por Cidinha da Silva*
Dilma é mulher e por isso, mesmo na condição de chefe de estado, foi alvo de xingamentos de ordem sexual durante a abertura da Copa do Mundo no Brasil, oriundos da ala VIP, onde se empoleiram os endinheirados beneficiados por ingressos gratuitos, simplesmente porque sua presença enobrece os eventos.
Passados os xingamentos orquestrados pela elite econômica e cultural branca presente ao estádio, a Presidenta foi defendida por mulheres (nenhuma surpresa) e parcos homens que o fizeram mais por respeito a uma senhora (símbolo da mãe, da mulher de família), do que por compreenderem de maneira profunda o teor destrutivo das representações sexistas que estão na base da alastrada e duradoura violência contra a mulher e do feminicídio, recurso vil empregado por aqueles que não atribuem qualquer valor às mulheres e à sua vida, justamente por serem mulheres e por isso, matam-nas ao mínimo sopro contrário à vontade do macho soberano.
Joaquim é um homem negro, dirigente da mais alta corte de justiça do país, achincalhado por uma entidade de classe porque um advogadozinho, membro da entidade, em busca dos holofotes destinados aos factoides políticos, desrespeita o Presidente do STF, ameaça “pegá-lo” na rua, grita dentro do Tribunal, não aquiesce ao chamamento ao equilíbrio, ao respeito às pessoas, às regras de boa conduta e à casa. Joaquim é um homem negro íntegro que reage, faz valer sua autoridade como Presidente do STF, não capitula diante do status quo que tenta acuá-lo na camisa de força de um dito temperamento irascível.
Pedagógico é observar como até a masculinidade de Joaquim é subalternizada por seus detratores, pois, de que outro homem, senão de um homem negro, se esperaria a recepção passiva a um homem (branco) que lhe pusesse o dedo no nariz e o ameaçasse em seu próprio posto de comando? Ademais, soube-se mais tarde, pelo depoimento dos seguranças que interceptaram a ação midiática do advogado, que ele estava visivelmente alcoolizado e que, se estivesse armado, “atiraria na cara do Presidente”. Mas, ainda assim, a entidade de classe conseguiu igualar a reação correta, altiva e preventiva de Joaquim Barbosa a práticas da ditadura civil-militar, porque, aos olhos deles, o homem de masculinidade subalternizada é quem deveria aquiescer diante um sujeito qualquer.
Dilma e Joaquim têm em comum a ocupação de um lugar inusitado de poder e o desconserto generalizado causado pela presença de ambos nesse lugar. A escória elitista não os engole porque são exemplo positivo para a raia miúda, porque as meninas hoje brincam de ser Presidenta, vestem as bonecas como Dilma e as bonecas presidem. Porque Joaquim Barbosa inspira milhões de mulheres e homens negros. Porque ele representa a possibilidade real de que pessoas negras ocupem postos de comando e promovam transformações simbólicas e concretas na vida material e na expectativa de uma vida melhor para os seus.
* * * * * * *
escritora, Cidinha da Silva mantém a coluna semanal Dublê de Ogum.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Ofensas e a falta de identificação do leitor serão excluídos.