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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Futebol e política se misturam, sim

Sei que vou chover no molhado, mas não resisto. Há muita gente que insiste em dizer que futebol e política não se misturam. Bobagem, pois se misturam sim e muito bem misturadinho.
Há vários exemplos que ilustram o fato, mas vou ficar com dois deles, quanto a mim, bastante emblemáticos. O primeiro diz respeito ao tricampeonato mundial conquistado pelo Brasil em 1970, em plena ditadura civil militar, quando o governo de plantão incorporou a conquista do tri campeonato dentro do ufanismo reacionário do “Brasil: ame-o ou deixe-o”, sem falar que houve interferência de Brasília na destituição do técnico João Saldanha (que foi, afinal, quem montou o time vitorioso) por ter respondido ao presidente Médici que ele mandava no governo, mas na seleção de futebol mandava ele, Saldanha.
Na copa de 1978, a ditadura argentina – anfitriã do evento - comprou uma derrota da seleção de futebol peruana, fato já comprovado por entrevistas de alguns dos envolvidos e que possibilitou a classificação da própria Argentina, levando-a também a conquistar o título mundial em um momento negro na história do país irmão, quando desapareceram mais de 30 mil pessoas, vítimas de repressão e das perseguições políticas. Era preciso conquistar a copa mundial e “aliviar” as pressões internas.
Outros exemplos poderiam ser aqui citados, mas já não é mais segredo para ninguém que todo e qualquer assunto relativo às atividades humanas tem como objetivo a integração, o convívio social, seja em qualquer nível: ambiental, religioso, comercial, político, cultural, esportivo, educacional. Para essas atividades humanas no seu todo, convergem os mais variados interesses, muitos deles conflitantes. E a política, a polis, permeia tudo isso.
Se o futebol não se mistura com a política, como explicar, por exemplo, algumas infâmias promovidas por repórteres e comentaristas esportivos em relação à Argentina ou ao Paraguai, nossos vizinhos e irmãos latinos? Ou o preconceito e o viés ideológico não passam por essas “reportagens”? Qual o problema de Maradona ter uma tatuagem do Che Guevara e Fidel e ter feito tratamento contra drogas em Cuba? Por quê o deboche contra o Paraguai feito por uma equipe do Sportv? Dunga virou bandido por não ter permitido entrevistas exclusivas à Rede Goebells? A liberdade de imprensa tem mão única ou vale para todos os cidadãos de um país?
Quando Pelé disse que os brasileiros não sabiam votar, ele estava fazendo um gol de letra ou fazendo política? O mesmo Pelé, quando omite a questão do racismo no Brasil, jamais tendo feito uma declaração a respeito, está sendo o jogador ou o político? Quando âncoras e comentaristas esportivos achincalham pessoas e povos do alto de sua cultura, que mal cabe numa caixa de fósforos estão sendo preconceituosos em termos esportivos ou políticos também?
O dia a dia do futebol no Brasil, e me arrisco a dizer em todo o mundo futebolístico mistura e muito a política com o esporte. A tal ponto que reconhecem a necessidade de aproveitar o maior evento do futebol para campanhas como a do antirracismo, por exemplo. No que aliás, fizeram muito bem.
Para aqueles que, porventura, tenha dúvidas a respeito do tema, sugiro que leiam o livro do jornalista escocês Andy Dougan, publicado pela Jorge Zahar Editora, intitulado FUTEBOL & GUERRA, um livro maravilhoso que conta a tragédia do Dínamo de Kiev, na Ucrânia ocupada pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

Izaías Almada é escritor, dramaturgo e colunista do NR.

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