Frank Jacobs faz mapas. Mapas que até a editora Penguin já publicou em uma antologia. Nada convencionais, variando do real ao fictício, os mapas de Jacobs podem ser vistos no blog que ele mantém desde 2006, Strange Maps.
São mais de 500 mapas disponíveis – e são bons! Selecionei um, muito interessante, que publico abaixo.
Nele, Jacobs faz “reflexões sobre a América do Sul”. Só que do ponto de vista dos EUA. Ele diz. “Segundo a maioria dos meios de comunicação dos EUA, o Brasil é um traidor porque Lula se atreveu a apertar a mão de Ahmadinejad, Evo Morales é um idiota comunista, a Argentina joga difícil e Chávez ... ele é Belzebu com uma máscara de ritual indígena.”
terça-feira, 30 de novembro de 2010
Aos blogueiros, o novo que a velha (mídia) não gostou
Se dúvida houvesse quanto ao fato de se afirmar que existe uma velha e uma nova mídia no Brasil, sendo esta pautada pela procura da responsabilidade na informação e aquela cada vez mais afundada em compromissos corporativistas, distante, pois, dessa responsabilidade, a entrevista concedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a blogueiros teve – entre outros méritos – o de provar a verdade desse contraste.
Destituída de maiores formalidades, bem organizada, democrática quanto a participação de cada um dos entrevistadores, solta, sem jogos de vaidade por parte dos jornalistas presentes, a entrevista mostrou um presidente bem humorado, falando abertamente aquilo que era possível falar, conforme suas próprias palavras, e sem fugir a alguns questionamentos mais delicados, mas feitos num ambiente de respeito por alguém que, injustamente, sofreu um verdadeiro linchamento da velha mídia por oito anos seguidos.
Ao contrário de analistas e jornalistas da velha mídia (que vai se mostrando cada vez mais velha, diga-se), os blogueiros presentes, onze representantes - e são muitos mais em toda blogosfera brasileira - de um estilo de jornalismo abandonado por seus pares de jornalões, revistões e televisões, tiveram a sensibilidade de entender aquele momento que viviam e construíam.
Diplomacia e bom humor
Momento histórico, já disseram muitos, porque em duas horas de transmissão, cada pergunta e cada resposta percorriam o simples caminho do diálogo entre pessoas que sabem ouvir, mesmo quanto a resposta do entrevistado era passível de uma réplica ou de contestação.
Toda a entrevista falou de um Brasil novo, que quer mudar, apesar dos enormes entraves ainda existentes. Com diplomacia e bom humor, o presidente Lula botava o dedo na ferida de várias mazelas ainda a serem enfrentadas não só pelo poder executivo, mas principalmente nos gargalos conservadores do legislativo e do judiciário. Sempre com o cuidado de dizer que determinadas mudanças só acontecerão quando a sociedade se conscientizar de que esta ou aquela mudança será necessária, como a Reforma Política, por exemplo. Disse mesmo que começaria a lutar por ela já no dia 02 de janeiro próximo dentro do seu próprio partido.
Uma entrevista que, mesmo discutindo problemas do presente e de nosso passado recente, projetava uma nação para o futuro, numa dialética que só é possível quando se faz entre pessoas cujo interesse é buscar soluções para um determinado número de problemas, de soluções para o país. E não só acuar, difamar, procurar os problemas sem indicar soluções que sejam compatíveis com a realidade que se vive no Brasil e no mundo.
Porque é assim que trabalha a velha mídia: desconstrói e achincalha, sem direito a defesa, sem o contraditório, desde que o governo ou a autoridade achincalhada e difamada em âmbito municipal, estadual e federal não dance conforme a música de seus interesses corporativos, conservadores e antinacionais.
Não é difícil mostrar a diferença de prática jornalística a partir da entrevista do presidente aos blogueiros. Vou usar aqui um exemplo que aprendi com o dramaturgo e professor de dramaturgia, meu velho amigo Chico de Assis, um dos formadores do histórico CPC da UNE nos anos 60. Em suas aulas, para tornar claro algum exemplo do tema que abordava, costumava usar uma técnica que era a de “raciocinar pelo absurdo”, isto é, você exagera uma determinada situação até o imponderável ou absurdo e, pela oposição a ela, você é capaz de compreender melhor o tema (no caso uma ação dramática) estudado.
A diferença
Vamos usar a técnica aqui e, raciocinando pelo absurdo, imaginemos que naquela mesma situação e naquele mesmo cenário o presidente Lula contasse com a presença de jornalistas como Myriam Leitão, Reinaldo Azevedo, Augusto Nunes, Eliana Catanhêde, Diogo Mainardi, Arnaldo Jabor, Clóvis Rossi, Merval Pereira, Lucia Hippolito e outros menos votados...
Começaram a perceber a diferença? Para além da empáfia e do preconceito disfarçado por teorias acadêmicas mal assimiladas, aquele ar de quem sabe tudo sobre todas as coisas, do torresmo aos Diálogos de Platão, do álbum de figurinhas às teorias de Stephen Hawking. A vaidade e o autoelogio se digladiando contra a ignorância do presidente semianalfabeto, a Casa Grande contra a senzala, o passado contra o presente (e o futuro), tal grupo de jornalistas aproveitaria a oportunidade para expor a verdade incontestável de seus argumentos, irretorquíveis, próximos à infalibilidade papal.
- Íntegra da entrevista de Lula aos blogueiros
O ranço e o verniz de uma autointitulada elite, digamos intelectual, em confronto com a linguagem mais popular do presidente, mais acessível ao cidadão comum, tão bem entendida por este, que foi capaz de lhe dar mais de 80% de popularidade em final de mandato e fazer de Dilma Roussef a nova presidente do Brasil.
O exemplo é até mais do que absurdo, mas escancara para quem acompanha o que se passa no país nesse momento a inequívoca diferença entre um jornalismo envolto em teias de aranha e naftalina e o nascimento de uma alternativa mais democrática, que respeita a inteligência do cidadão brasileiro, tendo na internet um novo e vigoroso meio de informação com responsabilidade. De tal maneira isso é verdade, que a velha mídia tentou ridicularizar o acontecimento, numa demonstração infantil de que não tem argumentos convincentes para se opor ao novo.
Nesse aspecto, as perspectivas para 2011 são promissoras. A herança bendita que o presidente Lula deixa à sua sucessora traz para ela, entre outras, a responsabilidade de efetivar, na prática, a democratização da informação no Brasil. Por aí se amplia o espaço de discussão de temas relevantes no aprofundamento e na garantia de conquistas e avanços que vão ajudar na superação de mazelas há quase cinco séculos introjetadas pela sociedade brasileira. A primeira delas é a de que um povo que estuda, tem emprego e comida na mesa, capaz de pensar melhor e combater a elite do atraso.
Izaías Almada é escritor e dramaturgo, colunista do Nota de Rodapé e do Escrevinhador.
