Se as eleições forem (fossem?) sérias e houvesse real debate de propostas, não haveria como este governo ser derrotado para um representante das ideias da década passada. Mas, como pontuei em coluna para este blogue antes do começo das eleições, se o governo Lula perder, terá perdido para sua falta de ousadia. Uma gestão com tamanha aprovação tinha a obrigação de promover mudanças estruturais. Uma das mais prementes é o câmbio radical no setor de comunicação.
Daqui por diante, em nome da elevação do nível do debate, deixo os leitores com as palavras da professora e filósofa Marilena Chaui, que seguramente tem argumentos mais bem trabalhados que os meus. Na sexta-feira (8), Marilena esteve em um ato pró-Dilma, no qual manifestou a necessidade de combater a agenda da mídia comercial e as velhas oligarquias do agronegócio, e de reforçar a democracia.
“Temos que impedir que três famílias pautem a agenda desse processo eleitoral. Quando digo que essas três famílias, que confundem seus lucros no mercado com a liberdade de expressão, porque é isso que acontece, a mídia está querendo agendar a temática desse processo eleitoral. E o que entra é a controvertida questão do aborto”, afirmou a professora, que considera que Serra é um candidato sem programa: “A ausência desse programa faz com que se procure inventar um assunto que possa ocupar a opinião pública, sobretudo por intermédio de uma intervenção de tipo religioso.”
Serra, oportunista, é agora religioso e ambientalista. Sobre o primeiro, não há necessidade de tecer comentários. Sobre o segundo, basta lembrar as obras do Rodoanel e da ampliação da Marginal do Rio Tietê. Mananciais e árvores? Não, Serra é da turma do cimento. Ou alguém que cogitou ter como vice Kátia Abreu, pilar-mor da bancada ruralista no Congresso, pode ser ambientalista?
Oras, o Brasil está saindo lentamente da longa noite dos quinhentos anos. Os trabalhadores, pela primeira vez, não têm de se agachar aos patrões – bem pelo contrário. O país, pela primeira vez, não tem de se agachar aos interesses de outras nações. Então, ou se aborta essa discussão oportunista sobre o aborto, ou acabaremos por abortar a conquista de nossa soberania. Por consequência, será abortado o fim da longa noite dos quinhentos anos. Voltaremos ao tempo em que mandavam os outros?
Único PS: está no pé da matéria sobre a pesquisa Datafolha, mas está: apenas 10% ainda cogitam mudar o voto. Como a diferença entre Dilma e Serra é de oito pontos, e o ponto que passa de um vai pra outro, as eleições, em tese, estão praticamente definidas. Mas, como o Datafolha conversa com gente de opinião volátil, tudo pode mudar. Principalmente na pesquisa de 30 de outubro.
João Peres é jornalista e colunista do NR
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