As palavras, como as pessoas, não escapam de sua época. Elas envelhecem, descem do pódio, são esquecidas. Como acontece com os profissionais, se aposentam ou são aposentadas. E o mais duro: são substituídas. Daí rodoviária vira terminal de ônibus, aviador vira piloto, aluna vira educanda, reclame vira propaganda, mesa de bar vira facebook.
As palavras, depois de um tempo de ostracismo ou exílio, voltam. São reabilitadas ou anistiadas. Seja nos nomes de bebês: Joaquim, Teresa, José, Adolfo, Antônia. Seja no linguajar da garotada: bárbaro, bizarro, bacana. Também há as que nunca saem de moda: amor, morte, festa, poder, nascimento, egoísmo, solidariedade.
As palavras, muitas delas, vêm de terras estrangeiras. Desembarcam com valises cheias de novidades. Algumas não se aclimatam e retornam para o lugar de origem. Outras se dão tão bem que viram verbos: empoderar, deletar, customizar, frilar, surfar, brifar, glamourizar, engajar, flanar, flertar, twittear, internetar.
As palavras sofrem sanções penais. São mandadas para presídios, alguns de segurança máxima. Basta conferir o index prohibitorum dos manuais de redação. Entre as interditadas, lá estão: esposo, esquife, passamento, sepulcro, toalete, lepra, tarado, do lar, vulgo, entanto, entrementes, outrossim.
As palavras quando se juntam formando expressões ficam altamente vulneráveis. Quanto mais usadas, mais condenadas. Logo são carimbadas como chavões: pôr a mão na massa, abrir com chave de ouro, luz no fim do túnel, no fundo do poço, na aurora da vida, no apagar das luzes, nascer em berço de ouro, página virada do meu folhetim.
As palavras faladas têm voz própria. Para existirem, elas não dependem dos gramáticos, filólogos, corretores da fuvest, jornalistas, escritores. Estão por aí, na boca do pipoqueiro, da costureira, do pedreiro, do gari. Estão nas canções, nos gritos dos feirantes, nos protestos dos indignados, nas gírias de amor e de ódio.
As palavras escritas têm assinatura própria. Estão certas ou erradas? São clichês ou inovações? Fáceis ou raras? Agradáveis ou inconvenientes? Poéticas ou burocráticas? Do gueto ou de todos? Isso depende do leitor. A emoção que ele sente é que dará a justa resposta. O leitor é o eleitor da língua.
As palavras se parecem com as pessoas. Não são fugazes nem eternas. Cada uma comunica suas histórias, seus sentidos, seus caminhos. Uma não é melhor do que a outra. São únicas. As palavras são bailarinas esperando que a gente toque a música para elas dançarem.
fernanda pompeu, escritora e redatora freelancer, colunista do Nota de Rodapé, escreve às quintas. Ilustração de Carvall, especial para o texto.
15 comentários:
Fernanda!
Sempre bom ler os seus textos...
:)
beijos
Delícia de palavras, como sempre.
Muito bom Fernanda! Abriu o ano com chave de ouro! Beijão, Silverio
Me encantam as palavras e como elas jogam conosco, fazendo-nos de uma peça do seu querer. A elas, me entrego, como à leitura do seu delicioso texto, Fê.
Gostei. Parbens. Ansioso aguardo novo texto acerca forma escrita. Abraço telegráfico. jsavio
mesa de bar virar facebook é um achado
as usual, fe, vc arrasa
beijo
marina
oh delícia! grande prazer e estamos só começando! bjs saudosos
darya
Texto delicioso. Parabéns!
sem palavras .......
Só beijos!
.... è Vero
O que dizer? Não sobrou nenhuma palavra para mim! Brincadeira! Maravilha. Parabéns.
Que bonito texto para começar o ano, Fernanda. Desejos de um grande 2012 para você! Abs!
"Sei que as vezes uso....palavras repetidas...
mas quais são as palavras que nunca foram ditas?
Grande Legião Urbana! Grande Fernanda que nos faz brincar, refletindo.
FERNANDA,
Parabéns por suas belas palavras! Mais que soltas, mais que frases, lindo texto poético para o início de um ano bom! Renovemos as esperanças! Obrigada e um beijo grande, Bel.
Fernanda querida, tá muito bonito o seu texto e, incrivelmente, também muito exato, nada transborda nem falta, deliciosamente na medida certa.!!! Bj, Guacira
Quando penso nisso, sempre penso em Jesus: um dos poucos em atividade mesmo depois de muito tempo após sua morte. É muito triste saber que, como meus tataravós, eu muito provavelmente serei esquecido após, no máximo, três gerações. Infelizmente, acho que não há há consolo para isso. Tadinho de nós - e das palavras também.
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