o filme inspirado no Roller Derby |
domingo, 27 de fevereiro de 2011
Roller Derby envolve ginga, visual e habilidade sobre patins
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
Big Mother, melhor que BBB
Quando estava grávida, entrei em contato com um grupo de mulheres muito bacana, militantes do parto humanizado
Para quem não sabe, o parto natural humanizado é aquele em que se respeita ao máximo a naturalidade do processo de parir; são evitadas ao máximo todas as intervenções na mãe e no bebê; o parto é feito na companhia das pessoas escolhidas pela parturiente; a mulher tem liberdade de movimentos durante o trabalho de parto e escolhe a forma como quer parir: de cócoras, na água, deitada, ajoelhada, apoiada nos braços do marido – ou o que lhe der na telha na hora. O uso de anestesia também não é incentivado, por atrapalhar muitas vezes na evolução do trabalho de parto, já que, anestesiada, a mulher perde a consciência real do processo.
Parto natural também é feito na água |
Para quem quiser saber mais sobre o assunto, que é longo, recomendo os sites do GAMA, Parto do Princípio e Amigas do Parto apenas como ponto de partida para a pesquisa. Existem muitos sites, blogs e redes mantidas pelas militantes, que disseminam ao máximo as informações na internet na tentativa de lutar contra a desinformação geral que leva tantas mulheres a cesáreas absolutamente desnecessáreas e – pior – arriscadas para mãe e para o bebê.
Uma dessas mulheres é Rosana Oshiro, mãe de quatro filhos e grávida do quinto, brasileira que mora no Japão. Rosana teve seus dois primeiros filhos por cesáreas desnecessárias, lutou por um parto natural na gravidez de seu terceiro filho (e acabou optando por um parto domiciliar – em casa) e em seu quarto filho acabou por ter um parto desassistido (sem auxílio médico nem de parteira), embora essa não fosse sua ideia inicial. Enfim: uma parideira de tirar o fôlego!
Rosana é militante ativa do parto humanizado, mantém três blogs e agora parte para o mais audacioso de seus atos de militância. Rosana está no início do trabalho de parto, no Japão, e vai transmitir seu parto ao vivo pela internet, no intuito de demonstrar que um parto natural, e em casa, pode ser seguro, tranquilo e, principalmente, muito mais prazeroso para a mãe e acolhedor para o bebê do que uma cirurgia, ou mesmo o ambiente de um hospital.
AO VIVO!
Ela acaba de informar por email que a bolsa já rompeu mas as contrações ainda não começaram. Como é madrugada no Japão, ela está descansando um pouco, mas vai iniciar a transmissão assim que as contrações começarem. Epa, peraí! A bolsa estourou e ela vai descansar? É isso mesmo, caro leitor. Quem se interessar, tem um tempinho para entender isso e outras coisas melhor dando uma olhada nos sites que coloquei acima. Ah, e tem os blogs da Rosana também: (www.relatosdeparto.blogspot.com e http://opartoeseu.blogspot.com). Boa leitura! Quando o “show” começar avisaremos pelo twitter e facebook.
Streaming live video by Ustream
Sofia Amaral, mãe da Manu que nasceu de uma cesárea, mas necessária e consciente. Também é colunista do Nota de Rodapé.
Promoção NR e Telemadrid sorteará um aparelho Blackberry Curve 8520
É primeira vez que o NR sorteia um produto voltado ao público que gosta de tecnologia e telecomunicações. Na primeira de várias parcerias que virão por aí, a Telemadrid ofereceu o aparelho (da foto abaixo) completo e desbloqueado para ser sorteado no dia 3 de Abril. Funciona assim: é preciso nos seguir no twitter e repassar a seguinte mensagem:
Pronto! Feito isso, você está concorrendo. O sorteio é realizado pelo sistema sortei.me. Ao ganhador, o prazo para envio dos dados e confirmação é de 48h do resultado da promoção, divulgado no blog e twitter. Caso o ganhador não entre em contato no prazo de 48h, novo sorteio será realizado. Boa sorte!
O aparelho tem os seguintes recursos disponíveis:
Câmera digital de 2,0 MP
Câmera de vídeo
Suporte à BlackBerry App World™
Memória flash de 256 MB
Wi-Fi® ativado
Bluetooth® ativado
Multimedia Player
E-mail sem fio
Organizador
Navegador
Telefone
SMS/MMS
Para saber mais detalhes acesse aqui.
Para conhecer a Telemadrid, acesse aqui.
#Promoção NR e Telemadrid: siga @notaderodape dê RT e concorra a Blackberry Curve 8520 http://kingo.to/usw
Pronto! Feito isso, você está concorrendo. O sorteio é realizado pelo sistema sortei.me. Ao ganhador, o prazo para envio dos dados e confirmação é de 48h do resultado da promoção, divulgado no blog e twitter. Caso o ganhador não entre em contato no prazo de 48h, novo sorteio será realizado. Boa sorte!
No Facebook:
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domingo, 20 de fevereiro de 2011
Zé
Zé
Zé Bahia não manda nada na quebrada.
Abaixa a cabeça pra polícia e pra bandido na quebrada.
De dentro do barraco ouve a malandragem.
- Esse carro é bem louco, é de bandido.
Zé firmeza se irritou um dia com o barulho da moto, o malandro não parava de ficar passando com o escapamento aberto.
Zé fudido da vida mandou o menino voltar de ré.
A noite Zé ficou na moral, bandidagem circulou perto do seu barraco.
Zé que antes era José Aparecido de Oliveira, mudou de nome quando entrou na obra, Zé da porra, Zé Largarto, Zé da pá (deu uma pazada num pião metido a forgado).
E finalmente Zé tiozinho. Com a velha sacola da World Tênnis e um conteúdo de alumínio.
A policia hoje parou o Zé, chamou de Zé Buceta, perguntou onde era a boca, ele apontou pra própria boca, pensou que era teste de embriaguez, mas viu que não era quando tomou um tapa, a bolsa a tiracolo caiu, o policia chutou, alguém gritou.
– é trabalhador, é um Zé povim! Um Zé qualquer!
Os hollerits se espalharam, voaram pelas quebradas.
O outro policial tomou a sacola a tiracolo, abriu a marmita, a população chegou perto.
- É trabalhador, seus coxinha de bosta!
Os agentes de cinza se enfezaram, encheran-se de fezes.
Agora que o governo mandou por a cor vermelha de sangue no veículo, eles tinham mais motivos para serem nervosos, fortes, quentes como o vermelho. Quentes como o inferno.
Um deles puxou o 38 cromado, abriu a marmita do Zé, enfiou a ponta do revólver dentro, cutucou, cutucou, espalhou a mistura e não achou nada, retirou o cano, fechou e deu para o Zé esculachado.
A população estava revoltada.
- Tantu bandidu na rua e us fi dégua ai pára um trabaiador, um Zé ninguém de merda.
- Tão abusando du Zé, qui é um coitado, se fose um bandido não faziam isso.
Os agentes da lei sairam, Zé humilhado entrou no meio do povo, se misturou pra ver se o aperto no peito parava, mas não parou.
Zé finiu.
Ferréz é datilógrafo (e escritor, autor de Capão Pecado e Manual Prático do Ódio). Conheca o seu blog.
Zé Bahia não manda nada na quebrada.
Abaixa a cabeça pra polícia e pra bandido na quebrada.
De dentro do barraco ouve a malandragem.
- Esse carro é bem louco, é de bandido.
Zé firmeza se irritou um dia com o barulho da moto, o malandro não parava de ficar passando com o escapamento aberto.
Zé fudido da vida mandou o menino voltar de ré.
