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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Você tem um amigo

Carole King
Dentre as canções que moldaram a minha juventude, há uma que se destaca. É “You’ve got a friend”, de Carole King. Foi lançada no final dos anos setenta e tão repetida na vitrola portátil do meu quarto que provavelmente até as paredes e roupas do armário ficaram saturadas. Sem falar na minha irmã, que tampouco tinha escolha.

Acho que sou da primeira geração para quem os amigos assumiram importância afetiva equivalente à da família. Até então, éramos tribais, vivíamos em clãs, não tínhamos tanto contato com o mundo externo que nos permitisse estabelecer vínculos profundos. Aliás, nem existia esse papo de vínculo, família era família, e ponto. Era o que tínhamos, não havia do que reclamar, nem muito o que esperar.

Afinidade, acolhimento, aceitação incondicional foram as ideias novas que mais me impressionaram no final da adolescência, sendo eu uma pirralha transgressora, profundamente solitária, deslocada num mundo em que recebíamos tudo pronto e resolvido, coisa que me dava uma agonia profunda.

A canção me oferecia um amigo, algo que eu ainda não sabia muito bem o que era. Compartilhei-a com as pessoas que sentia mais próximas, que vieram a se tornar grandes amizades – algumas até hoje. Pessoas que também estavam tentando driblar as decisões tomadas pelas famílias e ganhar mundo.

Foi o que fiz, e foi muito duro. Sofri essa dureza na carne e no coração, mas tive a sorte de ser amparada pelos amigos – mais ainda pelas amigas – que encontrei, com quem estabeleci cumplicidades e reciprocidades difíceis de descrever. Como disse a escritora portuguesa Inês Pedrosa numa entrevista, “tenho amigos por quem atravessaria um quarto em chamas”.

Júnia Puglia, cronista, mantém a coluna semanal De um tudo no NR.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Essa gente diferenciada

Machado de Assis (1839-1908) se diferenciou ao escrever com precisão e síntese numa época em que a maioria dos escribas eram prolixos, para não dizer verborrágicos. O maior mestiço da literatura brasileira se antecipou por mais de um século à escrita na internet, ao condensar informação e graça em enxutos parágrafos.

Nise da Silveira (1905-1999), contrariando os doutores da mente ortodoxos, apostou no poder curativo e solidário da expressão artística. No Hospital Psiquiátrico Pedro II, no bairro carioca de Engenho de Dentro, ela criou, no ano de 1952, o Museu de Imagens do Inconsciente. O acervo composto exclusivamente com obras dos internos.

Os jornalistas Gay Talese (1932) e Eliane Brum (1966) desafiaram editores e manuais de redação para criar estupendas reportagens. Nelas, as pessoas comuns, anônimas até, ganham o brilho de celebridades. Os dois contam histórias reais valendo-se do jeito de escrever ficção. Jornalismo e arte na mesma pena.

Gente diferenciada renderia uma lista enorme, maior do que os antigos catálogos telefônicos da cidade de São Paulo. Você mesmo, parando para lembrar, vai encontrar os diferentes na família, ou entre amigos e conhecidos.

Aquele tio que abandonou o bom emprego no Banco Central para tocar saxofone em bares noturnos. A prima que largou o marido rico para viver uma paixão com uma enfermeira pobre de Nova Jersey. O amigo que trocou a agência de publicidade - onde era infeliz, para abrir uma pastelaria na XV de Novembro - onde é mais ou menos feliz.

É nessa gente que penso, enquanto eu e meu carro congestionamos na Rua Piauí, ao lado da Praça Buenos Aires, coração do paulistano bairro de Higienópolis. Pois foi aqui que, faz um ano e pouco, a expressão gente diferenciada ganhou projeção municipal.

Tudo por conta da futura construção de uma estação de metrô. Uma senhora bem de vida, e de mal com o povo, protestou. Ela alegou que a estação atrairia essa gente diferenciada. No final, a história acabou em piada e em churrasco convocado pelas redes sociais.

Mas, já que o trânsito não desenrosca, fico olhando para os transeuntes na calçada da Piauí. Tento imaginar quantos entre eles são diferenciados. Quantos entre eles desafinam o coro dos contentes. Talvez aquela babá negra que empurra o carinho com um bebê dentro, loirinho e saltitante.

fernanda pompeu, webcronista, colunista do Nota de Rodapé, escreve às quintas a coluna Observatório da Esquina.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Emancipação capilar

Barbeiros não sabem cortar cabelos. Pode parecer uma afirmação absurda, mas é fato. Barbeiros cortam cabelos como se fossem gramados. E cabelos não são gramados. São parte da nossa identidade, como orelhas, nariz ou sobrancelhas. Mas os barbeiros não levam isso em conta. Apenas cortam, sempre igual. Antes de começarem, quando nos sentamos nas cadeiras das barbearias (tão parecidas com as dos consultórios dentários), eles sempre perguntam como queremos o corte: mais curto, mais comprido, pentear pro lado, pentear pra trás. Mas, no fim, cortam sempre igual.

Um homem que sai do barbeiro é reconhecido à distância. E por alguns dias tem de lidar com sua personalidade homogeneizada, qual um recruta do exército ou um menino de calças curtas, obrigado a acatar os gostos capilares da mãe.

Eu sempre odiei barbeiros por causa dessa mania de deixar todo mundo com a mesma cara de bom moço. Fossem os barbeiros arquitetos e todas as cidades se assemelhariam a condomínios de Alphaville. Um mundo limpinho, arrumadinho, porém desprovido de charme e de identidade própria.

Mas cheguei a tentar algumas vezes. Em geral em barbearias razoavelmente baratas, mas nem sempre. Certa vez, num lapso de insanidade e obviamente estimulado por uma mulher, fui a um desses salões caríssimos, onde todos vestiam quimonos. Me fizeram massagem, me lavaram a cabeça com xampus aromáticos de ervas desconhecidas, me deram revistas importadas pra eu apontar o penteado ideal, cortaram os cabelos com navalha e, no fim, o resultado foi a mesma bananice de sempre.

Por tudo isso, ao longo dos anos, me acostumei a entregar o cuidado das madeixas às mãos mais confiáveis do mundo: as da minha mãe. Geralmente escolho um domingo de sol, almoçamos juntos, ela coloca uma cadeira no jardim dos fundos, me cobre os ombros com uma toalha de mesa suja, e passamos meia hora na função barbearia, que quase sempre nos faz dar boas risadas.

Quase sempre, vejam bem. Porque há dias em que ela não está muito inspirada e me deixa longas antenas de comunicação intergaláctica atrás das orelhas. Em outros, tem arroubos de criatividade (“hoje vou começar pelo meio”) que nem sempre provocam resultados satisfatórios. Mas as risadas ficam mais raras mesmo quando Dona Helô não está com paciência pra coisa e quase me descasca o couro cabeludo com os dentes do pente. Nessas ocasiões, me vejo assombrado por uma imagem da infância: meu primo sangrando depois de ter um pedaço da orelha arrancado por uma tesourada de minha mãe. De qualquer forma, o resultado do corte caseiro invariavelmente supera o dos profissionais.

Mas, ultimamente, com compromissos de trabalho, o próximo livro que estou terminando pela terceira vez (e ainda devo terminar mais umas quatro) e esse trânsito da cidade que não anda, fica cada vez mais difícil me descambar até a casa da minha mãe. Então, semana passada, numa noite de insônia, olhei bem a minha própria cara no espelho, o canivete suíço que uso pra cortar unhas apoiado na janela, e lembrei do meu amigo Paulo.

Meu amigo Paulo compactua com meu desapreço por barbeiros. Tanto assim que, como me confidenciou certa vez, costuma cortar o próprio cabelo. A afirmação poderia ser de fato surpreendente, não houvesse sido produzida pelas cordas vocais do meu amigo Paulo.

Dou um exemplo, a título de explicação. Há algum tempo, fui visitar meu amigo Paulo numa noite de sábado. Sua namorada, a Nat, abriu a porta, me cumprimentou e voltou a lavar louças. Do segundo andar, vinha um agradável som de piano. “O Paulo está lá em cima, no piano, sobe lá”, disse a Nat, numa frase recheada com um agradável conforto doméstico.

Eu subi e topei com o meu amigo Paulo tocando, sem partitura, uma música que ele mesmo havia composto. “Eu nem sabia que você tocava, nem sabia que você compunha”, exclamei algo espantado. Ele disse que sim, vinha aprendendo piano sozinho e compunha nas horas vagas. Tinha algo como seiscentas (seiscentas!) músicas escritas.

Diante de surpresas como essa, convenhamos, não há como tomá-lo por referência. Ou, em outras palavras, se o meu amigo Paulo é capaz de cortar o próprio cabelo, não quer dizer que eu também o seja. E ainda por cima o cabelo dele é fino e liso, não duro e cheio como o meu, onde qualquer falha fica mais evidente.

Mas a insônia traz dessas insanidades. E eu comecei, com a tesourinha do canivete suíço (ah, se o MacGyver me visse...). Comecei pelo lado, acima da orelha. “É um trabalho pra se fazer com calma, dura algo como uma semana”, explicara meu amigo Paulo, agora promovido a guru capilar. Eu obedeci. Fui aos poucos. Tesouradas discretas e irregulares, pequenos tufos de cabelo lentamente deixando o conforto da cabeça para formar um ninho castanho no cesto de lixo do banheiro.

