Saramago pelo ótimo lápis de Cássio Loredano |
“Se eu tivesse morrido antes de te conhecer, Pilar, teria morrido sentindo-me muito mais velho. Aos 63 anos, a minha segunda vida começou”, contou certa vez o escritor que costumava dizer que as melhores coisas de sua vida haviam acontecido tardiamente. Não era uma queixa, mas uma constatação que fazia muito sentido. Saramago decidiu tornar-se escritor depois do 50 anos, conheceu Pilar depois dos 60 e recebeu o Nobel aos 74 anos.
Quem assistiu ao documentário José e Pilar viu a luta do escritor português contra a morte. O corpo começou a dar sinais de fadiga, mas Saramago ainda queria escrever e amar. Em 2007 ele havia se recuperado de uma grave doença. Naquela época Saramago disse: “Nossa única defesa contra a morte é o amor”. Em junho de 2010, numa sexta-feira, a morte chegou para ele.
É uma ausência presente, como escreveu Pilar recentemente. “Um ano já sem Saramago. Como é possível, perguntar-se-ão alguns, se continua a publicar livros, se está nas conversas dos analistas políticos, se os jovens saem à rua com as suas frases escritas em cartazes ou em t-shirts, se há concertos de rock onde o aplaudem ou se organizam outros de música erudita em seu nome? Que estranha ausência é essa?”.
Já faz um ano, mas o relógio da casa de Lanzarote não se moveu sequer um segundo. Continua marcando as mesmas 16 horas de sempre. As 16 horas do início da segunda vida de Saramago.
Nesta dia 18 as cinzas de José Saramago serão levadas a Lisboa e depositadas em frente à sede da fundação que leva seu nome. Ele descansará à sombra de uma oliveira trazida de Azinhaga, sua terra natal. Os visitantes terão o gosto de sentar-se no banco de jardim e admirar, ao lado do escritor, o rio Tejo.
Ricardo Viel é jornalista e colunista do NR
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