A noite Zé ficou na moral, bandidagem circulou perto do seu barraco.
Zé que antes era José Aparecido de Oliveira, mudou de nome quando entrou na obra, Zé da porra, Zé Largarto, Zé da pá (deu uma pazada num pião metido a forgado).
E finalmente Zé tiozinho. Com a velha sacola da World Tênnis e um conteúdo de alumínio.
A policia hoje parou o Zé, chamou de Zé Buceta, perguntou onde era a boca, ele apontou pra própria boca, pensou que era teste de embriaguez, mas viu que não era quando tomou um tapa, a bolsa a tiracolo caiu, o policia chutou, alguém gritou.
– é trabalhador, é um Zé povim! Um Zé qualquer!
Os hollerits se espalharam, voaram pelas quebradas.
O outro policial tomou a sacola a tiracolo, abriu a marmita, a população chegou perto.
- É trabalhador, seus coxinha de bosta!
Os agentes de cinza se enfezaram, encheran-se de fezes.
Agora que o governo mandou por a cor vermelha de sangue no veículo, eles tinham mais motivos para serem nervosos, fortes, quentes como o vermelho. Quentes como o inferno.
Um deles puxou o 38 cromado, abriu a marmita do Zé, enfiou a ponta do revólver dentro, cutucou, cutucou, espalhou a mistura e não achou nada, retirou o cano, fechou e deu para o Zé esculachado.
A população estava revoltada.
- Tantu bandidu na rua e us fi dégua ai pára um trabaiador, um Zé ninguém de merda.
- Tão abusando du Zé, qui é um coitado, se fose um bandido não faziam isso.
Os agentes da lei sairam, Zé humilhado entrou no meio do povo, se misturou pra ver se o aperto no peito parava, mas não parou.
Zé finiu.
Ferréz é datilógrafo (e escritor, autor de Capão Pecado e Manual Prático do Ódio). Conheca o seu blog.
A encruzilhada norte-americana
Não consigo entender a razão que me impede de ser um grande admirador dos Estados Unidos da América do Norte. E olhe que já tentei: comprei um chapeuzinho do Mickey na Disneylândia, fantasiei-me de Homem Aranha no Carnaval, compadeci-me com os assassinatos de John Kennedy e Martin Luther King, tenho uma nota de um dólar guardada como talismã, mas não tem jeito, não consigo engolir o tal ‘american way of life’.
Devo confessar, inclusive, que tenho grande admiração pela produção cultural norte americana, sua literatura, seu teatro dramático e musical, o blues e o soul na música, muitos de seus filmes, poetas como Whitman e Auden, dramaturgos como Albee, Miller e Tennessee Williams, escritores do talento de Faulkner e Baldwin... E a lista aqui seria extensa.
Mas quanto à sua decantada democracia e o seu papel de polícia do mundo, não. Aí, não... Aí o assunto se reveste de inquestionável transcendência. O mundo já está cansado da intromissão direta de siglas como CIA, DEA, FBI, MARINES ou indireta como FMI, ONU, OEA, OTAN (onde prevalece a ‘visão norte americana’ e corporativa do mundo capitalista) e outras menos conhecidas pelo grande público, mas não menos importantes ou perniciosas.
Desde que a Segunda Grande Guerra desmontou o poder hegemônico da Europa sobre o mundo, inclusive expondo as vísceras de um colonialismo perverso e ultrajante de países como a Alemanha, a Holanda, a Inglaterra, a Itália, Espanha, França, esse lugar foi ocupado pelos Estados Unidos da América do Norte, que soube, mais do que ninguém se aproveitar da oportunidade oferecida pelas circunstâncias da luta contra o nazi/fascismo, entre outros fatores, e assumir o papel de gendarme da humanidade.
Ao ajudar combater o eixo Roma/Berlim/Tóquio e eliminar o fantasma de um mundo governado por um psicopata como Adolpho Hitler, os EUA envolveram-se num manto de simpatia mundial que muito bem souberam canalizar para a defesa de seus interesses econômicos e estratégicos, aos poucos disseminado e sustentado por uma poderosa máquina de manipular ideias e consciências por meio do rádio, da imprensa, do cinema e da televisão.
Pode-se mesmo dizer que os últimos 70 anos vividos pela humanidade, se caracterizaram por uma monumental propaganda em favor de um sistema econômico que transforma a água em vinho, multiplica os pães, mas deixa na miséria, ou quase, 90% da população mundial. E, o que é mais grave, crucifica a todos aqueles que não rezam pela sua cartilha. E não são poucos os Pilatos que lavam as mãos diante de tal situação.
Coréia, Vietnam, Indonésia, ditaduras pela América Central e do Sul nos anos que se seguiram à Segunda Grande Guerra, apoio a genocidas africanos, apoio a golpes de estado em países como Chile, Brasil, Argentina, Bolívia, Uruguai, nos anos 60/70, Kosovo (Bálcãs), Haiti, Honduras em anos mais recentes dão, apesar do volume de ações, uma pálida idéia da intromissão de um país autoritário e arrogante na vida política de outros povos.
A livre concorrência e a defesa de interesses econômicos dão aos EUA, no limite dos direitos adquiridos e na prática de uma diplomacia minimamente civilizada, consoante as próprias leis que regem o sistema capitalista, a possibilidade de se fazerem ouvir em qualquer ponto do globo terrestre. Contudo, direito igual têm todos os outros países da comunidade internacional.
No entanto, não é esse o filme a que se assiste. Apoiado por uma poderosa máquina de guerra, onde se destacam as armas nucleares (negadas ou permitidas a outros países conforme as alianças que se fazem), a hipocrisia (para dizer o menos) da política norte americana é de transformar o Iago da tragédia shakespeariana numa verdadeira Madre Tereza de Calcutá.
Mistificando suas ações de combate ao terrorismo e ao narcotráfico, o Departamento de Estado e sua diplomacia feita de chantagens e espionagem, conforme revelações mais recentes do site Wikileaks, parecem ter chegado a um impasse nessa primeira década do século XXI. Sua economia vai mal, seu poder de barganha diminui, sua influência na América Latina e agora no Oriente Médio declina.
Conseguirá o presidente Barack Obama mostrar que foi merecedor de um prêmio Nobel de Paz ou esse galardão se desmoraliza em definitivo?
Izaías Almada é dramaturgo, escritor e colunista do Nota de Rodapé e do Escrevinhador
Devo confessar, inclusive, que tenho grande admiração pela produção cultural norte americana, sua literatura, seu teatro dramático e musical, o blues e o soul na música, muitos de seus filmes, poetas como Whitman e Auden, dramaturgos como Albee, Miller e Tennessee Williams, escritores do talento de Faulkner e Baldwin... E a lista aqui seria extensa.
Mas quanto à sua decantada democracia e o seu papel de polícia do mundo, não. Aí, não... Aí o assunto se reveste de inquestionável transcendência. O mundo já está cansado da intromissão direta de siglas como CIA, DEA, FBI, MARINES ou indireta como FMI, ONU, OEA, OTAN (onde prevalece a ‘visão norte americana’ e corporativa do mundo capitalista) e outras menos conhecidas pelo grande público, mas não menos importantes ou perniciosas.
Desde que a Segunda Grande Guerra desmontou o poder hegemônico da Europa sobre o mundo, inclusive expondo as vísceras de um colonialismo perverso e ultrajante de países como a Alemanha, a Holanda, a Inglaterra, a Itália, Espanha, França, esse lugar foi ocupado pelos Estados Unidos da América do Norte, que soube, mais do que ninguém se aproveitar da oportunidade oferecida pelas circunstâncias da luta contra o nazi/fascismo, entre outros fatores, e assumir o papel de gendarme da humanidade.
