Desde o dia 3 de maio, quase nada foi dito sobre o operário de 25 anos de idade. Na data, no canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Jirau, em construção no Rio Madeira, Rondônia, o funcionário da mega empreiteira Camargo Corrêa – parte do consórcio Energia Sustentável do Brasil, vencedor da licitação do Governo Federal e condutor do projeto – trabalhava acelerado. Como sempre, os gritos dos chefes exigiam “produção”, “produção”.
Sinaleiro de guindaste, José Roberto se equilibrava no topo de estruturas metálicas, servindo como os “olhos” dos motoristas das máquinas.
Estava há dois dias sem dormir. No dia 3, foi receber o pagamento e pagar contas em Porto Velho, capital do Estado, distante 135 quilômetros das obras. Voltou para o batente à noite, sem nenhum período de descanso, naquele que seria o último turno da sua vida.
A inexistência de bandejas de proteção no perímetro da estrutura, além da ausência de cabo guia para fixação do cinto de segurança, fizeram desaparecer a proteção ao trabalhador. O óbvio esgotamento físico e mental, se não foram definitivos, formam parte do cenário que provocou a queda fatal de José Roberto.
Histórias que poucos contam
No grupo de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal, a Usina de Jirau foi palco recente de greves em que operários protestavam contra falsas promessas na contratação, descumprimento de acordos, maus-tratos físicos, ameaças, desvios de função, falta de equipamento de segurança, não pagamento de horas extras, treinamento insuficiente e até a existência de um cartão bônus de R$ 600 para quem, entre outras coisas, não tirasse folgas para visitar familiares e não ficasse doente.
Dado impactante é que o consórcio Energia Sustentável do Brasil recebeu aproximadamente mil autuações da Superintendência Regional do Trabalho desde o início das obras, em 2008. Entre os itens flagrados nas fiscalizações, há vários relacionados com falta de segurança para trabalhar.
No entanto, as polêmicas das grandes usinas geradoras de energia, como Jirau e Santo Antonio, em Rondônia, e Belo Monte, no Pará, são cercadas, quase que totalmente, por debates baseados na questão ambiental. Campanhas mobilizam atores globais e exigem respeito à diversidade de fauna e flora locais, muitas vezes, sem nenhuma atenção à ciência.
Nesse embate, em que predomina o tom moralistóide na abordagem de assuntos estratégicos, como a energia, a justificativa é da importância do macro. Nele, vence a desculpa de um jornalismo ocupado com “questões maiores”, onde as histórias de vida e morte de trabalhadores de grandes empresas brasileiras que morrem nas obras regadas a recursos públicos – saídos do Fundo de Garantia e do BNDES – não têm espaço.
Moriti Neto, jornalista, mantém a coluna mensal Escarafunchar
9 comentários:
No alvo, Moriti. Parabéns!
Valeu, companheiro!
Até quando trabalhadores e trabalhadoras que passam a vida em busca do sustento dos seus, serão vitimas fatais desse discurço patronal hipócrita de que o macro se sobrepõe a vida desses homen e mulheres paes e mães de familia. Precisamos de mudanças.
fantástico Morti, bela matéria!!!
Obrigado pelos comentários, Dinho e Ge. Abraços.
Um ótimo texto com um tema de extrema importância! Parábens!!!
Olá, Cris. Valeu pelo prestígio.
Eis as notícias que ninguém quer dar.... Afinal, todo mundo nesse país parece ter um rabo preso com a Camargo Correa ou com Cachoeira.
Olha, Sara, em algumas situações, até podemos dispensar o "ou".
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