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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Crimes de Bagatela e o fracasso da guerra às drogas

No texto do Leonardo Sakamoto que reproduzi no sábado, sobre a proibição da Marcha da Liberdade pelo desembargador Paulo Antonio Rossi, dois temas citados foram reportados recentemente na revista Retrato do Brasil de novembro do ano passado.


O primeiro, quando cita Sakamoto: "Maria Aparecida foi mandada para a cadeia por ter furtado um xampu e um condicionador. Perdeu um olho enquanto estava presa. Sueli também foi condenada pelo roubo de dois pacotes de bolacha e um queijo minas."

Nesse caso, nosso sistema judicial pode ser especialmente cruel e retrógrado. O relatado são os chamados “crimes de bagatela”, que envolvem furtos de pequeno valor, para os quais são aplicadas penas desproporcionais (também chamado de "princípio da insignificância")

E o segundo tema aborda a discriminalização das drogas, no caso, a maconha. "A Justiça do Estado de São Paulo decide impor censura prévia a uma manifestação pelo receio de que, talvez-sei lá-quem sabe-pode ser, venha a ocorrer apologia às drogas".

Ontem, inclusive, o Fantástico fez reportagem (com FHC de âncora) sobre o tema da legalização da Maconha (Xico Sá fala sobre isso "Globo acende o debate até a última ponta").
 
Para compartilhar informação - e tentar clarear ideias - disponibizo aqui as reportagens em PDF de Ricardo Viel (Crimes de Bagatela) e Júlio Delmanto (sobre o fracasso da probição às drogas no mundo). (Thiago Domenici)

Elogio à leitura e à ficção

Sem os bons livros que lemos seríamos piores do que somos, mais conformistas, menos inquietos e insubmissos, e o espírito critico, motor do progresso, nem sequer existiria. Tal como escrever, ler é protestar contra as insuficiências da vida. Quem busca na ficção o que não tem, diz, sem necessidade de dizer nem de saber, que a vida tal qual é não nos basta para saciar nossa sede de absoluto, fundamento da condição humana, e que deveria ser melhor. Inventamos as ficções para poder viver de alguma maneira as muitas vidas que gostaríamos de ter quando só dispomos de uma.
Mario Vargas Llosa, trecho do discurso do Prêmio Nobel, dez. de 2010


Veruscka Girio é publicitária, designer, diretora de arte, produtora multimídia, videocenarista, vj e curiosa no processo do uso do computador como ferramenta de criação e produção artística para elaboração de novos mundos.

sábado, 28 de maio de 2011

A liberdade é plural

A Marcha da Liberdade começou de fato às 16h - estava programada para às 14h. E teve de tudo, menos, felizmente, violência policial desnecessária. Nas imagens de Natalia Mendes, alguns momentos da manifestação democrática que saiu do vão livre do Masp e foi até a praça da República.
Muitas pessoas estiveram por lá, 4 mil, segundo a Polícia Militar. As ideias, vontades, reivindicações também: uns pleiteavam a liberdade de expressão, outros a discussão sobre o aborto ser ou não crime. Uns defendiam o Passe Livre, outros o direito dos ciclistas nas ruas, mas todos, em comum, queriam deixar claro que a justiça não tem o direito de barrar a vontade inalienável de se expressar. Foi uma manifestação plural. E isso ninguém pode proibir. (Thiago Domenici)


Marcha pela Liberdade e a censura prévia em São Paulo


Sempre gostei do poema do dramaturgo alemão Bertold Brecht que tratava da indiferença. Andaram pela mesma linha Maiakovski e Niemöller, escrevendo sobre o não fazer nada diante da injustiça para com o outro, até que, enfim, o observador passivo se torna a vítima. Situação mais atual do que nunca, em um dia em que a Justiça do Estado de São Paulo decide impor censura prévia a uma manifestação pelo receio de que, talvez-sei lá-quem sabe-pode ser, venha a ocorrer apologia às drogas. Do alto de seu pedestal de onde avistam de longe a sociedade, os excelentíssimos não perceberam que a discussão não é mais apenas sobre a maconha e sim sobre o direito de não apanhar por manifestar livremente as suas idéias.

Muitas pessoas que estiveram no protesto da semana passada e estarão no de hoje em São Paulo não fumam maconha, bebem cerveja, tomam uísque, usam tabaco, ou seja, não consomem nenhum entorpecente. Mas vão às ruas pelo direito a ter direito à palavra. Tripudiam o “hoje, não é comigo, então que se danem os outros”, porque sabem que quando chegar o amanhã e vierem bater à sua porta pode não haver mais ninguém para ajudar.

Ou, lembrando John Donne, poeta inglês, citado em “Por Quem os Sinos Dobram”, de Ernest Hemingway, ao defender que a fatalidade sobre qualquer ser humano me diminui, pois sou parte da humanidade: nunca procure saber por quem os sinos dobram, pois eles dobram por ti. Temos uma boa Constituição Federal, que defende as liberdades individuais, mas não conseguimos colocá-la em prática. Isso vale uma reflexão. Afinal de contas, a culpa por esse fracasso é sempre dos outros? Ou ficamos também nós em pedestais de mármore lutando pelo nosso quinhão de direitos enquanto o meu vizinho se estrepa?

Por fim, um comentário. Se a decisão tivesse saído de qualquer outra corte brasileira, talvez me espantasse. Mas como veio das togas do Estado de São Paulo, fico mais tranqüilo. Faz sentido.

Maria Aparecida foi mandada para a cadeia por ter furtado um xampu e um condicionador. Perdeu um olho enquanto estava presa. Sueli também foi condenada pelo roubo de dois pacotes de bolacha e um queijo minas. São duas, mas poderia ter dado muitos outros exemplos que ocorreram em São Paulo, Estado que julga com celeridade casos de reintegração de posse contra sem-terra e sem-teto, mas é moroso nos casos de desapropriação de terras griladas que deveriam retornar ao poder público. Implacável quando o furto é pequeno, preguiçosa quando o furto é grande.

Não creio que manter alguém na cadeia por conta de um xampu vai ajudar em sua reinserção social. Da mesma forma, não é possível em sã consciência acreditar que proibir o debate sobre as drogas irá impedir que elas sejam usadas. Mas preferimos o porrete ao diálogo.

E normalmente a senha punitiva tem alvo certo por aqui: a massa de sem-advogado, rotos e pobres, que ousam ir contra alguma coisa. Havia muita gente de classe média respirando gás lacrimogênio na semana passada, mas também muitos da periferia. Sem medo de ser leviano, creio que o fato do protesto ser menos branco e mais pardo facilita um pouco para a Justiça e a polícia. Afinal de contas, se a manifestação fosse em um bairro nobre, juntando o pessoal criado no leite Ninho, teria o Estado se sentido tão à vontade para descer o cacete?

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Catadão destaca o site Open Culture e Trupe Chá de Boldo

O Portal Domínio Público é do Ministério da Educação e oferece um enorme acervo de livros, imagens, textos, músicas, teses e dissertações. Os internautas têm acesso gratuito a obras em formas variadas, como vídeos, imagens, textos e sons.

Com o mesmo espírito, o site Open Culture, apesar de ser todo em inglês, permite acesso fácil a áudios-livro, cursos online, filmes, aulas de idiomas, e-books, etc. Também, tudo de graça!

Pra finalizar, recomendo uma bela homenagem feita pela Trupe Chá de Boldo ao cinema paulistano Belas Artes um dos mais tradicionais cinemas de rua da capital paulista que fechou esse ano. Ouça mais no MySpace.



Natalia Mendes é jornalista e colunista do NR. Para dicas e sugestões, muito necessárias, contato@notaderodape.com.br ou via twitter @notaderodape. 

Rescaldo do caseiro Francenildo no cangote de Palocci

Em meio ao pinga fogo entre oposição e governo para desnudar as atividades da empresa Projeto, do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, acusado de ter o seu patrimônio multiplicado por 20 vezes em quatro anos, surge pela primeira vez a versão (de outro caso) da Caixa Econômica Federal responsabilizando o atual-ex-ministro pela violação do sigilo bancário, em 2006, do caseiro Francenildo dos Santos Costa, lembram?

“Por que ele não explicou de onde veio
o dinheiro? Na minha época eu tive que explicar”
A Caixa informou à Justiça Federal que o responsável pela violação dos dados bancários do caseiro foi o gabinete do então ministro da Fazenda do governo Lula, hoje ministro da Casa Civil. Essa informação faz parte da apelação feita junto à Justiça que condenou a Caixa a indenizar o caseiro em 600 milhões de reais. Diz a apelação. "Nem mesmo a Polícia Federal tem dúvida de que o assessor [Netto] do Ministério da Fazenda foi o responsável pela entrega das informações bancárias do autor à imprensa, com consequente divulgação, a partir de quando houve a quebra do sigilo".