Ao ajudar combater o eixo Roma/Berlim/Tóquio e eliminar o fantasma de um mundo governado por um psicopata como Adolpho Hitler, os EUA envolveram-se num manto de simpatia mundial que muito bem souberam canalizar para a defesa de seus interesses econômicos e estratégicos, aos poucos disseminado e sustentado por uma poderosa máquina de manipular ideias e consciências por meio do rádio, da imprensa, do cinema e da televisão.
Pode-se mesmo dizer que os últimos 70 anos vividos pela humanidade, se caracterizaram por uma monumental propaganda em favor de um sistema econômico que transforma a água em vinho, multiplica os pães, mas deixa na miséria, ou quase, 90% da população mundial. E, o que é mais grave, crucifica a todos aqueles que não rezam pela sua cartilha. E não são poucos os Pilatos que lavam as mãos diante de tal situação.
Coréia, Vietnam, Indonésia, ditaduras pela América Central e do Sul nos anos que se seguiram à Segunda Grande Guerra, apoio a genocidas africanos, apoio a golpes de estado em países como Chile, Brasil, Argentina, Bolívia, Uruguai, nos anos 60/70, Kosovo (Bálcãs), Haiti, Honduras em anos mais recentes dão, apesar do volume de ações, uma pálida idéia da intromissão de um país autoritário e arrogante na vida política de outros povos.
A livre concorrência e a defesa de interesses econômicos dão aos EUA, no limite dos direitos adquiridos e na prática de uma diplomacia minimamente civilizada, consoante as próprias leis que regem o sistema capitalista, a possibilidade de se fazerem ouvir em qualquer ponto do globo terrestre. Contudo, direito igual têm todos os outros países da comunidade internacional.
No entanto, não é esse o filme a que se assiste. Apoiado por uma poderosa máquina de guerra, onde se destacam as armas nucleares (negadas ou permitidas a outros países conforme as alianças que se fazem), a hipocrisia (para dizer o menos) da política norte americana é de transformar o Iago da tragédia shakespeariana numa verdadeira Madre Tereza de Calcutá.
Mistificando suas ações de combate ao terrorismo e ao narcotráfico, o Departamento de Estado e sua diplomacia feita de chantagens e espionagem, conforme revelações mais recentes do site Wikileaks, parecem ter chegado a um impasse nessa primeira década do século XXI. Sua economia vai mal, seu poder de barganha diminui, sua influência na América Latina e agora no Oriente Médio declina.
Conseguirá o presidente Barack Obama mostrar que foi merecedor de um prêmio Nobel de Paz ou esse galardão se desmoraliza em definitivo?
Izaías Almada é dramaturgo, escritor e colunista do Nota de Rodapé e do Escrevinhador
quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
Elites obscenas
O apetite e ganância dos ricaços globais não têm limites
O semanário britânico The Economist tem um fórum semanal de debates com a participação de leitores, de alta qualidade de argumentos. Hoje, quarta-feira, terminou um com um assunto da mais alta atualidade: as elites globais ajudam as massas populares?
Tratando-se de uma revista conservadora (mas séria), com leitores na maioria conservadores (mas em geral inteligentes) o resultado foi surpreendente.
As elites globais não ajudam as massas, foi a tese vencedora, por uma goleada de 84 a 16.
O defensor da tese, Jamie Whyte, jornalista, escritor e chefe de pesquisas da Oliver Wyman Financial Services, fez a ressalva que não acredita que as elites ganhem seus privilégios num mercado livre, pois tal coisa para ele não existe. O defensor da tese das elites globais benéficas disse que sua argumentação se restringia apenas aos fatos políticos, pois na área financeira e econômica ele vê um mundo tremendamente corrompido por “subsídios, privilégios legais. Banqueiros, fabricantes de aviões, promotores de ‘energia verde’, advogados, médicos, acadêmicos, fazendeiros e servidores públicos estão em alta. Meus argumentos são baseados em como funciona a democracia, não em mercados livres”. A ressalva não evitou que Whyte fosse bombardeado pela maioria dos leitores da influente revista. O debate pode ser visto AQUI.
O tema parece sido inspirado pelo artigo de capa da excelente revista americana The Atlantic. A autora, Chrystia Freeland, uma editora da Reuters, resumiu na revista um livro que está terminando sobre as novas super-elites globais.
A nova elite mudou bastante desde os tempos em que Karl Marx bisbilhotou as histórias dos ricaços, expondo as circunstâncias muitas vezes criminosas do que ele chamava de “acumulação primitiva”, que depois da lavagem de dinheiro acabava virando ricas famílias respeitáveis.
Durante muito tempo a maioria dos ricos vinham de famílias ricas, graças a um patriarca distante que ajuntou fortuna por métodos obscuros. Mas isso também mudou radicalmente segundo observou Chrystia, uma frequentadora dos círculos globais dessa nova elite, por força de seu cargo de jornalista de economia e finanças.
Essa nova elite é global, mesmo que tenham residência provisória em Nova York, Hong Kong, Moscou, Xangai ou Mumbai. Essa nova plutocracia é formada por bilionários de primeira geração, que não tiveram heranças e começaram quase do zero. “Eles se consideram uma nação deles mesmo”, sem lealdade a nenhum país, diz Chrystia. Quase todos passaram por Harvard, Cambridge, Oxford e outras universidades desse padrão. Eles vão aos mesmos restaurantes exclusivos em Nova York ou Moscou, tiram férias em resorts que nunca ouvimos falar. E, dentro de seus países eles engolem as riquezas coletivas de maneira obscena. Nos Estados Unidos, entre 2002 e 2007, mais de 65% do crescimento de riquezas foi abocanhado por apenas 1% da população do país. Não se trata mais apenas de um agravamento da tradicional desigualdade da distribuição de renda, mas um fenômeno novo, escreve Chrystia.
Flávio de Carvalho Serpa, jornalista, especial para o NR
O semanário britânico The Economist tem um fórum semanal de debates com a participação de leitores, de alta qualidade de argumentos. Hoje, quarta-feira, terminou um com um assunto da mais alta atualidade: as elites globais ajudam as massas populares?
Tratando-se de uma revista conservadora (mas séria), com leitores na maioria conservadores (mas em geral inteligentes) o resultado foi surpreendente.
As elites globais não ajudam as massas, foi a tese vencedora, por uma goleada de 84 a 16.
O defensor da tese, Jamie Whyte, jornalista, escritor e chefe de pesquisas da Oliver Wyman Financial Services, fez a ressalva que não acredita que as elites ganhem seus privilégios num mercado livre, pois tal coisa para ele não existe. O defensor da tese das elites globais benéficas disse que sua argumentação se restringia apenas aos fatos políticos, pois na área financeira e econômica ele vê um mundo tremendamente corrompido por “subsídios, privilégios legais. Banqueiros, fabricantes de aviões, promotores de ‘energia verde’, advogados, médicos, acadêmicos, fazendeiros e servidores públicos estão em alta. Meus argumentos são baseados em como funciona a democracia, não em mercados livres”. A ressalva não evitou que Whyte fosse bombardeado pela maioria dos leitores da influente revista. O debate pode ser visto AQUI.
O tema parece sido inspirado pelo artigo de capa da excelente revista americana The Atlantic. A autora, Chrystia Freeland, uma editora da Reuters, resumiu na revista um livro que está terminando sobre as novas super-elites globais.
A nova elite mudou bastante desde os tempos em que Karl Marx bisbilhotou as histórias dos ricaços, expondo as circunstâncias muitas vezes criminosas do que ele chamava de “acumulação primitiva”, que depois da lavagem de dinheiro acabava virando ricas famílias respeitáveis.
