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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

A quem interessa garfar 25% dos leitos do SUS?

Dezembro é mês de pé no freio. É também período em que notícias de interesse público caem no limbo. É o caso da aprovação do Projeto de Lei Complementar 45/2010, por 55 votos a favor e 18 contra, que reserva 25% dos leitos do Sistema Único de Saúde para Planos de Saúde privados. A aprovação se deu na noite do dia 21, uma terça-feira, na Assembleia Legislativa de São Paulo. Apresentada em regime de urgência pelo Governador Goldman, a mesma proposta foi vetada por José Serra no final de 2009. Estranho? Segundo o texto do PLC aprovado, a definição das unidades que poderão ofertar serviços a pacientes particulares ou usuários de planos de saúde privados e outras questões operacionais será realizada pela Secretaria Estadual da Saúde. Na mensagem que encaminhou o projeto, o Executivo argumentou que hospitais como o do Câncer, Dante Pazzanezze, e Instituto do Coração, que realizam atendimentos de ponta, poderão receber pacientes da rede privada, sendo ressarcidos por seus gastos. Pergunto: mas já não existe a Lei 9058/1994 trata sobre o reembolso de valores correspondentes a seguro-saúde de beneficiários atendidos gratuitamente na rede pública. Não seria o caso de cumprir a lei que já existe?

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Esse montande de leitos será reservado aos hospitais públicos de alta complexidade gerenciados por Organizações Sociais de Saúde (OSs). "Tendo em vista que cerca de 40% da população do Estado possui planos e convênios privados de saúde e que essa parcela se utiliza rotineiramente do atendimento destas unidades estaduais especializadas e de alta complexidade, não é adequado que as unidades respectivas não possam realizar a devida cobrança do plano ou do seguro privado que esses pacientes detêm", justificou o governador. Os deputados que votaram a favor da proposta (veja aqui a LISTA dos nomes) poderiam responder, então, o desabafo enviado ao NR por um médico que vive o dia a dia do SUS e dos Planos de Saúde que prefere não se identificar. “Na prática isso não dará certo. Leitos são unidades altamente dinâmicas, mudam a cada hora, a cada dia, e não dá prá dizer que a quantidade de doentes necessitados de leitos se enquadrarão exatamente nos 25% previstos na PLC. Mais uma vez interesses econômicos sobrepostos aos interesses pela saúde. E o trabalho médico fica extremamente limitado por medidas como essa. A partir do momento que isso começa a valer, o médico é cobrado pela instituição em que trabalha a não contrariar essa regra. Ou seja, se eu tenho 15 leitos para SUS e 05 para convênios, mas tenho 17 pacientes precisando de leitos de SUS, a lógica é simples: - Dr, vc vai ter que escolher, ou dá alta prá 02 do SUS que já estão "mais ou menos" ou se vira com esses 02 doentes! Aí, o médico põe o dele na reta e, caso um desses pacientes necessitados de leitos morra ou tenha complicações pela falta do leito, ou por uma alta precoce e "forçada" de alguém que deveria ter mais alguns dias de internação, a culpa não é da lei, do governo, da prefeitura ou do diretor do hospital, mas do médico que carimbou essa alta ou negou esse leito. Aí vem o Datena e fode com tudo de vez... É isso o que vejo, na prática, acontecendo.” 
O texto, promulgado no dia 27 de dezembro, diz. "O contrato de gestão deverá assegurar tratamento igualitário entre os usuários do Sistema SUS e do IAMSPE e os pacientes particulares ou usuários de planos de saúde privados." Mas quem regulará? Quem vai garantir que não teremos duas filas? Neste tema, caros deputados favoráveis e governador, muitas perguntas estão sem a devida resposta.

Thiago Domenici, jornalista

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