.

.
30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quarta-feira, 6 de junho de 2012

O samba do togado doido

Lula e Gilmar em 2010, durante trabalhos do STF
Não! Não pense o leitor que vou aqui destilar mais uma catilinária contra o ministro Gilmar Mendes em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Até por que o ex-presidente é maior de idade e saberá se defender muito bem, pois tem grande experiência política e sabe lidar com situações de saia justa.

O que chama a atenção no atual episódio do encontro no escritório do ex-ministro Jobim é o emaranhado de versões repercutidas na imprensa com o propósito simples e cristalino de desviar o foco das investigações da Polícia Federal e, sobretudo, das sessões da CPMI Cachoeira/Veja/Demóstenes no Congresso Nacional.

A “defesa” do senador Demóstenes na Comissão de Ética do Senado e as novas acusações do ministro Gilmar Mendes ao ex-presidente Lula, bem como o silêncio do contraventor Carlos Cachoeira na CPMI, formam um painel expressivo de como a bandidagem insiste em tentar melar a CPMI e livrar a própria cara e de outros meliantes envolvidos, em particular em órgãos de imprensa comprometidos com toda essa semvergonhice.

Um escárnio com o Brasil que tenta trabalhar, vencer enormes desafios nas áreas da educação, da saúde, de saneamento básico. De um Brasil que tenta passar seu passado ditatorial a limpo, que tenta acabar com os juros escorchantes cobrados pelos bancos privados. De um Brasil que quer incentivar e aumentar o seu parque industrial, consolidar seu mercado interno, desenvolver regiões como o nordeste e tirar milhões da pobreza.

O discurso do senador Demóstenes na Comissão de Ética é uma pérola de cinismo e deboche com a sociedade brasileira, delatando alguns companheiros de viagem, invocando a proteção divina e sugerindo, vejam só quanta honradez, que a CPMI cumpra a sua função de ir a fundo na sua tarefa, como se ele – Demóstenes – estivesse ali por acaso ou, como cinicamente afirmou, por uma grande perseguição pessoal.

Antes dele, os jornais já haviam estampado a fotografia do silêncio de Cachoeira, com aquela expressão de quem encara o país de frente e – como o célebre personagem do saudoso Chico Anísio – pergunta: “Sou, mas quem não é?” Milhões não são, bicheiro Carlinhos, milhões não são. E esses muitos milhões exigem justiça e, acima de tudo, respeito. O seu silêncio na CPMI é o silêncio dos covardes.

E agora vem o valente e destemido ministro Gilmar Mendes, esse exemplo de profissional discreto para o cargo que ocupa, a lançar suspeitas para todos os lados, sempre e quando essas suspeitas possam atingir o ex-presidente Lula, o Partido dos Trabalhadores, alguns de seus aliados e a esquerda de um modo geral.

Há quem diga que não existe crise nenhuma e que o Brasil real não está dando bola para essas diatribes de Gilmar Mendes & Cia. Será? É sempre recomendável que em política nenhum de nós se comporte como os avestruzes que enfiam a cabeça no buraco. Crises políticas e institucionais podem surgir em 24 horas a pretexto deste ou daquele acontecimento.

Senão vejamos: militares da reserva e alguns da ativa, segundo se depreende por manifestos aqui e ali, estão receosos ou mesmo contra a instalação e os trabalhos da Comissão da Verdade; fazendeiros e usineiros estão descontentes com os vetos da presidenta ao Código Florestal; os bancos privados ainda não engoliram a baixa dos juros e não vão abrir mão assim sem mais nem menos de seus escorchantes lucros; os conglomerados mediáticos andam assustados com medidas ou leis que possam vir a regular a atuação do setor com a criação de uma nova Lei de Meios. Tudo isso a um só tempo.

Juntos, esses setores, mesmo que com alguns conflitos de interesses entre eles aqui e ali, sempre estiveram nas trincheiras do obscurantismo, do conservadorismo, apenas em defesa de seus negócios e contra os direitos dos trabalhadores que constituem a maioria da população brasileira. Não há que superestimá-los, concordo, mas também não se deve subestimá-los.

Quando um país que inicia sua caminhada para a maioridade tem na sua mais alta corte de justiça um togado cuja atuação e o linguajar lembram mais nossas jagunçadas interioranas, torna-se necessário que botemos as barbas de molho. Ninguém é bandido até prova em contrário... E muito menos santo.

Izaías Almada, escritor, dramaturgo, mantém a coluna mensal Pensando Alto

Um comentário:

Anônimo disse...

É uma perseguição das elites, com certeza, ao PT e o novo pai dos miseráveis(ironia), vide o projeto de lei do Senador Delcídio Amaral do PT-MS para anistiar penal e tributariamente os nobres e probos Contribuintes, e não sonegadores,que trouxerem para o Brasil dinheiro enviado ilicitamente para o exterior.Isto beneficiará muito o povo que verá seu dinheiro que foi desviado de inúmeras obras públicas, por exemplo, sendo gasto legalmente pelos corruptos e corruptores aqui dentro do nosso país mesmo. Faço minhas, algumas de suas palavras:''É sempre recomendável que em política nenhum de nós se comporte como os avestruzes que enfiam a cabeça no buraco. Crises políticas e institucionais (pode-se ver aqui um exemplo, o juiz togado da mais alta corte comparado a um jagunceiro interiorano) podem surgir em 24 horas a pretexto deste ou daquele acontecimento''.Aliás o relator do processo do mensalão tem esta mesma opinião (sobre o jagunceiro) mas ninguém quer lhe dar crédito, afinal ele pede a condenação dos 43, do bando do Ali Babá.Desculpe-me Izaías, mas ao ler seu artigo vi nele justamente o que você disse que não iria fazer. Mas gostei dele em alguns pontos, inclusive de coisas que entram na imprensa para desviar o foco do que realmente é importante para o Brasil. José Carlos Sabino Tarsitano

Postar um comentário

Ofensas e a falta de identificação do leitor serão excluídos.

Web Analytics