Durante muito tempo a maioria dos ricos vinham de famílias ricas, graças a um patriarca distante que ajuntou fortuna por métodos obscuros. Mas isso também mudou radicalmente segundo observou Chrystia, uma frequentadora dos círculos globais dessa nova elite, por força de seu cargo de jornalista de economia e finanças.
Essa nova elite é global, mesmo que tenham residência provisória em Nova York, Hong Kong, Moscou, Xangai ou Mumbai. Essa nova plutocracia é formada por bilionários de primeira geração, que não tiveram heranças e começaram quase do zero. “Eles se consideram uma nação deles mesmo”, sem lealdade a nenhum país, diz Chrystia. Quase todos passaram por Harvard, Cambridge, Oxford e outras universidades desse padrão. Eles vão aos mesmos restaurantes exclusivos em Nova York ou Moscou, tiram férias em resorts que nunca ouvimos falar. E, dentro de seus países eles engolem as riquezas coletivas de maneira obscena. Nos Estados Unidos, entre 2002 e 2007, mais de 65% do crescimento de riquezas foi abocanhado por apenas 1% da população do país. Não se trata mais apenas de um agravamento da tradicional desigualdade da distribuição de renda, mas um fenômeno novo, escreve Chrystia.
Flávio de Carvalho Serpa, jornalista, especial para o NR
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
Enxugando gelo
O Jornal Metro que recebi no farol hoje, quarta-feira, traz uma manchete que mostra em dados – espero que confiáveis – a reprodução insana de um modelo de transporte individual – o carro – que já está em colapso há muito tempo. A cidade de São Paulo, cada vez mais afogada, não dá mais conta de tantos carros – 5,5 milhões – tanto que o rodízio já não tem efeito de melhoria no trânsito desde o ano passado.
A manchete que fala de estacionamentos na cidade: “Estacionar o carro vira missão impossível” afirma que a frota de veículos cresceu 95,5% em dez anos e que faltam vagas para estacionar o carro (somente no centro faltam 14 mil vagas). São 9 mil estacionamentos com, aproximadamente, 1 milhões de vagas na cidade. E os preços, ao que parece, são cada vez mais adequados ao desespero do motorista que se submete a pagar até 20 reais por hora. O jornal diz que o reajuste do estacionamento mensal em 2010 foi de 24%. Fosse SP uma cidade que tivesse um Plano Diretor que privilegiasse o transporte público e coletivo em vez de construir Pontes Estaiadas e avenidas além de dar de mamar ao setor imobiliário teríamos uma mobilidade urbana menos caótica e desgastante tanto para nosso bolso quanto para nossas emoções. Enquanto isso, continuaremos a enxugar gelo. (Thiago Domenici)
A manchete que fala de estacionamentos na cidade: “Estacionar o carro vira missão impossível” afirma que a frota de veículos cresceu 95,5% em dez anos e que faltam vagas para estacionar o carro (somente no centro faltam 14 mil vagas). São 9 mil estacionamentos com, aproximadamente, 1 milhões de vagas na cidade. E os preços, ao que parece, são cada vez mais adequados ao desespero do motorista que se submete a pagar até 20 reais por hora. O jornal diz que o reajuste do estacionamento mensal em 2010 foi de 24%. Fosse SP uma cidade que tivesse um Plano Diretor que privilegiasse o transporte público e coletivo em vez de construir Pontes Estaiadas e avenidas além de dar de mamar ao setor imobiliário teríamos uma mobilidade urbana menos caótica e desgastante tanto para nosso bolso quanto para nossas emoções. Enquanto isso, continuaremos a enxugar gelo. (Thiago Domenici)
sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011
Promoção Retrato do Brasil, ganhadores de fevereiro
Os 10 ganhadores que levaram um exemplar da Revista Retrato do Brasil de fevereiro. Saiba mais da promoção AQUI que ocontecerá todos os meses. Por favor, enviem o quanto antes seus endereços completos para contato@notaderodape.com.br
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
Robôs recuperam empregos mais rápido que humanóides
Como os humanos, os robôs são fortemente vulneráveis às crises financeiras, talvez até mais. Em 2009, por exemplo, a crise mundial ceifou o nascimento de 47% de robôs, em relação a 2008 – quase 60 mil unidades deixaram de ser produzidas, segundo o relatório da World Robotics. Como a indústria automobilística é a principal compradora de robôs, a queda foi inevitável.
Mas a recuperação foi mais rápida do que a destruição de empregos entre humanóides no mesmo período. Nos primeiros 9 meses de 2010 as vendas de robôs industriais já havia dobrado em relação ao mesmo período de 2009 (que foi um ano ruim). Essa é uma faceta histórica da grande empresa. Elas têm sistematicamente usado os períodos de recessão para investimentos em automação, e essa tendência não só vai continuar, como provavelmente se acelerar, devido às pressões contínuas por inovações que precisam ser despejadas no mercado num ritmo cada vez mais veloz. Nas fábricas highTech, os escravos mecânicos já escorraçaram irreversivelmente seus competidores humanos. Segundo o World Robotics, um relatório anual produzido pela Federação Internacional de Robótica (dirigida por humanos, ainda) já existem 8,6 milhoes de robôs grandes em todo mundo. E as vítimas não serão apenas as pessoas com trabalhos repetitivos que não exigem muito raciocínio. Com o avanço paralelo da Inteligência Artificial, até os mais altos escalões das empresas poderão ser substituidos com vantagens por robôs frios e calculistas, que não cedem a paixões transitórias. Outro ponto a favor dos fabricantes de robôs é que a vida útil deles varia entre 12 e 15 anos. O mercado cativo de substituições é estável. Segundo a Federação Mundial de Robótica, a competição pela produtividade vai tornar inevitável a decolagem dos robôs em todos os ramos industriais, não apenas na indústria automobilística. Eles calculam que o ritmo de crescimento de 10% ao ano vai se consolidar entre 2011 e 2013. Propelido, é claro, pela China, talvez a Índia e EUA. A demanda por robôs desde os mergulhadores para plataformas petrolíferas marítmas até as máquinas ordenhadoras de vacas vão disparar. Robôs pessoais para cuidar de idosos, fazer a faxina em casa, podar a grama e nas salas de cirurgias para operações delicadas estão numa lista infindável dos fabricantes. “Essas coisas vão atingir a maturidade por volta de 2020”, calcula o relatório annual do Robotic World.
O Brasil, evidentemente, não pode nem sonhar em fazer parte da produção dessas máquinas, por falta de todas as infraestruturas básicas, da mecânica fina, eletrônica e mão de obra. Mas pode apostar na importação de mais robôs para enfrentar a competição de preços e rapidez de produção em todas as áreas de manufatura.
Mas, ironicamente, devido à indefinição dos modelos de negócio na robótica, os brasileiros podem pegar uma carona. Robôs, mesmo com produção em escala, sempre vão ser caros e pode ser inviável um aposentado rico comprar um. É mais provável que provedoras de serviços (como as de telefonia celular) subsidiem os robôs, que ficariam em consignação, mesmo porque a vida útil deles é curta. Nesse caso, talentos de negócios e softwares brasileiros teriam uma chance considerável no desenvolvimento de aplicativos originais. É uma aposta que parece valer a pena, se o sistema educacional do país encarar o desafio.
