.

.
30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

O último Amor

Faleceu ontem, em um pequeno povoado ao Sul do país, o último exemplar conhecido de Amor. As causas da morte ainda não foram confirmadas pelas autoridades, mas as primeiras informações dão conta de que a pequena criatura de apenas cinco meses não suportou o rigidez dos tempos em que vivemos e sofreu uma parada cardíaca fulminante.

A notícia da morte causou comoção não só na comunidade científica, mas na sociedade civil em geral - o assunto foi o mais comentado nas redes sociais. O governo decretou luto por nove dias e o primeiro-ministro enviou condolências aos proprietários do último Amor.

Há cerca de três meses a notícia de que ainda existia um sentimento como esse foi recebida com surpresa e enorme alegria em todo o país, já que a espécie havia sido declarada extinta no ano passado. Por questões de segurança e privacidade a identidade do casal que cultivava o Amor e o local exato onde vivia foram preservados.

Ontem, após um longo silêncio sobre o desenvolvimento da criatura, as autoridades divulgaram um comunicado com a notícia que ninguém gostaria de receber: o último Amor se foi.

Havia dentro da comunidade científica a expectativa de que esse exemplar, quando chegasse à idade adulta, pudesse cruzar com outros sentimentos (como o Altruísmo ou a Amizade) e se reproduzir como espécie. Mas a prematura morte pôs fim às esperanças.

Confirmada a extinção, restaria a possibilidade da produção artificial - em laboratório - de Amores.

Os cientistas garantem que, por meio de uma modificação genética, poderiam alcançar o objetivo. No entanto, esse tipo de pesquisa segue proibida pelo governo, que alega ser impossível prever as consequências de experimentos dessa natureza.

“A manipulação de sentimentos é muito perigosa e ainda não há como garantir que esse tipo de atividade não gere mutações incontroláveis, o que colocaria em perigo todos os seres humanos. Além disso, muitos de nós vivemos sem um Amor e nunca morremos. É questão de acostumar-se. As próximas gerações, por nunca terem visto um Amor, sequer sentirão falta”, afirmou o ministro de Defesa e Tecnologia em uma coletiva de imprensa.

O velório do último Amor que se tem notícia será amanha em local não divulgado. A cerimonia será fechada para a imprensa e apenas as pessoas mais próximas poderão se despedir do pequeno, que foi embora sem saber que trouxe alegria e esperança a tanta gente. Gente que agora chora sua morte.

Ricardo Viel, jornalista, colunista do NR e do Purgatório

Um comentário:

Fernando Evangelista disse...

Genial! Excelente!

Postar um comentário

Ofensas e a falta de identificação do leitor serão excluídos.

Web Analytics