Naquela noite mesmo, terminei as laterais. Na manhã seguinte, talvez ainda encorajado pela falta de sono, retoquei o trabalho anterior e ataquei a parte de cima e da frente. Estava já mais seguro, confiante nas tesouradas. Cheguei a arriscar até umas aparadas atrás, mas aí não foi tão fácil.

Meu amigo Paulo diz que chegou a usar dois espelhos, operação que se mostrou complexa até para seu intelecto privilegiado. “Você nunca sabe pra onde está movendo a mão. É completamente aleatório. Você quer mexer pra trás, mas a tesoura vai, sei lá, pra direita.” Diante disso o que fez meu amigo Paulo? Cortou de olhos fechados.

Eu, como um marinheiro de primeira viagem, preferi pedir ajuda à Helena. Ela, a princípio, não quis arcar com a responsabilidade, mas eu ameacei cortar de olhos fechados e ela topou me agraciar com algumas tesouradas. Depois, no fim de semana, ainda dei uma passada na casa da mama pra uma aparadela final.

E o resultado? Bem, caros leitores, pode ser orgulho de criador diante da criatura, mas creio estar portando o melhor corte de cabelo dos meus trinta e um anos de vida. Curto, mas não muito, levemente repicado, discretamente caótico, revolto e másculo, sem qualquer indício de bananice. Ainda estou tentando me livrar dos fios que se espalharam por cada fresta do chão do banheiro, mas não importa. É um preço pequeno a se pagar por tamanha liberdade.

Tomás Chiaverini é autor do romance Avesso (Global), e dos livros reportagem Cama de Cimento e Festa Infinita (ambos pela Ediouro). Mantém a coluna mensal Abelha na Orelha.

Minicraques da Política #2 (Edição de Colecionador)

[clique na caricatura para ver em tamanho grande]

Caco Bressane, arquiteto e ilustrador, colunista do NR, atualmente mantém a série A Fábrica de Brinquedos Pau-brasil

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Outro fim trágico no caso da americana Rachel Corrie

Todo mundo se lembra da icônica imagem de um estudante chinês se manifestando por liberdade democrática plantado em frente a um tanque de guerra na praça da paz celestial, em Beijing, na China.

Outra imagem igualmente dramática, e com final cruelmente trágico, não teve a mesma divulgação na grande imprensa. Trata-se da jovem americana Rachel Corrie que, aos 23 anos, foi para a Palestina protestar contra a demolição de habitações de moradores que estavam sendo expulsos de suas casas numa operação militar do exército israelense, em 2003.

O motorista militar do trator pesado, ao contrário do condutor do tanque na praça da paz celestial, não parou. Soterrou Rachel, deu ré e avançou novamente. As imagens da tragédia podem ser vista no Youtube.

A diplomacia americana pressionou Israel para uma investigação rigorosa envolvendo a cidadã norte-americana. O resultado saiu ontem, 27. As autoridades israelenses decidiram que o militar que dirigia o bulldozer não teve culpa, nem comportamento negligente, segundo artigo no jornal inglês The Guardian.

O grupo Jewish Voice, formado por judeus democratas que se opõem à política de repressão armada ao povo palestino, lamentou a decisão hoje. Esse grupo está pressionando, nos EUA, para que os investidores americanos se livrem das ações da empresa Caterpillar, a fabricante dos tratores pesados que são usados militarmente na política israelense de demolição de casas e até vilarejos inteiros.

O embaixador americano em Israel, Dan Shapiro, disse à família de Corrie que a investigação “não foi satisfatória, rigorosa, acreditável nem transparente como deveria ser”.

Flávio de Carvalho Serpa, jornalista, especial para o NR

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Notas sobre uma guerra que não me pertenceu

Borges dizia que se há algo que não existe esse algo é o esquecimento.

Na Espanha pós-Franco, os responsáveis pela transição democrática ignoraram a sentença do escritor argentino e fizeram de conta que a Guerra Civil Espanhola – que cobrou cerca de meio milhão de vidas – nunca havia existido.

A Morte do Soldado Legalista, de Robert Capa,  fotografia
das mais conhecidas sobre a Guerra Civil Espanhola
Espalhadas por praticamente todo o país, há cerca de duas mil valas comuns onde jazem por volta de cem mil vítimas da guerra. Pouco mais de 10% dessas valas foram abertas. O mais assustador é que muitos dos familiares sabem onde estão enterrados os seus. Apenas querem que eles sejam identificados e ganhem uma sepultura digna, para que deixem de ser “desaparecidos”.

Os que defendem que não se deve voltar a tocar nessa ferida dizem que isso é passado, aconteceu há muitas décadas, e que é preciso seguir adiante. Mas os fatos desmentem essa afirmativa.

1) “Na minha casa a Guerra Civil é presente, se fala dela, se vive ela. Minha mãe paralisou sua vida por quase 30 anos até encontrar meu avô”, me conta um conhecido. Seu avô, para salvar a vida, partiu para o México. Depois de décadas conseguiu reencontrar a família. Para eles é impossível esquecer algo que determinou suas vidas.

2) Henrique sofre de Alzheimer. Não se lembra de praticamente nada e não reconhece ninguém. Quem cuida dele são os vizinhos, já que não tem família. Não tem família porque na época da Guerra Civil seu pai foi assassinado, seu irmão teve que fugir para outro país e sua mãe foi enforcada, mas não morreu (viveu até os 93 anos).

Quando ainda era possível estabelecer uma conversa, Henrique contava sobre o episódio, mas nunca disse se assistiu à tentativa de execução da mãe. Hoje ele quase não fala e se comportava como uma criança – joga no chão a comida, rasga revistas. Quem cuida de Henrique gostaria de acreditar que ele também esqueceu o que aconteceu durante a guerra, mas seu olhar perdido diz o contrário.

3) Há alguns meses fui a uma exposição de fotos sobre a Guerra Civil. Eram instantâneas que retratavam lugares destruídos, famílias em fuga, hospitais e centros de acolhida de órfãos. As fotos me tocaram, mas aquela guerra não me pertencia; me pareciam algo distante no tempo e no espaço. Logo percebi que não era tanto assim.

Vi um casal de idosos, ela amparando ele pelo braço, olhando uma das imagens detidamente. Estavam muito próximos do retrato, talvez pela miopia. Eu passava ao lado deles quando ela sentenciou: “Sim, isso aqui é em Valência, eu me lembro desse lugar, nós passamos por lá”.

Ricardo Viel, jornalista, escreve às segundas, de Salamanca, Espanha.

sábado, 25 de agosto de 2012

quadrinhos_11


Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista. Mantém o Estúdio Saci.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Coração materno

Pânico. Entrando no carro com aquela pacotinho bem embrulhado no colo, várias bolsas de viagem, meu marido do lado, o que eu sentia mesmo era pânico. O que seria daquela menina? Por que o hospital não entregava junto com ela uma enfermeira ou, pelo menos, um manual? Será que não dava pra ficar mais uns dias internada, uma semana, dois meses?

Cadê a felicidade dos comerciais de fraldas? A realização, a sensação de poder, a doçura, a disposição pra matar e morrer?

Nada disso. Tudo era cansaço, como se eu tivesse vivido noventa anos. Por que ninguém me avisou que era tão exaustivo? Quando vou dormir de novo? E essa dor, esse aperto na garganta, essa vontade de sumir? Era um padecimento sem nenhum indício de paraíso.

Muitos dias pra me acalmar. Nada parecia natural, mas brutal, amargo, sufocante. Quando mamava, ela me olhava, e eu chorava. Pensei tem que haver um jeito, não pode ser tão ruim. Aos poucos fui descobrindo.

O filho é uma pessoa. Já nasce sabendo muita coisa. Minha filha sabia que eu buscava desesperadamente um sentido, e me deu seus olhos, que me acompanhavam e me diziam que quando a gente se conhecesse melhor, tudo seria mais fácil. E foi. Com ela, e com o menino que veio depois – nasceu sabendo abraçar! – aprendi que minha incapacidade de me apropriar do mito do amor materno instantâneo e incondicional abriu-nos caminho para a conquista. Portanto, estamos aprendendo juntos, num processo que já teve de tudo um pouco e está longe de acabar, mesmo os dois já tendo passado dos vinte anos.

Esse papo de mães e filhos é interminável, porque foi transformado em algo tão complexo e equivocado, com cobranças e expectativas tão absurdas, que parece que ninguém mais sabe de nada. Nem eu sei, mas, se me permitem uma sugestão, acho que nos vermos uns aos outros como pessoas, indivíduos que trazem consigo uma enorme complexidade impossível de ser espremida dentro daquilo que se forjou como “amor de mãe” e “fazer tudo pelo filho”, pode abrir uma perspectiva mais verdadeira. E paro por aqui.

Júnia Puglia, cronista, mantém a coluna semanal De um tudo no NR.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Coisas que eu sei

Não foi maciota ter sido adolescente sob o regime militar. Eu tinha 13 anos quando baixaram o AI-5, em dezembro de 1968. Lembrando para os mais jovens: o AI-5 enterrou o que restava das liberdades democráticas – já feridas de morte com o Golpe de 1964.

Ficava proibida qualquer manifestação política contrária à ditadura. A manifestação podia ser uma peça de teatro, uma canção, um livro, uma charge, um artigo de jornal. Podia ser um discurso proferido em uma esquina, ou numa mesa de bar.