Lula e os blogueiros na entrevista em novembro de 2010 |
Ao contrário de analistas e jornalistas da velha mídia (que vai se mostrando cada vez mais velha, diga-se), os blogueiros presentes, onze representantes - e são muitos mais em toda blogosfera brasileira - de um estilo de jornalismo abandonado por seus pares de jornalões, revistões e televisões, tiveram a sensibilidade de entender aquele momento que viviam e construíam.
Diplomacia e bom humor
Momento histórico, já disseram muitos, porque em duas horas de transmissão, cada pergunta e cada resposta percorriam o simples caminho do diálogo entre pessoas que sabem ouvir, mesmo quanto a resposta do entrevistado era passível de uma réplica ou de contestação.
Toda a entrevista falou de um Brasil novo, que quer mudar, apesar dos enormes entraves ainda existentes. Com diplomacia e bom humor, o presidente Lula botava o dedo na ferida de várias mazelas ainda a serem enfrentadas não só pelo poder executivo, mas principalmente nos gargalos conservadores do legislativo e do judiciário. Sempre com o cuidado de dizer que determinadas mudanças só acontecerão quando a sociedade se conscientizar de que esta ou aquela mudança será necessária, como a Reforma Política, por exemplo. Disse mesmo que começaria a lutar por ela já no dia 02 de janeiro próximo dentro do seu próprio partido.
Uma entrevista que, mesmo discutindo problemas do presente e de nosso passado recente, projetava uma nação para o futuro, numa dialética que só é possível quando se faz entre pessoas cujo interesse é buscar soluções para um determinado número de problemas, de soluções para o país. E não só acuar, difamar, procurar os problemas sem indicar soluções que sejam compatíveis com a realidade que se vive no Brasil e no mundo.
Porque é assim que trabalha a velha mídia: desconstrói e achincalha, sem direito a defesa, sem o contraditório, desde que o governo ou a autoridade achincalhada e difamada em âmbito municipal, estadual e federal não dance conforme a música de seus interesses corporativos, conservadores e antinacionais.
Não é difícil mostrar a diferença de prática jornalística a partir da entrevista do presidente aos blogueiros. Vou usar aqui um exemplo que aprendi com o dramaturgo e professor de dramaturgia, meu velho amigo Chico de Assis, um dos formadores do histórico CPC da UNE nos anos 60. Em suas aulas, para tornar claro algum exemplo do tema que abordava, costumava usar uma técnica que era a de “raciocinar pelo absurdo”, isto é, você exagera uma determinada situação até o imponderável ou absurdo e, pela oposição a ela, você é capaz de compreender melhor o tema (no caso uma ação dramática) estudado.
A diferença
Vamos usar a técnica aqui e, raciocinando pelo absurdo, imaginemos que naquela mesma situação e naquele mesmo cenário o presidente Lula contasse com a presença de jornalistas como Myriam Leitão, Reinaldo Azevedo, Augusto Nunes, Eliana Catanhêde, Diogo Mainardi, Arnaldo Jabor, Clóvis Rossi, Merval Pereira, Lucia Hippolito e outros menos votados...
Começaram a perceber a diferença? Para além da empáfia e do preconceito disfarçado por teorias acadêmicas mal assimiladas, aquele ar de quem sabe tudo sobre todas as coisas, do torresmo aos Diálogos de Platão, do álbum de figurinhas às teorias de Stephen Hawking. A vaidade e o autoelogio se digladiando contra a ignorância do presidente semianalfabeto, a Casa Grande contra a senzala, o passado contra o presente (e o futuro), tal grupo de jornalistas aproveitaria a oportunidade para expor a verdade incontestável de seus argumentos, irretorquíveis, próximos à infalibilidade papal.
- Íntegra da entrevista de Lula aos blogueiros
O ranço e o verniz de uma autointitulada elite, digamos intelectual, em confronto com a linguagem mais popular do presidente, mais acessível ao cidadão comum, tão bem entendida por este, que foi capaz de lhe dar mais de 80% de popularidade em final de mandato e fazer de Dilma Roussef a nova presidente do Brasil.
O exemplo é até mais do que absurdo, mas escancara para quem acompanha o que se passa no país nesse momento a inequívoca diferença entre um jornalismo envolto em teias de aranha e naftalina e o nascimento de uma alternativa mais democrática, que respeita a inteligência do cidadão brasileiro, tendo na internet um novo e vigoroso meio de informação com responsabilidade. De tal maneira isso é verdade, que a velha mídia tentou ridicularizar o acontecimento, numa demonstração infantil de que não tem argumentos convincentes para se opor ao novo.
Nesse aspecto, as perspectivas para 2011 são promissoras. A herança bendita que o presidente Lula deixa à sua sucessora traz para ela, entre outras, a responsabilidade de efetivar, na prática, a democratização da informação no Brasil. Por aí se amplia o espaço de discussão de temas relevantes no aprofundamento e na garantia de conquistas e avanços que vão ajudar na superação de mazelas há quase cinco séculos introjetadas pela sociedade brasileira. A primeira delas é a de que um povo que estuda, tem emprego e comida na mesa, capaz de pensar melhor e combater a elite do atraso.
Izaías Almada é escritor e dramaturgo, colunista do Nota de Rodapé e do Escrevinhador.
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segunda-feira, 29 de novembro de 2010
Wikileaks em “primeira mão” ao público brasileiro
O site Wikileaks, que escarafuncha os segredos militares dos EUA, agora tem uma versão para o público brasileiro que já está no ar. Entre as informações recentes, assinadas no texto da repórter Natalia Viana, o relato de um telegrama do ex-embaixador americano no Brasil, Clifford Sobel, que acusa a Polícia Federal (PF) brasileira de encobrir investigações sobre a atuação de terroristas no país. Outros documentos dizem que o governo brasileiro está preocupado com o avanço de organizações terroristas, principalmente com a aproximação dos Jogos Olímpicos, em 2016.
Segundo o site, "Ontem, dia 28 de novembro de 2010, o WikiLeaks começou a publicar o maior vazamento de documentos confidenciais da história. São telegramas enviados pelos diplomatas de diversas embaixadas pelo mundo para Washington ou do Departamento de Estado para as representações americanas. Eles mostram ordens expedidas aos consulados e embaixadas, a inteligência pedida pelo Departamento de Estado e o que os diplomatas descobrem a respeito de cada lugar, além de relatos detalhados de encontros com membros dos governos - e a verdadeira opinião dos americanos a respeito de cada um deles. São 261.276.536 palavras que cobrem um grande período da história moderna – de 28 de dezembro de 1966 a 28 de fevereiro de 2010.", explica o texto (na íntegra). No caso brasileiro, são 2.855 documentos no total, sendo 1.947 da embaixada em Brasília, 12 do Consulado em Recife, 119 no Rio de Janeiro e 777 em São Paulo.