Flávio de Carvalho Serpa, jornalista, especial para o Nota de Rodapé
A indústria automobilística é a principal compradora de robôs |
Robô que encenou peça de teatro na Suiça, no musical Robots |
Mas, ironicamente, devido à indefinição dos modelos de negócio na robótica, os brasileiros podem pegar uma carona. Robôs, mesmo com produção em escala, sempre vão ser caros e pode ser inviável um aposentado rico comprar um. É mais provável que provedoras de serviços (como as de telefonia celular) subsidiem os robôs, que ficariam em consignação, mesmo porque a vida útil deles é curta. Nesse caso, talentos de negócios e softwares brasileiros teriam uma chance considerável no desenvolvimento de aplicativos originais. É uma aposta que parece valer a pena, se o sistema educacional do país encarar o desafio.
Flávio de Carvalho Serpa, jornalista, especial para o Nota de Rodapé
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Parceria do WikiLeaks é com blogs independentes e você escolhe
"Passados quase dois meses do lançamento dos documentos das embaixadas americanas, o WikiLeaks vai começar uma nova estratégia de divulgação aqui no Brasil. A partir de agora, vamos deixar o público escolher quais os temas que devem ser pesquisados no arquivo de documentos e publicados no site do WikiLeaks.
Basta responder a esse post pedindo um tema, figura pública ou evento a ser pesquisado, que eu vou selecionar os documentos. Todos os pedidos serão publicados, e os temas mais pedidos terão prioridade.
Para a divulgação, vamos fazer parceria com uma série de blogs e veículos independentes, entre eles: Carta Capital, Conversa Afiada, Luis Nassif Online, Blog do Mello, Escrevinhador, Viomundo, Nota de Rodapé, Maria Frô, Fazendo Média, Futepoca, Elaine Tavares, Gonzum, Blog do Rovai, Blog da Cidadania e Altamiro Borges. É um experimento inédito. Até agora, Globo, Folha e WikiLeaks estavam usando seus critérios para julgar quais documentos seriam publicados por vez, algo “de cima pra baixo”. Dessa vez, o próprio público vai decidir, invertendo a lógica da produção da notícia. As publicações começam na próxima semana. (Natalia Viana, Blog da Carta Capital)." Os leitores do NR podem deixar no comentário dessa postagem o que desejam saber dos documentos ou mesmo acessar o Blog da Carta Capital e deixar seu recado.
Basta responder a esse post pedindo um tema, figura pública ou evento a ser pesquisado, que eu vou selecionar os documentos. Todos os pedidos serão publicados, e os temas mais pedidos terão prioridade.
Para a divulgação, vamos fazer parceria com uma série de blogs e veículos independentes, entre eles: Carta Capital, Conversa Afiada, Luis Nassif Online, Blog do Mello, Escrevinhador, Viomundo, Nota de Rodapé, Maria Frô, Fazendo Média, Futepoca, Elaine Tavares, Gonzum, Blog do Rovai, Blog da Cidadania e Altamiro Borges. É um experimento inédito. Até agora, Globo, Folha e WikiLeaks estavam usando seus critérios para julgar quais documentos seriam publicados por vez, algo “de cima pra baixo”. Dessa vez, o próprio público vai decidir, invertendo a lógica da produção da notícia. As publicações começam na próxima semana. (Natalia Viana, Blog da Carta Capital)." Os leitores do NR podem deixar no comentário dessa postagem o que desejam saber dos documentos ou mesmo acessar o Blog da Carta Capital e deixar seu recado.
O que E=Mc2 tem a ver com Cameron Diaz?
Ao ler que a atriz Cameron Diaz vem passar o Carnaval do Rio me lembrei que o físico David Bodanis dedicou a ela sua obra E=Mc2. Acontece que numa entrevista a uma revista de futricas de celebridades, ao ser perguntada sobre o que ela mais desejaria entender, a loira respondeu: “Queria saber o que E=Mc2 realmente significa”. Bodanis nunca soube se ela estava troçando, mas publicou o trecho da entrevista no seu livro.
Procurei no Google para ver se isso teve algum desdobramento mas não achei. Quem sabe se algum jornalista que vai cobrir o camarote de celebridades faria o favor de perguntar a ela como se sentiu ao ser citada num livro sobre Relatividade e se já leu o livro de Bodanis e, finalmente, se chegou a entender o que significa a famosa equação de Albert Einstein. Pelo menos ela revelou uma curiosidade saudável. Outra estrela, Ivete Sangalo, comenteu o papelão de dizer numa entrevista que não gostava de ler. Podia ter ficado de boca fechada.
Flávio de Carvalho Serpa, jornalista
Procurei no Google para ver se isso teve algum desdobramento mas não achei. Quem sabe se algum jornalista que vai cobrir o camarote de celebridades faria o favor de perguntar a ela como se sentiu ao ser citada num livro sobre Relatividade e se já leu o livro de Bodanis e, finalmente, se chegou a entender o que significa a famosa equação de Albert Einstein. Pelo menos ela revelou uma curiosidade saudável. Outra estrela, Ivete Sangalo, comenteu o papelão de dizer numa entrevista que não gostava de ler. Podia ter ficado de boca fechada.
Flávio de Carvalho Serpa, jornalista
segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
Argentina decadente, Brasil latente
Há um não-sei-que de Brasil de 1990 na Argentina de 2011; E mais: Cesar Maia vale-se de documentos coloniais para justificar sua visão colonialista. Estranho?
Lê-se na revista Sueños Compartidos, editada pelas Mães da Praça de Maio, que foi com Néstor Kirchner que a “Argentina encontrou seu verdadeiro lugar no mundo: a América Latina”. Há meias-verdades que a licença poética criada pela morte nos permite criar, penso eu, mas me permito discordar.
É certo dizer que o Pinguim, falecido em outubro último, aumentou a integração argentina com a América Latina, e aí está a União de Nações Sul-americanas (Unasul) para não nos deixar mentir. Mas a verdade é que os argentinos nos descobriram – os latino-americanos – um tempinho antes, e não foi exatamente um encontro romântico, algo como Evita-Juan Domingo. Quando a Argentina nos viu, após séculos de chamegos com a Europa, certamente não ronrronou “Ó, mi general” - mais justo com a história seria um “Mira, boludo, !que cagada! La puta que lo parió, che”.
Os argentinos, até então, sabiam da existência de uns certos sudacas – sudamericanos cagones –, mas ainda não haviam se dado conta de que dividiam conosco este cortiço, que enxergavam como um apartamento triplex com direito a vista pro mar. Foi nos anos 1990. Quem ainda não havia se dado conta dos efeitos da ditadura pré-neoliberal começou, enfim, a sentir os efeitos da pré-democracia neoliberal. Houve ainda retardatários, que só se deram conta quando a vaca já habitava o brejo, entre 2001 e 2002.
Andando pela Argentina dos dias de hoje, tenho a inevitável sensação de que este país tem um não-sei-que do Brasil de 1990. A falta de combustível nos postos simplesmente por alguma decisão estúpida e, nas filas, carros mais esfarelados que a zaga do último Mundial esperando que alguém lhes avise que é hora de parar. A falta de notas de dinheiro nos caixas eletrônicos porque, por algum motivo, o Banco Central não as imprimiu em quantidade suficiente. As moedas guardadas com um preciosismo impressionante, mais importantes que joias, raras que são por estas bandas, sabe Deus qual o motivo.
Poderia ter sido, mas não foi
A admiração pelo clássico de Buenos Aires, a lembrar-nos - aos brasileiros - nosso papel de demolidores de prédios históricos, já não se repete como antigamente. Tenho a impressão de que a capital vizinha, em algum momento dos últimos anos, deixou de ser clássica: é velha, anda desgastada (mas ainda linda, viva, vívida). Em documentário, Fernando “Pino” Solanas fala da Argentina Latente, daquela que poderia ter sido, mas não foi.