A ordem era: cala a boca, se não te prendo, te torturo, te mato, te desapareço. Imaginem, então, descobrir o mundo público em meio ao estado de mordaça e terror. Imaginem o desconforto dos adolescentes tão ávidos de se expressar. Tão a fim de afirmar: Eu existo!

Mas não pensem que o autoritarismo vinha apenas dos militares, dos policiais e dos políticos cúmplices. Ele se tornou viral. Encorajou porteiros, síndicos, seguranças. Qualquer um desses estava no direito de exigir documentos e barrar passagens.

O autoritarismo – revólver dos medíocres – passou para as mãos de alguns professores, inspetores, diretores escolares. Talvez seja impossível para o adolescente de 2012 compreender o que era frequentar uma escola pública sob o regime militar.

Desastre! Perguntar, provocar, pensar fora do quadrado estava definitivamente fora de questão. Éramos encarados como seres sem vontade ou luz próprias. Silêncio! Silêncio! era o grito que mais ouvíamos.

Fora dos muros da escola, convivíamos com o ufanismo oficial. Milagre econômico, operário padrão, prá frente brasil, melhor futebol do mundo, tv globo, miss brasil, integração nacional, transamazônica, ponte Rio-Niterói. Enfim, ame-o ou deixe-o.

Nós, adolescentes de então, novos velhos de hoje, herdamos traços importantes da cultura do cala a boca, quem manda aqui sou eu. Porque pensem: se racismo, sexismo, homofobia, intolerância se aprendem, o autoritarismo também.

O que pergunto para os mais jovens, para os meus amigos, para os meus adversários e, fundamentalmente, para mim mesma é: como se desaprende?

fernanda pompeu, webcronista, colunista do Nota de Rodapé, escreve às quintas a coluna Observatório da Esquina.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

A fase marighelliana de Mano Brown

Clara Charf, viúva de Marighella, com Mano Brown, na
casa dela, em junho de 2011 (Foto: Isa Grispum Ferraz)
Há cerca de três anos, quando minha mãe (Isa Grinspum Ferraz) começou a produção do documentário “Marighella” (sobre o líder comunista e guerrilheiro assassinado em 1969 pela ditadura), ela me perguntou quem seria o rapper mais interessante para fazer uma música para a trilha do filme. A ideia era dialogar também com as novas gerações e com a população de um modo mais amplo, e o rap parecia um bom caminho.

Não precisei pensar muito para responder: “O cara é o Mano Brown. Sem nenhum pingo de dúvida”. Para mim, Brown é não só o maior rapper brasileiro, mas também uns dos maiores gênios da música nacional das últimas décadas. Eu já tinha mostrado para minha mãe, desde a adolescência, faixas como “Homem na Estrada”, “Fim de Semana no Parque”, “Diário de Um Detento” e “Negro Drama”. Lembrando disso, ela topou na hora.

Mas e para ele topar? Todos sabemos que o acesso a Mano Brown não é fácil. E dessa vez não foi diferente. Demorou um ano e meio para conseguirmos fazer ele aceitar a empreitada. A produção do filme já estava bem adiantada. De cara ele pediu para assistir o primeiro corte, de cerca de quatro horas. A partir daí se encantou com a história de Marighella, começou a pesquisar mais e pediu para conhecer Clara Charf, viúva do líder.

As coisas começaram a fluir, até desembocar na música “Marighella: Mil Faces de Um Homem Leal” – que fecha o filme e ganhou clipe.

"ESSE NOME FICOU:
MARIGHELLA"


Brown: "Uma vez falaram que eu parecia com o Marighella"
Recentemente, pouco antes da estreia do filme, foi pedido para que eu fizesse uma entrevista com o Brown para ser usada pela assessoria. Não tive muito tempo de preparar, mas não dava para perder a oportunidade. Algumas perguntas tinham mais a ver com a divulgação do trabalho, e as cortei da versão que publico aqui. Minha intenção, neste NR, não é divulgar filme nenhum, mas sim colocar no mundo essa entrevista em que Brown fala coisas tão interessantes sobre sua identificação com Marighella.

Quando cheguei na casa em que fui encontrá-lo (sede da produtora do clipe), o cumprimentei e tentei puxar assunto. Comentei que estava ouvindo bastante as músicas do começo dos Racionais, como “Voz Ativa” e “Negro Limitado”. Ele me olhou meio estranho e falou: “É mesmo? Você não acha muito radical?”. Fiquei um pouco tenso, e achei que a partir daí a entrevista seria difícil. Mas não, o papo fluiu muito bem, como você verá a seguir.

NR – Como você tomou contato com a história do Marighella?
Brown – Uma vez falaram pra mim que eu parecia com o Marighella. Depois, há uns 8 anos encontrei a Clara (Charf) e ela me falou sobre ele. Aí esse nome ficou: Marighella. Eu sabia que era um cara dos nossos, mas ainda não tinha me aprofundado nas ideias dele. Eu também já tinha ouvido rap’s que citavam ele, e um pouco antes de eu ser chamado pra fazer a música, um amigo meu tinha pichado o nome do Marighella em um muro lá na minha quebrada, junto com outros como Che Guevara, Malcom X, Sabotage... Então eu já estava tendo contato aos poucos.

NR – E o convite para o filme?
Brown – Me disseram que era o filme da sobrinha do Marighella, aí eu falei que topava fazer. Eu, então, pedi pra ver o filme, porque queria ver como era a obra da diretora, eu queria entrar no contexto. Eu tinha que fazer uma música que combinasse com o filme, não simplesmente um rap sobre o Marighella. Tinha que combinar no som, no jeito de cantar, de falar...

NR – E conhecendo melhor a história do Marighella, você concordou que vocês se pareciam? Como foi essa identificação?
Brown – Parece mesmo. A origem dele é a mesma que a minha, baiano com italiano. Preto com branco. O nariz parece... E a adrenalina, ele gostava disso, era sonhador, visionário também. Quase um santo, eu diria. Se você for ver, os grandes heróis da humanidade também tiveram que pegar em armas pra lutar por suas causas. Se matou muito em vão, se matou muito em nome de Cristo também. E o Marighella lutava por uma causa até bem mais justa do que o cristianismo, que era justiça, liberdade de religião, e tantas outras liberdades.

NR – Quando aceitou fazer a música você falou para a diretora: “Eu vou fazer porque não é o seu povo que precisa de heróis, mas o meu povo”. Para quais brasileiros você acha que a história do Marighella serve como lição de resistência, como exemplo?
Brown – O brasileiro no geral. É bom saber que você teve um cara que acreditava na justiça, acreditava no país. Era um cara do povo que acreditava no povo dele. Ele via condições de o Brasil ser grande já naquela época. E via que o que não deixava o país ser grande era a corrupção, a desinformação, a alienação. E ele lutou contra isso de todas as formas, ensinando, sendo político... E num certo momento chegou a conclusão de que contra a força, só usando a força. Contra a força, a força.

"A minha maior inspiração  foi aproximar o Marighella da periferia, mostrar que é um cara como nós (...)"

NR – E a história do Marighella ainda é pouco conhecida de modo geral, principalmente nas periferias, entre as classes baixas... Então o seu rap leva essa história pra muita gente que nunca teve acesso a ela...
Brown – Foi essa a minha maior inspiração, aproximar o Marighella da periferia, mostrar que é um cara como nós. Um cara de um valor inestimável, gigante para a história do Brasil e para a raça negra também.

NR – E sobre o processo de composição do rap, ouvi você dizer que não queria apenas contar uma história, mas “somar”, contribuir com algo novo. Como foi isso?
Brown – Para dialogar com o filme, eu não podia copiar o estilo da diretora. Eu tinha que entender a forma de ver dela, mas fazer a minha, pra somar mesmo. Como se eu colocasse um bonezinho ali em cima do fraque, bem no meu estilo. Então assisti o filme umas quatro vezes, pra ver o caminho que a autora seguiu e seguir um outro complementar, mas diferente. Porque é arte. Música é arte e cinema é arte. São duas artes, elas não podem se copiar. E tem ali no rap a minha visão, claro, mas eu também não quis “entortar” a história do Marighella pro lado que eu quisesse. Quis levar ele pra periferia, mas não “entortar” a história dele pra fazer com que os caras gostassem. Existe uma verdade. Era um cara que gostava de samba, carnaval, de fazer poesia, mas também pegava uma arma e assaltava um banco. É um herói mesmo, que deu a vida por uma causa.

NR – Em “Voz Ativa”, lá no começo dos Racionais, vocês falam que o Brasil precisava de um líder, um herói como Malcom X foi na América...
Brown – Marighella! Se fosse fazer essa música Parte 2 seria o Marighella, com certeza. É um herói brasileiro, mas foi bloqueado ao povo saber da história dele. Porque quando os caras ouvem se identificam rápido. Pensam: porra, era um cara comum, que jogava bola, se fantasiava no carnaval... mas era um monstro, de inteligência e de disposição, de foco. Eu queria ter um cara desses na minha família!

NR – Naquela época (ditadura) havia uma clareza maior de quem era o inimigo, contra o que lutar. Como é a resistência hoje? Contra o que?
Brown – Resistência contra qualquer forma de injustiça. Injustiças cotidianas, pequenas ou grandes. Pequenos racismos, grandes racismos. A luta é fazer a teoria virar prática. Não ficar só falando, mas fazer mais. Às vezes, sair da música e ir pra escola, por exemplo. Nos anos 1990 tudo foi muito cantado, nos anos 2000 tá sendo vivido. Talvez a música tenha dado mais espaço à prática. Se faz o que se cantava nos 90.
Tem muita coisa pra melhorar ainda. No Brasil todo. O país tá mais antenado com o mundo, mas falta muita coisa. Falta escola, universidade gratuita pra todos. Tem muita repressão ainda. Tem ainda uma guerra de poderes no novo Brasil, tem ainda uma esquerda e uma direita. De vez em quando eles convivem, negociam. Mas quando não dá certo quem paga é o povo.