- Por dentro do Wikileaks: a democracia passa pela transparência radical (Natalia Viana, no Opera Mundi)
Segundo Natalia Viana explicou ao Nota de Rodapé, o Wikileaks convidou alguns jornalistas investigativos independentes para colaborar com eles escrevendo reportagens a respeito de seus países e regiões. “Eu estou fazendo a parte do Brasil. Tem sido muito intenso e incrível”, conta Natalia. “A preocupação do site é poder trazer em primeira mão para o público brasileiro, em uma comunicação direta, o que os documentos contêm”, afirmou. Nessa primeira semana todo dia pela manhã novas matérias sobre o Brasil em português. Os textos podem ser acessados AQUI.
Thiago Domenici, jornalista
Julian Assange, fundador do Wikileaks |
- Por dentro do Wikileaks: a democracia passa pela transparência radical (Natalia Viana, no Opera Mundi)
Segundo Natalia Viana explicou ao Nota de Rodapé, o Wikileaks convidou alguns jornalistas investigativos independentes para colaborar com eles escrevendo reportagens a respeito de seus países e regiões. “Eu estou fazendo a parte do Brasil. Tem sido muito intenso e incrível”, conta Natalia. “A preocupação do site é poder trazer em primeira mão para o público brasileiro, em uma comunicação direta, o que os documentos contêm”, afirmou. Nessa primeira semana todo dia pela manhã novas matérias sobre o Brasil em português. Os textos podem ser acessados AQUI.
Thiago Domenici, jornalista
Rima Pobre, Fernando Carvall
Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista para o Nota de Rodapé. Conheça também seu blog: ONG PI.
domingo, 28 de novembro de 2010
Promoção Solo Lounge Beatles e Chico, os vencedores
Ganhadores dos Cd Solo Lounge do Chico Buarque e Beatles da @gravadoramcd.
Aos que concorreram pelo twitter, Parabéns para:
@carminha_2012 Ganhou do Chico Buarque CONFIRMADO
@evellincaa Ganhou dos Beatles CONFIRMADO
Nos cadastrados no boletim e aos que deixaram comentários na postagem da promoção e-mails vencedores são:
eric.s.oliveira@hotmail.com Ganhou do Chico Buarque CONFIRMADO
renato.zanarolli@ig.com.br Ganhou dos Beatles NÃO CONFIRMOU.
Novo sorteado no lugar:
Andrea Magri
Os vencedores tem até terça-feira para escrever para contato@notaderodape.com.br com endereço e nome completo. Obrigado a todos pela participação em mais uma promoção! Em breve, tem mais!
Thiago Domenici, coordenador e editor do NR
Aos que concorreram pelo twitter, Parabéns para:
@carminha_2012 Ganhou do Chico Buarque CONFIRMADO
@evellincaa Ganhou dos Beatles CONFIRMADO
Nos cadastrados no boletim e aos que deixaram comentários na postagem da promoção e-mails vencedores são:
eric.s.oliveira@hotmail.com Ganhou do Chico Buarque CONFIRMADO
renato.zanarolli@ig.com.br Ganhou dos Beatles NÃO CONFIRMOU.
Novo sorteado no lugar:
Andrea Magri
Os vencedores tem até terça-feira para escrever para contato@notaderodape.com.br com endereço e nome completo. Obrigado a todos pela participação em mais uma promoção! Em breve, tem mais!
Thiago Domenici, coordenador e editor do NR
Igreja da Penha no RJ
Caco Bressane, arquiteto e ilustrador paulistano, na ilustração da semana para o Nota de Rodapé: "Igreja da Penha". A Igreja da Penha, 1728, sempre foi um marco na paisagem carioca e estava, pelo ótimo ponto de observação e controle que é, tomada pelo tráfico.
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
O Rio de Janeiro menos lindo
A enxurrada de informações sobre a crise da Segurança Pública no Rio de Janeiro confunde a cabeça de qualquer um. Fiz aqui uma linkagem de alguns textos que julgo importantes para a leitura e melhor compreensão dos acontecimentos - são reflexivos, de entrevistas a artigos. Um compêndio que pode - ou não - ajudar a formar opinião. Se tiverem sugestões, me escrevam: contato@notaderodape.com.br
- O desespero de Marcinho VP é revelado em grampo telefônico
- Freixo: segurança pública reforça criminalização da pobreza
- Troca de elite, mas os inimigos ainda são os mesmos!
- O risco dos tanques
- A crise no Rio e o pastiche midiático
- UPPs bloqueiam cadeia do tráfico, afirma sociólogo
- Após ocupação da Vila Cruzeiro, Paulo Lins prevê chacina no Complexo do Alemão no RJ
- Desde domingo, ao menos 38 morreram e quase 200 foram presos no Rio
- A suposta carta de união entre os traficantes da ADA e Comando Vermelho
- Líder comunitária teme 'efeito colateral' da repressão no Rio
- Rio de Janeiro. Primeira onda de ataques do crime organizado já atingiu finalidade. Tendência é submergir para voltar a surpreender
- Tem um artigo interessante no Estadão (só para assinantes) da Edna Del Pomo intitulado: "A sociedade deu carta branca para a polícia?". E sobre as Milícias, matéria publicada na Retrato do Brasil, publicada aqui na íntegra.
- O desespero de Marcinho VP é revelado em grampo telefônico
- Freixo: segurança pública reforça criminalização da pobreza
- Troca de elite, mas os inimigos ainda são os mesmos!
- O risco dos tanques
- A crise no Rio e o pastiche midiático
- UPPs bloqueiam cadeia do tráfico, afirma sociólogo
- Após ocupação da Vila Cruzeiro, Paulo Lins prevê chacina no Complexo do Alemão no RJ
- Desde domingo, ao menos 38 morreram e quase 200 foram presos no Rio
- A suposta carta de união entre os traficantes da ADA e Comando Vermelho
- Líder comunitária teme 'efeito colateral' da repressão no Rio
- Rio de Janeiro. Primeira onda de ataques do crime organizado já atingiu finalidade. Tendência é submergir para voltar a surpreender
- Tem um artigo interessante no Estadão (só para assinantes) da Edna Del Pomo intitulado: "A sociedade deu carta branca para a polícia?". E sobre as Milícias, matéria publicada na Retrato do Brasil, publicada aqui na íntegra.
Íntegra da entrevista de Lula aos blogueiros
A primeira entrevista concedida por um presidente da república, numa espécie de coletiva de imprensa, nesta semana. Entre tantos assuntos abordados, falou da regulamentação da mídia, do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos, da abertura dos arquivos da ditadura, entre outros assuntos. Ao final da entrevista Lula declarou que pretende tirar a limpo a mal contada história do mensalão, assim que deixar a Presidência da República, além de ser blogueiro e tuiteiro.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Retrospectivas: escolha o texto piegas que será dispensado aos mineiros chilenos
Dezembro trará consigo as retrospectivas na televisão. Via de regra, textos dinâmicos recheados de lugares-comuns farão conexões improváveis entre os fatos, numa torrente de informações que destina 15 segundos a cada tema.
