Acrescento alguns brazucas à lista de Elvira. Começando pela contribuição consanguínea da música sertaneja: Tonico e Tinoco, Chitãozinho e Chororó, Leandro e Leonardo, Zé Camargo e Luciano, Sandy e Júnior. Temos também os irmãos Sarney, os Buarques de Holanda, os Marinhos, os Frias, os Mesquitas e, é claro, Pedro e Fernando Collor. Esses dois últimos, uma versão tupiniquim de Caim e Abel.
Sampa fica bem na fita. Mais contemporâneo escrever, bem no Facebook. Mesmo que muita gente não se dê conta, moramos, trabalhamos ou caminhamos sobre algumas irmãs. Irmãs que deram o nome a vilas. Como o caso da Ida, Beatriz e Madalena. O pai, seu Gonçalo, imigrante português, fatiou uma imensa gleba e decidiu homenagear as filhotas.
Cada uma delas, mesmo depois de findas, ganharam coloridos de personalidade. Beatriz mantém o ar da origem campestre, ainda é possível ouvir o galo cantar nos quintais de suas casas. Ida, a mais séria, sedia a Paróquia Nossa Senhora Rainha da Paz, orgulhosamente construída pelos moradores. Diga-se como ilustração, as três vilas se formaram, na primeira metade do XX, pelas mãos de motorneiros, padeiros, sapateiros, pedreiros, costureiras, doceiras e funcionários públicos.
Madalena roubou a cena das irmãs. Fez isso com a ajuda da proximidade de Pinheiros, da especulação imobiliária, da estação de metrô, das dezenas de bares, restaurantes, ateliês e lojas charmosas. O pessoal do entorno diz apenas Vila e todo mundo sabe que é a Madá. "Lá na Vila". "O metrô da Vila". "A feira da Vila". "A livraria da Vila".
Na região central da cidade, há o caso de três irmãs, não em sangue, mas em títulos de nobreza. Filhas de barões, duas viraram ruas e uma, avenida. Maria Antônia, Veridiana e Angélica se tornariam conhecidas por 92% dos paulistanos. Cada uma, depois de mortas, e a sua maneira, fariam história na Paulicéia.
Dona Veridiana, a caridosa. Os que procuravam a Santa Casa da Misericórdia para se curar ou abandonar bebês na Roda dos Expostos passavam por ela. Dona Veridiana e a Santa Casa continuam lá, agora sem Roda dos Expostos, mas com muitos aflitos.
Maria Antônia se tornou referência histórica, quando em 1968, com a ditatura militar a pleno cassetete, eclodiu o conflito entre estudantes do Mackenzie e os da Faculdade de Filosofia da USP. O Mackenzie tinha grupos de direita e a Filosofia, é claro, abrigava gente de esquerda. A coisa esquentou com ovos, pedras, paus, coquetéis Molotov. Essa passagem ficou conhecida como "A batalha da Maria Antônia".
Por fim, a mais importante delas, Angélica. Em um século, a avenida teve várias caras. Abrigou casarões de barões do café, prédios de apartamento com estilo. Entre eles, um de Oscar Niemeyer. Uma praça maravilhosa, a Buenos Aires. Hoje, a inquieta Angélica segue mudando com construções de mau gosto e grana muito alta.
Fernanda Pompeu, escritora e reatora freelancer, colunista do NR e do Estúdio Saci, escreve às quintas. Ilustração de Carvall, especial para o texto.
2 comentários:
Amei a ilustração do Carvall
Eu também, diferente de seu trabalho e tão bom quanto o texto!!!
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