"Marighella é pesado, fui mexer com o cara... foi uma fase marighelliana. Parei tudo pra fazer a música, não tinha como fazer mais nada"
NR – Por que os brasileiros devem ver um filme como “Marighella”?
Brown – Porque o país está em um momento novo e o brasileiro precisa saber que tem gente com a cara dele que faz tempo que é grande. Tem Zumbi, tem Marighella.

NR – E entre várias músicas do Racionais compostas depois do último CD, por que vocês escolheram fazer um clipe justamente de “Marighella”?
Brown – O Marighella precisava de um clipe, de uma apresentação, mostrar a figura dele. E é uma música compacta, que já dava um caminho pro clipe. Foi uma música que foi impactante de fazer. Acima da média. Bati três carros... fiquei doente (risos). Marighella é pesado, fui mexer com o cara... foi uma fase, essa fase marighelliana. Parei tudo pra fazer a música, não tinha como fazer mais nada. É uma puta responsa. Falar de mim é uma coisa, falar de outros é foda.

Marcos Grinspum Ferraz, jornalista e saxofonista da banda Trupe Chá de Boldo estreia hoje a coluna mensal Verbo Sonoro, sobre cultura e música.

Jogo do Mensalão

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Caco Bressane, arquiteto e ilustrador, colunista do NR

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Profanação geral da república*

Será uma manhã diferente igual a tantas outras. Acordarei que estava sonhando quando o sol, com seus raios dourados, tingir de prata o canto escuro do meu quarto iluminado. Será preciso enfrentar o silêncio com todo som que se acumula dentro da minha cabeça, pois antes de abandonar a luta há que desistir de tudo. A última desistência será sempre uma das primeiras virtudes de um pecador ateu. A esperança é a última que morde...

Convencido de que o momento presente será o futuro da humanidade, abrirei o jornal na seção de esportes à procura do último crime político... Ou será o contrário? Isso: abrirei a seção política à procura do último resultado esportivo e deparar-me-ei com a mais grave denúncia sem qualquer sentido ilógico: os últimos continuarão a ser os últimos e os primeiros, os primeiros. Na escola primária da minha rua haverá uma verdadeira luta de classes.

A união fará a forca, a guilhotina ou os supremos tribunais federais. A distribuição da justiça será feita em saquinhos de pipoca de milho verde no cineminha do bairro central da periferia. Brancos e negros se darão as mãos, que ficarão manchadas com a cor do outro. O mudo fará sinais ao surdo tentando explicar que ninguém é perfeito, mas o pior cego é quem entenderá esses sinais...

Na academia brasileira de letras cada acadêmico terá um número e os seus olhos não verão quando a lua surgir no céu da boca. O recomeço de tudo será o final do nada. O pão será farto e a fome infinita. A sede conduzirá o rio até o mar.

Crucificado, o demônio caminhará sobre as águas pluviais e o canto do cisne não mais se ouvirá. A última flor do Lácio será a primeira a murchar e entre David e Golias se fará a justiça de Salomão. Se o mundo estiver à beira do abismo, serei eu a dar o primeiro passo. Reunirei toda a coragem dos covardes e mergulharei nas areias escaldantes do Pólo Norte.

A dúvida é a única certeza. O verdadeiro sábio é aquele que sabe, já dizia acacianamente o procurador escondendo os seus argumentos. Da gaveta da memória perderam-se todas as chaves. No jogo das incertezas o coringa olha para todos os lados por trás dos seus óculos escuros e transparentes.

Quem sabe um dia seremos ouvidos? Ou bocas? Ou narizes? Pois a soma do quadrado é o cateto da hipotenusa, ficando por demonstrar que todo e qualquer nenhum é melhor que nada. Nada e se afoga. E se afoga é porque não sabe nadar. Ou melhor: não nada nada...

Nas costas do Brasil abunda a pita e lá trina o sabiá na seca galha... Nem mais, nem menos. Todo idiota tem seu dia de glória. A melhor defesa é o achaque. No mar de lama que o Brasil rico e culto se esconde, o jornalismo é a ponta do iceberg, o esgoto por onde escorre a merda lançada por algumas de nossas “melhores cabeças”...

(*) Dedico esse texto a alguns membros da mais alta corte de justiça do país, agora transformada em casa de variedades, onde os cidadãos são condenados antes de julgados. E também ao jornalismo de pensamento único. Se por acaso algum leitor não entender o que vai aí acima escrito, não se preocupe, ele não foi escrito para pessoas inteligentes, mas para idiotas como o próprio autor que finge acreditar na justiça de classe praticada no Brasil.

Izaías Almada, escritor e dramaturgo, mantém a coluna mensal Pensando Alto

É preciso ler Jaime Sabines

*Para Ouicho, que me chamou de amoroso e me mostrou Sabines

Editores, diretores e diretoras das grandes e pequenas editoras brasileiras, responsáveis por fazer com que um livro seja lançado no Brasil, mecenas tupiniquins (eles existem?), faço aqui um apelo a vocês.

Sei que poesia não vende no nosso país. Sei também que a exceção de dois ou três, escritores latino-americanos não fazem sucesso em nossas terras.

Enfim, esqueçamos esses pormenores, e vamos ao que interessa: é preciso, urge, faz-se necessário, fundamental publicar Jaime Sabines. Esse mexicano morto em 1999, aos 72 anos, foi o poeta das massas, foi a voz de gerações. Enchia auditórios de pessoas dispostas a escutá-lo declamar suas poesias. Foi tão adorado justamente por ser capaz de falar para e por todos. Seus versos tocaram intelectuais e humildes, jovens e velhos, crentes e descrentes do amor.

Tenho certeza que vertidos ao português esses poemas alimentariam a muitas almas enfraquecidas pela dureza da vida.

Se eu tivesse dinheiro, traduziria e publicaria (ainda que em edições piratas) Sabines e distribuiria aos meus amigos, como se fosse um tesouro – por que o é. Daria também às pessoas que perderam as esperanças, aos resignados, aos que nunca acreditaram no amor ou perdem sua fé nele.

Como não tenho dinheiro, terminarei este texto com um gesto simbólico: a tradução de um dos poemas de Sabines. Um dos mais emblemáticos. Provavelmente o que mais me toca.

E fico na torcida de que estes versos e este texto cheguem aonde deve chegar.
OS AMOROSOS

Os amorosos calam.
O amor é o silêncio mais fino,
o mais angustiante, o mais insuportável.

Os amorosos buscam,
os amorosos são os que abandonam,
são os que mudam, os que esquecem.

Seus corações lhes dizem que nunca vão encontram,
não encontram, buscam.

Os amorosos andam como loucos
porque estão só, só, só
entregando-se, dando-se a cada instante,
chorando porque não salvam o amor.

Lhes preocupa o amor. Os amorosos
vivem o dia, não podem fazer mais, não sabem.

Sempre estão indo,
sempre, a alguma parte.

Esperam,
não esperam nada, mas esperam.

Sabem que nunca vão encontrar.
O amor é a prorrogação perpétua
sempre o passo seguinte, o outro, o outro.

Os amorosos são os insaciáveis,
os que sempre – que bom! – estarão sozinhos.

Os amorosos são a peçonha do conto.
Têm serpentes no lugar dos braços.
As veias do pescoço lhes incham
também como serpentes para asfixia-los.

Os amorosos não podem dormir
porque se dormem são comidos pelos vermes.

Na escuridão abrem os olhos
e neles lhes cai o espanto.

Encontram escorpiões embaixo do lençol
e sua cama flutua como se estivesse em um lago.

Os amorosos são loucos, só loucos,
sem Deus e sem diabo.

Os amorosos saem de suas covas
estarrecidos, famintos,
para caçar fantasmas.

Riem das pessoas que sabem tudo,
das que amam a perpetuidade, veridicamente,
das que acreditam no amor
como uma lâmpada de inesgotável azeite.

Os amorosos brincam de pegar a água,
de tatuar a fumaça, de não ir.

Jogam o longo, o triste jogo do amor.

Ninguém há de resignar-se,
Dizem que ninguém há de resignar-se.

Os amorosos se envergonham de todo conformismo,
Vazios, porém vazios de uma a outra costela,
a morte lhes fermenta atrás dos olhos,
e eles caminham, choram até a madrugada
em que trens e galos se despedem dolorosamente.

Lhes chega às vezes um cheiro à terra recém-nascida,
à mulheres que dormem com a mão no sexo, prazerosamente,
à arroios de aguas brandas e à cozinhas.

Os amorosos colocam-se a cantar entre lábios
uma canção não aprendida,
e vão embora chorando, chorando,
a formosa vida.
Ricardo Viel escreve às segundas de Salamanca, Espanha.

sábado, 18 de agosto de 2012

Altamiro Carrilho: "Canarinho Teimoso"


Ilustração em homenagem aos 87 anos de vida e 70 de música brasileira de Altamiro Carrilho que faleceu na última quarta-feira, 15 de Agosto.