Os assuntos considerados importantes ganham 30 segundos. Como me cabe no Nota de Rodapé falar também de América Latina, seguramente o resgate dos mineiros chilenos figurará entre estes temas. Vale se antecipar, ludicamente, sobre qual a característica coletiva que será mais exaltada no texto piegas destinado a este reality show mais reality do que se poderia desejar. Quem quiser arriscar um palpite, que fique à vontade:
1. Solidariedade (“A solidariedade foi a chave para que os mineiros chilenos sobrevivessem às dificuldades 600 metros abaixo do solo”);
2. Coragem (“Os mineiros chilenos foram uma prova de que a coragem vence as barreiras mais difíceis, como a vida durante mais de um mês em um buraco 600 metros abaixo do solo”);
3. Superação (“A superação dos mineiros chilenos foi uma inspiração para o mundo todo, que acompanhou atônito, em silêncio, a um resgate dramático");
4. Persistência (“Durante mais de 30 dias, os mineiros chilenos deram uma aula de persistência, sobrevivendo com pouca água e pouca comida às terríveis dificuldades).
Por último, alguém se lembrará que, antes de heróis, os mineiros chilenos são vítimas de uma legislação trabalhista flexibilizada pelo ideário neoliberal? Terá, alguma das retrospectivas, a preocupação em mostrar o estado atual dos mineiros, alguns com problemas psicológicos decorrentes da vida no buraco e da superexposição a que foram submetidos após a saída?
João Peres é jornalista, colunista do NR e repórter da Rede Brasil Atual
Os assuntos considerados importantes ganham 30 segundos. Como me cabe no Nota de Rodapé falar também de América Latina, seguramente o resgate dos mineiros chilenos figurará entre estes temas. Vale se antecipar, ludicamente, sobre qual a característica coletiva que será mais exaltada no texto piegas destinado a este reality show mais reality do que se poderia desejar. Quem quiser arriscar um palpite, que fique à vontade:
1. Solidariedade (“A solidariedade foi a chave para que os mineiros chilenos sobrevivessem às dificuldades 600 metros abaixo do solo”);
2. Coragem (“Os mineiros chilenos foram uma prova de que a coragem vence as barreiras mais difíceis, como a vida durante mais de um mês em um buraco 600 metros abaixo do solo”);
3. Superação (“A superação dos mineiros chilenos foi uma inspiração para o mundo todo, que acompanhou atônito, em silêncio, a um resgate dramático");
4. Persistência (“Durante mais de 30 dias, os mineiros chilenos deram uma aula de persistência, sobrevivendo com pouca água e pouca comida às terríveis dificuldades).
Por último, alguém se lembrará que, antes de heróis, os mineiros chilenos são vítimas de uma legislação trabalhista flexibilizada pelo ideário neoliberal? Terá, alguma das retrospectivas, a preocupação em mostrar o estado atual dos mineiros, alguns com problemas psicológicos decorrentes da vida no buraco e da superexposição a que foram submetidos após a saída?
João Peres é jornalista, colunista do NR e repórter da Rede Brasil Atual
terça-feira, 23 de novembro de 2010
A mídia independente depois das eleições
Foi bastante compreensiva, para não dizer providencial, a postura combativa dos meios de comunicação alternativos durante o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras. Muitas revistas e jornais de pequena circulação, blogues e iniciativas digitais, como o 48hdemocracia, simplesmente não titubearam em vestir a camisa de Dilma Rousseff. O objetivo era claro: defender a candidata do PT contra as investidas da campanha de José Serra e as manipulações da chamada grande imprensa – para muitos, favorável ao tucano.
Pudera. Menos de um mês depois da apuração, virou clichê dizer que o processo eleitoral de 2010 ficará marcado como um dos mais pobres em discussões e ideias desde a redemocratização. A disputa pela sucessão de Luiz Inácio Lula da Silva talvez tenha sido o ponto álgido do marketing político e do oportunismo eleitoreiro. Nunca se viu marqueteiros tão poderosos a ponto de dobrar convicções ideológicas e apequená-las diante da sanha pelo poder e da caça indiscriminada de votos. Até quem nunca tinha ido à igreja ajoelhou-se e rezou para os padroeiros da opinião pública.
Na tevê, no rádio e sobretudo na internet, a campanha demo-tucana e seus apoiadores (voluntários ou não) preferiram apelar para os mais profundos preconceitos da sociedade brasileira como estratégia para angariar, através do medo, um apoio popular que nunca tiveram e reverter, pela pobreza do discurso moralista, o resultado das pesquisas, que vinham anunciando mais uma vitória do petismo.
A tática foi bastante parecida com a estratégia derrotada de 2002. Faltou apenas colocar uma estrela de novela confessando seu temor eleitoral diante das câmeras. Desta vez, porém, o PSDB resolveu ir mais fundo em seu conservadorismo e pedir socorro aos representantes de Jesus Cristo na Terra.
Todos nos lembraremos – e não devemos nos esquecer jamais – que José Serra convocou para a batalha das urnas o apoio dos setores mais retrógrados do país e pactuou com as alas extremistas tanto da igreja católica como das evangélicas. Apesar de autoelogiar seu desempenho como ministro da Saúde, o candidato aliou-se com gente que desconsidera a epidemia de aids que paira pelo mundo, a importância social do planejamento familiar e que, ainda hoje, se presta a fazer campanha contra o uso de preservativos.
José Serra praticou deliberadamente o obscurantismo em torno de temas tão polêmicos quanto importantes para o bem-estar da população, como é o caso do aborto e da união civil de homossexuais, aferrando-se ao medievalismo cristão para angariar votos entre os poucos fiéis que ainda fazem o que o padre diz. Também manipulou o papel histórico desempenhado pela resistência armada durante a ditadura militar. Sua guerrilha digital vestiu Dilma Rousseff de verde oliva e impôs-lhe um charutão a la Fidel Castro entre os dentes.
No auge da empulhação, o tucano simulou uma agressão física que nunca existiu. Tanto que sua calva seguiu lustrosa e radiante durante toda a passeata que realizou no Rio de Janeiro. A bolinha de papel pode ter doído no brio, mas não lhe feriu a cabeça.
Por fim, é digno de nota – e despreço – o renascimento da xenofobia no Brasil. Desta vez o bairrismo paulista e o ódio contra nordestinos transcendeu os ambientes privados e escapou pelo twitter. É certo que a onda de manifestações preconceituosas foi desencadeada pelas declarações de José Serra e seus asseclas, que endossaram a tese de que as eleições dividiram o país entre indivíduos pobres e incapacitados, que moram no Nordeste e votam em Dilma, versus cidadãos conscientes, que habitam as regiões mais prósperas e apertaram 45 para presidente.
Lá como cá
Muitas análises compararam a postura anti-argumentativa e preconceituosa da Coligação Brasil Pode Mais (PSDB, DEM, PPS) ao discurso revisionista do Tea Party, a grande sensação política do momento nos Estados Unidos. Nitidamente, a principal semelhança entre um e outro é a opção por fugir do debate sério e aprofundado, livre de lugares-comuns, sobre as questões mais prementes para o futuro do país.
