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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Hora do almoço

por Thiago Domenici*

Não teve dúvidas. Apontou o dedo na cara do sujeito e gritou:

– Você roubou! Devolve!

O centro apinhado de gente e o calor dava àquela cena um ar cinematográfico. Ao meio-dia a rua 7 de abril é um corredor congestionado. Não se pode vacilar. É São Paulo, centrão, no universo chamado Praça da República.

– Devolve agora.

– Não peguei nada, não, dona!

A amiga agitada olhava no entorno a procura de alguma ajuda. A roda viva de curiosos se formou em segundos.

– Devolve essa porra logo seu filho da puta! – acusou um desconhecido.

O circo estava armado. Um senhor de cabelos brancos falou com o suspeito algo incompreensível. Ele concordou com a cabeça nervosamente. Estava rodeado. Se tentasse correr, toparia com um muro de gente. A situação não era confortável.

– Você já ligou para você mesma? – gritou um sujeito risonho.

A mulher pronunciou impropérios. A amiga – que desistira da polícia – sacou o telefone do bolso.  “Será?", pensei comigo. A acusadora revirou a bolsa.

– Não foge, não! – gritou a plenos pulmões para o suspeito imóvel.

O sujeito não iria fugir. Ele deu de ombros e esperou. Um telefone tocou longe. Claramente é música sertaneja. O celular era de capa rosa com penduricalhos de bichinhos. E estava no bolso interno do casaco.

Na mesma hora a turma entoou uma vaia avassaladora e a mulher, sem chão, sem desculpas, mas com o celular, saiu apressada com a amiga em direção ao metrô.

– Vai à merda sua vaca maluca – disse o suspeito indignado que ficou a berrar que deveria processá-la.

Testemunhas não iriam faltar. Meia dúzia a toa ria da bizarra situação. A confusão deve ter animado os papos na hora do almoço. Em segundos tudo voltou ao normal.

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Thiago Domenici, jornalista, editor e coordenador do NR

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