Para quem não conheceu o flautista que gravou mais de cem discos, entre LP’s e compactos e deixou cerca de 200 composições para o mundo ouvir, assoviar e dançar, segue abaixo um documentário da TVE Cultura contando um pouco de sua história.

Obrigado ‘Flautamiro’, para sempre em nossa música. O Brasil agradece.


Kelvin Koubik, artista visual e músico de Porto Alegre, colunista do NR

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Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista. Mantém o Estúdio Saci.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Incômodo animal

Houve um incêndio num apartamento. Não um apartamento qualquer, mas a casa de um grande colecionador de obras de arte, onde estavam objetos de valor incalculável, e muitos deles foram consumidos pelo fogo. Vi a notícia na televisão, junto com um rápido desabafo do proprietário, muito abalado com o acontecido. Não tanto pela sua coleção, como ele mesmo disse; muito mais pela morte do seu gato.

Esta ligação profunda entre humanos e alguns grupos de mamíferos quadrúpedes, especialmente cachorros e gatos, é coisa que vem de longe, milênios de convivência e adaptação mútua, durante os quais os bichos foram trazidos para dentro da casa e da vida das pessoas, estabelecendo uma convivência intensa. Os chavões em torno do assunto são mais do que surrados, mas nenhum como o que determina o cão como o melhor amigo do homem.

Não tenho uma ligação profunda com nenhum animal. Pelo contrário: durante toda a minha infância, eu tinha muito medo de bichos, independentemente do porte, temperamento ou incentivos para me aproximar. Aprendi a conviver com eles depois da chegada em casa de um cachorro que ganhamos de amigos. Mais recentemente, evoluí para uma relação de proximidade e afeto com os sucessivos gatos adotados pela minha filha, e não descarto a possibilidade de eventualmente escolher um bicho de estimação pra mim.

O que tem me chamado muito a atenção, nos últimos anos, é o que nós, humanos, fizemos e estamos fazendo com os outros animais, inclusive os “domésticos”. Uma coisa é domesticar, ou seja, trazer para dentro de casa e para a convivência cotidiana seres não humanos, e estabelecer com eles uma relação de amizade e parceira. Outra coisa é transformá-los em humanos – ou tentar fazê-lo. E é isto que anda me incomodando.

Um dia desses, vi uma notícia dessas bem malucas, sobre uma socialite de Nova York que havia dado uma grande festa pra comemorar o casamento de sua cadela. Festança mesmo, com vestido de noiva, véu e grinalda, bolo, champagne e tudo o mais. E a pobre bichinha lá, junto com o “noivo”, fazendo aquele papel ridículo.

Leio e ouço sobre gatos e cachorros obesos e deprimidos. Vejo cães enormes confinados em apartamentos, praticamente impedidos de andar, fazendo dieta especial, desenvolvendo artrite, artrose, neuroses, intolerância alimentar, frequentando dentista, terapeuta, massagista, academia e toda a parafernália que construímos para lidar com a vida insana que desenvolvemos para nós, especialmente nas grandes cidades.

Sem falar na infinidade de produtos como roupas, sapatos, brinquedos, adornos, xampus, cremes, guloseimas e o que mais se possa pensar, que inventamos e compramos, como se fosse pra nós mesmos. O nó da questão é que aquelas criaturas não são como nós.

Acolher os animais, tratá-los bem, cuidar da sua saúde e bem-estar “enquanto bicho” é uma coisa. Querer mudar a sua natureza é outra bem diferente e, na minha opinião, muito cruel. (Ao mesmo tempo, tem gente que adota animais apenas para maltratá-los e torturá-los, mas essa é uma outra história).

Enquanto brigamos pelo nosso direito de escolher e de viver a vida do jeito que quisermos, impomos aos animais com quem convivemos uma vida infernal. Nossa arrogância, mais uma vez, se sobrepõe ao que poderia ser – e em muitos casos, é – uma convivência harmoniosa, mutuamente gratificante e valiosa, ficando cada um no seu quadrado. Quem disse que o bicho quer ser gente? E quem disse que ser gente é bom pra ele?

Não sei como era no caso mencionado lá em cima, do gato morto no incêndio, mas espero que ele tenha tido uma boa vida de gato, apesar do fim trágico.

Júnia Puglia, cronista, mantém a coluna semanal De um tudo no NR.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Um álbum precioso

Fruto de uma expedição norte-americana, o álbum Native Brazilian Music reuniu a nata do samba carioca. Uma história perdida no baú que o NR recupera e, de quebra, te convida a escutar. 

Maestro da tradicional Orquestra da Filadélfia, o estadunidense Leopold Stokowski (1882–1977) entrou para a história cultural de seu país como um grande diretor musical. Responsável pela trilha sonora para o cinema da inovadora e clássica animação Fantasia’, da Disney, de 1940, também criou diversos conjuntos musicais, entre eles a All-American Youth Orchestra, com quem veio a América do Sul entre 1940 e 1941. A visita fez parte da “Política de Boa Vizinhança”, instituída pelos EUA com os países latino-americanos.

Stokowski esteve no Rio de Janeiro a bordo do S.S. Uruguay, navio equipado com um estúdio completo, preparado pela extinta gravadora Columbia para registrar a música folclórica de países latino-americanos. O objetivo era, posteriormente, celebrar um congresso folclórico pan-americano, o que não chegou a ser realizado.

Antes do embarque, o maestro contatou Heitor Villa-Lobos, apresentando a ele a ideia de registrar os expoentes da música brasileira, que vivia uma era de transição do caráter folclórico-rural para o popular-urbano. Villa-Lobos chamou seus amigos Cartola, Donga e Zé Espinguela, que entendiam – e muito – do riscado, para reunir a nata, os melhores e mais representativos músicos populares do Rio de Janeiro da época.

Em uma grande cerimônia, subiram ao S.S. Uruguay, em agosto de 1940, nomes como Pixinguinha, Donga e João da Baiana, a Santíssima Trindade do Samba – maiores representantes da primeira geração de sambistas do Rio. Também estiveram lá Cartola, ao lado de sua Estação Primeira e um coro de pastoras de Mangueira; Zé da Zilda, um dos primeiros sambistas “de morro”, provenientes das Escolas de Samba, a fazer sucesso “no asfalto”; Jararaca e Ratinho, mestres da embolada; Luiz Americano, saxofonista e chorão, um dos pioneiros no uso do instrumento na música popular brasileira; e Zé Espinguela, macumbeiro, figura de suma importância para o meio cultural da época.

Outros solistas presentes foram Janir Martins, da Rádio Nacional, o cantor Mauro César, que acompanhou o Conjunto Regional de Donga, além de um quarteto masculino do Orfeão Villa-Lobos. Os músicos presentes eram aqueles que costumavam acompanhar os melhores sambistas da época nas gravações e nas apresentações realizadas por toda a Guanabara. Relatos da época dão conta que outros nomes de valor, como Paulo da Portela, Augusto Calheiros e o violonista Laurindo de Almeida estiveram presentes naquela sessão de gravação. Ataulfo Alves e Carlos Cachaça – que jamais faltou ao trabalho – também foram convidados, mas não puderam comparecer.

O registro histórico era uma grande coletânea de ritmos populares brasileiros (samba, choro, partido alto, toada, embolada, macumba, candomblé e cântico ameríndio), interpretada pelos próprios autores, acompanhados pelos melhores músicos de então. Foi a primeira gravação de Cartola, aos 31 anos de idade, e a única de Zé Espinguela, cantando alguns pontos de macumba. Também trouxe Pixinguinha tocando magistralmente flauta, seu primeiro instrumento, depois substituído pelo saxofone, e João da Baiana tocando, à sua maneira, seu pandeiro. Tudo ali era primoroso, de fato aquela era a melhor e mais representativa música popular brasileira.

Calote: gravaram,
mas não pagaram


Ao final das gravações, o maestro agradeceu com um aperto de mão a cada um dos músicos e zarpou aos EUA. As promessas feitas a Villa-Lobos de remuneração e cessão de cópias das gravações foram ignoradas. Alguns músicos foram pagos, tempos depois, com quantias irrisórias. Cartola, por exemplo, relata que ganhou 1.500 réis, o equivalente a três maços de cigarro baratos. Além do calote norte-americano, os músicos não puderam ouvir o disco, já que ele foi lançado somente nos EUA.

Das 40 músicas gravadas, a Columbia lançou somente 16 delas, reunidas no álbum “Native Brazilian Music”, que continha dois volumes, cada um com quatro discos (contendo uma música de cada lado) de 78 rotações por minuto. O texto de apresentação dizia:

“Aqui neste álbum da Columbia Discos você tem a autêntica música do Brasil... Magnificamente tocada por músicos nativos... Selecionados e gravados sob a supervisão pessoal de Leopold Stokowski. Estas expressivas gravações foram feitas durante a excursão pela América do Sul do maestro Stokowski com a All American Orchestra. Em vários pontos da Excursão, o doutor Stokowski ouviu o folclore nativo e a música popular interpretados por músicos dos nossos bons vizinhos. Para a gravação, escolheu o que concluiu ser o melhor e o mais típico”.

Nomes das músicas, dos intérpretes e dos compositores foram escritos com a grafia errada, o que demonstrou o pouco cuidado no preparo do disco. O “Grupo do Pai Alufá” (Zé Espinguela), por exemplo, virou “Grupo do Rae Alufá”. Além disso, as descrições das músicas deixavam a desejar. Pouca gente deu valor ao disco nos EUA. Lá, ninguém queria saber da nossa “música folclórica”. Cá, muitos queriam, mas não podiam, pois o disco estava lá.