O movimento Tea Party surgiu na esteira da vitória de Barack Hussein Obama, em 2008. A musa do movimento, Sarah Palin, foi então candidata a vice na chapa derrotada, encabeçada por John McCain. Ambos pertencem ao Partido Republicano, e foi exatamente entre seus membros que se acomodou o Tea Party. No seio conservador da América, não precisou de muito esforço para crescer. Afinal, um objetivo comum unificou os interesses da direita ianque: derrocar o primeiro negro a assumir a Casa Branca, que, não bastasse a cor da pele, ainda tem sobrenome árabe.
Na mesma semana em que o Brasil escolhia seu próximo chefe-de-estado, os estadunidenses eram chamados a definir a composição da Câmara e do Senado para os próximos quatro anos. E as eleições legislativas impuseram uma profunda derrota ao governo democrata. Mais que um mero fracasso político de Barack Obama, o evento significou o maior fiasco de um presidente em influenciar a composição do parlamento desde 1938. Os democratas perderam a maioria entre os deputados, que haviam conseguido durante a administração George W. Bush, e viram sua vantagem minguar a um empate técnico entre os senadores.
A estratégia dos republicanos, capitaneados pelo Tea Party, foi bastante clara. Acusaram o presidente de ser um marxista empedernido, de praticar secretamente o Islã, de querer aumentar o poder e a influência do estado na vida dos cidadãos e de internalizar valores tribais herdados de seus antepassados quenianos. Para a direita, Barack Obama não está imbuído dos princípios americanos.
O Tea Party abominou a reforma democrata no sistema de saúde e rechaçou o pacote econômico lançado pela Casa Branca para aliviar os efeitos da crise no país. Aliás, num enorme esforço de desinformação, a ala mais conservadora dos conservadores estadunidenses atribuiu ao presidente toda a responsabilidade pela recessão – senão pelas suas causas, pelo fracasso em paliar suas consequências.
Na terra do Tio Sam, portanto, o Tea Party já conseguiu colher expressivos resultados eleitorais e ninguém duvida que sua retórica tresloucada imporá novas derrotas políticas ao governo democrata. Com a guinada republicana e a ascensão dos radicais de direita, Barack Obama ficou engessado na presidência.
A reforma no sistema de saúde corre o risco de morrer de inanição pelo boicote anunciado à assignação de recursos. E a política externa obamista, que tem buscado mais diálogo do que Washington estava acostumado e que rendeu ao presidente um prematuro prêmio Nobel da Paz, pode voltar a adotar o bordão “nós ganhamos, eles perdem”.
O esperançoso bordão Yes We Can, que uniu forças progressistas em torno da figura de Obama e de suas promessas de mudança, fatalmente se transformará num lema inócuo quando encontrar a barreira montada pela oposição no Congresso.
Risco de retrocesso
O caso dos Estados Unidos demonstra que as táticas de manipulação e preconceito político sim podem influenciar no resultado das eleições e destruir, do dia para a noite, projetos nacionais que levaram décadas para serem postos em prática.
No Brasil ainda não existe um movimento conservador com tanto apelo popular, mas o PSDB se aproximou perigosamente da baixaria do Tea Party neste segundo turno. Basta lembrar que José Serra saiu por aí frequentando missas, beijando santos, lendo a Bíblia e distribuindo panfletos com os dizeres “Jesus é a verdade e a justiça”. Enquanto encarnava o papel de missionário, dava sermões sobre seu papel de redentor das liberdades civis no país, sobretudo da liberdade de imprensa, que estaria em risco no caso de mais uma vitória do PT.
Entre seus cabos eleitorais, estava o bispo de Guarulhos, dom Luiz Bergonzini. Por intermédio de um militante da causa monarquista, o religioso mandou imprimir folhetos com o logo da CNBB condenando o aborto e sugerindo o voto no tucano. O papa Bento 16, às vésperas do pleito e com ampla cobertura dos meios de comunicação, também deu um empurrãozinho na candidatura do PSDB. No flanco evangélico, o apóstolo Renê Terra Nova não poupou esforços para viajar o Brasil com seu jatinho semeando a palavra de deus travestida de propaganda serrista.
O segundo turno forjou um cenário eleitoral em que os avanços sociais e democráticos alcançados durante o governo Lula foram repentinamente laçados à berlinda das urnas. Dois caminhos estavam à disposição dos brasileiros. Com Dilma, poderíamos seguir uma rota semelhante à trilhada nos últimos 8 anos e, por ventura, aprofundar as mudanças. Com Serra, o retrocesso batia à porta, exposto pelas alianças costuradas pelo PSDB na tentativa de vencer a qualquer custo.
Foi então que a imprensa alternativa reagiu prontamente. Cada ataque da campanha de José Serra ou do noticiário tucanófilo era acompanhado de uma enxurrada de contrapontos, argumentos, fatos e imagens, veiculados pela internet, por jornais ou revistas de esquerda. Talvez o maior exemplo da capacidade de resposta dos meios alternativos tenha sido a determinação dos blogues em destruir a farsa montada pela Rede Globo ao redor da bolinha de papel.
Houve vítimas pelo caminho, claro. A psicoanalista Maria Rita Kehl, que até o segundo turno escreveu para o jornal O Estado de S. Paulo, foi demitida após defender o Bolsa-Família e criticar as correntes anti-nordestinas que pipocavam nas caixas de e-mail pelo Brasil afora. O semanário CartaCapital foi chamado a explicar perante a Justiça os contratos de publicidade que mantém com o governo federal. A Revista do Brasil foi censurada pelo TSE após estampar o rosto de Dilma Rousseff na capa de sua edição de outubro, publicada uma semana depois do primeiro turno.
A polarização era tanta que teve jornalista demitido até no Ceará. Seu pecado foi publicar um caderno especial sobre o intelectual franco-brasileiro Michael Löwy e dois livros de sua autoria: Revoluções e Aviso de Incêndio. Também houve repórteres hostilizados durante o exercício da profissão. Foi com um raivoso “pelego filho da puta” que Aloysio Nunes Ferreira, senador eleito por São Paulo, recebeu um trabalhador da imprensa alternativa por demais insolente ao ponto de querer entrevistá-lo.
Depois da militância
A mídia alternativa desempenhou um duplo papel durante as eleições: não só cumpriu com suas obrigações jornalísticas ao desfazer manipulações, combater preconceitos e oferecer diferentes pontos de vista sobre os fatos, como também atuou política e partidariamente com o objetivo de garantir a vitória de uma candidatura que, a seu juízo – e o segundo turno deixou poucas dúvidas disso –, representava a melhor opção para governar o país. Na maioria das vezes, foi feliz e matou estes dois coelhos com uma cajadada só.
