A candidata Dilma Roussef não fugiu ao desenho que se esboçou durante a campanha, deixando bem claro o seu programa de governo e, nele, a sua preocupação em eliminar a miséria no Brasil, destacando a saúde e a educação como elementos fundamentais para esse objetivo. E com muita razão.
Completados os primeiros 45 dias após o resultado das eleições e chegando o ano de 2010 ao seu final, a presidente eleita – com aparente calma e determinação – vai montando a sua equipe de governo num quadro, se é possível assim dizer, bem mais tranquilo do que aquele que caracterizou a primeira eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
As pressões para a indicação de ministros, internas e externas, essas normalmente apresentadas como balões de ensaio pela velha mídia, são inúmeras. Não deve ser fácil à presidente eleita equilibrar na balança do poder os seus objetivos estratégicos de governo com os compromissos assumidos com partidos aliados e até com o seu próprio partido.
Em segundo plano
Bem posta a questão e consideradas as dificuldades naturais para a composição de um novo governo, a sucessora do presidente Lula comete, involuntariamente quero acreditar, o mesmo erro da maioria de seus antecessores, incluindo o próprio Lula. Os ministérios prioritários da Saúde e da Educação, até a altura em que escrevo esse artigo (14/12), ainda não tiveram seus ministros definidos. Além desses dois, outro ministério importantíssimo, o da Cultura, como sempre acontece, é um dos últimos a ter o seu titular definido. Uma vez mais a Cultura fica relegada a um segundo plano dentro das prioridades governamentais, o que – aliás – ocorre há anos. E não somente em nível federal, mas também em níveis estaduais e municipais.
Não quero fazer disso uma crítica a um governo que nem ainda tomou posse. Reconheço que seria uma irresponsabilidade, mas o fato em si é um acontecimento que se repete invariavelmente, pois o Brasil ainda não aprendeu a reconhecer o valor da Cultura (com C maiúsculo mesmo) como elemento mobilizador de enriquecimento e transformação de seus cidadãos. Fala-se muito a respeito, mas faz-se pouco, essa é a verdade que não quer calar. Basta ver no orçamento da União o valor da verba destinada à Cultura.
Caríssima presidente: a senhora ainda deve se lembrar com entusiasmo do revigoramento da sua campanha por ocasião dos encontros com artistas e intelectuais no Teatro Casagrande no Rio de Janeiro e no TUCA em São Paulo. Não se trata aqui de estabelecer qualquer tipo de privilégio, mas o seu governo poderá resgatar uma dívida do estado brasileiro para com muitos daqueles que têm dedicado boa parte de suas vidas a tentar fazer da cultura brasileira um símbolo de humanismo e solidariedade, uma luta de resistência contra a mercantilização de alguns valores tão caros a uma cidadania que teima, por exemplos de governos ainda recentes, em escoar pelo ralo da mediocridade e da arrogância, quando não da venda pura e simples da nossa alma ao diabo.
Eliminar a pobreza, mas não só a material. Essa, com certeza, é urgente. Contudo, a pobreza espiritual também merece cuidados. Não é por acaso e chega a ser patético que uma ex-miss Brasil, transformada em atriz de telenovelas e que agora se diz também escritora proclame no lançamento do seu primeiro de dez livros escritos em apenas um ano: “Detesto escrever para pobres”. Ainda temos que ouvir essas barbaridades.
Izaías Almada é escritor e dramaturgo e colunista do Nota de Rodapé
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