Por longas décadas esses registros foram muito raros. O pesquisador Lúcio Rangel foi um dos poucos a ter a sorte de adquirir um exemplar, por acaso, em Nova York. Resolveu, então, doar para o Museu da Imagem e do Som (MIS), por achar o melhor destino para tal tesouro. Deveria ser, mas não era: o álbum, tempos depois, simplesmente sumiu, foi roubado.

Em 1987, então, no ano do centenário de Villa-Lobos, o Museu Villa-Lobos relançou, em uma edição limitada, as dezesseis gravações do Native Brazilian Music. Produzido por Suetônio Valença, Marcelo Rodolfo e Jairo Severiano, e com texto do musicólogo Ary Vasconcelos, o relançamento foi feito a partir de discos 78 rpm doados pelo colecionador Flávio Silva, e não por meio das matrizes originais (o que seria o ideal).

Sendo um produto especial, de tiragem baixa (3 mil cópias), a edição brasileira do disco logo esgotou-se. Mais uma vez, poucos podiam escutar a beleza contida naquele registro. Poucos sabiam a respeito do emblemático álbum.

No início dos anos 2000, a pesquisadora musical estadunidense Daniella Thompson iniciou em sua terra natal uma busca sobre o paradeiro das matrizes originais do álbum. Eis que ela não apenas localizou-as nos porões da Sony, detentora do catálogo da Columbia, como descobriu que existe um outro volume, com oito músicas, que jamais foi lançado.

Travou-se, então, uma luta para relançar, em CD, tanto o álbum original quanto o volume jamais lançado. Até agora não houve nenhum avanço neste sentido, mas a Internet fez com que, pouco a pouco, este disco chegasse aos ouvidos de uma nova geração de sambistas e admiradores da boa música brasileira.

A partir do momento em que uma alma caridosa a partir do LP lançado em 1987 disponibilizou para downloads as músicas que por tantas décadas não puderam ser ouvidas, tudo mudou. Hoje, com alguma busca e poucos cliques, você confere a beleza da flauta de Pixinguinha, do pandeiro de João da Bahiana, o seminal registo de Cartola como cantor, entre outras riquezas musicais que o disco contém.

André Carvalho, jornalista, mantém a coluna mensal Batucando, sobre samba, a ser publicada sempre na terceira quarta-feira do mês. Ilustração de Kelvin Koubik, artista visual e músico de Porto Alegre, especial para o texto

Escute e saiba mais
sobre as 16 pérolas
1 - Macumba de Oxóssi (Donga - José Espinguela) com Zé Espinguela e Grupo do Pai Alufá
[Um ponto de macumba para Oxóssi]
2 - Macumba de Iansã (Donga - José Espinguela) com Zé Espinguela e Grupo do Pai Alufá
[Um ponto de macumba para Iansã. Estes registros foram os únicos feitos Zé Espinguela em sua vida]
3 - Ranchinho Desfeito (Donga - De Castro e Souza - David Nasser) com Mauro César
[Samba-canção interpretada por Mauro César, com o Conjunto Regional de Donga e solos de flauta de Pixinguinha]
4 - Caboclo do Mato (Getúlio Marinho da Silva “Amor”) com João da Bahiana, Janir Martins e Jararaca
[Corima que traz João da Bahiana no solo e Janir Martins e Jararaca nos refrões, com improvisos de flauta feitos pelo gênio Pixinguinha. O registro traz o excepcional pandeiro do solista]
5 - Seu Mané Luiz (Donga) com Zé da Zilda e Janir Martins
[Zé da Zilda canta em dueto este divertido samba com Janir Martins. No acompanhamento, mais uma vez, o regional de Donga, com Pixinguinha à flauta]
6 - Bambo do Bambu (Donga) com Jararaca e Ratinho
[Embolada “trava-língua” de Donga, interpretada por Jararaca e Ratinho, acompanhados pelo violonista Laurindo de Almeida e conjunto regional]
7 - Sapo no Saco (Jararaca) com Jararaca e Ratinho
[Mais uma embolada, desta vez de autoria do próprio Jararaca. Com Laurindo de Almeida e conjunto regional]
8 - Que Quere Que Quê (João da Bahiana - Donga - Pixinguinha) com João da Bahiana e Janir Martins
[Macumba carnavalesca de autoria atribuída à Santíssima Trindade do Samba (embora especule-se que seja apenas de João da Bahiana). O pandeiro de João da Bahiana e a flauta de Pixinguinha, mais uma vez, roubam a cena]
9 - Zé Barbino (Pixinguinha - Jararaca) com Pixinguinha e Jararaca
[Maracatu com metais e percussão, é um registro raro de Pixinguinha cantando]
10 - Tocando pra você (Luiz Americano) com Luiz Americano
[Choro de clarineta acompanhado por um conjunto regional que traz João da Bahiana ao pandeiro]
11 - Passarinho bateu asas (Donga) com Zé da Zilda
[Com o Conjunto Regional de Donga, solos de flauta de Pixinguinha e acompanhamento vocal feminino]
12 - Pelo Telefone (Donga - Mauro de Almeida) com Zé da Zilda
[Com o Conjunto Regional de Donga, solos de flauta de Pixinguinha e acompanhamento vocal feminino. “Pelo Telefone” é um dos sambas mais emblemáticos (foi primeira música registrada como ‘samba’ no Brasil) da história da música popular brasileira]
13 - Quem me vê sorrir (Cartola/Carlos Cachaça) com Cartola e Coro da Mangueira
[Cartola fez aí sua estreia como intérprete, aos 31 anos de idade. Na gravação, é acompanhado por Aluísio Dias, um de seus mestres na Mangueira, ao violão, pela bateria da Estação Primeira e por um coro de “pastoras”]
14 - Teiru/Nozani-Ná (música folclórica, adaptada por Heitor Villa-Lobos) com Quarteto do Coral Orfeão Villa-Lobos
[Dois cantos ameríndios. “Teiru” é um canto fúnebre para a morte de um cacique, recolhido por Roquete Pinto, em 1912. “Nozani-Ná” está catalogada nas “Canções Típicas Brasileiras” (1919), de Villa-Lobos]
15 - Cantiga de Festa (Donga - José Espinguela), com Zé Espinguela e Grupo do Pai Alufá
[Corima contendo solo masculino e coro feminino, batucada e palmas]
16 - Canidé Ioune (música folclórica, adaptada por Heitor Villa-Lobos)  [Quarteto do Coral Orfeão Villa-Lobos. Este canto ameríndio foi recolhido pelo viajante Jean de Léry em 1553]

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

#Minicraques: Coronel Brilhante Ustra

[clique na caricatura para ver em tamanho grande]


Caco Bressane, arquiteto e ilustrador, mantém a série Mini-Craques, a seleção da política brasileira, a ser publicada toda quarta-feira

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Retrato em branco e preto

Sim, claro que era impressionante sua educação
- sentada ali junto aos adultos,
falando quase aos cochichos com a madrinha,
pedindo por favor e com licença a todo tempo-,
mas não foi isso o que me chamou a atenção;

E de fato, eram curiosas as histórias contadas pela tia:
de como a sobrinha, desde os seis anos,
ia sozinha ao colégio, inclusive sob neve;
de que parava nos cruzamentos
e mesmo que não viesse nenhum carro
não se movia até que o sinal de pedestres ficasse verde
(na Espanha, nas férias, repreendia os adultos que descumpriam a lei);

Nem mesmo o fato daquela garota não ser suíça,
mesmo tendo nascido e vivido todos os seus dez anos no país
[coisas da legislação de lá, explicava a tia],
foi o que me marcou daquele encontro;

Para mim, da tarde de café, museu e passeio
a imagem que ficou,
gravada na retina,
indelével
é o enorme vazio,
de compadecer brutos e calejados,
que havia no olhar daquela criatura

Ricardo Viel, jornalista, escreve às segundas de Salamanca, Espanha

sábado, 11 de agosto de 2012

Ah, o tão sonhado ouro


Esbravejei quando o meia Oscar, sozinho, errou a cabeçada no último lance contra o México, na final do futebol masculino hoje pela manhã. Poderia ter empatado o jogo, levado para a prorrogação e, quem sabe, ter ganhado a partida. Mas isso não aconteceu. Instantes depois vi o meia-atacante Lucas, que entrou no jogo aos 40 minutos da etapa final, chorar copiosamente no ombro de um integrante da comissão técnica.

Neymar, sentado no gramado, exausto, joelhos abraçados, provavelmente pensava o quão difícil foi chegar até ali. Sabedor da responsabilidade que carrega estava a tomar novo fôlego para a enxurrada de criticas que viria em sua direção. Quem acha que eles estavam em campo para perder, por favor, não leia a sequência do texto.

Esses três jogadores têm em comum a pouca idade, contratos milionários e a enorme esperança que o torcedor deposita neles. Você há de concordar, então, que ganhando milhões era mais do que obrigação obter sucesso nas olimpíadas, certo? Errado. Eles tiveram êxito. E muito. A prata, a tão desprezada prata, tão “olímpica” para um país que não tem investimento esportivo, sobretudo nos esportes menos populares, deveria ter mais valor.

Enquanto as imagens da comemoração mexicana rolavam alternadamente com a tristeza dos jogadores brasileiros ouvi o comentarista, ex-jogador e deputado federal Romário enxovalhar o técnico Mano Menezes pela derrota. “Fraco” e “Espero que não vista a camisa da seleção” foram duas de suas declarações sobre o técnico. E advertiu: “venho falando isso desde o Pan”.