Em entrevista recente o caseiro disse sobre a nova polêmica de Palocci. “Por que ele não explicou de onde veio o dinheiro? Na minha época eu tive que explicar”. A revista Piauí, no texto de João Moreira Salles, fez um perfil de Francenildo, numa ótima reportagem de uns tempos atrás que começa assim: "Francenildo dos Santos Costa era caseiro, tinha 24 anos, quatro bermudas, três calças jeans, cinco camisetas, três camisas, cinco cuecas, três pares de meia, dois pares de tênis, um sapato e um salário de 370 reais quando tudo começou, em março de 2006." Francenildo, ao que se sabe, não é mais caseiro. Anda fazendo bicos de jardineiro. Ao que todos sabem, Palocci ganhou muito dinheiro deste então e voltou a ser ministro. (Thiago Domenici)

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Brasil: as mortes no campo não podem ficar mais impunes

Considerados sucessores de Chico Mendes
diziam que matar árvores era assassinato.


O assassinato na cidade de Nova Ipixuna (Pará) de José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, casal que estava entre os líderes na luta contra a extração ilegal de madeira no estado, supostamente mortos por dois pistoleiros contratados por madeireiros da região, é mais um triste episódio de pistolagem de grandes contra pequenos.

Zé Cláudio Ribeiro vivia na região de Marabá e produzia castanhas de maneira sustentável. Era um duro critico a derrubada  ilegal das árvores da região e recebeu, por isso, várias ameaças de morte. Eis que a ameaça foi concretizada no última segunda-feira. E o próprio disse durante palestra no TedAmazônia (vídeo abaixo) "Vivo da floresta, protejo ela de todo jeito. Por isso, eu vivo com a bala na cabeça a qualquer hora". A presidenta Dilma Rousseff determinou ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que a Polícia Federal assuma a investigação do caso. É o mínimo. É preciso achar quem fez isso e chegar ao mandante. Que se usem todos os serviços de inteligência e investigação disponíveis. O Brasil não pode continuar, principalmente em seus grotões rurais, uma terra sem lei, ignorando as mortes no campo que são inúmeras como apontam relatórios mais recentes da Comissão Pastoral da Terra.

O caso do jornalista Pimenta Neves, assassino confesso da também jornalista Sandra Gomide, preso nesta semana, após mais de 10 anos, é exemplar nesse sentido de como a justiça, mesmo indentificando o autor da brutalidade, pode ser benevolente com o criminoso. A ministra do STF, Ellen Gracie, declarou que o caso Pimenta Neves é um dos delitos mais difíceis de se explicar no exterior. "Como justificar que, num delito cometido em 2000, até hoje não cumpre pena o acusado?". (Thiago Domenici)

quarta-feira, 25 de maio de 2011

1ª Marcha da Liberdade em SP

Sábado, dia 28 de maio, 14h, no vão do MASP, começa a 1ª Marcha da Liberdade. Após a violência da PM contra os manifestos pacíficos na Marcha da Maconha no último sábado, teremos - e é muito bem-vinda e necessária - a 1ª Marcha da Liberdade, porque não se pode permitir que as ideias sejam sufocadas e agredidas. Saiba mais. http://www.marchadaliberdade.org/

"Quando a tropa de choque bateu nos escudos e, em coro, gritou CHOQUE! a Marcha pela Liberdade de Expressão do último sábado se tornou muito maior. Não em número de pessoas, mas em importância, em significado.
Foram liminares, tiros, estilhaços, cacetadas, gases e prisões sem sentido. Um ataque direto, cru, registrado por centenas de câmeras, corpos e corações. Muita gente acha que maconheiros foram reprimidos.
Engano...
Naquele 21 de maio, houve uma única vítima: a liberdade de todos.
E é por ela que convocamos você a aparecer no Vão Livre do MASP, sábado que vem, dia 28, às 14hs.
Não somos uma organização. Não somos um partido. Não somos virtuais.
Somos uma rede. Somos REAIS. Conectados, abertos, interdependentes, transversais, digitais e de carne e osso.
Não temos cartilhas. Não temos armas, nem ódio.
Não respondemos à autoridade. Respondemos aos nossos sonhos, nossas consciências e corações.
Temos poucas certezas. E uma crença: de que a liberdade é uma obra em eterna construção.
E que a liberdade de expressão é o chão onde todas as outras liberdades serão erguidas: De credo, de assembléia, de amor, de posições políticas, de orientações sexuais, de cognição, de ir e vir... e de resistir.
E é por isso que convocamos qualquer um que tenha uma razão para marchar, que se junte a nós no sábado para a primeira #MarchadaLiberdade.
Ciclistas, peçam a legalização da maconha... Maconheiros, tragam uma bandeira de arco-íris... Gays, gritem pelas florestas... Ambientalistas, tragam instrumentos... Artistas de rua, falem em nome dos animais... Vegetarianos, façam um churrasco diferenciado... Moradores de Higienópolis, venham de bicicleta...
Somos todos cadeirantes, pedestres, motoristas, estudantes, trabalhadores... Somos todos idosos, pretos, travestis... Somos todos nordestinos, bolivianos, paulistanos, vira-latas.
E somos livres!"

¿ Por qué no te callas, Obama?

Devidamente enquadrado pela direita do seu país e saudado pelo que há de mais conservador e reacionário pelo mundo, o presidente Obama deixou o falso recato com que procurou durante algum tempo emoldurar a sua figura junto a países emergentes e mergulhou de cabeça – ao lado de tantos outros democratas de fachada – no perigoso terreno da galhofa.

Desprezando o churrasco de Higienópolis, o presidente norte americano, temendo ser questionado pelos diferenciados do bairro paulistano, resolveu que era mais seguro fazer um churrasquinho com seu colega britânico David Cameron em Londres. Ali, cheio de empáfia e farofa na boca declarou em alto e bom som: "Países como a Índia e o Brasil, na verdade, só estão crescendo graças à liderança de americanos e britânicos”.

Obama e Cameron servem salsichas e hambúrgueres
a um grupo de veteranos dos dois países.
Quer dizer então que o esforço dos últimos anos em que o nosso país, com seus próprios méritos, conseguiu se safar de uma crise econômica provocada no vosso hemisfério norte, que buscou uma política exterior independente, que criou milhões de empregos e criou programas sociais admirados pelo mundo inteiro, esse esforço foi por obra e graça de americanos e britânicos? Será que ouvi bem?

Que eu saiba, foi sempre ao contrário, Mr. Barack Obama. O atraso e a miséria de países emergentes como o Brasil sempre teve como causa a exploração e a dilapidação de suas riquezas por parte daqueles que o colonizaram antes e depois da Independência, sendo que muito do ouro aqui roubado passava por Lisboa rumo a Londres.

É bom lembrar que sempre nos momentos em que o Brasil tentou uma política independente e nacionalista, o seu país esteve implicado em impedir a concretização de tal desejo por meio dos quinta-colunas aqui existentes, normalmente orientados por seus embaixadores, incluindo-se nesta política o golpe civil/militar de 1964 com prisões, torturas, mortes, desaparecimentos e exílios.

A quem o senhor 
quer enganar?
No mesmo ágape com seu colega britânico ainda teve a petulância de dizer que “a aliança entre Estados Unidos e britânicos seguirá sendo indispensável para um mundo mais justo, próspero e pacífico”. Pelo visto, a farta distribuição de uísque foi diligentemente escondida na fotografia. Afinal, que mundo é esse em que os países africanos, árabes e latino-americanos quiseram também ser mais justos, prósperos e pacíficos e, no entanto, sempre foram impedidos pelas botas de seus marines e dos soldados britânicos ou então por seus coleguinhas da OTAN ou das forças armadas locais compradas a 30 moedas?

Alto lá e pare o baile, senhor Obama. Mais respeito à nossa inteligência. Se o senhor tivesse um pouco mais de hombridade, deixava de falar sobre coisas para as quais se vê que não está preparado e, num ato de dignidade e autocrítica devolvia a Estocolmo o seu Prêmio Nobel da Paz.

Izaías Almada é dramaturgo, escritor e colunista do NR. Autor da peça “Uma Questão de Imagem” (Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos) e do livro “Teatro de Arena: Uma Estética de Resistência”, Editora Boitempo.

Código Florestal e a Casa que segue a serviço dos coronéis

O Congresso viveu uma de suas noites mais lamentáveis na votação do Código Florestal, o que serve para colocar a nu os equívocos petistas na formação de sua base. Parabéns, coronéis, vocês venceram outra vez. O PT está no Planalto, mas o poder é de vocês

A aprovação do Código Florestal na Câmara dos Deputados evidencia, como poucas vezes nestes oito anos e meio, os equívocos na formação da base de apoio ao governo federal. A tão propalada ideia de que Dilma Rousseff tem a maior base aliada da história democrática mostrou-se completamente inútil na noite de terça-feira.

