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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 18 de julho de 2011

A bióloga Lynn Margulis contesta teorias de Darwin

A bióloga Lynn Margulis, que foi mulher do astro científico Carl Sagan (fumavam muita erva juntos, admitiram) tem seu brilho próprio. Numa polêmica entrevista na última edição da revista Discover, Margulis desafia quase toda comunidade de biólogos, a começar pelo título: “Minhas ideias não são controvertidas. Eu estou certa”. Os errados, diz ela, são os neodarwinistas, geneticistas populacionais, pesquisadores da Aids e os biólogos em geral.

Margulis contesta as teorias da evolução darwiniana
O que ela está contestando é simplesmente qual seria o motor principal da evolução darwiniana. Segundo a escola clássica as novas espécies surgem por causa de pequenas mutações que vão acumulando e dando vantagens ambientais e competitivas para os sortudos que vencem na luta pela vida.

Margulis argumenta que as mutações não provocam o aparecimento de novas espécies mais adaptadas. Para ela o processo evolutivo é acionado por trocas simbióticas, uma idéia herética. Isso implica a transferência de material genético entre organismos, não apenas pelo cruzamento sexual.

Margulis tem cacife para defender uma hipótese tão revolucionária. Foi ela quem descobriu uma importante mudança genética que levou ao aparecimento das células eucariotas, aquelas que existem nas bactérias e nos animais complexos, como os humanos.

A descoberta foi publicada em 1967 no Journal of Theoretical Biology e amplamente comprovada.Segundo ela, numa hipótese agora aceita por toda a comunidade científica, algumas células procariotas, as mais primitivas, algum dia, há centenas de milhões de anos, seqüestraram uma organela livre, a aprisionaram num cativeiro dentro das células que acabaram virando as bem sucedidas eucariotas – a que temos em todo o organismo. Essa organela tinha uma grande vantagem de produzir energia química essencial para toda célula funcionar eficientemente, o ATP, (Adenosina Trifosfato).

O ATP é basicamente a “gasolina” de toda célula eucariota. A organela que produz o ATP, a mitocôndria, tem seu DNA próprio e independente fora do DNA das células e, curiosamente, só é transmitida ao feto pela parte materna.

Esse é um exemplo agora clássico de um passo fundamental da evolução ocorrido por ação simbiótica, ou de modo mais geral, pela chamada transferência genética horizontal entre espécies. Nessa simbiose a mitocôndria ganhou um meio ambiente favorável dentro das células eucariotas e em troca virou a fornecedora de combustível. Eventualmente perdeu grande parte dos seus genes por falta de uso, pois dentro das células eucariotas a mitocôndria não precisa se defender de uma vasta gama de predadores. Mas não pode mais voltar aos tempos de vida isolada.

Uma grande conseqüência da hipótese de Margulis é que os “reinos” da biologia ficam drasticamente reduzidos. Na biologia tradicional existem principalmente bactérias, fungos, plantas e animais. Para ela existem apenas dois reinos: o das bactérias e o resto.

A idéia de que as bactérias são a forma de vida dominante no planeta não é nova. Afinal os humanos e todos os animais complexos são amontoados de células que no fundo são bactérias que perderam a capacidade de vida isolada e independente.

O famoso biólogo Shetphen Jay Gould apoiava essa visão, e várias vezes argumentou contra uma ciência antropocêntrica, produzida pelos humanos, especialmente no seu livro Lance de Dados (332 páginas, Editora Record). A vida no planeta, argumenta ele, é predominantemente bacteriana e os organismos complexos são uma minoria irrisória, embora poderosa.

Como para dar razão a essas hipóteses, recentemente se descobriu que até mesmo nos seres humanos as células produzidas pelo DNA próprio da espécie estão em franca minoria. Recentes estudos  mostram que apenas 5% das células num corpo de animais complexos são geradas pelo material genético do genoma humano. O resto, 95%, é constituído de bactérias que coexistem pacificamente (às vezes nem tanto) dentro do corpo.

Um lado altamente positivo dessa hipótese é o de que os humanos devem também se preocupar com seu meio ambiente interno, constituído por enorme diversidade de micróbios. Afinal são as bactérias que povoam os intestinos, estômago, pele e pulmão as que produzem muitas das vitaminas que o organismo puramente humano não produz.

O assim chamado “bacterioma”pode eventualmente até alterar o funcionamento mental do ser onde estão hospedados. Assim como os humanos começam a tomar cuidados com o meio ambiente planetário, agora é a hora de se cuidar do meio ambiente interno ao organismo. Começando por restringir o uso indiscriminado de antibióticos, que matam bactérias vitais para os humanos e acabam abrindo espaço para mortais bactérias resistentes a todas as medicações.

Flávio de Carvalho Serpa é jornalista, especial para o NR

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