Chupar é bom e da nossa fisiologia. No futebol, no entanto, não é bem assim. (GettyImages) |
Fulano grita diante do gol de seu time “Chupaaaa”. Outro reverbera de outro ponto com mais ardor “Chupaaaaaaaaaaaaaaaaa”.
Sempre, é claro, com o complemento: “Porcada”, “Gambá”, “Bambi” para ficar em poucos exemplos regionais de São Paulo.
O “chupa” ou “ chupar”, utilizado com essa eloquencia entre torcedores rivais diante de um gol, vitória ou título sempre me encafifou. Explico. Chupar, segundo o dicionário, significa “levar (líquido) à boca por meio de uma sucção feita pelos movimentos dos lábios e da língua”. É da nossa fisiologia como, por exemplo, beber, mastigar e cheirar.
Chupar é também um ato de prazer que pode ser conseguido de várias maneiras – além do sexo oral, no sorvete, na bala, no mel etc; no mundo animal, o exemplo que me vem a cabeça é o beija-flor, que não deixa de ser um chupa-flor.
A sanguessuga (ou sangue-chupa) é um bicho que se alimenta do sangue de outros animais. E não esqueçamos dos recém-nascidos e crianças que chupam o dedo a doidado ou se abastecem de chupetas bem transadas dadas pelos pais.
Chupa é até nome de um distrito do Peru, no departamento de Puno, localizada na província de Azángaro. Tem gente que gosta de chupar o gelo de um drink. E o chimarrão? Ora, pessoas chupam o mate para conseguir o sabor proporcionado pelo alimento da erva-mate; precisam da cuia, bomba e água morna. É um hábito cultural tradicional herdado dos índios.
E o Chup-Chup (também conhecido como geladinho e sacolé) com seu frescor de gelo com algum sabor de sucos artificiais, tudo dentro de um saquinho? Em épocas de vacas magras, cheguei a vender de limão, tangerina e chocolate para levantar um trocado.
Da grupo musical Aviões do Forró se tira outro caso: “Na sua boca eu viro fruta/Chupa que é de uva!/Chupa! Chupa!/Chupa que é de uva!”. Da letra sensual se supõe o óbvio. E além da uva, são chupaveis a manga, laranja, limão, mexerica, lichia, jabuticaba, ameixa e outras delícias.
E se fizermos uma pesquisa mais detalhada descobriremos outras canções que tem no “chupar” o seu mote musical. Gostamos da coisa de várias maneiras e somos todos chupadores.
A expressão “Chupa que a cana é doce” é mais antiga e muitos devem se lembrar. Se a cana for mesmo doce, chupá-la é uma delícia. Talvez daí se origine o chupa do futebol, como interjeição de vitória.
Acho, no entanto, que mandar o rival chupar tem também o sentido de fazer sexo oral a contragosto e sem prazer; fulano manda geralmente “chupar o pau” do outro como uma forma de submissão e inferioridade do adversário.
O torcedor que se propõe a essa tentativa de ofensa cai numa armadilha inevitável. É que, mesmo sem saber e sem querer, reforça toda uma cultura machista e homofóbica que impregna o esporte (e grande parte da sociedade).
O que me conforta é que se me mandarem chupar vai me soar como “tenha prazer”. O que é bonito e solidário, vejam só, já que ao obter seu prazer futebolístico vai me lembrar que posso obter o meu ao chupar um sorvete de doce de leite, dos meus preferidos, para amenizar o meu desgosto.
Thiago Domenici, jornalista. Texto publicado em conjunto no blog TodasNós.
8 comentários:
Thiago, o texto é tão delicioso que me deu vontade de chupar. Chupar o ritmo, a fluência, a brincadeira!
Valeu, Fê, querida. vou começar a dizer chupa em vez de tchau. Hehe.
No meu prédio - e eu mesmo - já mandei muita gente chupar. Legal esse ponto de vista do prazer do negócio. Bom texto, Thiago, escreva mais, parabéns. Fredo Sidarta, SP
Querido! Que saudades!!!
Lindo e erotizado texto. Sinal que as coisas andam bem e eu fico feliz por isso. Grande beijo! EY.
Eliana, é sempre uma alegria você por aqui. :)
Saudades de você também. Obrigado pela leitura, fico honrado! Beijão. Thiago
Só li agora, velho. Adorei. Além de divertido, foi uma bela sacada no encerramento. Abraço.
Muito bom, Thiago!!
Chupa!!
Parabéns pelo texto... É bom saber que ainda existem pessoas com este bom humor!
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