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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Guitarrista do Skyrocket Love diz como é trabalhar nos EUA

Que viver de música no Brasil é um problema, a gente já sabe. Hoje, com raras exceções, qual artista vive de venda de material fonográfico? Estar no palco, fazer shows e grandes turnês é que pode garantir uma verba para estes profissionais que na maioria das vezes trabalham como freelancers, ou seja, não contam com nenhuma segurança ou estabilidade profissional.E se a coisa é tão complicada no Brasil, como é ser um brasileiro, músico e viver dessa profissão nos EUA?
Desta vez, “Penetra Oficial” resolveu conversar com o cearense Lucas Martins Guterres, de 25 anos, guitarrista que atualmente enfrenta a burocracia dos EUA para se estabilizar no país e na profissão.
Lucas é o único brasileiro da banda Skyrocket Love, que ele define como um pop/rock moderno estilo 30 Seconds To Mars, Muse e Coldplay.
Por Fabiana Cardoso dos Santos, jornalista e produtora

Você vive de música ou tem outra profissão nos EUA?
Lucas: Eu inicialmente vim pra estudar apenas, e agora estou vivendo apenas de música.

Com qual idade você se mudou de país? Por quê?
Lucas: Eu me mudei pros EUA em 2010, aos 24 anos. Vim pra estudar Engenharia de Áudio (apesar de ser guitarrista) pois sempre quis adquirir o conhecimento de estúdio, gravação, produção, etc.. Pra tentar de alguma forma adquirir mais conhecimento como músico. Estudei numa escola bastante reconhecida, e que recomendo demais pelas oportunidades profissionais que eles dão aos alunos. A quem possa interessar, a escola é o Musicians Institute em Hollywood/CA, e eles oferecem cursos de todos instrumentos, com duração de 3 meses até bacharelado.

Quais são as principais diferenças, vantagens e desvantagens de cada país?
Lucas: Acho que pra começar, depois de experimentar os dois lados, eu diria que músico no Brasil não é reconhecido como merece. Não que nos EUA seja, mas definitivamente o Brasil sendo um país naturalmente tão musical, as pessoas poucas vezes prestam atenção no que realmente tem qualidade ou em novas bandas, e sim no que são "forçadas" a gostar pela mídia. Uma vantagem no Brasil - na minha opinião - é a forma como as pessoas demonstram sentimento por música, talvez seja até algo cultural, não necessariamente uma desvantagem na América. E um ponto positivo nos EUA seria a forma como as pessoas estão dispostas a ouvir e conhecer novos artistas, o que definitivamente não acontece no Brasil.

Quanto às diferenças musicais, quais as principais?
Lucas: À primeira vista, acho que aqui (EUA) é conhecido como o país do rock, enquanto o Brasil como o país do samba. Pessoalmente, acho que o Brasil tem uma variedade musical maior, embora tudo que tem nos EUA, também tem no Brasil. Mas, nosso país leva vantagem nos extras, como samba, axe, forró, MPB, e por aí vai. Já no EUA o acesso à qualidade é mais fácil, por exemplo, o preço de equipamentos são mais baixos, consequentemente muitas vezes você consegue criar um bom produto com poucos recursos. Acho que o brasileiro, quando interessado, tem a oportunidade de trazer na bagagem uma cultura musical maior!

E sobre a abertura de mercado, como funciona?
Lucas: Como falei anteriormente, isso definitivamente é um fator positivo aqui nos EUA. Pra exemplificar: Em praticamente todas as casas de show de Hollywood você tem a chance de ver entre 3 a 4 bandas autorais por noite, de segunda a segunda. Não apenas nos finais de semana. Não significa que é mais fácil você conseguir um contrato com gravadora ou colocar sua banda no topo do mercado, mas com certeza é uma forma de poder mostrar seu trabalho.

Os músicos conseguem destaque em grandes eventos?
Lucas: Acho que isso acontece da mesma forma que no Brasil, através de um "relações-públicas". O segredo é qual você vai contratar. Naturalmente, levando em conta que os maiores eventos do entretenimento mundial acontecem aqui em Los Angeles, ter um agente que consiga te colocar nos eventos "classe A" vai de acordo com o quanto você, sua banda, ou gravadora está disposta a pagar. Nas semanas que antecedem eventos como Oscar e Grammy, a cidade ferve com festas promocionais todas as noites, e pra entrar nos eventos mais concorridos, às vezes só artistas com nomes estabelecidos no mercado, ou muito bem relacionados com os organizadores/patrocinadores.

E você já vivenciou o desespero das "sub-celebridades" tentando aparecer no show business?
Lucas: Isso é tão comum que assusta. Como eu sou avesso a certos tipos de badalação, mas muitas vezes tenho que ir por compromissos profissionais, eu geralmente assumo uma postura de observador em alguns eventos. E, talvez por ser tão constrangedor, acabo achando engraçado aqueles artistas que (literalmente) dão qualquer coisa pra dar uma entrevista; tirar uma foto com artista famoso; desfilar no tapete vermelho e fazer poses absurdas prós fotógrafos, que grande parte das vezes não fazem a menor idéia de quem é a pessoa; ou muitas vezes ficam pedindo quase que desesperadamente pro seu assessor conseguir uma entrevista, mas na hora de falar assumem aquela postura arrogante como se fossem superiores à todos em sua volta. Sabe a famosa vergonha alheia? É constante.

