Se houve um estupro e dele resultou uma gravidez é porque Deus quis; logo, não se deve abortar. Foi o que disse na semana passada um político estadunidense em campanha para o Senado.
A concepção divina de Richard Mourdock é, grosso modo, a de muitos crentes. Ele [Deus] está em todos os lugares, é onipresente e nada acontece sem sua benção. “Não cai uma folha de uma árvore se Ele não quiser”. Portanto, se uma mulher ficou grávida era para ser assim, e o fato dele não querer aquele filho, do feto não ter cérebro ou qualquer outro “detalhe” é secundário.
Se eu acreditasse em um deus, o odiaria. Ao menos que aceitasse que esse deus, após criar o mundo e as pessoas, foi descansar e nunca mais acordou. Caso contrário, seria difícil ter qualquer apego por um ser sádico, perverso, implacável e injusto.
Tenho alergia a extremistas, e acredito que um ateu que pregue sua ausência de fé deve ser tão insuportável quanto um crente que faz o mesmo. Não pretendo que quem tenha um Deus deixe de tê-lo, mas apenas fazer um alerta que em nome de um deus se pode cometer barbaridades como obrigar uma mulher a parir uma criatura fruto de um estupro.
Um mundo com menos fanatismo religioso possivelmente seria um mundo melhor, sem tanto preconceito e intolerância, e talvez menos injusto - já que o discurso da existência de um ente superior que tudo vê e tudo pode acarreta em muitos o comodismo e a resignação.
Durante um tempo pensei que ter fé trazia paz e um certo sentido na vida, e cheguei até a invejar os crentes. Hoje me sinto livre por não acreditar numa força superior, já que nutriria por ele uma repulsa e um ódio que não faz bem que se cultive, muito menos contra algo que nem sequer existe.
Ricardo Viel, jornalista, escreve às segundas, de Lisboa, Portugal
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