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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Eles, os decididos

Acreditasse eu no juízo final e já estaria sofrendo antecipadamente. Como não acredito, posso gritar aos quatro ventos: guardo dentro de mim a maioria dos (senão todos) pecados capitais. Digo isso porque decidi confessar hoje minha enorme inveja por uma classe de pessoas: os decididos.

Uma das minhas maiores fraquezas é a dúvida. Quer me ver nervoso e confuso pergunte-me qualquer coisa de bate-pronto, sem me preparar antes. Pode ser algo muito básico, como o CEP da minha casa, meu número de telefone ou em que ano me formei. Sentir-me-ei frente a um tribunal da Santa Inquisição e mesmo sabendo a resposta será difícil e sofrido dizê-la.

Digamos que eu, mesmo suando e tremendo, tenha conseguido responder e você ainda queira me torturar. Basta rebater: “tem certeza”?

Não, eu nunca tenho certeza. Podemos estar falando sobre um assunto que domino, que estudei, que li, que me interessa; de um lugar que conheço bem, de um episódio que vivi; podemos estar falando de algo íntimo meu. Se me perguntar se tenho certeza do que estou a dizer eu direi que não.

E é por conta disso que tenho tanta inveja dos decididos. Essa gente que fala a maior besteira do mundo com segurança tal que não deixa espaço para a dúvida. Não têm a menor ideia do que dizem, mas estão absolutamente seguros.

Gente capaz de me convencer de que estou errado, mesmo estando certo. Capaz de discorrer por horas sobre um assunto sem ter lido qualquer livro sobre o tema (ou sobre qualquer tema), de descrever detalhadamente um lugar sem nunca ter lá estado, de dar respostas definitivas sobre questões em que essa possibilidade nem existe.

Invejo essa gente que sempre sabe. Que nunca, jamais, titubeia ao ser questionado se tem certeza. Gente que desconhece as expressões “não sei”, “não saberia responder”, “não me sinto preparado para falar sobre esse assunto”, “vou checar e depois te digo”.

Invejo os decididos, mas se me perguntarem se tenho certeza do que acabo de escrever obviamente responderei que não.

Ricardo Viel, jornalista, escreve às segundas, de Salamanca, Espanha

Um comentário:

Anônimo disse...

Pois é Ricardo. Houve um tempo que invejava mais os decididos. Confesso que até hoje, dependendo do assunto entra aquele sentimento de: "como conseguem afirmar tanto?" Mas percebi, com o tempo e muitas respostas inacabadas, que ser crítico e se questionar é muito bom, e anda em falta no mercado. Então, parabéns por ser indeciso e se questionar sempre.

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