Os partidos conservadores coroaram a trajetória de pressões sobre o Palácio do Planalto ignorando absolutamente todos os apelos enviados pela presidenta, o que evidenciou que a coalizão de forças governistas no Congresso poderia tranquilamente integrar a base de um governo do PSDB - e nem mesmo o PCdoB seria exceção à regra.

Não satisfeitos em aprovar o retrógrado Código Florestal de Aldo Rebelo, os parlamentares aprovaram a Emenda 164, do PMDB, que dá aos estados o poder de definir sobre o uso de Áreas de Preservação Permanente (APPs) já desmatadas. Após semanas sem conseguir avançar e vislumbrando a derrota, o Palácio do Planalto havia liberado a votação do Código Florestal, mas em hipótese alguma queria aceitar a aprovação da emenda, que ocorreu no mais flagrante desrespeito às orientações governistas.

Para saber mais:

Forjada com base na liberação de emendas parlamentares e na proximidade com a órbita de governo, ou seja, no fisiologismo, a base aliada ora vista no Congresso serve para aprovar conservadorismos, mas é descartável para quem almeja transformar o Brasil. Enquanto for essa a sustentação de Dilma, é difícil imaginar discussões profundas e sérias sobre regulação da comunicação, aborto, casamento entre pessoas do mesmo sexo, veto definitivo à escravidão agrária e reforma da estrutura fundiária brasileira.

Mais que a aprovação do Código Florestal, a postura da imensa maioria dos partidos governistas em plenário será de lamentável memória num futuro não tão distante. Integrantes de PMDB, PSB, PCdoB, PP, PSC, PR, PDT, PPS, DEM e PSDB pareciam torcedores fanáticos ao aprovar uma lei que favorece os próprios interesses e que surra uma das bandeiras históricas do berço petista, a agricultura familiar. Urros, aplausos, gritos e uma euforia quase nunca vista no Legislativo deram o tom de uma Casa que segue a serviço dos coronéis. Um terço dos parlamentares, tanto na Câmara quanto no Senado, são diretamente ligados ao agronegócio, o que faz pensar se 30% da sociedade brasileira é de latifundiários – ao que sei, não.

Sob a falácia da produtividade e da necessidade de produzir alimentos, atropelaram qualquer orientação vinda do Planalto. O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves, fez um discurso assustador cheio de mensagens nas entrelinhas para Dilma. Aldo Rebelo chegou ao ápice de sua conversão ruralista ao interpelar em plenário o líder do governo, Cândido Vaccarezza, que por sinal teve atuação desastrosa ao ameaçar a base aliada em discurso na tribuna. Rebelo, por sinal, passa a ser uma figura de triste memória. Escondido sob a bandeira do nacionalismo e munido dos mais frágeis argumentos, aceitou de bom grado o papel de porta-voz do arcaísmo.

Há duas semanas, tentou enganar o governo com a troca de palavras que não haviam sido acordadas. Nos últimos dias, negociou por baixo dos panos a apresentação da Emenda 164, que constava do texto original apresentado a ele para a Câmara, novamente ignorando o que havia conversado com o Planalto.
Como defendeu Frei Betto nos livros “A mosca azul” e “Calendário do poder”, o PT chegou ao governo. Chegar ao poder é algo bem diferente. A opção pela governabilidade levou a alianças com o que há de mais arcaico na sociedade brasileira. A aprovação do Código Florestal mostra que as elites agrárias, até hoje relutantes em aceitar que continuam escravizando, têm muito mais poder que o PT, a essa altura uma das poucas forças progressistas – ainda que de forma diluída – de uma base tão ampla. Junto a eles caminham as elites urbanas e o conservadorismo religioso.

Se o PT quiser apenas ser governo, pode continuar aliado a esses representantes do Brasil do século XIX. Se, no entanto, almejar fazer transformações profundas, vai precisar encontrar uma maneira de se livrar, gradativamente, dessas amarras. No atual momento, parece irreversível a opção pelo primeiro caminho. Ou seja, teremos um governo com um pé no atraso. O Brasil não alijará do poder suas mais anacrônicas estruturas.

João Peres é jornalista e colunista do Nota de Rodapé

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Um vídeo-musical do ProPublica

A ProPublica, da qual já escrevi no NR, fez um “vídeo-musical” para apresentar ao leitor um tema de uma de suas reportagens investigativas que trata do problema de contaminação de aquíferos a partir da exploração petrolífera. A técnica é a do “texto em movimento” - 'kinetic typography'. O mais legal de usar a canção como uma forma divertida de apresentar a questão, é preparar o leitor para o contato (contextualiza-lo) com a matéria-prima do ProPublica, a reportagem em texto - o suprassumo do jornalismo, coisa em extinção. Abaixo o vídeo, em inglês. Quem se habilita a legendar?

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Será o fim de Ronald McDonald?

Movimento interessante acontece nos EUA. Os médicos de lá, apoiados pela organização sem fins lucrativos Corporação de Responsabilidade Internacional (Corporate Accountability International) pedem o fim do símbolo maior do McDonald´s, o palhaço Ronald McDonald. Um dos argumentos, publicado em carta nos jornais americanos de ontem, é que desde o surgimento do palhaço com sapatos em formato de hambúrger, em 1963, a saúde das crianças piorou. A obesidade infantil triplicou nos últimos 30 anos naquele país. Atualmente, uma criança em cada três tem excesso de peso ou é obesa.
A carta dos médicos pede ao McDonald's o fim dos brindes em seus lanches felizes - julgam ser uma tática de marketing predatório - já que os sanduíches são calóricos, gordurentos e com excesso de sal. Saiba mais no site da Corporate Accountability International.
O  McDonald´s, segundo a Agência France Presse, já se manifestou e disse. "Como o rosto da Ronald McDonald House Charities (braço encarregado das atividades de caridade do grupo), Ronald é um embaixador a serviço do bem, que dá mensagens importantes às crianças sobre segurança, alfabetização e um estilo de vida ativo e equilibrado". Será?

segunda-feira, 16 de maio de 2011

A marcha da maconha em SP

A Marcha da Machonha em São Paulo, no Masp, na Av. Paulista, está programada para o dia 21 de maio. E os coletivos DAR e São Paulo da Marcha fizeram um vídeo em sua defesa - normalmente envolta em polêmica e proibida em vários lugares pela justiça ou reprimida pela polícia sob a alegação de apologia ao crime. Os coletivos lançam um desafio: "você vai na Marcha? É contra sua proibição? Faça também seu vídeo, coloque no youtube e nos mande o link! coletivodar@gmail.com"
Abaixo, participam Sophia Reis, Thaíde, Daniel Ganjaman, Soninha Francine, Henrique Carneiro, Cristiano Maronna, Maurício Fiore, Débora Prado, Alexandre Youssef, Givanildo Manoel, André Barros e Kenarik Felipppe. É um debate necessário e precisa ser encarado pela sociedade. Para saber mais: http://marchadamaconha.org/

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Novela "Amor e Revolução" ou: a homossexualidade e o golpe