Contudo, passado o susto de uma ressaca conservadora que não aconteceu, talvez seja o momento de jornalistas independentes e meios de comunicação alternativos reavaliarem seu posicionamento no teatro do bem e do mal da política brasileira. Afinal, qual é a linha que separa o chapa-branquismo da defesa do interesse público?
No segundo turno de polarizações eleitorais, criticar as vicissitudes do governo Lula ou as deficiências de Dilma Rousseff era dar munição à violenta campanha montada pela oposição. Por isso, às vésperas do pleito, a corrida presidencial ganhou ares de jogo de futebol. Se os brasileiros deixamos de ser cidadãos e fomos transformados em torcida organizada, o jornalismo seguiu o mesmo rumo: era PT ou PSDB, Gaviões da Fiel ou Mancha Verde, sem meio termo.
Qualquer desconfiança quanto à própria escolha significava ceder à “superioridade” do adversário. A política deu lugar à paixão. E, entre apaixonados, no esporte ou nas eleições, não há diálogo nem entendimento. Tampouco autocrítica: afinal, não se critica o próprio time na final de um campeonato. O atacante pode estar fora de forma e o técnico, ser um energúmeno. O que importa é ganhar.
Dilma ganhou e, felizmente, a peleja chegou ao fim. Como sempre, depois de um processo eleitoral, agora há um país a construir e que tem que dar certo para a maioria. Em tempos de paz, talvez não seja papel do jornalismo – nem do tradicional nem do alternativo – vestir a camisa deste ou daquele partido. Isso não quer dizer que temos de ressuscitar os mitos enterrados da imparcialidade. Tomar partido em épocas de polarização, como vimos, é saudável. Porém, submeter-se aos ditames de um grupo político a tempo completo pode ser danoso.
Em última análise, não há qualquer mal intrínseco em transformar-se no porta-voz de um projeto de poder. Nas democracias mais maduras, as forças partidárias estão bem representadas na imprensa. Na Espanha, o El País mantém relações com o PSOE. Nos Estados Unidos, os democratas estão mais presentes no New York Times. O Il Manifesto, da Itália, não esconde sua preferência comunista. Esta é uma opção legítima para externar à sociedade como uma agremiação política vê o mundo e interpreta a realidade. Da mesma maneira que, no Brasil, os grandes meios de comunicação se identificam com as pautas liberais e com as candidaturas mais conservadoras, como as do PSDB, é saudável que o PT e todos os demais partidos, à medida que ganhem força, também tenham aliados na trincheira midiática.
Entretanto, já passou da hora de jornalistas e meios de comunicação independentes (ou pelo menos os que desejem denominar-se como tais) assumirem papel protagônico no cenário informativo brasileiro. Entre blogueiros e profissionais que ganham a vida fora do eixo tradicional, há capacidade de sobra em braços e cabeças para elaborar uma cobertura livre das amarras mercadológicas e da estreiteza temática da opinião pública.
A internet oferece milhões de possibilidades para a criação de novos paradigmas informativos em áudio, texto, vídeo e imagens, ou na fusão simultânea de todas as mídias, tudo a baixo custo. E há pautas suficientes para preencher um novo noticiário permanente que consiga abarcar, com qualidade técnica e estética, os temas de maior interesse à sociedade nacional e internacional – sobretudo os que não estão ou não encontram na imprensa de massa o espaço que merecem.
Não há razões, portanto, para que os jornalistas independentes se restrinjam ao papel subalterno de combater as infinitas distorções da grande mídia. Estar atento para o que acontece no main stream sempre foi e continuará sendo importante. Afinal, é através do Jornal Nacional, da Veja e dos jornalões que se constrói o senso comum no país. E, ao desconstruir a visão de mundo que diariamente penetra nos lares brasileiros, o jornalismo alternativo oferece novas maneiras de enxergar os fatos, as fotos e as declarações.
Continuar nesta trilha, porém, é ficar à reboque da pauta tradicional – ainda que seja um reboque às avessas. Assim, os veículos da imprensa alternativa correm o risco de se transformar em observatórios de mídia: darão um passo para fora do jornalismo e assumirão funções de críticos, o que já é feito há muito tempo por alguns acadêmicos e, claro, pelo Observatório da Imprensa.
O salto da reportagem
Chegamos ao limite da crítica. O jornalismo alternativo precisa mudar de patamar se quiser continuar existindo de maneira independente e cercar-se de legitimidade social. Porque o melhor combate à grande imprensa se dá oferecendo ao público um conteúdo melhor, que traz em cada manchete o ideal que se revela nas entrelinhas da crítica: opiniões menos superficiais, matérias mais completas, pautas que problematizem a realidade ao invés de simplesmente reproduzi-la ou contrapô-la pelo automatismo cotidiano.
O grande filão do jornalismo independente é a reportagem, que hoje em dia foi colocada em segundo plano pela imensa maioria dos meios de comunicação tradicionais. E por um motivo bastante simples: realizar investigações jornalísticas é muito caro e traz pouco resultado comercial. Aliás, uma boa reportagem muitas vezes atenta contra o mercado publicitário, pois tem a nobre vocação de chafurdar fundo nas mazelas sociais que via de regra põem em xeque o interesse de empresas, instituições ou governos — enfim, os anunciantes em potencial. A reportagem precisa de dinheiro tanto quanto tem o potencial de repeli-lo. Eis a grande sinuca de bico do jornalismo independente hoje.
Assumir uma postura governista durante a gestão do PT pode dar sobrevida econômica aos meios de comunicação alternativos. Não foi à toa que, durante o governo Lula, o Brasil assistiu à diversificação política da imprensa. Antes dominado por conglomerados empresariais, hoje o noticiário brasileiro é mais plural. Os últimos 8 anos ampliaram a liberdade de comunicação e expressão no país, o que é motivo de comemoração, mas ainda estamos longe do ideal.
Nenhum cidadão ficará satisfeito com a divisão da comunicação social entre veículos pró-PT, pró-PSDB ou pró-qualquer-coisa. O jornalismo independente é um serviço público e deve advogar em causa própria. E a causa da imprensa livre foi e sempre será o interesse da maioria da população — ou da fatia social que ela se diz representar. Direitos humanos, justiça social, preservação do meio-ambiente, bem-estar coletivo e liberdades civis são alguns dos valores que podem nortear o ofício de informar.
É a partir deles – e, eventualmente, de sua ampliação e radicalização – que o jornalismo pode escolher criticar ou elogiar governos e desgovernos pelo mundo afora. Elogiar, porém, me parece bastante complicado, já que sempre é possível para a administração pública fazer mais e melhor. Talvez seja a sina do jornalista independente estar permanentemente na oposição, não porque desprecie tudo o que existe ou não seja capaz de reconhecer avanços, mas porque não deve descansar enquanto houver qualquer rastro de injustiça e desigualdade no planeta. É longo o trabalho que tem pela frente: revelar o que está escondido, trazer à tona o que foi submerso pela indiferença cotidiana, discutir o que normalmente não se discute.
