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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Nove perguntas sobre a puta da Uniban


hoje é curta, mas não é banal. tem textinhos engraçadinhos e simpáticos meus pra entrar, mas pedi um espaço urgente pro thiago. e não é porque eu ache que tenho alguma coisa importante pra dizer ou uma reflexão maravilhosa pra fazer. é simplesmente porque hoje é sexta-feira, são 10h da manhã e eu me sinto enjoada há pelo menos uma hora, desde que li na folha de s. paulo o caso da “puta da uniban”.

parênteses pra quem não sabe do que eu tô falando: http://www1.folha.uol.com.br/folha/videocasts/ult10038u644777.shtml
e pra quem sabe mais ou menos, mas não tem a dimensão da coisa, esse vídeo foi feito de dentro da multidão. atenção ao coro: http://www.youtube.com/watch?v=f2dPmntMDSk

eu me pergunto:

1. até que ponto podem chegar essas pessoas? esses meninos são os meninos que andam de ônibus com a gente, que não levantam pros velhos no metrô, que entram na mesma fila na padaria, que sentam ao nosso lado no cinema. até ponto eles podem ir quando em grupo? matar, linchar, esquartejar?

2. e as mulheres? em um dos vídeos dá pra ouvir claramente um diálogo entre duas amigas. uma delas diz “ela tá chorando!”. a outra responde: “dane-se!”. na reportagem da folha também diz que, antes do tumulto, a moça foi ao banheiro, já acompanhada de uma amiga que receava que acontecesse algo. o banheiro foi invadido por cerca de 20 meninas que tentaram obrigá-la a mudar de roupa. que pensam essas mulheres? concordam quando os homens dizem que uma mulher foi estuprada “porque tava pedindo” ou apanhou do marido “porque mereceu”?

3. claro que ter namorado não é garantia de bom caráter nem de discrição, mas a menina tinha ido arrumada para a faculdade porque o namorado iria buscá-la no fim da aula para ir a uma festa. quantas meninas não fazem isso? por que o fato de ela ser gostosa incomoda tanto pessoas que mal a conhecem, sendo que não incomoda nem mesmo o namorado da moça, já que ela disse já ter usado o vestido outras vezes?

4. será que as mulheres se sentem tão pressionadas pela ditadura da beleza, da magreza, dos peitões, do cabelo loiro e liso, que numa catarse descontaram todas as suas frustrações na moça?

5. será que os homens se sentem tão pressionados a só conquistar e gostar de mulheres que façam parte desse estereótipo que numa catarse também descontaram suas frustrações na moça?

6. ou será que a autoestima de todos é tão baixa que apenas procuram alguém que seja “pior” do que eles, alguém em que possam jogar pedras para poder dizer “eu sou uma merda, mas tem gente ainda pior”?

7. a atitude dos professores e da polícia: será que eles de fato acharam relativamente normal o que aconteceu, o que pelo menos fizeram parecer a partir das declarações que deram a imprensa e das frases que falaram pra moça? o que é, então, a realidade das faculdades e das escolas? algo muito pior do que imaginamos?

8. num país como o brasil, onde todos andam com o corpo a mostra pelo menos quatro meses por ano, num calor infernal, e num mundo como o nosso, onde o que mais se vende é o que está relacionado de alguma forma a sexo (apresentadoras peitudas, realitys com gostosas na piscina, aulas de sexo anal em programas vespertinos na tv, revistas que ensinam como conseguir um orgasmo rápido e fantástico), por que esse inesperado surto moralista?

9. e afinal de contas: por que tanto ódio?

joga pedra na geni, joga bosta na geni. você pode nos salvar, você vai nos redimir. você dá pra qualquer um… bendita geni!

Sofia Amaral é roteirista e produtora

11 comentários:

natalia viana disse...