Até há pouco tempo, fazia sucesso falar do Brasil que não chegou a ser, que abortou. Uma das diferenças fundamentais entre as últimas duas décadas diz respeito a isso: autoestima. Os programas de humor dos 90 tinham como pressuposto básico de qualquer piada um país que jamais daria certo. Hoje, tirar sarro de algumas situações é mais que válido, mas o país como um todo se leva a sério, e é impopular menosprezá-lo – talvez isso explique porque o Casseta & Planeta se viu forçado a parar seu carrinho no “martelinho de ouro”.
Os argentinos, por outro lado, incorporaram com o dramatismo clássico a situação reversa, de baixa autoestima, a crença de que os problemas não têm solução. No caso deles, há uma diferença básica: a Argentina vem na trajetória de queda, há um passado semiglorioso a ser lamentado; no Brasil, a década de 1990 tinha como único significado a sequência de um grande embuste, estávamos apenas na manutenção daquilo que já vinha de há muito, tanto fazia estar fodido ou muito fodido.
Há, em boa parte dos argentinos, a sensação de que o subdesenvolvimento obtido graças a décadas de incansáveis trabalhos não vai embora – lembra como era sentir isso? Não que o nosso tenha ido embora, longe disso, mas pelo menos se pode acreditar que algum dia irá. Não é difícil recordar que, antes, dizer-se brasileiro era motivo de uma ponta de vergonha para muita gente. Nossa alteridade frente ao mundo todo se construía sobre o futebol: Pelé, Ronaldo: e nada mais. Agora, como ser brasileiro virou coisa fashion, até os ricos gostam de exibir umas notinhas de reais por aí. Inútil achar que 1990 e 2000-10 são a mesma coisa. A história é bem diferente.
Mascando coca com Cesar Maia
O artigo de Cesar Maia, ex-prefeito do Rio, na Folha do último sábado (5) é digno de nota (ou de choro?). Imbuído de excelentes intenções, o cacique do DEM vale-se de artigos de cronistas espanhóis dos tempos coloniais para desmerecer o uso da folha de coca pelos povos andinos, numa tentativa de simplificar a empreitada de Evo Morales pela despenalização do vegetal – não do pó. Entre outras coisas, cita passagem em que se fala sobre o uso constante da folha: "demônio, que é o inventor dos vícios, faz notável colheita de almas".
Quisesse realmente estudar o assunto, buscaria falar com os próprios andinos. Ou, caso não queira ir tão longe, pode buscar na internet estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) feito na década de 1990 comprovando que nada há de mal no acullico, o ato de mascar coca pelos indígenas. Poderia também ler os relatos de outros cronistas espanhóis sobre outras substâncias, como o mate. Caso Maia desconheça, a substância também foi tida como maleva, demoníaca e coisa de vagabundos durante o século XVI – poucas décadas depois, transformada em monopólio dos jesuítas, seria desdemonizada. Ou será que o ex-prefeito conhece alguém que tome mate e saia por aí dando piruetas, correndo alucinadamente pela rua, dançando durante quinze horas numa balada? Fossem os franceses a mascar coca, Maia daria a mesma peitada?
A argumentação de Maia é tão válida quanto lançar mão de depoimento obtido sob tortura para montar o perfil, digamos, de uma presidente eleita. Isso, sabemos, não ocorrerá: só mesmo um jornal ditabroso seria capaz de atitude tão desonesta. No Brasil, em que temos uma mídia aberta, respeitosa e democrática, uma reportagem deste cunho está descartada.
João Peres é jornalista e colunista do Nota de Rodapé
sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011
Retrato do Brasil de fevereiro + Promoção no Twitter
A revista mensal Retrato do Brasil traz, neste mês de fevereiro, reportagens sobre segurança pública, ciência, política nacional e internacional, condições de vida, economia e cultura. Na reportagem principal, uma nova incurssão no Morro do Alemão. Em 15 páginas de reportagem, Raimundo Rodrigues Pereira mostra que o apoio das Forças Armadas à operação policial em favelas do Rio foi vendido como uma “guerra limpa”. Nossa reportagem, no entanto, mostra que a verdade não é bem essa.
Diogo Ruic e Barbara Monteiro escrevem sobre um tema recorrente todos os anos: o ritual de ingresso secular nas universidades sempre vem acompanhado de um problema crônico, a violência. Qual o motivo? Na matéria de economia, o desemprego caiu e a renda cresceu. Mas a indústria, que oferece trabalho melhor remunerado, está enfraquecida. José Carlos Ruy aponta que em 2009, a crise financeira global também atingiu os super-ricos. Mas só de raspão. Com ilustração de Caco Bressane, a repórter Tânia Caliari mostra porque os homens têm vida breve. Eles em relação a elas são mais frágeis ao nascer, vivem sob risco maior e morrem mais cedo.
De Internacional temos o enigma militar chinês que tem tecnologia de guerra tão boa quanto a das grandes potências militares. Vai utilizá-la de maneira ofensiva? Em outro texto, o foco é a Costa do Marfim. Lá, o povo preparava-se para encerrar democraticamente anos de conflito armado. Mas o governo se esquivou. Em ciência, Flávio de Carvalho Serpa traz o texto “A vida como ela é”, que trata do estardalhaço da Nasa com a “descoberta” da bactéria que incorporaria arsênio a seu DNA.
Em cultura dois textos: você sabia que Mao Tse Tung escrevia poemas afinados com a tradição poética e as transformações sociais do seu país? Texto de Antônio Carlos Queiroz. E Eloar Guazzelli escrevre sobre "a hora e a vez do quadrinho brasileiro". O mercado editorial abre espaço a novos autores de HQs que lançam histórias inéditas e adaptam clássicos da literatura.
Promoção Retrato do Brasil e Nota de Rodapé
Via Twitter, iremos sortear 10 exemplares da revista de fevereiro. Basta retuitar:
O sorteio será dia 11 de fevereiro, sexta-feira que vem.
Boa sorte e boa leitura!
Capa da edição de Fevereiro, nº 43 |
De Internacional temos o enigma militar chinês que tem tecnologia de guerra tão boa quanto a das grandes potências militares. Vai utilizá-la de maneira ofensiva? Em outro texto, o foco é a Costa do Marfim. Lá, o povo preparava-se para encerrar democraticamente anos de conflito armado. Mas o governo se esquivou. Em ciência, Flávio de Carvalho Serpa traz o texto “A vida como ela é”, que trata do estardalhaço da Nasa com a “descoberta” da bactéria que incorporaria arsênio a seu DNA.
Em cultura dois textos: você sabia que Mao Tse Tung escrevia poemas afinados com a tradição poética e as transformações sociais do seu país? Texto de Antônio Carlos Queiroz. E Eloar Guazzelli escrevre sobre "a hora e a vez do quadrinho brasileiro". O mercado editorial abre espaço a novos autores de HQs que lançam histórias inéditas e adaptam clássicos da literatura.
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#Promoção. Siga @notaderodape dê RT e concorra a exemplares da revista Retrato do Brasil de fevereiro: http://kingo.to/sJt
O sorteio será dia 11 de fevereiro, sexta-feira que vem.
Boa sorte e boa leitura!
