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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Três vivas para a conversinha sobre o tempo


por Tomás Chiaverini     ilustração Victor Zalma*

 Ele mal dá seta e já para na sua frente. Você para em seguida e leva um buzinaço que não lhe cabe. Mas que filho da puta! E ainda vai entrar na garagem do seu prédio. Agora fica aí, enrolando pra abrir o portão eletrônico. É só apertar o botão do controle, filho, não tem mistério não. Custa comprar uma bateria nova? Pronto, finalmente, um ano depois... Agora mais meia hora pra conseguir engatar a primeira. Mas foi. Aleluia, irmão!

Cacete! Não é que a vaga dele é mais fácil que a sua? Que filho da puta, com esse carrão enorme, todo automático, com sensor que apita em tudo que é canto. Tá na cara que é um desses novos ricos da Dilma. Deve pagar um por fora pro síndico. Agora você fica aí, fazendo manobra e o sujeitinho já parou, já se escapuliu do carrão, saiu todo apressado e vai tomar o elevador sem nem te esperar. Ok, esperou. Mas te fez correr. Fica embaçando no carro e agora dá de apressadinho aí, segurando a porta. Tem pressa de que? Piriri?

E esse terno? Lã fria risca de giz, camisa sob medida... Capaz que ganhe o dobro que você. Por isso corre tanto. Tem de subir logo pra abrir o Ipad e ver se não tem nenhum email do patrãozinho. Bem feito.

Rá, seu andar é mais alto. Mas o apartamento dele deve ser de dois quartos, cheio de televisores de led, home theaters e sofás reclináveis de veludo. Fica do outro lado do prédio, então a vista deve ser melhor também. Mas o que importa? Se tem de correr tanto pra responder o email nem deve conseguir parar em casa, muito menos olhar a vista.

Você pensa, tentando não olhar pro sujeitinho enquanto são içados juntos rumo ao céu, no caixote de metal espremido em meio a toneladas de concreto. E lá vem aquele silêncio constrangedor maldito. Ou:

- Esquentou, né?

- Pois é...

- Previsão disse que ia mudar o tempo, mas firmou.

- Parece que vai virar no fim de semana.

- Putz, é sempre assim. Sempre no fim de semana né? Quando o pessoal vai viajar, chove.

- Pois é.

- Boa noite.

- Boa.

E não é que o cara parece ser gente fina?

* * * * * *

Tomás Chiaverini é autor do romance Avesso (Global), e dos livros reportagem Cama de Cimento e Festa Infinita (ambos pela Ediouro). Mantém a coluna mensal Abelha na Orelha. Ilustração de Victor Zalma, especial para o texto

Um comentário:

Mari disse...

uma porcaria de texto

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