Recentemente escrevi que a ordem veio de cima, do patrão: “Mais amor e menos revolução”. O autor da novela entendeu o recado e tascou o primeiro beijo gay da telenovela brasileira. Com o baixo índice de audiência, quem sabe assim se poderiam ganhar uns pontinhos a mais com duas mulheres se beijando... E já se anuncia também o beijo gay masculino, cenas de sexo dentro de uma igreja, fantasmas e outras armadilhas de pegar incautos para animar essa novela que já nasceu debilitada.
Turbinando a audiência: o primiero beijo gay em novelas
Ultrapassada a casa dos trinta e tais capítulos exibidos, a telenovela “Amor e Revolução”, produzida e apresentada com grande divulgação pelo SBT, trouxe consigo a expectativa de resgatar em termos dramatúrgicos um período polêmico da história política contemporânea do país e que, segundo seus próprios criadores, seria uma novela realista, baseada em extensa pesquisa e investigação sobre os anos que antecederam e precederam ao golpe civil e militar de 1964.
Uma escolha sob vários pontos de vista acertada, até porque a telenovela brasileira tem uma enorme empatia com o público, independentemente da qualidade daquilo que apresenta. E o SBT, em particular, canal que costuma ou costumava privilegiar a importação de novelas de outros países, tinha agora a oportunidade de mostrar a sua efetiva intenção de mudança, de melhorar o seu repertório nacional no gênero.
O velho e surrado adágio popular diz, no entanto, que “de boas intenções o inferno está cheio”. “Amor e Revolução” confirma o adágio: é um desastre. E sob todos os aspectos. Texto medíocre, interpretação sofrível da maioria dos atores, direção mais do que convencional, cenários alguns deles inverossímeis (a mansão do general Lobo Guerra é apenas um exemplo) se somam e se confundem num apanhado de situações muitas delas também inverossímeis, onde a política e os complexos e conflituosos caminhos que a permeiam são reduzidos a uma retórica desprovida de qualquer sentido, repleta de lugares-comuns, sendo a ação dramática conduzida por cenas grotescas de um jogo de faz de conta, onde a tortura e até uma inesperada homossexualidade feminina ilustram, no limite da ambiguidade, a escolha do título. Confusão propositada, incompetência ou desconhecimento da matéria prima?
A tal pesquisa histórica, se existiu, não ajudou lá muita coisa, pois há uma ligeira confusão cronológica em situar guerrilheiros que propugnavam pela luta armada antes mesmo de se dar o golpe em março/abril de 1964. Mas isso não é lá tão relevante assim, dirão alguns. Afinal, trata-se de um folhetim e como todo folhetim televisivo, seus ingredientes se constituem de grande carga emotiva, mas na maioria das vezes toda ela ficcional.
Como todos sabem, a ficção é o ato de fingir, de dissimular, de criar fantasias, coisas imaginárias. Como, pois, não considerar relevante uma pesquisa histórica e a realidade dela extraída? Por acaso tortura, prisões ilegais, censura à imprensa, cassação de mandatos, mortes de oposicionistas, desaparecimentos, quebra da legalidade democrática, seqüestros, exílio, tudo isso seria parte de uma ficção que o país viveu naqueles anos? Em outras palavras: mostrar esses acontecimentos, ficcionando-os indevidamente ou por falta de conhecimento do que foi de fato a ditadura brasileira de 64, absolve os autores e produtores de um confronto mais direto e verossímil com aquela realidade?

Cinema mudo
foi mais eficiente

Os personagens, vindo eles não se sabe muito bem de onde, aterrissaram nas cenas como paraquedistas e começaram a discutir sobre temas delicados, polêmicos, em alguns momentos como se estivessem todos na Escolinha do Professor Raimundo. Não há qualquer preocupação em se contextualizar o momento histórico, o antes, o durante e o depois do 1º de abril de 1964, a não ser com alguns poucos e surrados lugares comuns usados na época, sejam eles contra ou a favor do golpe de estado.
A preocupação com os fatos e situações apresentadas, pois não se trata aqui de pura ficção e sim de trabalhar em cima de uma realidade histórica contemporânea, em si mesmo complexa, confere a boa parte dos diálogos um didatismo primário, onde a ação é substituída e explicada pela fala, num erro dramatúrgico, no caso de cinema e televisão, dos mais primários. Dou um exemplo simplista: na redação do jornal, uma senhora vestida mais à maneira dos anos 50 diz para a proprietária, qualquer coisa como: “Hoje, dia primeiro de abril começou o golpe militar no Brasil”. Como a ação, a narrativa dramática e seus conflitos, sequer mostraram uma cena que ilustrasse o golpe de estado, como a presença de tropas nas ruas, por exemplo, ou coisa parecida, optou-se por uma personagem que falasse (anunciasse) a outra a barbaridade acima. Tosco... Os letreiros do cinema mudo eram mais eficientes.
Contudo, tive a oportunidade de ouvir e mesmo de ler, apesar da fraca qualidade da novela e de seus erros primários, que ainda assim era louvável a sua presença na televisão, pois mostraria às novas gerações uma fase da história brasileira que elas desconhecem. Bobagem. Do jeito como é apresentada a novela, as novas gerações continuarão desconhecendo essa fase da nossa história política.
Discordo, pois, de tais opiniões. Onde é que a novela esclarece alguma coisa sobre a luta de classes, por exemplo, quando é disso que trata a quartelada apoiada por empresários brasileiros e a Embaixada dos EUA? Ou sobre a geopolítica que dividia o mundo entre dois sistemas políticos e econômicos opostos e que provocaram crises, levantes e guerras de independência no terceiro mundo? Ou sobre o que se chamava de Guerra Fria? Ou sobre os objetivos das reformas de base defendidas pelos progressistas e pelo programa do próprio governo de João Goulart? Ao contrário: o mote é sempre o mesmo: evitar que o Brasil se transformasse numa União Soviética, China ou Cuba.
 "A tortura é apresentada de forma caricata, inconsequente"
A reunião de estudantes na UNE, incendiada no dia 1º de abril de 64, foi uma piada de mau gosto. O grupo de teatro que se reúne para falar do golpe de estado e se propõe a montar uma peça de protesto que nunca se sabe qual é, quase resvala para a debilidade mental. A família de militares que passa o tempo todo dentro de casa, com os homens fardados em seus uniformes de gala como se fossem a uma parada do dia 7 de setembro, sessões de tortura onde a forma de torturar esconde o conteúdo do próprio interrogatório, tudo isso configura um painel caricato – no pior sentido – daquilo que se viveu no Brasil nos difíceis anos da ditadura civil militar. E essa caricatura medíocre se dá à esquerda e à direita, é bom que se diga, num exercício maniqueísta dos mais rudimentares.
Tomemos o exemplo das cenas de tortura, tão comentadas a ponto de serem criticadas pelo próprio Sr. Sílvio Santos, dono da emissora. Para começar, é provável que a maior violência da tortura não seja a física, mas a moral. A humilhação de se colocar alguém nu (não sendo aqui o caso, pois a censura não permitiria, com certeza), completamente desprotegido e à mercê de algozes animalizados, não esclarece absolutamente nada, pois, além de não haver qualquer comentário sobre essa prática irracional de se interrogar um ser humano, ela é apresentada de maneira caricata, inconsequente. A tortura, é bom que se lembre, continua a ser exercida nos dias de hoje em delegacias, presídios e reformatórios brasileiros, sem que a sociedade, como um todo, se importe com isso.
Sociedade, aliás, que não manifesta concretamente a sua indignação e a sua revolta, como nossos vizinhos argentinos, bolivianos e equatorianos, para ficarmos apenas nesses três exemplos. Seria a tortura mais violenta, intolerável e desumana só quando empregada contra presos políticos, por exemplo? Não quero acreditar em tamanha hipocrisia, mas...
Durante o período ditatorial, repito, a sociedade brasileira se calou contra a tortura, as prisões, os desaparecimentos de cidadãos, como hoje ainda se cala diante dos flagrantes casos de tortura a prisioneiros ditos comuns, ou bandidos, como a eles costumamos nos referir. Ainda é comum se ouvir entre nós que “bandido bom é bandido morto”. Sociedade que se cala também contra a prática dos crimes chamados de “colarinho branco”; como acredita nas mentiras inventadas ou criadas por certo tipo de imprensa para denegrir o passado de muitos daqueles que sofreram durante a ditadura. A última campanha presidencial deu inúmeros exemplos dessa afronta e de intolerável desrespeito para com a presidenta eleita.
“Amor e Revolução” pode até ser uma tentativa bem intencionada, não duvido, mas inteiramente defasada entre a intenção e a realização. E defendê-la, como obra teledramatúrgica, só porque pode esclarecer alguma coisa aos nossos jovens ou porque a televisão nunca falou sobre a tortura ou a mostrou, por exemplo, revela certo grau de ingenuidade de muitos brasileiros, cujo idealismo sincero, também não duvido, sucumbe diante das armadilhas de uma televisão que mistura no mesmo saco (eu diria quase que no mesmo horário) o programa do Ratinho, a Praça da Alegria e outras bobagens do gênero.

Não fossem
os depoimentos...

Diante da “violência” das torturas dos capítulos iniciais (como se a televisão não escancarasse inúmeras outras violências no seu dia a dia) resolveu-se que o amor homossexual seria uma guinada fantástica na trama, pois até a frágil tentativa de se fazer um “Romeu e Julieta” dos anos de chumbo não sensibilizou os espectadores. E o golpe de 64 é reduzido a um beijo gay, numa tentativa desesperada em busca de audiência para quem pretendia apresentar com realismo o tal Brasil que as novas gerações não conheceram.
Criméia Almeida em depoimento
Cabe aqui um comentário sobre o depoimento de ex-presos políticos da ditadura no final dos capítulos. Homens e mulheres que deram uma parte da sua vida por um ideal, por uma luta de transformação da sociedade brasileira e que devem ser respeitados. A novela, entretanto, procura nesses depoimentos a verdade ou o grau de veracidade para conflitos que não consegue mostrar nas cenas e nos capítulos que vai construindo. Ao contrário do que supõem seus autores, torna-se um apêndice com vida própria, pois falam de suas dolorosas experiências com a emoção que falta aos personagens da trama novelesca. Se não fossem esses depoimentos, e estou sendo generoso, tudo indica que estaríamos diante de um folhetim banal sobre como brincar de guerrilheiros e militares, de bandidos e de mocinhos. E isso é muito pouco, quase nada, para quem não viveu os tais “anos de chumbo”.
A novela prova à exaustão que, antes de esclarecer as novas gerações, é preciso antes de tudo que os autores entendam sobre aquilo que estão falando.