Investir em educação – e não só – contribui para o PIB
O estudo do Instituto de Pesquisa Ecônomia e Aplicada (Ipea) é interessantíssimo. “Comunicado nº 75 – Gasto com a Política Social: alavanca para o crescimento com distribuição de renda” indica que a cada um real gasto com educação pública se gera R$ 1,85 para o Produto Interno Bruto (PIB). Dentre os gastos sociais, foi o que mais representou favoravelmente ao PIB. No site do IPEA, o diretor de Estudos e Políticas Sociais, Jorge Abrahão, disse que “O gasto na educação não gera apenas conhecimento. Gera economia, já que ao pagar salário a professores aumenta-se o consumo, as vendas, os valores adicionados, salários, lucros, juros”. No caso da Saúde, por exemplo, também de cada um real se gera ao PIB R$1.70 e da Dívida Pública, de cada um real gasto com os juros dela, se gera R$ 0,71. O texto diz também que 56% dos gastos sociais retornam ao Tesouro na forma de tributos.
Catadão destaca Google Art Project e Repórter Brasil
ENTREVISTE O LOBÃO. “50 anos a mil” (Nova Fronteira, 2010) é dos livros de não-ficção mais vendidos atualmente no país. É a biografia de Lobão, o irreverente e polêmico músico, autor de clássicos como Rádio Blá, Corações Psicodélicos e tantas outras. E aqui no Nota de Rodapé você pode enviar até o próximo dia 10 de fevereiro, uma quinta-feira, sua pergunta para que ele responda. Recebemos, até o momento, pouco mais de uma dezena de questões. Então, uma convocatória, afinal não é todo dia que temos essa chance. Vamos lá, questionem, ainda dá tempo! penetraoficial@notaderodape.com.br
GOOGLE ART PROJECT. Imagens de 17 museus e mais de 1000 obras de arte estão disponíveis em alta resolução na internet. O passeio virtual, sem brincadeira, é incrível e usa a mesma tecnologia do Google Street View, aquele em que você percorre as ruas de vários lugares do mundo com visão total. No caso das obras, você vê seus detalhes, pode fazer sua galeria de obras favoritas. Entre os museus listados estão A National Gallery, o Van Gogh Museum, o Palácio de Versailles e o The Metropolitan Museum of Arts. Abaixo, um making off do projeto.
FOTOGRAFIA: o fotógrafo Alfred Eisenstaedt imortalizou esta cena do soldado e da enfermeira se beijando no pós-guerra na Times Square, publicada na revista Life em 1945, em preto e branco. O artista “mygrapefruit” colorizou e renovou a cena no Photoshop. Ele pesquisou em postais antigos para descobrir a cor dos edifícios no entorno. O resto, foi imaginação. O resultado antes e depois.
Leia as outras colunas do Catadão AQUI.
Para dicas e sugestões, muito necessárias, contato@notaderodape.com.br ou via twitter @notaderodape
GOOGLE ART PROJECT. Imagens de 17 museus e mais de 1000 obras de arte estão disponíveis em alta resolução na internet. O passeio virtual, sem brincadeira, é incrível e usa a mesma tecnologia do Google Street View, aquele em que você percorre as ruas de vários lugares do mundo com visão total. No caso das obras, você vê seus detalhes, pode fazer sua galeria de obras favoritas. Entre os museus listados estão A National Gallery, o Van Gogh Museum, o Palácio de Versailles e o The Metropolitan Museum of Arts. Abaixo, um making off do projeto.
HESITO, LOGO, COEXISTO. A entrevista que o sociólogo e especialista em segurança pública, autor de livros como Elite da Tropa I e II e Meu Casaco de General, LUIZ EDUARDO SOARES, deu a revista Retrato do Brasil em janeiro está disponível na íntegra em seu blog.
FOTOGRAFIA: o fotógrafo Alfred Eisenstaedt imortalizou esta cena do soldado e da enfermeira se beijando no pós-guerra na Times Square, publicada na revista Life em 1945, em preto e branco. O artista “mygrapefruit” colorizou e renovou a cena no Photoshop. Ele pesquisou em postais antigos para descobrir a cor dos edifícios no entorno. O resto, foi imaginação. O resultado antes e depois.
REPÓRTER BRASIL: Dia 28 de janeiro foi o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Acreditem ou não, um problema ainda grave no país. O site da Repórter Brasil é referência na área com jornalistas, pesquisas e reportagens de grande qualidade e relevância a respeito deste tema. Aqui no NR você pode ler uma reportagem a respeito também.
CIDADE DOS BICOS: Tem de tudo mesmo. Este site, por exemplo, chamado Cidade dos Bicos permite que você ofereça, ou encontre, os mais variados tipos de serviço por no máximo 10 reais.
URBANIAS: Problemas na cidade de SP? rotinas dos moradores, trânsito, problemas nos bairros, meio ambiente e vida política, entre outros. Este site de comunicação entre comunidade e órgãos públicos te ajuda a chegar lá para resolver seus problemas...
Leia as outras colunas do Catadão AQUI.
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011
Mapa curioso do PIB dos EUA comparado ao de outros países
A revista The Economist publicou um mapa sobre a maior economia do mundo, a dos EUA. Em 2009, o PIB norte-americano foi estimado em 14 trilhões de dólares. Isso significa um quarto do valor nominal do PIB mundial. O que a revista fez: pegou o PIB dos Estados norte-americanos e comparou ao de países que tem PIBs próximos.
- Mapa dos EUA segundo a CIA com dados gerais
Se este conteúdo foi útil, conheca e indique o NR.
No mínimo, curioso para quem não gosta de economia. O PIB da Rússia, por exemplo, é equivalente ao do Texas e o da Itália, ao da Califórnia. A Austrália, equivale ao de Nova York. O curioso é que o Brasil, oitavo PIB do mundo nas três listas consultadas (FMI, Banco Mundial e CIA) não entrou no mapa.
O PIB do Brasil é próximo ao da Itália, sétimo PIB do mundo também nas três listas. A explicação, segundo a Economist, é a taxa de câmbio nominal, por isso, imagino, ficamos de fora. Abaixo os dois mapas, mas no site da Economist, o infográfico ainda dá a comparação por população e é interativo.
- Mapa dos EUA segundo a CIA com dados gerais
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No mínimo, curioso para quem não gosta de economia. O PIB da Rússia, por exemplo, é equivalente ao do Texas e o da Itália, ao da Califórnia. A Austrália, equivale ao de Nova York. O curioso é que o Brasil, oitavo PIB do mundo nas três listas consultadas (FMI, Banco Mundial e CIA) não entrou no mapa.
O PIB do Brasil é próximo ao da Itália, sétimo PIB do mundo também nas três listas. A explicação, segundo a Economist, é a taxa de câmbio nominal, por isso, imagino, ficamos de fora. Abaixo os dois mapas, mas no site da Economist, o infográfico ainda dá a comparação por população e é interativo.
terça-feira, 1 de fevereiro de 2011
Dilma pode ter aprovação maior que a de Lula?
Um motivo para acreditar que sim, o bom senso. E outros motivos para apostar que não, não pode
Ao fim do primeiro mês de governo Dilma Rousseff, restam mais perguntas que respostas – normal. Diz a regra, ditada não se sabe por quem, que há que esperar os primeiros cem dias para uma avaliação mais profunda. Ao fim do primeiro ano, será possível saber com um pouco menos de imprecisão se Dilma tem condições de realizar o improvável: ter mais popularidade do que Lula.
Este é um campo em que há apenas duas possibilidades: sim e não, e o divertido é começar pelo insensato. Sim, Dilma pode ter aprovação maior que a de Lula. Se há uma questão que ficou clara nestas primeiras semanas, trata-se do estilo Dilma de governar. O viés mais discreto, com menos aparições públicas, tem o poder de agradar aos famosos 3% que viam o governo Lula como “ruim/péssimo” e mesmo aos 13% que aceitaram, de malgrado, engolir a gestão anterior como “regular”.
