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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

A recepção


por Celso Vicenzi*

 - Pode entrar, Marina, sinta-se como se a casa fosse sua... até uma rede mandei instalar!

- Eduardo, não me fale em rede, por favor. O tombo foi grande.

- Entre, não repare a bagunça. Não deu tempo de organizar uma festa, foi tudo tão de repente. Como a senhora disse que nenhum desses partidos a representava, já tínhamos perdido as esperanças.

- Pior pra mim, que perdi a rede. Tudo culpa dos cartórios.

- Mas, cá entre nós, a senhora não acha que também teve alguma culpa no cartório?

- Eu não, Eduardo. Sempre fui uma moça tímida, evangélica, casada na igreja. Apenas não tinha ainda conseguido arrumar um bom partido, mas aí, com jeitinho, você tocou no meu ponto fraco.

- E qual é?

- É derrotar a velha política deste país. Posso não ter conseguido fundar um partido – afinal, não é tarefa fácil; temos só 32! –, mas sinto-me preparada para governar o Brasil.

- Calma, Marina, vamos com calma. Sobre isso a gente conversa depois... deixe-me apresentar nossos companheiros. Este é Jorge Bornhausen, que trouxe também o filho (o neto ainda não tem idade hehehe!).

- Bornhau... Bornhausen? Que surpresa! Não sabia que você tinha se tornado socialista.

- É a política, Marina, sempre mudando. Mas sempre me interessei pelo Capital.

- O Capital, de Marx?

- Não, o meu capital. Como é enorme, eu costumo citá-lo em maiúscula, entende?

- Não muito, ainda... mas estou recém-chegando, não é, Eduardo?

- Exato, Marina, você verá que estamos levando a mensagem do socialismo a todas as pessoas. A começar pelos mais renitentes, que são justamente os capitalistas. Ah, este é Heráclito Fortes, que você conhece do Congresso.

- Heráclito? Você também aqui?

- Pois é, Marina, uma hora tô aqui, outra ali. É a minha trajetória, que começou na Arena, depois PMDB, depois PFL, depois o DEM e agora aqui no Partido Socialista Brasileiro, onde finalmente encontrei velhos companheiros.

- Mas e aquelas conversas reveladas pelo WikiLeaks, em que você sugeria ao governo norte-americano estimular a produção de armas no Brasil para conter supostas ameaças de Venezuela, Irã e Rússia?

- Justamente, precisamos conter o comunismo e estimular o socialismo ao estilo brasileiro, moreno, alto, bonito e elegante como Eduardo Campos. Você fez uma ótima opção, seja bem-vinda!

- Eduardo, e quem mais vai estar conosco nessa disputa eleitoral. Eu preciso saber. Tem colega que não posso ver nem pintado.

- Pintado, não, nunca. No máximo caiado. Estamos tentando trazer o Ronaldo Caiado, outro jovem com muito futuro no socialismo.

- Mas Eduardo, ele sempre votou contra o meio ambiente. Como é que fica o meu discurso?

- Ô Marina, é só fazer umas pequenas adaptações. Muda uma vírgula aqui, umas 30 páginas ali e pronto. Relaxa, Marina, o Caiado é aliado do PSB em Goiás e defende adesão integral do DEM ao projeto socialista.

- E você garante que esse projeto tem sustentabilidade? Sinto falta do apoio de uma rede...

Não se preocupe, a Rede Globo estará conosco! Somos o novo. E o que é novo é verde. Verde... meio ambiente..., viu, temos muito em comum. Se você me der licença, tenho uma reuniãozinha rápida com a bancada ruralista sobre o Código Florestal. Se quiser deitar na rede, fique à vontade!

* * * * *

*Celso Vicenzi, jornalista, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, com atuação em rádio, TV, jornal, revista e assessoria de imprensa. Prêmio Esso de Ciência e Tecnologia. Autor de “Gol é Orgasmo”, com ilustrações de Paulo Caruso, editora Unisul. Escreve humor no tuíter @celso_vicenzi. “Tantos anos como autodidata me transformaram nisso que hoje sou: um autoignorante!”. Mantém no NR a coluna Letras e Caracteres.

3 comentários:

Wagner Baggio disse...

Estou com inveja de tanta criatividade nos trocadilhos e tanta perspicácia nas ironias. Afinal, o PSB tem esse 'B' de biodiversidade ou de Bornhausen???, credo!

Emanuelle Torres disse...

Celso, como sempre, teu texto primoroso, sem contar o talento aguçado para envolver a seriedade com bom humor. "Ler" a política desta forma se torna até convidativo.

Mário Medaglia disse...

O B pode ser também da Bancada ruralista

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