Romário, que tem ácida opinião, decepcionou-me com suas declarações. Não pela critica a Mano Menezes, mas pela postura diante da derrota. Algo que ele já vivenciou algumas vezes. Como Neymar, Oscar e Lucas, o deputado já ganhou a prata pela seleção na década de 80. Ao menos se corrigiu no sentido de não rotular os meninos como “geração de perdedores”. Deveria, a meu ver, exaltar a conquista do segundo lugar como um passo para um time que pode se tornar muito vitorioso.

Ressabiado com a falta de percepção de Romário, que deve ter influenciado a opinião de muita gente, fui ver a repercussão na internet. E nossa imprensa, parte dela pelo menos, também menosprezou a conquista da prata. Mesmo se mantendo no auge tantos anos, o nadador Cesar Cielo sentiu a veia torcedora da imprensa quando “decepcionou” com o bronze nos 50 metros nado livre.

No caso do futebol a FSP online escreveu: "Brasil repete fiasco de 84 e 88 no futebol e fica apenas com a prata". Fica “apenas” com a Prata? Fiasco, veja só, é "Fracasso completo, insucesso ridículo e vexatório." Que jogo ou competição eles assistiram?

Só posso crer que o autor de tal manchete buscava os "indignados" ou o grupo do "efeito manada" que diante de uma derrota age sem pensar e corre para o lado da maioria: xingamentos, criticas sem fundamento, desvalorização do atleta e choramingos.

Das duas uma: a  sensação que tenho é que estamos distantes de uma postura menos mimada diante das adversidades no esporte ou temos mesmo falta de capacidade de assimilar o óbvio: perder é parte do jogo, por mais incômodo emocional que isso possa causar.

Como bem lembrou um colunista dessa mesma FSP pela manhã: "o espírito de porco de boa parte da torcida brasileira [incluo a imprensa] vai dar o tom brasileiro, nenhum esforço pode ser reconhecido a não ser que se ganhe sempre”.

É... se o aforismo de Carlos Drummond fosse uma máxima: "o mérito da derrota consiste em insentar o derrotado das responsabilidades da vitória" não estaria aqui a escrever esse texto.

PANO RÁPIDO
Enquanto finalizo essas linhas nossa seleção feminina de Voleibol ganha o ouro dos EUA para amenizar a dor da manhã enquanto o narrador diz que o time “se superou na competição na hora certa”. Existe hora certa para se superar?

Thiago Domenici, jornalista

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Fernando Carvall
, ilustrador e caricaturista. Mantém o Estúdio Saci.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Eternidade já

Tanta filosofia, tanta teologia, milênios de especulação sobre a hipótese da eternidade e da vida após a morte. Tanto desejo de ser lembrado depois, tanto esforço para deixar obras permanentes, nomear praças e viadutos, escrever o livro definitivo, compor a canção mais popular. Tanta preocupação em agradar deus, deuses, deusas, divindades, de forma a garantir um cantinho que seja no paraíso. Pessoas que gastam fortunas pra se congelar e tentar “reviver” no futuro. Aviso: se você tem seu perfil em redes sociais digitais, mesmo que seja numa só, seus problemas acabaram. Pode relaxar.

Não sou das mais dedicadas ao grande “livro de caras”, mas fui lá há algum tempo, talvez um ano, e “abri uma conta”, como se diz na língua internética. Achei divertido esse lugar virtual onde as pessoas vão deixando rastros do que fazem, onde vão, com quem se relacionam. Mostram fotos (muuuitas de bichos!), divulgam eventos, comentam sobre o que rola, sobre a balada de ontem, o cachorro que comeu documentos, o por do sol na Tailândia, pedem apoio para causas as mais variadas, avisam que estão na Flórida, que aquela gripe sarou e tudo o mais que se possa imaginar, dentro de certos parâmetros do que se considera socialmente aceitável. Compartilham músicas, vídeos e textos, inclusive este. Ah, e reclamam de mau atendimento e serviços em geral, coisa que tem tirado o sono de muita gente por aí. De vez em quando, elogiam também.

Por mecanismos cuja compreensão me escapa, os administradores desse forró digital vão sugerindo pessoas com quem você talvez queira se relacionar, geralmente amigos de amigos. Foi assim que “adicionei” muita gente com quem não tenho grande proximidade, ou cujo contato havia perdido. Mas também sugerem pessoas que a gente não tem ideia de quem sejam. Deve ser pra facilitar a vida de quem quer ter um milhão de amigos sem se levantar da frente do computador.

Mas então eu estava lá um dia, passeando pelo “livro”, quando um nome “sugerido” me chamou a atenção. Estavam me oferecendo amizade com um morto. Simples assim. Achei que podia ser um homônimo, sei lá, e fui no perfil do cara. Era ele mesmo, que eu sabia que havia morrido uns meses antes. Estava lá, sorridente, como se nada tivesse acontecido.

Passado o choque, mas ainda muito incomodada com aquilo, comecei a me perguntar como se morre virtualmente. Até o momento, e depois de perguntar a várias pessoas que entendem mais de redes sociais do que eu (fácil, fácil), esta pergunta continua sem resposta. Como é isto, alguém pode ir lá e te apagar? Quem? Como?

Por enquanto, concluo que ter um perfil numa rede social é uma espécie de vida eterna. Você vai ficar ali, existindo no espaço virtual, até o final dos tempos, a hecatombe nuclear ou a explosão da internet. Não se trata da memória que ficará na sua família, nas pessoas queridas, em quem conviveu com você, mas algo que transcende a vida que você tenha vivido, digamos, concretamente.

A despeito de qualquer convicção religiosa ou metafísica, que não está em discussão aqui, pensar que a morte física, a única certeza certa da vida, pode ser “driblada” por uma “existência” virtual é no mínimo inquietante. Mas também pode ser um alento, à escolha do freguês. Sensação esquisita.

Júnia Puglia, cronista, mantém a coluna semanal De um tudo no NR.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Milton, 50 anos de canção

Jules e Jim, o filme que inspirou o mineiro
“Eu cantei essa música [canção da américa] a vida inteira nos meus shows. Hoje, vocês vão cantar pra mim.” Assim pediu Milton Nascimento no show dos seus 50 anos de carreira, na última sexta-feira, em São Paulo.

O show, emocionante, teve a participação de Lô Borges, do clássico Clube da Esquina, que completa 40 anos neste 2012. Durante a canção Milton ficou sentado numa cadeira no centro do palco, apenas acenando com a cabeça e regendo suavemente quando necessário a toada da música - o vídeo abaixo mostra um pouco do que escrevo.

Ainda no palco, Milton comentou rapidamente como decidiu compor músicas profissionalmente e não só interpretar a de outros cantores. Foi durante as sessões seguidas do filme Jules et Jim, do francês Françoise Truffaut, que veio a inspiração. Estava com o amigo Márcio Borges. "Vamos lá para casa compor", teria dito ao amigo ao término do filme.

Truffaut, portanto, tem um dedo nessa “Travessia”.  E lá se vão 50 anos.



Thiago Domenici, jornalista

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Minicraques da Política # 1



[clique na caricatura para ver em tamanho grande]


Caco Bressane, arquiteto e ilustrador, estreia hoje a série Mini-Craques, a seleção da política brasileira, a ser publicada toda quarta-feira

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Saudade II

Sabe-se lá por que – talvez sejam os anos que de maneira assustadora começam a se acumular –, mas o fato é que de tempos para cá a saudade é assunto que insistentemente volta a habitar meus pensamentos.

Não faz muito tempo escrevi um texto sobre e agora já cá estou outra vez a aborrecê-los. É que fato corriqueiro acabou por remexer no porão das memórias e me obrigou novamente a debruçar sobre o assunto.

Nesta semana, no meio da bagunça, encontrei um livro de poesia que o amigo Ricardo Sangiovanni me deu. E naquele gesto quase automático, inocente, de abrir um livro e ler qualquer linha antes de deixa-lo novamente na estante, me encontrei com estes versos:

Algumas sinceridades
Em algum momento
sinto saudades de ti.
Desculpa…
a minha fala mais sincera
diz outra coisa.
Em algum momento
sinto saudades de mim
quando estava por acaso.
O autor é o poeta soteropolitano Damário Dacruz e creio que o poema traz questão fundamental a ser pensada quando falamos da saudade. Nesse sentimento nostálgico relativo a momento, situação ou pessoal há também a nostalgia de nós próprios, de quem éramos naquela época na qual gostaríamos de voltar. Quando sentimos saudade de alguém sentimos saudade também (e sobretudo) de nós mesmos, mais especificamente da pessoa que éramos quando tínhamos ao lado essa que já não está mais.

O que disse João Cabral de Melo Neto em relação ao amor também se aplica à saudade: não há guarda-chuva contra esse “mal”. Estamos condenados – e cada vez mais, porque pelo caminho vamos conhecendo gente, e lugares, e experiências – a sentir saudade de nós, daquele que um dia fomos, aquele que sonhava, que acreditava, que fazia planos e que se entregava.

Mario Benedetti escreveu que no final da vida chega a sabedoria e com ela a certeza de que o mundo, no final das contas, é “nos seus melhores momentos uma nostalgia e nos piores momentos um desamparo.”

Enfim, há que acostumar-se com a ideia, e nem adianta buscar proteção: não há guarda-chuva contra a saudade.

