Seriam os atrasos uma forma de a esquerda nacional se diferenciar da neurose direitista por horários e protocolos?
Direto de Porto Alegre - Os atrasos são parte do protocolo do Fórum Social Mundial. Começar fora do horário, muito fora do horário, estranhamente sempre foi um orgulho para a esquerda brasileira.
É possível que alguém saiba a origem disso. Talvez, em algum momento, tenha sido uma maneira de se diferenciar da direita, neurótica com horários e protocolos, algo assim.
O fato é que aqui, em Porto Alegre, os eventos vão entrar em competição para ver quem começa com o maior atraso. Parece aquela rodada final do Brasileirão em que uma partida depende da outra e acha que leva vantagem quem retardar um pouquinho mais o pontapé inicial.
O atraso mínimo é de 45 minutos e a média é de uma hora, podendo facilmente atingir o pico de uma hora e meia. Curiosamente, discute-se outro mundo possível por aqui.
Talvez se imagine que, nesse outro mundo, todos terão mais tempo disponível para uma boa prosa e, por isso, não é preciso ter pressa.
Mas, enquanto isso não se concretiza, quem pena são los de abajo. Por exemplo, o evento desta quarta-feira (27) na Assembleia Legislativa gaúcha discutia o bem-viver, ou seja, um modo de que todos vivam com qualidade de vida. Começou às 9h50. Dentro do horário previsto, portanto, nove da matina.
Bobo é o jornalista que ainda chega no horário, penso eu. Quando finalmente começam os debates, e lá se vai uma hora sentado na cadeira, ninguém fala dentro dos minutos protocolares, claro, e estender-se pelo dobro do previsto também é regra.
Resulta que acaba sempre depois de uma da tarde a discussão que deveria ter se encerrado, no máximo, ao meio-dia.Os painelistas têm pela frente uma tarde livre para irem aos outros debates. Quem acompanha o Fórum de perto ganha duas horas para comer e ir à programação da tarde, considerando que haverá mais uma hora de lambuja de atraso.
O jornalista, no entanto, precisa escrever sobre os debates da parte da manhã, engolir alguma coisa e novamente imaginar, erroneamente, que pela tarde um outro mundo será possível e tudo vai começar no horário. Ele avança pelas ruas, pega o primeiro pastel que aparece pela frente e chega ao outro evento. Por lá, desolado, dá-se conta de que vai esperar mais uma hora.
E que o evento da tarde, portanto, vai acabar quando a noite gaúcha estiver caindo. Ele ainda precisará escrever o que o cérebro permitir e, claro, comer aquilo que não comeu no almoço.
Na próxima edição, bem que os organizadores do Fórum poderiam pensar no bem-viver dos repórteres. Ou distribuir porções em pacotinho.
-Me dá um pouco de bem-viver?
-Claro. Vai querer de 300 ou de 500?
-Não, hoje vou me acabar. Quero um litro. E pode mandar direto na veia!
Enquanto isso não acontece, alguém tem um pouco de bem-viver para me dar?
João Peres é jornalista e colunista do Nota de Rodapé
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