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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Gim Argello e as histórias de faroeste em Brasília


O orçamento em ótimas mãos
Gim Argello do PDT-DF
Ganhou as manchetes dos jornais nos últimos dias o caso que envolve o senador Gim Argello, relator da comissão mista do orçamento para 2011. A acusação, feita depois de investigação do repórter do jornal O Estado de São Paulo, pelo excelente jornalista (com J maiúsculo) Leandro Colón, que foi meu veterano na faculdade, é de que Gim e mais uma meia dúzia de parlamentares do Centro-Oeste faziam emendas ao orçamento destinando verbas a eventos culturais, e depois mandavam ver no lobby com ministros para que entidades fantasmas deles próprios, registradas em nome de laranjas, recebessem a verba para organizar os supostos eventos. Até aqui, nada de novo do que já foi relatado pela imprensa toda. Então por que esse texto? Bem, em Brasília, há particularidades que são difíceis de entender para quem não convive, pelo menos um pouco, com essa realidade maluca daqui.

A questão da terra
Terra é poder. No Brasil, a história da disputa do poder é a história da disputa pela terra. Em Brasília, essa máxima chega a níveis exorbitantes, simplesmente porque terra, aqui, vale ouro, e o melhor negócio do mundo é ter uma construtora ou uma imobiliária em Brasília. Para se ter uma ideia, Águas Claras, uma cidade que há dez anos não existia, hoje já é enorme e continua em construção, sendo considerada o maior canteiro de obras da América Latina.

Carreira meteórica
Em 1998, Gim Argello era um talentosíssimo corretor de imóveis. Dizem que tinha um tino incrível para o ramo. Nesse ano, Gim se elegeu deputado distrital, e chegou a presidir a Assembleia Legislativa local. Foi então que ele, espertamente, aliou seu enorme talento ao poder que passou a ter.

Lotes
Já tratei nessa coluna, outras vezes, da questão do lote. Aqui, um pedaço de terra é praticamente uma medida corrente, como sal na Roma antiga ou arroz no Japão medieval. Pois bem, Gim se especializou no seguinte esquema: um laranja seu comprava um lote que era destinado para, digamos, construir uma creche. Como a cidade é planejada, cheia de regras, e tem toda essa coisa do lote e da terra, ali seria, de fato, construída uma creche. Mas ele, na Câmara, conseguia aprovar uma medida que transformava aquele lote, que ele comprou por R$ 200 mil, digamos, em um lote destinado à construção de um posto de gasolina.

Valorização
É claro que posto de gasolina é negócio muito mais lucrativo que creche. Então, aquele lote, comprado por R$ 200 mil, passava a valer R$ 2 milhões. Simples não? E posto de gasolina não foi exemplo. Seu laranja que comprava os lotes era ligado a uma grande empresa petrolífera – e hoje é dono de um dos jornais da cidade.

E ninguém via?
Via sim. Só que uma série de outros deputados também tinha interesse em mudar a destinação de um monte de lotes. Então eles se juntaram e começaram a mudar a destinação das terras para o que bem lhes conviesse. Gim ficou mais com essa parte dos postos de gasolina, que lhe rendeu uma boa grana, enquanto outros destinavam lotes para outras áreas. Até que, em uma legislação posterior, os deputados mudaram essa regra. Agora, só o poder executivo pode mudar a destinação de um lote.

Desproporcional
Uma das coisas que chamou a atenção da Justiça foi o fato de Gim Argello ter, hoje, patrimônio absolutamente incompatível com as funções e negócios que já teve. Não se deve pegar apenas o salário de deputado, porque no Brasil, em geral, deputado mantém uma série de outros negócios, e em geral legisla para garantir os melhores resultados do seu negócio, e tudo o mais. Mas mesmo assim. Sem nenhum alarde nem cobertura da imprensa que cobre o jet set local, diz-se que, recentemente, Gim Argello comemorou o fato de seu patrimônio pessoal ter chegado aos R$ 2 bilhões.

Deserto
Gim é só mais um personagem dessa terra que parece produzir, todos os dias, histórias de faroeste – não, não sou fã de Legião Urbana, apesar que, aqui, todo mundo gosta deles. É uma cidade cheia de caciques, de “otoridades”, de manda-chuvas com aura de mafiosos, que parecem achar que moram em Beverly Hills ou em Mônaco enquanto, ao mesmo tempo, podem usufruir de toda a permissividade da cultura do homem cordial.

Rodrigo Mendes de Almeida é jornalista, editor do Jornal da Comunidade em Brasília e colunista do NR.

Um comentário:

Anônimo disse...

Meu Deus do céu!
Como dói viver num mundo tão recheado de descalabros!
E é incrível a criatividade deles, não?

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