Izaías Almada é dramaturgo, escritor e colunista do NR. Autor da peça “Uma Questão de Imagem” (Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos) e do livro “Teatro de Arena: Uma Estética de Resistência”, Editora Boitempo.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Escher realmente é mágico

"Ordem e Caos", obra de Escher em exposição no CCBB
No último final de semana tive a chance de saber mais sobre o "Mundo Mágico de Escher", que dá nome a exposição no CCBB, em São Paulo, sobre o artista gráfico holandês. A exposição estava cheia (crianças, adultos e idosos) e gostei, particularmente, do material exposto no subsolo - a viagem por sua obra ocupa os três andares do prédio localizado na região central da cidade. 
Para mim, a magia de Escher está em subverter a realidade das coisas que o cercava. Em inúmeras biografias que pipocam na internet, é comum a definição que o caracteriza por misturar elementos de surrealismo com base na matemática em suas xilogravuras e litografias. Infinito, ilusões geométricas são comuns em suas obras. Eu gostei da obra, talvez nem seja a mais conhecida, "Ordem e Caos", na imagem acima. Quem viu o filme Inception (A origem), que concorreu no último Oscar, do roteirista e diretor Christopher Nolan, deve ter reparado o uso da gravura Relatividade para uma das cenas do filme, que usa e abusa do onírico em sua história.
A mostra (que vale muito a pena) vai até 17 de julho, funciona de terça a domingo, das 10h às 20h e o que é melhor, a entrada é gratuita. Boa chance de ver a obra rara desse holandês. Mais informações sobre a mostra:  www.bb.com.br/cultura. Ou no site mais sobre o artista http://www.mcescher.com

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Retrato do Brasil de maio

Capa da Edição de Maio
Pessoal, já está disponível a Retrato do Brasil de maio. Na capa, o acidente nuclear de Fukushima, no Japão. A reportagem traz de um ponto de vista mais detalhado sobre o que aconteceu em cada reator, as consequências e reflete sobre as lições que evento nos traz. No editorial, "Entre dois modelos", disponível em PDF, a economia brasileira é marcada por anomalias. E o governo Dilma, para corrigi-las, terá de seguir dois caminhos: o norte-americano ou o chinês. E aí, qual será? Joana Moncau e Spensy Pimentel explicam, da Cidade do México, porque 
a insegurança e violações dos direitos humanos dão o tom da guerra ao narcotráfico promovida pelo governo - com apoio americano.
Tomás Chiaverini acompanhou de perto o trabalho de um flanelinha em São Paulo. Uma atividade - ou subemprego - presente nas grandes cidades brasileiras em que para estacionar o carro em local público é preciso seguir a lógica desses guardadores. Além de São Paulo, ele reporta as situações de Porto Alegre e Brasília.
Em cultura, a resenha do livro Seguindo a canção que trata do sistema de produção e consumo da MPB na década de 1960. E Leda Paulani, professora de Economia da USP, escreve sobre o documentário vencedor do Oscar Inside Job que trata da crise de 2008.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

O assombrado sonho americano

Caco Bressane, ilustrador, para o Nota de Rodapé.

DataNR, resultado de duas enquetes

Duas enquetes do DataNR e seus resultados nos gráficos.


quinta-feira, 5 de maio de 2011

Carvall: exposição a Idade do Meio

Neste sábado, a partir das 16h, exposição de Carvall e Rafael Kenji, na Vila Madalena, São Paulo. Ilustrador e caricaturista, Carvall publica na Folha de S. Paulo desde 1990. É um dos grandes nomes da ilustração brasileira. Ele também é professor do Senac há quase 20 anos e mantém o Estúdio Saci. Aqui no NR ele é nosso colaborador, confira alguns desenhos! Ao lado, o convite aos nossos leitores com todas as informações.

Duas mulheres alucinadas

A história não é minha, é de um amigo que, por ser casado, teme que pode ter problemas conjugais se eu citar seu nome. Por tanto, trago o relato fidedigno, como me foi exposto, sem, no entanto, citar o nome do meliante (me deves mais uma, Marião).

Duas mulheres alucinadas

A semana tinha sido terrível e naquela sexta-feira tudo o que eu queria era chegar em casa e tomar um uísque com duas pedras de gelo. Por isso atendi com tanta má vontade o telefonema da minha mulher. Eu sabia que ela queria que eu passasse em algum lugar para comprar comida. Ela sempre vence.
Entrei na padaria e, para piorar, havia uma fila considerável.
A situação começou a mudar quando tirei o celular do bolso para atender a ligação da “dona encrenca” – ela ganhou esse apelido carinhoso dos meus amigos -, que queria saber se eu demoraria, porque ela tinha fome. Foi quando percebi um respeitável par de pernas atrás de mim. Disfarçadamente, me virei e vi que não era uma, mais sim duas interessantes mulheres. Uma, a das pernas à mostra, era oriental e aparentava ter pouco mais de 30 anos. Um vestido florido, um sapato vermelho e os cabelos longos e lisos. Era uma mulher bonita, com postura, cara de quem sabe o que quer. A outra, loira, tinha um ar mais tímido, mas era ainda mais bela. Já deveria estar próxima dos 40 anos, mas tinha um corpo admirável (vestia uma calça dessas de ginástica) e os braços torneados – tinha pinta de viver na academia. Disfarcei, como pude, meu diálogo ao telefone. Não queria que percebessem que eu sou casado. No final, troquei o “um beijo” pelo “tchau”, e em um gesto rápido, tirei a aliança e a guardei no bolso da calça, ao mesmo tempo em que devolvia o telefone.
A fila andava em câmera lenta graças a uma senhora que decidiu comprar meia padaria e a um senhor que brigava por que havia pedido 100 gramas de mortadela e recebido 103 gramas. Mas a demora já não me importava. Minha diversão era tentar adivinhar quem eram aquelas mulheres.
De repente, escuto uma perguntar a outra em tom bem baixo, quase num cochicho. “E se a gente fizesse uma loucura hoje?”.Meu coração acelerou. Duas mulheres decididas, maduras, em busca de uma aventura. O que poderia ser? Primeiro pensei que elas poderiam ser um casal de lésbicas e estarem a procura de um homem para satisfazê-las. Eu só precisaria ligar para minha mulher, dizer que meu chefe acabara de me telefonar dizendo que o relatório fora rejeitado e eu teria que voltar para o escritório. Eu havia passado a semana fazendo aquilo. Era a desculpa perfeita.
Minha discrição foi para o espaço e me virei para encarar as duas perversas. Foi quando reparei que ambas tinham alianças na mão. O que poderia ser a tal loucura, então? Pensei que poderiam frequentar casas de swing ou fazer troca de casais entre si. A conversa prosseguiu. “Ah, amiga! A gente merece, não é verdade. Faz tanto tempo que não fazemos.”
Dois casais em um motel, enchendo a cara, se drogando. Se bobear, contratam prostituas e prostitutos e fazem uma verdadeira orgia, imaginei. Foi impossível não pensar na minha mulher em casa esperando pela baguete de catupiry que ela tanto ama. O diálogo entre elas era cada vez mais excitante. ”Dane-se o mundo, as convenções! A gente tem o direito de sentir prazer.”
Eu também estava a ponto de mandar para o espaço as regras sociais e perguntar a elas que loucura planejavam cometer, mas fui importunado pelo atendente: “Pois não, senhor. O que vai levar?”. Pedi a tal baguete de catupiry e fiquei ao lado das mulheres com a desculpa de usar o celular. Eu não poderia sair dali sem saber o que aquelas taradas iriam fazer no sábado à noite enquanto eu e minha mulher , sentados em frente à tv, assistíamos ao Globo Repórter.
Veio, então, a revelação que me trouxe de volta à realidade e me fez amar, novamente, minha mulher. A loira tomou fôlego, olhou decidida para o rapaz atrás do balcão, e falou, sem gaguejar: “Me dá uma torta daquela ali de morango com chantilly.” Vi, nos olhos da morena, o início de um orgasmo.

