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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Não é todo dia que se vê um jogo de Copa do Mundo

por Pedro Mox*

O horário da partida era uma da tarde, mas às nove eu estava pronto. Não é todo dia que se vê – e porque não, sente – um jogo de Copa do Mundo. O estádio Governador Magalhães Pinto, popular Mineirão, receberia o último confronto do grupo D; o temido grupo formado por Itália, Uruguai, Inglaterra e Costa Rica. Àquela altura, entretanto, o “grupo da morte” mostrava-se letal apenas aos campeões mundiais: os caribenhos jogavam por um empate, que lhes asseguraria a primeira colocação. Itália e Uruguai digladiariam pela segunda vaga, aos ingleses restava tentar não realizar a pior campanha do país na história em mundiais.

O trajeto até o estádio mostrava-se descomplicado até a metade do caminho, quando filas intrínsecas a eventos de tal magnitude acabam aparecendo. Nas proximidades do estádio, diversas placas apontavam o caminho de estacionamentos e entradas para pedestres. Estaciono sem problemas e faltando pouco para o meio-dia avisto o imponente estádio de capacidade para 62 mil torcedores. Seu entorno tem chão acimentado, na cor do estádio, que por fora não me parece muito diferente do “velho” Minera. Uma gigantesca faixa com grafismos do evento exibe a frase “Bem vindos a/welcome to Belo Horizonte”. Todas as placas, bem como informações vindas pelos alto-falantes do estádio são em inglês e português.

Ao contrário do que imaginei, em nenhum momento foi-me solicitado o ingresso nos arrabaldes do Mineirão. Bem verdade que era um “amistoso”, mas o clima de alegria e descontração era geral – como imagino ser também nos outros. Fantasiados, caras pintadas, perucas, todos os tipos mais excêntricos que aparecem na TV estavam lá. Dezenas de camisas de clubes e seleções também conviviam harmonicamente: Brasil, México, Argentina; Cruzeiro e Galo; times de outros estados... Um mar de cores que, tal qual o vento em um deserto, formava e destruía belos mosaicos a cada instante.

A primeira entrada é um raio-x, para bolsas e pessoas – idêntico aos de aeroportos. A fila é organizada e não leva mais de 10 minutos. Não é permitido entrar com nenhum alimento, o que me fez pensar o desperdício de milhares de barrinhas de cereal ou biscoitos tipo social club. Acharia ótimo se, em vez de um lixeiro, houvesse um cesto de doação que pudesse aproveitá-los. Já mais próximo, mas ainda fora do estádio, está a entrada de fato, na qual uma voluntária passa meu ingresso num leitor óptico e deseja “boa partida” – sem catracas ou barreiras. Não sei se tal logística permanecerá nos jogos do brasileirão.

Dentro há mesinhas e lixeiras, com separação do que é reciclável. No momento que fui, os banheiros estavam limpos, mas metade das pias não tinha água. Os bares oferecem sanduíche natural, hambúrguer, salgadinhos. Fiquei feliz ao ver que o famoso tropeiro do Mineirão continua lá, ao preço de 15 reais, vendido numa quentinha de isopor. E continua saboroso. Para beber, Budweiser, cerveja oficial da copa, R$ 13; e Brahma, patrocinadora nacional do evento, R$ 10, ambas 473ml (equivalente a um pint estadunidense). Coca cola, num copo que traz também o jogo do dia. Aí está uma grande cretinice da FIFA, na minha opinião: o bar só aceita cartões Visa, patrocinadora do evento. Se o torcedor tem 10 em dinheiro e cartão Master, é obrigado a ir ao caixa eletrônico do estádio para sacar em espécie.

Compro minha cerveja – ou melhor, compro um copo e ganho a cerveja – e sigo para meu lugar: anel superior, cadeira em frente ao círculo central. O melhor lugar para se assistir a partida. Se por fora não mudou muito, internamente é um novo estádio, não lembra em nada o antigo Mineirão. O locutor pede aos presentes que se levantem para os hinos nacionais, e ambas torcidas os cantam alto. No anel inferior, à minha esquerda, a maioria inglesa; à direita costarriquenhos. A torcida brasileira torcia em massa para os latinos, e porventura eu fosse um dos poucos brasileiros torcendo pela terra da rainha – inclusive com a bela camisa vermelha de 66. Os telões alternam a exibição do jogo, com placar e tempo, com torcedores que vez ou outra produzem vaias ou aplausos.

Sem muitas pretensões por parte das equipes, futebolisticamente o jogo é fraco. Mas as torcidas dão show, com grito de “chicos” e “go england”. Fico lá sentado, literalmente apenas assistindo. Mas, esse modo “padrão fifa” é muito chato para mim. No intervalo, rumo ao setor britânico; já no acesso me sinto num território gringo, só ingleses falando alto e tomando Brahma como se fosse Carling. Na arquibancada, em meio a muitas bandeiras da Inglaterra, arrumo um lugar na reta da bandeira de escanteio, na verdade quase no corredor. Ali não tem assento marcado e todos vêem o jogo de pé. Muitos tem os três leões da FA (a CBF inglesa) tatuados; apesar de o jogo não valer nada eles cantam e incentivam o time como se a vitória valesse algo mais que uma despedida honrosa.

As entradas de Gerrard e Rooney dão novo ânimo, Sturridge e Sterling até executam boas jogadas. Braços erguidos, os “pais do futebol” cantam “shall we sing a song for you”, a melodia de “Hey Jude” dizendo “En-gland”. Não há como não acompanhar. Já nos acréscimos o fair play dá lugar às provocações naturais do futebol: torcida grita “olé”, “eliminados”, e vejo alguns copos voando da parte superior em nossa direção. Os ingleses mostram o dedo do meio e continuam cantando; foi o único momento no qual ponderei que algum incidente poderia acontecer – eu não vi, mas li que a tropa de choque cercou os eliminados mais exaltados para evitar qualquer confusão, que de fato não houve.

Apesar de um segundo tempo de muita garra, o placar permaneceu zerado. O que não mudou em nada o reconhecimento daqueles que cruzaram o oceano para acompanhar sua seleção. Após a partida jogadores e técnico se aproximam para agradecer, alguns jogaram camisas, e ali ficaram alguns minutos, admirando a enorme festa feita na arquibancada.

Na saída a fila é muito maior que na chegada, algo que não chega a surpreender dado o público de quase 58 mil pessoas. Todos vão-se com calma, tiram fotos. Uns agora iriam para casa, outros continuam na copa. Se o futebol não encantou, Inglaterra x Costa Rica proporcionou uma inesquecível partida.

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*Pedro Mox, jornalista e fotógrafo, especial para o NR

Um comentário:

Brandão disse...

Grande Pedro, mais um bom texto

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