Como é o contato com os músicos internacionais?
Lucas: Conheço artistas quase que diariamente aqui, seja em shows, festas ou em estúdio. Mas nunca conheci nenhum dos meus grandes ídolos. E acho que prefiro assim. Muitas vezes você cria uma imagem de um músico que você acompanha a carreira há 10 anos, mas na verdade na vida pessoal ele é totalmente o oposto (risos). Por outro lado, já tive a chance de assistir shows de todos eles ao vivo, com exceção dos que já partiram. Alguns que já fui aos shows são: John Mayer, Keith Urban, Bon Jovi, Aerosmith, Eric Clapton, Jason Mraz, AC/DC, Paul McCartney, Elton John, e por aí vai. Dos que já foram com certeza Stevie Ray Vaughan é o principal deles!

Você sabia?
A Hollywood do cinema não é uma cidade, mas sim um distrito de Los Angeles, a maior cidade da Califórnia e segunda maior dos Estados Unidos. O local ganhou imensa notoriedade por conta da concentração de inúmeras empresas ligadas ao cinema, desde estúdios até empresas que trabalham com efeitos especiais, edição e outros serviços ligados à indústria.

Em quais casas importantes você já tocou nos EUA?
Lucas: Definitivamente é uma das experiências que eu agradeço ter vivido aqui. Você trabalha, trabalha, e quando se dá conta está tocando no mesmo palco que no passado seus ídolos tocaram. Whisky a Go Go é um desses lugares. Pequeno, estilo bem underground, sem nenhum tipo de luxo, mas cheio de história. Nos passado foi palco de várias bandas e artistas que se tornaram famosos, como Guns n' Roses, Jimi Hendrix, The Who, The Police, entre muitos outros. É um bom começo!

Como é trabalhar com grandes empresários e produtores. E com quais já trabalhou?
Lucas: Tive oportunidade de trabalhar com vários produtores e conhecer muitos outros. Luke Ebbin foi um dos que tive a oportunidade de trabalhar. Ele produziu o álbum Crush do Bon Jovi, que foi uma das primeiras bandas da qual virei admirador. Coincidência ou não, em um dos dias que estávamos no estúdio, ele nos mostrou - sem saber que eu era fã de carteirinha - uma música que tinha acabado de gravar com Richie Sambora como possível tema de um programa de televisão aqui nos EUA. A sensação de ouvir uma música inédita do seu ídolo antes de todo mundo foi interessante. Outro que sou muito grato por ter trabalho foi o Dan Korneff, que já trabalhou com bandas como Paramore e My Chemical Romance. Um talento absurdo e uma humildade rara de encontrar nesse meio!

E quais foram os maiores perrengues que passou, tanto no Brasil como nos EUA?
Lucas: Acho que todo músico, principalmente no início de carreira, passa por umas situações desagradáveis. Desde a forma como algumas vezes é tratado por um contratante, até contratempos no palco durante um show. Acontecem tanto os problemas técnicos, como um amplificador dar problema, como os fisiológicos, tipo ter dor de barriga no meio do show. E se já é difícil parar no meio do show, imagine em lugares que sequer há um banheiro decente! Acontece nas melhores e maiores bandas (risos).

Quais são as documentações necessárias para conseguir trabalhar de forma legal como músico nos EUA?
Lucas: A forma mais comum de conseguir trabalhar legalmente como músico nos EUA é com o visto de artista. Não é simples conseguir (estou passando por isso no momento), mas se você preencher os requisitos dá certo! Alguns dos itens principais requisitados são: um contrato nos EUA que prove que você vá trabalhar como músico e ser bem pago por isso; vasta publicidade como músico profissional no seu país de origem, comprovando que você é reconhecido pelo seu trabalho, antes de vir morar nos EUA. A lista é bem extensa, mas se você possui esses dois primeiros, já começou bem. E claro, o preço é bem salgado. Contando as taxas de aplicação e honorários de advogado, o processo inteiro custa em média U$4.500.

Você, como brasileiro, qual conselho dá para quem quer sair do país para trabalhar como músico?
Lucas: Acho que músico de verdade nunca escolhe essa profissão pelo dinheiro ou fama, e sim por amor. Mas claro, todo mundo tem contas pra pagar no final do mês! Pensando nisso, eu diria que vale a pena correr atrás do que você sonha, mas sempre com um projeto em mãos e um objetivo a ser alcançado. O famoso "american dream" não existe, se é que um dia existiu, então não adianta sair do Brasil pra um país de primeiro mundo, seja os EUA ou qualquer outro, achando que vai ser mais fácil. Talvez você seja mais bem recompensado financeiramente, mas vida de músico nunca vai ser fácil (risos). Mas sem dúvida é um grande passo pra adquirir experiência, conhecer novos músicos, e assim crescer profissionalmente.

Por fim, como você analisa sua vida como músico fora do Brasil?
Lucas: O fato de estar em Los Angeles me deu a oportunidade de conhecer e trabalhar com pessoas que sempre admirei, mas se engana quem pensa que a vida de músico nos EUA é mais fácil. Além das dificuldades burocráticas por ser de outro país, ainda existe o fato de aqui ter talvez 20 ou 30 vezes mais bandas que no Brasil, isso faz com que a concorrência seja muito maior. Mas, acho que o lugar de cada um de nós está guardado, só temos que correr atrás!

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