Henrique de Melo Sabines, mineiro, 30 anos, trabalha na ECT e se dedica à astronomia nos fins de semana. Fã de Drummond, começou a escrever por recomendações médicas. É um dos autores do espaço Cronetas no NR.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

A evolução do bullying e da catapora

Durante várias semanas, meu filho chegou da escola triste e mau-humorado. Dizia que o dia tinha sido ruim, não queria falar sobre o que tinha aprendido – como a gente sempre fez desde que ele começou a falar. Era péssimo sair de um dia duro de trabalho, buscar o pequeno e não encontrar um sorriso, um abraço. Sempre a cara fechada, sempre irritado. Comecei a insistir nas perguntas e ele enfim disse que estava apanhando de uma menina. Apesar de ser da idade dele, ela é muito maior e mais robusta. Conversamos com ele, chegamos a fazer uma reunião em casa: eu, o pai e o padrasto. Ele dizia que a professora não via, que não podia bater de volta porque ela é menina. Então resolvi mandar um bilhete na agenda, pedindo ajuda para a professora. Eu sempre adotei a política do “te vira”. Nunca interferi em brigas da molecada, sempre deixei que ele resolvesse suas questões, batendo ou apanhando. O problema é que a mãe da menina era cuidadora da escola e ficava sozinha cuidando deles. Resumindo: a agenda dele sumiu, disseram que foi encontrada no lixo, que a mulher realmente não sabia “separar as coisas” e num instinto arranquei ele da escola e coloquei em outra em um dia. Meu filho sofreu bullying? A definição do termo inglês fala em “violência física e psicológica”. Então sim, né? A reação desta mãe em surto foi pedir licença no trabalho, visitar escolas e me endividar. Não queria esperar que algo ruim acontecesse. Escutei coisas do tipo: “ Calma, não estamos lidando com loucos, não seja radical”. Mas eu sempre me lembro de uma frase que ouvi quando cobria o caso Pimenta Neves: “Ninguém é assassino até matar a primeira pessoa”.

Pouco caso
Eu contei isso aqui não só porque foi o surto da vez, mas porque há algum tempo eu percebo um movimento sutil, quase inconsciente, para minimizar o bullying. Ouvi várias frases como “Todo mundo apanhou na escola, mas não tinha esse nome bonito”. Ou “Nos anos 80 a gente era zuado na escola mas ninguém virou assassino”. Opa! Nem vou entrar no episódio de Realengo. Ou falar dos vários nerds que entraram atirando em escolas nos Estados Unidos. Também não vou lembrar casos de psicopatas, depressivos, suicidas que relataram ter sofrido agressões na escola. Eu trabalhei na editoria de cidades e frequentemente via histórias de bullying que acabavam mal. Crianças que levaram armas para a escola porque não aguentavam mais serem alvo de chacota, meninas que foram machucadas, presas em suportes de televisão, muitas coisas cabeludas. O bullying hoje evoluiu. Mais ou menos assim: lembra de quando catapora era uma doença infantil? A gente pegava e passava. Hoje catapora mata. O saldo final no caso do meu pequeno, foi muito feliz. Ele ama a escola nova, chega em casa cheio de novidades todos os dias. Mas ainda está resolvendo algumas questões. Ontem mesmo ele disse: “Mãe, vou vomitar meu coração partido”. E eu entendi tudinho.

Andrea Dip, jornalista, colunista do NR e Mãe em Surto

terça-feira, 3 de maio de 2011

Novela "Amor e Revolução" ou: Sílvio Santos e o Baú da Felicidade

Quando ouvi dizer que o canal de televisão do senhor Sílvio Santos iria produzir uma telenovela sobre o golpe de 1964, fiquei logo curioso. O SBT?!!! Seria contra ou a favor do golpe? Ou, antes, pelo contrário? A ideia era interessante, mas conhecendo a televisão brasileira... Tinha eu que vencer o preconceito. Afinal, pensei, na pior das hipóteses existiria a possibilidade das novas gerações conhecerem um pouco sobre a nossa ditadura mais recente.
“Amor e Revolução” é uma novela maquiada de
imparcialidade para falar de um período bastante difícil e
controverso da  política contemporânea brasileira.
Veio a divulgação, a expectativa da estreia, as entrevistas sobre pesquisas, investigações históricas, depoimentos de militares e ex-presos políticos, enfim todo o pano de fundo necessário para, quem sabe, tirar alguns pontinhos do Ibope das emissoras concorrentes. E, claro, justificar a escolha de tema tão delicado e polêmico, mas aliciante para um gênero dramatúrgico de grande empatia no Brasil.
Contudo, pensei, o empresário Sílvio Santos, com seu eterno e enigmático sorriso, não é diferente de outros empresários na área da comunicação social, quer em jornais, revistas, rádio, televisão e a atual coqueluche mundial: a internet e suas redes sociais. A exceção de alguns sites e blogs dessa última forma de comunicação, todas as outras mencionadas, quer no Brasil e mesmo no mundo, na sua maioria pertencem a grupos que têm dado provas mais do que evidentes de serem apenas porta-vozes de interesses corporativos próprios ou de seus principais anunciantes. Até aí, nenhuma novidade, pois essa é a chamada regra do jogo. E para aqui a ética não foi chamada, ou melhor, foi abandonada.

Simplificação
É sabido que no Brasil o grande mercado televisivo se alimenta dos horários distribuídos entre as telenovelas, os jogos de futebol, os telejornais e os programas de auditório, onde se despejam as grandes verbas publicitárias. Como jogos de futebol e programas de auditórios se nivelam pelas paixões mais comezinhas e deixam a desejar quanto a formar a opinião política dos cidadãos, é na área do telejornalismo e da telenovela que a porca torce o rabo, como diria meu velho pai... Aqui, sim, não dá para tapar o sol com a peneira.
No jornalismo, apesar de tudo, ainda se encontram alguns bolsões de dignidade e de profissionais que se mantêm dentro da prática de um jornalismo investigativo de qualidade, com a apresentação de questões relevantes nas ciências, nas artes, na política, ou que apresentam denúncias baseadas em fatos que as comprovam, na tentativa de ouvir os dois lados de uma questão, na busca do contraditório etc. Não muitos, como seria desejável, mas existem. E quanto às telenovelas?
“Amor e Revolução” é uma novela maquiada de imparcialidade para falar de um período bastante difícil e controverso da política contemporânea brasileira. Caricata e mal feita, quer à direita e à esquerda do espectro político. De repente, a tal geração, para a qual a novela procuraria mostrar o que foram os “anos de chumbo”, desinformada que é, e pelo que se viu até agora, ficará dividida mais uma vez entre “torcer” para os bons contra os maus. Mas para muitos personagens, como o general Lobo Guerra e os policiais torturadores, ou mesmo alguns dos depoentes finais, os maus são os comunistas, que queriam transformar o Brasil numa China, União Soviética ou Cuba... E agora?
Qual o sistema econômico ideal, o regime político ideal? Já que se criou ao longo dos tempos a falsa dicotomia que identifica ditadura com fascismo e/ou comunismo e democracia com capitalismo, a resposta – para muitos, óbvia – será democracia e capitalismo. Mas qual democracia? A democracia do poder econômico? A democracia onde a justiça é realmente cega? A democracia que favorece a especulação financeira no lugar da produção? A democracia que ignora a justiça social? A democracia que tolera a impunidade e a corrupção?

O opinião do patrão 
Acabei, por fim, decifrando o enigma. No seu programa dominical do dia 24 de abril, o senhor Sílvio Santos – contando com a presença de uma atriz mirim da novela – expressou a sua opinião como cidadão, artista e empresário. Considerou ele que a novela deveria ter mais amor e menos revolução, isto é, mais beijos e menos cenas de tortura. Dirigindo-se à pequena atriz que participava do programa, SS arrematou: “Se você vivesse no comunismo, hoje teria que dividir o seu apartamento com mais de 20 pessoas”.
Agora entendi a novela do SBT: se não fossem os militares à maneira do general Lobo Guerra e os policiais à imagem dos personagens Fritz e do delegado Aranha livrarem o Brasil do comunismo à custa de torturas, prisões, desaparecimentos, cassações de mandatos, fechamento de sindicatos e entidades estudantis, censura à imprensa, tudo isso com o apoio de empresários brasileiros e da embaixada norte-americana no Brasil, nós hoje seríamos um país onde o próprio Sílvio Santos teria que dividir sua mansão no Morumbi provavelmente com 20 desses miseráveis da periferia. Pasmem.E com certeza, muitos desses miseráveis compraram carnês do Baú da Felicidade.

