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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Que eu sou eu?

por Fernanda Pompeu*

Leitores consolidados sabem que o autor é diferente do narrador. Essa maravilha permite que uma escritora use a primeira pessoa de um personagem masculino e um poeta fale em nome de um eu feminino. Para ficar num exemplo doméstico, Chico Buarque se "fez" de mulher em Tatuagem, Atrás da Porta, Olhos nos Olhos.

Quando uso o eu - em poema ou prosa - não é necessariamente a Fernanda Andrade Pompeu, nascida no Rio de Janeiro, moradora de Sampa. O eu que escrevo pode ser a dona Laurinda que fumava cachimbo e passava as anáguas da minha avó. Pode ser meu pai com vinte anos ao fazer sua carteirinha no PCB.

Quem é leitor de boa data dirá: isso é óbvio! Mas esse óbvio não é tão cristalino para os novos leitores - particularmente os jovens que xeretam histórias em blogs. Observo pelos comentários postados que a maioria acredita que autora e narradora são uma única persona.

Talvez o Facebook e o Twitter contribuam para essa confusão. Uma vez que nas redes sociais a escrita é sempre em primeira pessoa, acompanhada de uma fotinho de cada eu. Curto, comento, compartilho, escrevo. Isso cria a ilusão de que o eu que escreve é o ego.

Longe de mim dizer que as pessoas usam a primeira pessoa para contar mentiras. Elas recorrem ao eu para contar uma parte da verdade. Ou a verdade daquele momento. Pois o eu é entidade líquida, mutante. É de um jeito às oito da manhã, de outro às treze horas.

O eu que escrevemos é um eu linguagem. Eu que mostra e que esconde. Que lembra e inventa. Que esquece. Um eu tentando editar a vida. Por que não? um eu louco para consertar o que sai errado. Um eu Pinóquio.

Qual eu - da galeria dos meus - escreve essa notinha? O eu bom? O eu ruim? O eu inteligente? O eu burro? O eu feminino? O eu masculino? O mascarado, ou sem máscara? Mais sincero dizer: o eu múltiplo. Meio fictício, meio realidade. Eu escrevinhadora.

*fernanda pompeu, webcronista do Yahoo e do Nota de Rodapé, escreve às quintas.

2 comentários:

Tito Glasser disse...

Olá Fernanda,

Realmente somos os grandes articuladores da linguagem neste mundo que o "Eu" nem sempre é visto como liberdade ou como dito por ti múltiplo.

Beijos e até breve.

Anônimo disse...

O eu literário é o eu outro!

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