Felizmente, a internet está aí para servir-nos. O grande desafio, quem sabe, seja saber como podemos remunerar e possibilitar vida digna aos jornalistas capazes e dispostos a serem independentes. Afinal, por mais autônomo que consiga ser, ninguém escapa da ditadura das contas.
Tadeu Breda é jornalista, colunista do NR. Mantém o blog Latitude Sul.
Pudera. Menos de um mês depois da apuração, virou clichê dizer que o processo eleitoral de 2010 ficará marcado como um dos mais pobres em discussões e ideias desde a redemocratização. A disputa pela sucessão de Luiz Inácio Lula da Silva talvez tenha sido o ponto álgido do marketing político e do oportunismo eleitoreiro. Nunca se viu marqueteiros tão poderosos a ponto de dobrar convicções ideológicas e apequená-las diante da sanha pelo poder e da caça indiscriminada de votos. Até quem nunca tinha ido à igreja ajoelhou-se e rezou para os padroeiros da opinião pública.
Na tevê, no rádio e sobretudo na internet, a campanha demo-tucana e seus apoiadores (voluntários ou não) preferiram apelar para os mais profundos preconceitos da sociedade brasileira como estratégia para angariar, através do medo, um apoio popular que nunca tiveram e reverter, pela pobreza do discurso moralista, o resultado das pesquisas, que vinham anunciando mais uma vitória do petismo.
A tática foi bastante parecida com a estratégia derrotada de 2002. Faltou apenas colocar uma estrela de novela confessando seu temor eleitoral diante das câmeras. Desta vez, porém, o PSDB resolveu ir mais fundo em seu conservadorismo e pedir socorro aos representantes de Jesus Cristo na Terra.
Todos nos lembraremos – e não devemos nos esquecer jamais – que José Serra convocou para a batalha das urnas o apoio dos setores mais retrógrados do país e pactuou com as alas extremistas tanto da igreja católica como das evangélicas. Apesar de autoelogiar seu desempenho como ministro da Saúde, o candidato aliou-se com gente que desconsidera a epidemia de aids que paira pelo mundo, a importância social do planejamento familiar e que, ainda hoje, se presta a fazer campanha contra o uso de preservativos.
José Serra praticou deliberadamente o obscurantismo em torno de temas tão polêmicos quanto importantes para o bem-estar da população, como é o caso do aborto e da união civil de homossexuais, aferrando-se ao medievalismo cristão para angariar votos entre os poucos fiéis que ainda fazem o que o padre diz. Também manipulou o papel histórico desempenhado pela resistência armada durante a ditadura militar. Sua guerrilha digital vestiu Dilma Rousseff de verde oliva e impôs-lhe um charutão a la Fidel Castro entre os dentes.
No auge da empulhação, o tucano simulou uma agressão física que nunca existiu. Tanto que sua calva seguiu lustrosa e radiante durante toda a passeata que realizou no Rio de Janeiro. A bolinha de papel pode ter doído no brio, mas não lhe feriu a cabeça.
Por fim, é digno de nota – e despreço – o renascimento da xenofobia no Brasil. Desta vez o bairrismo paulista e o ódio contra nordestinos transcendeu os ambientes privados e escapou pelo twitter. É certo que a onda de manifestações preconceituosas foi desencadeada pelas declarações de José Serra e seus asseclas, que endossaram a tese de que as eleições dividiram o país entre indivíduos pobres e incapacitados, que moram no Nordeste e votam em Dilma, versus cidadãos conscientes, que habitam as regiões mais prósperas e apertaram 45 para presidente.
Lá como cá
Muitas análises compararam a postura anti-argumentativa e preconceituosa da Coligação Brasil Pode Mais (PSDB, DEM, PPS) ao discurso revisionista do Tea Party, a grande sensação política do momento nos Estados Unidos. Nitidamente, a principal semelhança entre um e outro é a opção por fugir do debate sério e aprofundado, livre de lugares-comuns, sobre as questões mais prementes para o futuro do país.
O movimento Tea Party surgiu na esteira da vitória de Barack Hussein Obama, em 2008. A musa do movimento, Sarah Palin, foi então candidata a vice na chapa derrotada, encabeçada por John McCain. Ambos pertencem ao Partido Republicano, e foi exatamente entre seus membros que se acomodou o Tea Party. No seio conservador da América, não precisou de muito esforço para crescer. Afinal, um objetivo comum unificou os interesses da direita ianque: derrocar o primeiro negro a assumir a Casa Branca, que, não bastasse a cor da pele, ainda tem sobrenome árabe.
Na mesma semana em que o Brasil escolhia seu próximo chefe-de-estado, os estadunidenses eram chamados a definir a composição da Câmara e do Senado para os próximos quatro anos. E as eleições legislativas impuseram uma profunda derrota ao governo democrata. Mais que um mero fracasso político de Barack Obama, o evento significou o maior fiasco de um presidente em influenciar a composição do parlamento desde 1938. Os democratas perderam a maioria entre os deputados, que haviam conseguido durante a administração George W. Bush, e viram sua vantagem minguar a um empate técnico entre os senadores.
A estratégia dos republicanos, capitaneados pelo Tea Party, foi bastante clara. Acusaram o presidente de ser um marxista empedernido, de praticar secretamente o Islã, de querer aumentar o poder e a influência do estado na vida dos cidadãos e de internalizar valores tribais herdados de seus antepassados quenianos. Para a direita, Barack Obama não está imbuído dos princípios americanos.
O Tea Party abominou a reforma democrata no sistema de saúde e rechaçou o pacote econômico lançado pela Casa Branca para aliviar os efeitos da crise no país. Aliás, num enorme esforço de desinformação, a ala mais conservadora dos conservadores estadunidenses atribuiu ao presidente toda a responsabilidade pela recessão – senão pelas suas causas, pelo fracasso em paliar suas consequências.
Na terra do Tio Sam, portanto, o Tea Party já conseguiu colher expressivos resultados eleitorais e ninguém duvida que sua retórica tresloucada imporá novas derrotas políticas ao governo democrata. Com a guinada republicana e a ascensão dos radicais de direita, Barack Obama ficou engessado na presidência.
A reforma no sistema de saúde corre o risco de morrer de inanição pelo boicote anunciado à assignação de recursos. E a política externa obamista, que tem buscado mais diálogo do que Washington estava acostumado e que rendeu ao presidente um prematuro prêmio Nobel da Paz, pode voltar a adotar o bordão “nós ganhamos, eles perdem”.
O esperançoso bordão Yes We Can, que uniu forças progressistas em torno da figura de Obama e de suas promessas de mudança, fatalmente se transformará num lema inócuo quando encontrar a barreira montada pela oposição no Congresso.
Risco de retrocesso
O caso dos Estados Unidos demonstra que as táticas de manipulação e preconceito político sim podem influenciar no resultado das eleições e destruir, do dia para a noite, projetos nacionais que levaram décadas para serem postos em prática.