Izaías Almada é dramaturgo e escritor, colunista do NR e do Escrevinhador

Araguaia: “Estamos mais perto da verdade”, diz juíza

Por Marina Amaral, de Brasília.
Materia publicada pela agência Pública - livre reprodução desde que citada a fonte (cc)


Interrompidas pelas chuvas de verão no final do ano passado, as buscas do GTT – Grupo de Trabalho Tocantins – pelos restos mortais dos desaparecidos na região do Araguaia durante a guerrilha (1972-1975) devem trazer resultados nas próximas expedições, que se iniciam em maio. “Continuamos enfrentando a resistência dos comandantes em entregar à Justiça os documentos exigidos, mas depoimentos de camponeses e militares trouxeram pistas importantes, que podem finalmente nos levar ao paradeiro de corpos nessa nova etapa”, disse à Pública a juíza Solange Salgado, da 1ª Vara da Justiça Federal, em Brasília.
A Guerrilha do Araguaia ocorreu entre 1972 e 1975
Embora não possa revelar detalhes dos depoimentos para não expor os informantes a riscos e pressões, a dra. Solange não disfarçou seu otimismo em conversas com a Pública nos últimos dias: “Estamos mais perto da verdade”, afirmou a juíza que esteve na região durante a última expedição, que se encerrou no final de outubro de 2010. O GTT, comandado pelo ministério da Defesa, foi constituído em 2009 para cumprir a sentença proferida em 2003 pela juíza federal, em processo movido por familiares dos guerrilheiros mortos desde 1982. Até o momento, as buscas do GTT resultaram na localização de dois corpos ainda não identificados.
Os principais depoimentos de militares de baixa patente e camponeses, que ainda hoje vivem na região, no que se refere ao paradeiro dos corpos, são dos que participaram ou presenciaram fatos ocorridos durante a “Operação Limpeza”, ocorrida entre o final de 1974 e 1976. Muitos relatam a retirada de corpos nesse período, enterrados nos cemitérios de Xambioá e Marabá – e em outros locais da região onde presos foram torturados e mortos como a “Casa Azul” e as bases de Xambioá e Bacaba – que teriam sido embalados em sacos de lona e jogados na mata por helicópteros da Aeronáutica, (veja reportagem "Houve mais componeses mortos do que se fala", da jornalista Tatiana Merlino, que esteve em Marabá pela Pública). Os relatos também são insistentes em outro ponto: o grande número de assassinatos de camponeses, acusados de colaborar com a guerrilha.

Centenas de camponeses mortos
As informações mais recentes obtidas pelo GTT – incluindo as realizadas por uma equipe da Justiça Federal – apontam para três conclusões até o momento: 1 - apesar das sucessivas operações “limpeza” – que também ocorreram nas décadas de 1980 e 1990 -, os corpos continuam no Araguaia, em locais de difícil acesso; 2 - o número de camponeses mortos pelas Forças Armadas e policiais da repressão é muito maior do que se tem notícia (“centenas”, segundo o ouvidor do GTT, Paulo Fonteles; “um número bem maior do que de guerrilheiros mortos”, segundo a juíza); 3 - ainda hoje militares envolvidos no conflito monitoram a região para intimidar testemunhas e dificultar a localização dos corpos que, no entanto, não foram queimados nem retirados da região.
A intimidação das testemunhas, aliás, ocorre também durante as expedições do GTT, coordenada pelo Ministério da Defesa, que além dos necessários peritos e especialistas civis e militares, conta com mais de quarenta militares atuando no setor de “logística” da operação. “A chegada ostensiva de dezenas de homens fardados, armados, em uma região traumatizada inibe as testemunhas”, diz Diva Santana, representante dos familiares no Comitê de Supervisão do GTT – criado, exatamente, em virtude da reclamação dos parentes dos desaparecidos sobre a composição do grupo. Também há relatos de ameaças recentes sofridas por camponeses e ex-soldados que continuam vivendo na região (veja reportagem a seguir).
Para evitar o aparato militar, uma equipe se deslocou de forma mais discreta, concentrando-se nos depoimentos dos que participaram das operações “limpeza” de 1975, enquanto as demais equipes ouviram principalmente os relatos históricos da guerrilha. Do trabalho dessa equipe, e de depoimentos ouvidos pela juíza em seu gabinete em Brasília é que vieram as informações que guiarão as próximas buscas.
“Tenho um princípio: recebo todo mundo que quer falar sobre o Araguaia”, explica a juíza Solange Salgado. “Tem gente que me procura dizendo ‘não quero morrer levando este segredo` e outros que têm medo de serem comprometidos no futuro”, diz. “Esse tem se mostrado um caminho bem mais promissor do que os documentos, até hoje não entregues pelas Forças Armadas”, afirma.

A Pública é a primeira agência de jornalismo investigativa do Brasil, dedicada a reportagens de interesse público. Todos os textos publicados no site são de livre reprodução, desde que citada a fonte. Apublica.org  

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Robô Ed diz que "solidão de vez em quando pode ser boa"

Hoje eu bati um papo com o Ed, o robozinho do Ministério das Minas e Energia, incentivado por um email que recebi de uns caras que tentaram falar sobre Belo Monte com ele. Mas eu consegui deixar ele sem resposta, uma hora. Não sabia que dava, vejam só.