Sof, acho que o episódio trágico (no mínimo) tem mais a ver com o comportamento das massas do que a um ódio real desses alunos universitários. As massas são burras - muitos já disseram isso e escreveram sobre elas - e podem chegar a comportamentos absurdos pelo simples fato de estarem entre "iguais" (ou quererem se igualar aos demais). Um dos meus videozinhos favoritos do Youtube é uma pegadinha genial da TV japonesa que ilustra bem isso. Vou colocar aqui até pra me fazer sentir melhor diante dessa barbaridade, que tb me fez muito mal. http://www.youtube.com/watch?v=OYuMUTaLgEA.
Ah, e conclamo Renato Pompeu a opinar sobre isso.

sofia amaral disse...

nat, sem dúvida tem a ver com o comportamento das massas - eles nunca teriam essa atitude individulamente - mas a questão é: por que esse alvo e não outro? e por que esse alvo despertou tanta violência?

mari disse...

como eu disse no twitter, acho que tem mais dessa história que a gente não sabe e a menina já devia ser hostilizada antes. acho muito estranho que essa reação descabida tenha sido despertada por um episódio só, mas ao mesmo tempo já vi universitários quando juntos se comportarem como ogros antes, então não duvido de nada...

Renatão Pompeu disse...

Nat e Sof, creio que o que está acontecendo é uma fascistização da juventude, que não vê perspectivas de futuro pela frente, com a crise econômica mundial, e não crê também em soluções de esquerda, já que as esquerdas perderam o rumo após a queda do comunismo e praticamente não têm o que dizer à juventude. O fascismo oferece o caminho da exclusão do "outro" (sendo o outro odiado como concorrente a um espaço na sociedade) e o "outro", contra o qual os jovens podem se unir, podem ser quaisquer grupos sociais estigmatizados, como os judeus, os negros, os homossexuais, os estrangeiros e as mulheres que usam minissaia. Concordo com vocês que as pessoas em massa tendem a reagir com uma irracionalidade e violência que não demonstrariam se agissem como indivíduos isolados, mas essa é uma visão geral e cada caso concreto tem de ser avaliado segundo o que o desencadeou. No caso, no meio de jovens que não têm perspectivas de empregos acessíveis em futuro próximo, talvez uma mulher bonita de minissaia tenha muito mais chance do que a média de obter um emprego no ramo de turismo. Concordo também que é preciso apurar melhor a história, mas acho que o fulcro é esse da fascistização de uma juventude para a qual a esquerda não tem nada a dizer.
Abraços do Renato

Fabiana Cardoso | Canción Comunicação disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fabiana Cardoso | Canción Comunicação disse...

Vergonha, senti vergonha alheia. A maioria desses "universitários" sai da faculdade sem saber a diferença entre "a gente" e "agente". Dá até pra entender o motivo: eles não sabem escrever algo que não sabem o significado: não entendem o coletivo, não sabem o significado de um grupo, se acham a parte, poderosos, donos da razão.

J. C. David disse...

fica também outra questão, se realmente (acho que não é o caso) ela fosse Garota de programa, isso faria com que ela mereçe-se esse tipo de tratamento, então, quer dizer, que essas pessoas que a hostilizaram, são as mesmas, que, provavelmente, agridem travestis, prostitutas, etc, nas ruas.

Moriti disse...

Nossa, que coisa nojenta. Tinha ideia do quão eram grandes a mediocridade, a futilidade e até a imbecilidade de boa parte da classe universitária de hoje, mas percebi que a coisa sempre pode piorar.
Esse é o típico comportamento das massas acéfalas, símbolo do modelo atual de sociedade, que se deteriora progressivamente.
E pensar que tal fato ocorreu em um local que deveria ser um centro de pesquisas, um "espaço do pensar".
Ah, sim. Parabéns pelo texto, Sofia. Bela análise.

Militante disse...

já que as esquerdas perderam o rumo + a esquerda não tem nada a dizer = crise da direção (pt, psol e pstu - cut, une e mst - no Brasil)

Valter disse...

e a moça foi expulsa da faculdade... mais uma vez se fez a justiça do rei: manda prender a vítima!
valter

Anônimo disse...

Imagino quantas meninas dessa faculdade que fizeram parte desse linchamento não fazem programas e não se vendem para qualquer um que apareça com um maço de reais para satisfazerem seus desejos sexuais, quantas não fazem programa para pagar a faculdade e descontaram suas frustrações em cima do vestuário da moça.

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