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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quarta-feira, 23 de maio de 2012

O entendimento de cada um

– Quer CPF na nota?
– Não, obrigado. Não quero nada de nota fiscal paulista, nem mineira, baiana, gaúcha...
– Nota Fiscal Paulista é preconceito, né?
– Claro que não. É porque estamos em São Paulo, por isso tem esse nome.
– Será? Acho que é preconceito... devia ter outro nome.
– Imagina, imagina. Preconceito é outra coisa...
(fim de papo)

O diálogo acima se deu entre um senhor grisalho a fazer compras e uma caixa de supermercado. Eu vinha logo atrás, com uma tulipa em mãos, a presentear uma amiga de minha esposa, aniversariante naquele dia. O que soa engraçado na cena – e é, sem dúvida, inusitado – me fez pensar no significado que cada um dá as coisas.

A moça do supermercado, meio sem jeito, seguiu no atendimento dos poucos gatos pingados. Pensava, acho, no que tinha acabado de dizer. E eu, imaginava, o que ela pensava sobre o que havia dito.

Uma versão possível para mim é que, de certa forma, preconceito é tudo aquilo que não entendemos (ou não queremos entender) e, portanto, rechaçamos sem mais pensar. É o que podemos descobrir, compreender e conviver e, sem mais, ignoramos por comodismo, ignorância, desinformação. Em alguns por ideologias intolerantes.

A caixa do supermecado, a meu ver, respondeu no automático uma intervenção de um cliente que pretendia ser engraçado. Ela tentou interagir. Quando o cliente viu que sua intenção não foi recebida como tal, recuou, afinal, a discussão passava para algo mais complexo.

Em geral a reflexão requer dedicação. E temas importantes da sociedade costumam ser deixados de lado, em segundo plano. Mas a cena em questão me criou uma ideia curiosa: um diálogo entre a caixa e o senhor grisalho em que todos na fila acabariam se envolvendo. Os temas: nada de trânsito, futebol ou clima. Por que não trabalho escravo, aborto, política educacional ou cotas em universidades?

Não seria interessante e também engraçado? Um avanço, sem dúvida.

Thiago Domenici, jornalista

4 comentários:

Moriti disse...

Ótimo, Thiago. Curti muito a reflexão sobre preconceito. É bom ter o NR de volta. Abraço.

Bruno Silveira disse...

Parabéns pelo texto, Thiago! Essa história de conversas serem mais complexas e se tornarem triviais é uma das coisas que desejo também.
Seguimos firmes, porém.
Abraços!

Fernanda Pompeu disse...

Arguto, Thiago!

Thiago Domenici disse...

Obrigado pela leitura! Abs, Thiago

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