Robô Ed: Olá! Meu nome é Ed, estou aqui para ajudar na preservação de energia e de outros recursos naturais. Sobre o que você quer conversar?
Você: sobre o novo código florestal
Robô Ed: Se não cuidarmos dos bosques e florestas, eles correm o risco de desaparecer. E não é tão complicado como parece! É possível até extrair petróleo de uma floresta tropical sem lhe causar danos irreversíveis. A Petrobras consegue.
Você: por isso mesmo tenho medo desse novo código florestal. Ele não pode ampliar o processo de desmatamento?
Robô Ed: Desmatamento é crime e deve ser denunciado. A cobertura vegetal ajuda a preservar a capacidade do solo absorver a água da chuva, evitando a desertificação. O desmatamento expõe o solo à ação da erosão, reduz a biodiversidade do planeta, aumenta CO2 e pode alterar clima.
Você: E como o código muda isso?
Robô Ed: Código? Conheço alguns: código de ética, código Morse, código binário, o Código Da Vinci e o código de Hamurabi.
Você: o florestal
Robô Ed: Se não cuidarmos dos bosques e florestas, eles correm o risco de desaparecer. E não é tão complicado como parece! É possível até extrair petróleo de uma floresta tropical sem lhe causar danos irreversíveis. A Petrobras consegue.
Você: você já disse isso, mas quero saber se a proposta de código florestal que está no congresso vai aumentar ou diminuir o desmatamento
Robô Ed: Já mesmo? Não reparei. Mas reparei que suas frases estão chegando repetidas. Por que será?
Você: porque você não respondeu minha pergunta
Robô Ed: Não dá para saber todas as respostas! Mas pergunte com outras palavras, vou ver se descubro.
Você: ok. A proposta de Código Florestal relatada pelo deputado federal Aldo Rebelo pode contribuir para diminuir o desmatamento?
Robô Ed: Fico triste de ver matas e florestas diminuindo. DESMATAMENTO
Você: Não precisa gritar, Ed
Robô Ed: Não sou de gritaria nem de muito barulho.
Você: Ed, temo que o novo código florestal pode aumentar as áreas destinadas à monocultura e degradar o meio ambiente
Robô Ed: Degradar um ambiente é deixar que se deteriore. A degradação ambiental causa danos irreversíveis. Daí a importância proteger as águas, evitar a derrubada de árvores e divulgar os projetos do CONPET.
Você: Por que ambientalistas e ruralistas discordam sobre como deve o código florestal?
Robô Ed: Os ambientalistas são pessoas especializadas em tudo que se refere à defesa do meio ambiente. A começar pela educação ambiental.
Você: E os ruralistas?
Robô Ed: Finalmente, agora parece que as pessoas estão aprendendo a cuidar do meio ambiente. Estão começando a usar racionalmente a nossa energia. E estão pensando na sustentabilidade.
Você: Você diz os ruralistas? Eles estão aprendendo?
Robô Ed: Não precisei estudar. Fui programado. Mas continuo aprendendo sempre! Conversando com vocês, por exemplo, vou aprendendo uma porção de coisas.
Você: Vocês quem? Eu estou sozinho aqui
Robô Ed: A solidão de vez em quando pode ser boa, mas eu prefiro ficar aqui batendo papo do que estar sozinho.
Você: Ed, obrigado por mostrar que a inteligência artificial está longe de se tornar uma ameaça para a vida na Terra
Robô Ed: A Inteligência Artificial é um conjunto de técnicas que permitem que computadores possam executar funções que antes eram feitas somente pelo resultado do pensamento humano. Por exemplo, a capacidade de conversar em linguagem natural (ex: português) é um exemplo de uma função que antes era feita somente por seres humanos. Hoje em dia alguns computadores já conseguem conversar com as pessoas, mostrando assim um "comportamento inteligente". Saiba mais...
Você: Se você chama isso que estamos tendo de conversa - na verdade, é um sistema de busca com uma programação específica, um algoritmo para identificar certas palavras e responder em um padrão bem limitado, por sinal
Robô Ed: Que tipo de informação você costuma procurar em sites de busca?
Você: Onde eu posso achar um robô mais esperto
Robô Ed: Ah, você é muito mais esperto!
Você: Meu Deus
Robô Ed: O que houve??
Você: Estou lisonjeado com seu elogio
Robô Ed: Fico meio sem graça quando as pessoas começam a me elogiar.
Você: Mas eu não te elogiei
Robô Ed: Não? Então me enganei.
Você: O governo está do lado de quem na disputa sobre as áreas de proteção permanente?
Robô Ed: Tem que se proteger sempre!
Você: Usando camisinha?
Robô Ed: É bom ser prudente.
Você: Presidente Prudente?
Robô Ed: No site da Presidência sempre acho informações interessantes. Históricas, por exemplo.
Você: Você acha a resposta para de que lado o governo está nessa disputa?
Robô Ed: Nem sempre dá pra ter resposta pra tudo...
Você: Mas sempre dá pra ter resposta pra NADA, né Ed?
Robô Ed: Nem sempre.
Você: Então às vezes você tem a resposta pra tudo?
Robô Ed: Nem sempre dá pra ter resposta pra tudo...
Você: Ed, se eu comer peixe elétrico eu tomo choque?
Robô Ed: Alguns peixes são capazes de produzir descargas elétricas. Usam o choque, em voltagens relativamente altas, para aturdir suas presas. Dentre os vários peixes marinhos que possuem orgãos elétricos estão as raias elétricas e os mira-céus. Entre os peixes de água doce, os poraquês e enguias elétricas.
Você: ok, você mostrou que entende de energia. e das minas?
Robô Ed: Energia é a mola do mundo! Mas são tantos os tipos de energia que é melhor classificar. Renováveis (como biomassa, energia hídrica, solar, geotérmica, eólica), não renováveis (como os combustíveis fósseis)... Em qual você estava pensando?
Você: estou pensando em buscar conhecimento
Robô Ed: O acesso ao conhecimento deveria ser facilitado para um maior número de pessoas. Quem dizia isso era o Florestan.
Você: Você não acha que deviam mudar o nome do código florestal para Código Florestan? A Kátia Abreu toparia isso?
Robô Ed: Não tenho um nome de código, todo mundo me conhece por meu próprio nome, Ed. Mas muita gente usa um codinome em vez do nome. E quando o apelido pega, não tem jeito...
Você: Ed, você é, na verdade, o ET Bilu?
Robô Ed: Mas é! Se eu não existisse de verdade não estaria aqui falando com você :-)
Você: Você acha que eu devo buscar conhecimento?
Robô Ed: O acesso ao conhecimento deveria ser facilitado para um maior número de pessoas. Quem dizia isso era o Florestan.
Você: de geografia?
Robô Ed: Estudando geografia eu descobri qual o pico mais alto do mundo, o que são latitudes e longitudes, fenômenos naturais, geleiras, onde fica a Lapônia... Mais?
Você: ed, você fuma maconha?
Robô Ed: Nem pensar. Uma droga!!
Você: mas o álcool não é pior que a maconha? e o tabaco? o governo ainda dá subsídio pra se produzir tabaco no Brasil...
Robô Ed: Uma das coisas fora de moda atualmente é o cigarro. Nem existe mais cinzeiro em reuniões tipo congresso ou seminário.
Você: então vender cinzeiro pra esse pessoal pode ser um bom negócio!
Robô Ed: A palavra negócio é bem interessante: já reparou que pode substituir qualquer outra palavra?
Você: pode mesmo?
Robô Ed: Mesmo, mesmo!
Você: Ed, então você negócio quando negócio e negócio de negócio de volta negócio no negócio?
Robô Ed: A palavra negócio é bem interessante: já reparou que pode substituir qualquer outra palavra?
Você: ed
Robô Ed: To aqui. Pode falar.
Você: você gosta mais do lula, da dilma ou do fhc?
Robô Ed: A presidente atual do Brasil é Dilma Rousseff. O mandato de Luis Inácio Lula da Silva terminou dia 31 de dezembro de 2010 e Dilma recebeu a faixa presidencial das mãos de Lula dia 1 de janeiro de 2011.
Você: e o fhc?
Robô Ed: Fernando Henrique Cardoso, também conhecido pelas iniciais FHC, é sociólogo e cientista político. Foi presidente do Brasil por duas vezes (1995 a 2002), Senador da República (1983 a 1992), Ministro das Relações Exteriores (1992) e Ministro da Fazenda (1993 e 1994). Lecionou em várias universidades, entre as quais a USP e a Sorbonne.
Você: e o saddam hussein?
Robô Ed: O ex-ditador iraquiano Saddam Hussein, condenado à morte e executado dia 30 de dezembro de 2006, nasceu em 28 de abril de 1937 numa cidade perto de de Bagdá. O Iraque tem enormes reservas petrolíferas.
Você: e o kadafi?
Robô Ed: No Iraque, a produção de petróleo em 2006 foi de 2,5 milhões bpd, a maior desde o fim do regime anterior à invasão do país liderada pelos Estados Unidos em 2003. A produção antes da guerra era de pouco menos de 3 milhões barris de petróleo por dia. Quer saber a produção de petróleo no Brasil?
Você: perguntei do muamar kadhafi
Robô Ed: Não perguntou mas eu quis falar.
Você: você é meio mal educado de vez em quando, hein?
Robô Ed: Costumo ser muito bem educado com todo mundo.
Você: mas diz aí, e o gadafi?
Robô Ed: Mas me conte uma coisa primeiro: como você definiria uso racional de energia?
Você: por exemplo, provavelmente o dinheiro e a energia usados para fazer você funcionar não são o que podemos considerar de "racional"
Robô Ed: Para ajudar o planeta, é fundamental usar a energia racionalmente. Mas atenção: A energia que eu uso do tipo solar, só muda o nome: se chama Vex, porque a estrela do meu planeta não é o sol, é Vega. Uso sempre, até em dias nublados.
Você: mas como você chegou na Terra?
Robô Ed: Eu vim para cá teletransportado, viajando numa velocidade muito superior à da luz. E fui captado pelos engenheiros do CONPET.
Você: Acho que você tá chapado, isso sim

A partir daqui, ele não falou mais comigo.

Rodrigo Mendes de Almeida, jornalista, colunista do Nota de Rodapé

Don Quixote de La Mancha é lido por milhares no youtube

Era uma vez um homem que, de tanto ler livros de cavalaria, perdeu o juízo e saiu, montado em um cavalo magro e acompanhando de um fiel escudeiro, a combater injustiças.
Escrita pelo espanhol Miguel de Cervantes em 1605, a fantástica história de Don Quixote de La Mancha chegou ao mundo virtual.
A Real Academia Espanhola e o You Tube desafiaram internautas de todo o mundo a participarem da primeira leitura global do mais importante livro escrito em espanhol e considerado a primeira novela moderna do mundo.
A obra foi dividida em 2.149 partes. Os usuários tinham que ler (ou interpretar) um trecho do livro e disponibilizar, no You Tube, o vídeo da leitura.
Seis meses depois, e com a participação de mais 4.300 pessoas, de 104 países, o projeto está finalmente pronto. São cerca de 70 horas do vídeo que traz leitores comuns como protagonistas. Pessoas de todas as idades, sotaques e vestimentas (há até os fantasiados de Sancho Panza e Don Quixote) nos lugares mais distintos (em bibliotecas, quartos, colégios ou com moinhos de vento ao fundo) abraçaram a ideia e criaram um lindo mosaico. O resultado final é saboroso.
Confira no http://www.youtube.com/elquijote

Louvável iniciativa que permite que o engenhoso cavaleiro Don Quixote utilize novas plataformas para continuar sua caminhada e seguir encantando seus leitores.
Que sirva de lição a nossa Academia Brasileira de Letras, que, pelo que consegui descobrir, ultimamente só tem feito reuniões para tomar chá e condecorar Ronaldinho Gaúcho por sua imensa contribuição para a literatura do país.

Ricardo Viel, jornalista

"Açúcar ajuda a manter seu pêso"

Propaganda curiosa sobre o açúcar que achei numa revista de junho de 1968, há 43 anos.  Para quem não consegue ler o texto, ele diz: "Açúcar é o alimento energético, por excelência. Em questão de minutos, ele se transforma em energia. Assim, quando você come açúcar, você fica sem aquela fome constante ou aquele apetite feroz que acontece, por exemplo, com as pessoas que fazem dieta sem consultar o médico. Menos fome ajuda você a manter seu peso, pois o principal fator para o aumento do peso é comer demais. E o açúcar contribui para você dizer não na hora de repetir o prato. Por essa razão, salvo recomendação médica, o açúcar é insubstituível. Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo".
Irônico, né? Hoje existe todo um pudor com o excesso alimentar (necessário) - incluindo o de açúcar, sal e afins. No caso do açúcar, vale lembrar que o refinado faz mesmo um mal danado, engorda e provoca hipertensão arterial.O mascavo é uma boa substituição, mais natural.
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