Ricardo Viel, jornalista, escreve às segundas direto de Salamanca, Espanha

domingo, 5 de agosto de 2012

DataNR e os resultados da enquete sobre a Revista Veja

O NR perguntou em enquete aos navegantes sobre a Revista Veja, publicação da Editora Abril. A ideia era saber sobre publicação tão polêmica nos últimos anos. Ao término do período de votação, durante a semana, temos o seguinte quadro de um total de 405 votos únicos.

61% acredita que o que revista faz “não é jornalismo”. A maioria, portanto, parece não confiar no conteúdo da publicação semanal. Já 30% responderam que “não lê e desgosta muito” a publicação o que coaduna com a visão dos 61% citados que não acreditam no seu jornalismo.

Somando-se os que “leem e gostam muito” com os que acham que Veja “é perseguida pelo ótimo jornalismo que pratica” temos 5% dos votos. Fechando a conta, 1% não tem opinião formada. E você que não participou da enquete, o que acha? Deixe nos comentários.
Leio e gosto muito! 18 (4%)
Não leio e desgosto muito! 123 (30%)
O que Veja faz não é jornalismo 249 (61%)
A Veja é perseguida pelo ótimo jornalismo que pratica 7 (1%)
Não tenho opinião formada 8 (1%)

sábado, 4 de agosto de 2012

quadrinhos_8




















Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista. Mantém o Estúdio Saci.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Canções em prosa

Assim como tem a música erudita, os compositores de peças clássicas, longas e complexas, com vários movimentos, todos remetendo a um mesmo tema, a ser executadas por uma orquestra inteira, algumas incluindo coro em várias vozes, tudo isso exigindo uma harmonia super-complexa e muita competência de quem compõe, quem rege e quem toca, há também a música popular.

E eu adoro a música popular, especialmente a brasileira. Tem pra todos os gostos, ritmos e estados de espírito. Obras-primas em poucos versos, dirigidos diretamente a quem ouve. (Tem muita porcaria também, claro, mas vamos ficar só nas coisas boas).

Assim como temos os Bach e Beethoven da vida – e ainda bem que os temos – podemos nos deliciar com Noel Rosa, Dolores Duran, a unanimidade Chico, Adriana Calcanhoto, Gil, Caetano, Cartola, Sueli Costa e milhares de outras pessoas talentosas, que nos oferecem sua arte nas palavras e notas das canções que nos acompanham a vida toda. Isso sem falar em quem tem o dom de cantar pra nós o que essas cabeças iluminadas compõem.

Da mesma maneira, temos também os grandes escritores, que escrevem milhares de páginas, passam anos debruçados sobre temas complexos, romances, ciências, tratados, enciclopédias, bibliotecas inteiras sobre tudo que é assunto neste mundo. Sem falar nos poetas, contistas e cronistas, que nos oferecem textos mais breves sobre os quais rir, chorar, refletir e captar um mundo de sentimentos, sensações e enredos.

O que tenho conseguido escrever tem uma brevidade, uma espécie de urgência. Sou, na minha própria percepção, obcecada pela síntese, ela me seduz de forma irresistível. Encontrar palavras, poucas, ajeitá-las em frases, brincar com elas em uma só página, às vezes meia, podendo de alguma forma registrar o que me vai por dentro, é o que me dá prazer. Muito.

O texto curto, enxuto, é como uma canção popular. Enquanto os grandes mestres e mestras produzem suas grandes obras, longas ou curtas, a gente vai aqui, fazendo uns chorinhos, uns sambas de nenhuma nota, só algumas palavras, umas canções em prosa.

Tomara que alguém as leia e nelas veja seu reflexo. Sei como é bom quando isto acontece comigo sobre o texto dos outros.

Júnia Puglia, cronista, mantém a coluna semanal De um tudo no NR.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Dizem que o povo gosta

No momento em que desenvolvo uma interessante pesquisa sobre um dos maiores homens de teatro do Brasil, falecido em 2009, tenho lido não só sobre ele, como é natural, mas, sobretudo, os seus próprios textos. E nesse aspecto a produção de Boal tem bastante fôlego. É consistente.

No momento, entre outras, estou lendo sua obra “O Teatro Como Arte Marcial” (Ed. Garamond, 2003) que contém uma série de reflexões do mestre sobre a arte de Sófocles, Shakespeare e Brecht, para ficarmos apenas em três nomes sonantes.

Em nome de um teatro político, de intervenção social, Boal fala sobre tudo e escarafuncha o individual e o social com as lentes da dialética, muitas vezes não deixando pedra sobre pedra. Escreve com impagável ironia e rigorosa linha de raciocínio. Sua tese: todos nós somos atores, ou, espect-atores, como gosta de dizer. O teatro não é uma atividade para iluminados.

Vejam, por exemplo, sua opinião sobre o deserto de ideias que é a televisão. À página 125 do livro citado, Boal escreve um artigo com o título acima e que passo a reproduzir:
“É “disso que o povo gosta” – assim justificam os canais de televisão a qualidade execrável de muitos dos seus piores programas.”

“Fosse válido esse argumento, estariam nossas escolas autorizadas a substituir as difíceis matemáticas, a última flor do Lácio e a filosofia kantiana por fáceis aulas práticas do sensual Kama Sutra, porque é disto que o povo gosta...”
“Nossos museus exibiriam, em lugar de obras primas da pintura renascentista, as esculturais coelhinhas da Playboy, ao vivo, porque disto a máscula metade brasileira sempre foi ávida – disto o povo gosta, e com apetite.”
“Nossos hospitais, em vez de médicos e medicamentos, empregariam homens de terno e gravata operando histéricos, descarregos, sacerdotes de variadas religiões eletrônicas, porque, infelizmente, as curas milagrosas são o refúgio de boa parte da nossa ingênua população, que disto gosta ou isto teme: das televisivas bocas pastorais jorram labaredas do ameaçador diabo tridentino, rouco e fanho, exigindo o dízimo, em horário nobre!”

“Outro argumento, falaz como primeiro, diz que a TV deve mostrar a crua realidade tal como é, sem grinaldas nem guirlandas. Para este efeito, proliferam policiais perseguindo bandidos em alta velocidade; casais acusando-se de caleidoscópicas infidelidades e promovendo físicas violências diante das ávidas câmeras; portadores de exóticas deformidades lamentando a sorte ingrata e o cruel destino. Realidades são: existem! Quem duvida? Realidades banais, vidas vazias, sem rumo, sem sal. É assim mesmo, dizem, é a vida como ela é...”

“Mas – cabe a pergunta – a vida de quem? Não existem outras vidas neste Brasil imenso? Seremos todos reles idiotas?”

“Nestes últimos anos, no Brasil, seguindo a trilha de vários outros países do mundo, assistimos à proliferação do pior e mais nefasto dos programas que já surgiram nessa fábrica de vacuidades que é a TV: os reality-shows.”

“Neles, pessoas insossas – sem o menor interesse intelectual, sem que se destaquem artística, política ou socialmente, nem sequer pelas tatuagens impregnadas em seus ombros, costas, nádegas e cóccix – ficam encerradas em uma casa sem nada dizer ou fazer, nenhum objetivo a perseguir a não ser o de permanecer em cena o maior tempo possível atraindo a atenção dos camera-men, esperançosos de um close-up.”

“As telenovelas – mesmo de trama inverossímil e flácida, mesmo superficial e anódina – mostram relações humanas estruturadas segundo certos valores morais e políticos... mesmo discutíveis. Já os reality-shows, ao optarem pela ausência (aparente) de qualquer trama preconcebida, ao deixarem que tudo aconteça ao sabor do acaso, e pela total falta de lucidez de pensamento, nada oferecem a não ser o despropósito daquelas vidas psiquicamente vegetativas.”

“Vidas fragmentadas e míopes, sem metas em longo prazo, nas quais a maior preocupação ontológica dos personagens é abrir a geladeira e a reclamar da falta de uma boa pizza; sua maior angústia, o telefone que não toca.”

“Essa fragmentação se assemelha ao cotidiano igualmente fragmentado da maioria dos telespectadores que são, assim, confortados em suas vidas despropositadas.”

“Qual o universo vocabular desses reality-shows? Talvez não alcance as básicas duzentas ou trezentas palavras usadas comumente na TV, mesmo se incluirmos artigos e pronomes, interjeições e nomes próprios e as freqüentes onomatopéias. Que idéias inteligentes poderá gerar esse esquálido repertório léxico? Talvez somente uma: desliguem suas TVs.”

O texto de Boal é longo e continua a tratar o tema com fina ironia. Peço licença aos leitores para um salto no texto e ir para a sua parte final onde se pode ler:
“Mas a TV – para quem é isso que o povo quer! – só nos mostra um casal vestido de nudez caçando sabonetes na banheira de meia água ou fornicando atrás da porta; mostras socos, tiros, explosões, e nos faz pensar que as torres gêmeas fazem parte do enredo das Aventuras do Homem Aranha – filme que, aliás, foi banido depois do 11 de setembro, porque as semelhanças eram chocantes, e o sádico prazer de alguns espectadores seria bem maior do que o recomendável patriotismo.”

“Na pequena tela, a vida vã e fútil importa mais do que a destruição da camada de ozônio ou da floresta amazônica: o fogo, de longe, não se vê; na tela luzem sorrisos.”

“Hoje, no Brasil, ninguém é inocente”
Izaías Almada, escritor e dramaturgo, mantém a coluna mensal Pensando Alto
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