro nos pasa a todas las que no hablamos como debe de ser!!!! inolvidable
Realmente, essa experiência foi DEMAIS! kkkkkk, Beijos, Marina.
ja, ja, muy buena la historia Junia!! Esa mezcla de humor y sarcasmo tan personal. me gustó mucho!
Ri muito, querida! Que história ótima! Muitos beijos pra você.
Marcia
Engraçado como coisas desse tipo só acontece quando você está por perto, querida!!!
Rolou o envento, então...
Saudades angelíticas!
Postar um comentário
Ofensas e a falta de identificação do leitor serão excluídos.