Pouco importa se o estilo discreto é fruto de marketing, como supõe a Folha de S. Paulo, ou de características pessoais, como supõe o bom senso. A bem da verdade, já que ora se fala neste assunto, Dilma parece gostar de falar pelas entrelinhas: foi a ato contra o Holocausto em Porto Alegre e fez questão de se reunir com as Mães da Praça de Maio em Buenos Aires.
É importante lembrar que, entre os que desaprovavam Lula, há uma dose nada desprezível – ou muito desprezível? – de preconceito. Gente que “teve” de aguentar durante oito anos o estilo nordestino-sindicalista de Lula está a admirar o estilo gaúcho-técnico da presidenta. A mídia brasileira, em nossa fábula da vida política, deu a Dilma o papel da pessoa séria e rigorosa, dois atributos deveras valorizados pelas classes médias e altas que tanto odiavam a Lula. O gaúcho foi o mais próximo que chegamos da Europa, que saudades da Europa, com seu lenço no pescoço, o semblante fechado e o vinho no lugar da cerveja. O rigoroso é a incorporação do trabalho duro, sem espaço para desvios de conduta, bem diferente da “república sindicalista” de Lulla – sim, eles adoram lembrar de Collor.
Mostras desse segundo atributo foram dadas neste primeiro mês, com a condenação aos problemas de direitos humanos no Irã e em Cuba, a demora em receber as centrais sindicais e a ordem para cortar geral no Orçamento, temas com grande poder de penetração no cérebro modelo Jornal Nacional das classes médias e altas. Os governos iraniano e cubano são, para o clube dos 3%, o exemplo do que há de pior no mundo, e com os quais Lula foi “conivente”. As “torneiras abertas” dos cofres públicos e o mundo sindical caem como uma luva no imaginário autoflagelador dos ricos brasileiros, sempre queixosos da alta carga tributária e das classes políticas, assim genericamente denominadas.
De boatos e silêncios
Por tudo isso, Dilma poderia angariar uma popularidade altíssima e reaproximar o PT das classes médias, levando-o a um êxito maior nas eleições municipais de 2012. Ocorre que é improvável que se consiga ganhar de um lado sem perder de outro, e aí vem a análise menos divertida da situação geral. A primeira questão é óbvia: contraria a lógica que alguém possa obter mais aprovação que o presidente mais popular de que se tem notícia.
Depois disso, o estilo discreto de Dilma, se agrada os outrora “reprovantes”, pode ser lido como um silêncio incômodo sob o olhar de parte dos eleitores do novo governo. A presidenta sabe, ou poderia ter aprendido com o primeiro turno das eleições, que o boato prospera principalmente onde há silêncio e incerteza. É aí que podem ser plantadas notícias, caírem ministros e, mais que nada, serem criados imensos mal-entendidos.
Imagina-se que Dilma virá a público mais vezes após esta fase inicial de montagem de gabinete e rateio de cargos, e parece necessário que o faça para não permitir que acabe falando pela boca de terceiros. Há dubiedade, até agora, sobre a real intenção do governo em relação a pontos tidos como fundamentais por apoiadores mais “ideológicos”, como o marco regulatório das comunicações e a criação da Comissão da Verdade. Dilma sabe que, para seguir em frente nestes dois assuntos, vai comprar brigas exatamente com o piso de cima da sociedade, e até mesmo com os estratos de baixo influenciados pelos setores conservadores da imprensa. Será preciso esperar os cem dias, e talvez mais, para saber se vai ou não aceitar essas pelejas – e se sua arma será a peixeira ou a boleadeira.
João Peres é jornalista, colunista do Nota de Rodapé
Seu estilo discreto é fruto de Marketing como supõe a Folha de S.Paulo? Ou são características pessoais? |
Este é um campo em que há apenas duas possibilidades: sim e não, e o divertido é começar pelo insensato. Sim, Dilma pode ter aprovação maior que a de Lula. Se há uma questão que ficou clara nestas primeiras semanas, trata-se do estilo Dilma de governar. O viés mais discreto, com menos aparições públicas, tem o poder de agradar aos famosos 3% que viam o governo Lula como “ruim/péssimo” e mesmo aos 13% que aceitaram, de malgrado, engolir a gestão anterior como “regular”.
Pouco importa se o estilo discreto é fruto de marketing, como supõe a Folha de S. Paulo, ou de características pessoais, como supõe o bom senso. A bem da verdade, já que ora se fala neste assunto, Dilma parece gostar de falar pelas entrelinhas: foi a ato contra o Holocausto em Porto Alegre e fez questão de se reunir com as Mães da Praça de Maio em Buenos Aires.
É importante lembrar que, entre os que desaprovavam Lula, há uma dose nada desprezível – ou muito desprezível? – de preconceito. Gente que “teve” de aguentar durante oito anos o estilo nordestino-sindicalista de Lula está a admirar o estilo gaúcho-técnico da presidenta. A mídia brasileira, em nossa fábula da vida política, deu a Dilma o papel da pessoa séria e rigorosa, dois atributos deveras valorizados pelas classes médias e altas que tanto odiavam a Lula. O gaúcho foi o mais próximo que chegamos da Europa, que saudades da Europa, com seu lenço no pescoço, o semblante fechado e o vinho no lugar da cerveja. O rigoroso é a incorporação do trabalho duro, sem espaço para desvios de conduta, bem diferente da “república sindicalista” de Lulla – sim, eles adoram lembrar de Collor.
Mostras desse segundo atributo foram dadas neste primeiro mês, com a condenação aos problemas de direitos humanos no Irã e em Cuba, a demora em receber as centrais sindicais e a ordem para cortar geral no Orçamento, temas com grande poder de penetração no cérebro modelo Jornal Nacional das classes médias e altas. Os governos iraniano e cubano são, para o clube dos 3%, o exemplo do que há de pior no mundo, e com os quais Lula foi “conivente”. As “torneiras abertas” dos cofres públicos e o mundo sindical caem como uma luva no imaginário autoflagelador dos ricos brasileiros, sempre queixosos da alta carga tributária e das classes políticas, assim genericamente denominadas.
De boatos e silêncios
Por tudo isso, Dilma poderia angariar uma popularidade altíssima e reaproximar o PT das classes médias, levando-o a um êxito maior nas eleições municipais de 2012. Ocorre que é improvável que se consiga ganhar de um lado sem perder de outro, e aí vem a análise menos divertida da situação geral. A primeira questão é óbvia: contraria a lógica que alguém possa obter mais aprovação que o presidente mais popular de que se tem notícia.
Depois disso, o estilo discreto de Dilma, se agrada os outrora “reprovantes”, pode ser lido como um silêncio incômodo sob o olhar de parte dos eleitores do novo governo. A presidenta sabe, ou poderia ter aprendido com o primeiro turno das eleições, que o boato prospera principalmente onde há silêncio e incerteza. É aí que podem ser plantadas notícias, caírem ministros e, mais que nada, serem criados imensos mal-entendidos.
Imagina-se que Dilma virá a público mais vezes após esta fase inicial de montagem de gabinete e rateio de cargos, e parece necessário que o faça para não permitir que acabe falando pela boca de terceiros. Há dubiedade, até agora, sobre a real intenção do governo em relação a pontos tidos como fundamentais por apoiadores mais “ideológicos”, como o marco regulatório das comunicações e a criação da Comissão da Verdade. Dilma sabe que, para seguir em frente nestes dois assuntos, vai comprar brigas exatamente com o piso de cima da sociedade, e até mesmo com os estratos de baixo influenciados pelos setores conservadores da imprensa. Será preciso esperar os cem dias, e talvez mais, para saber se vai ou não aceitar essas pelejas – e se sua arma será a peixeira ou a boleadeira.
João Peres é jornalista, colunista do Nota de Rodapé
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