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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Direito de resposta

Kike,

Eu tinha jurado que não responderia mais a tuas mensagens, mas vou quebrar essa promessa porque me senti um pouco ofendida com a tua carta.

Primeiro que me pareceu bastante apelativo usar a nossa história de amor para tentar ganhar um concurso literário. Segundo, é uma carta recheada de mentira e lugares comuns. Com certeza você não vai conseguir nada com ela.

Essa comparação de que nossa historia foi como um acidente de avião me pareceu ridícula, desculpa dizer. Acidente de avião, ainda mais em pleno ar, é coisa muito rara. O nosso foi uma corriqueira batida de carro, um choque a pouca velocidade que resultou em feridos leves, nada mais do que isso.

Dizer que foi tudo um grande erro somado com azar… Você realmente acha isso?
O que você não percebe, ou faz de conta que, é que não há culpados, não há mocinho nem bandido nessa história e não há do que se arrepender. Simplesmente o que aconteceu foi que o amor acabou, Kike. Você sabe que isso acontece, todos sabemos que isso acontece. O amor acabou, mas antes disso vivemos momentos bonitos, fomos felizes e aprendemos muito, não é verdade? Você acha isso pouco?

Foi breve, mais foi intensa e prazerosa, pelo menos para mim. E quando deixou de ser eu tive a coragem, para meu bem e para o teu, de dizer que não queria mais.

Acha que foi fácil do lado de cá tudo isso? Acha que não doeu em mim também? Claro que eu penso em você às vezes e que às vezes sinto saudade. Mas tenho certeza que a minha decisão foi a melhor. Foi como tirar um peso de cima das costas, me senti leve. De repente eu não tinha mais que me preocupar com o que ia acontecer, se eu conseguiria mudar você ou se era eu quem tinha que me adaptar.

O amor não se alimenta só de ilusões, Kike, é preciso ter pelo menos um dos pés no chão. Acho que foi isso que aconteceu entre nós, você estava todo o tempo voando e eu tenho medo de altura. Era uma guerra em que eu tentava te puxar para baixo, enquanto você queria que eu voasse contigo. Eu sou medrosa, essa é a questão.

Preciso de alguém que fique aqui comigo, com os dois pés bem presos à terra; e você, Kike, você tem mais é que voar. Vai encontrar uma mulher com umas asas lindas e bem grandes e vocês serão felizes na imensidão do céu, enquanto eu vou estar aqui embaixo acenando para vocês, espero que na companhia de um covarde.

Fique bem. Eu te amo, você sabe disso, mas estou convencida que o amor não é suficiente.

Beijos,

Maía (tua pequena para sempre)

Ricardo Viel, jornalista, colunista do Purgatório e do NR, escreve às segundas, direto de Salamanca, Espanha.

Um comentário:

Anônimo disse...

"O amor não se alimenta só de ilusões, Kike, é preciso ter pelo menos um dos pés no chão. Acho que foi isso que aconteceu entre nós, você estava todo o tempo voando e eu tenho medo de altura."
Incrível como a história se repete. Estamos condenados eternamente à solidão?
Diego

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