No Brasil ainda não existe um movimento conservador com tanto apelo popular, mas o PSDB se aproximou perigosamente da baixaria do Tea Party neste segundo turno. Basta lembrar que José Serra saiu por aí frequentando missas, beijando santos, lendo a Bíblia e distribuindo panfletos com os dizeres “Jesus é a verdade e a justiça”. Enquanto encarnava o papel de missionário, dava sermões sobre seu papel de redentor das liberdades civis no país, sobretudo da liberdade de imprensa, que estaria em risco no caso de mais uma vitória do PT.
Entre seus cabos eleitorais, estava o bispo de Guarulhos, dom Luiz Bergonzini. Por intermédio de um militante da causa monarquista, o religioso mandou imprimir folhetos com o logo da CNBB condenando o aborto e sugerindo o voto no tucano. O papa Bento 16, às vésperas do pleito e com ampla cobertura dos meios de comunicação, também deu um empurrãozinho na candidatura do PSDB. No flanco evangélico, o apóstolo Renê Terra Nova não poupou esforços para viajar o Brasil com seu jatinho semeando a palavra de deus travestida de propaganda serrista.
O segundo turno forjou um cenário eleitoral em que os avanços sociais e democráticos alcançados durante o governo Lula foram repentinamente laçados à berlinda das urnas. Dois caminhos estavam à disposição dos brasileiros. Com Dilma, poderíamos seguir uma rota semelhante à trilhada nos últimos 8 anos e, por ventura, aprofundar as mudanças. Com Serra, o retrocesso batia à porta, exposto pelas alianças costuradas pelo PSDB na tentativa de vencer a qualquer custo.
Foi então que a imprensa alternativa reagiu prontamente. Cada ataque da campanha de José Serra ou do noticiário tucanófilo era acompanhado de uma enxurrada de contrapontos, argumentos, fatos e imagens, veiculados pela internet, por jornais ou revistas de esquerda. Talvez o maior exemplo da capacidade de resposta dos meios alternativos tenha sido a determinação dos blogues em destruir a farsa montada pela Rede Globo ao redor da bolinha de papel.
Houve vítimas pelo caminho, claro. A psicoanalista Maria Rita Kehl, que até o segundo turno escreveu para o jornal O Estado de S. Paulo, foi demitida após defender o Bolsa-Família e criticar as correntes anti-nordestinas que pipocavam nas caixas de e-mail pelo Brasil afora. O semanário CartaCapital foi chamado a explicar perante a Justiça os contratos de publicidade que mantém com o governo federal. A Revista do Brasil foi censurada pelo TSE após estampar o rosto de Dilma Rousseff na capa de sua edição de outubro, publicada uma semana depois do primeiro turno.
A polarização era tanta que teve jornalista demitido até no Ceará. Seu pecado foi publicar um caderno especial sobre o intelectual franco-brasileiro Michael Löwy e dois livros de sua autoria: Revoluções e Aviso de Incêndio. Também houve repórteres hostilizados durante o exercício da profissão. Foi com um raivoso “pelego filho da puta” que Aloysio Nunes Ferreira, senador eleito por São Paulo, recebeu um trabalhador da imprensa alternativa por demais insolente ao ponto de querer entrevistá-lo.
Depois da militância
A mídia alternativa desempenhou um duplo papel durante as eleições: não só cumpriu com suas obrigações jornalísticas ao desfazer manipulações, combater preconceitos e oferecer diferentes pontos de vista sobre os fatos, como também atuou política e partidariamente com o objetivo de garantir a vitória de uma candidatura que, a seu juízo – e o segundo turno deixou poucas dúvidas disso –, representava a melhor opção para governar o país. Na maioria das vezes, foi feliz e matou estes dois coelhos com uma cajadada só.
Contudo, passado o susto de uma ressaca conservadora que não aconteceu, talvez seja o momento de jornalistas independentes e meios de comunicação alternativos reavaliarem seu posicionamento no teatro do bem e do mal da política brasileira. Afinal, qual é a linha que separa o chapa-branquismo da defesa do interesse público?
No segundo turno de polarizações eleitorais, criticar as vicissitudes do governo Lula ou as deficiências de Dilma Rousseff era dar munição à violenta campanha montada pela oposição. Por isso, às vésperas do pleito, a corrida presidencial ganhou ares de jogo de futebol. Se os brasileiros deixamos de ser cidadãos e fomos transformados em torcida organizada, o jornalismo seguiu o mesmo rumo: era PT ou PSDB, Gaviões da Fiel ou Mancha Verde, sem meio termo.
Qualquer desconfiança quanto à própria escolha significava ceder à “superioridade” do adversário. A política deu lugar à paixão. E, entre apaixonados, no esporte ou nas eleições, não há diálogo nem entendimento. Tampouco autocrítica: afinal, não se critica o próprio time na final de um campeonato. O atacante pode estar fora de forma e o técnico, ser um energúmeno. O que importa é ganhar.
Dilma ganhou e, felizmente, a peleja chegou ao fim. Como sempre, depois de um processo eleitoral, agora há um país a construir e que tem que dar certo para a maioria. Em tempos de paz, talvez não seja papel do jornalismo – nem do tradicional nem do alternativo – vestir a camisa deste ou daquele partido. Isso não quer dizer que temos de ressuscitar os mitos enterrados da imparcialidade. Tomar partido em épocas de polarização, como vimos, é saudável. Porém, submeter-se aos ditames de um grupo político a tempo completo pode ser danoso.
Em última análise, não há qualquer mal intrínseco em transformar-se no porta-voz de um projeto de poder. Nas democracias mais maduras, as forças partidárias estão bem representadas na imprensa. Na Espanha, o El País mantém relações com o PSOE. Nos Estados Unidos, os democratas estão mais presentes no New York Times. O Il Manifesto, da Itália, não esconde sua preferência comunista. Esta é uma opção legítima para externar à sociedade como uma agremiação política vê o mundo e interpreta a realidade. Da mesma maneira que, no Brasil, os grandes meios de comunicação se identificam com as pautas liberais e com as candidaturas mais conservadoras, como as do PSDB, é saudável que o PT e todos os demais partidos, à medida que ganhem força, também tenham aliados na trincheira midiática.
Entretanto, já passou da hora de jornalistas e meios de comunicação independentes (ou pelo menos os que desejem denominar-se como tais) assumirem papel protagônico no cenário informativo brasileiro. Entre blogueiros e profissionais que ganham a vida fora do eixo tradicional, há capacidade de sobra em braços e cabeças para elaborar uma cobertura livre das amarras mercadológicas e da estreiteza temática da opinião pública.
A internet oferece milhões de possibilidades para a criação de novos paradigmas informativos em áudio, texto, vídeo e imagens, ou na fusão simultânea de todas as mídias, tudo a baixo custo. E há pautas suficientes para preencher um novo noticiário permanente que consiga abarcar, com qualidade técnica e estética, os temas de maior interesse à sociedade nacional e internacional – sobretudo os que não estão ou não encontram na imprensa de massa o espaço que merecem.
Não há razões, portanto, para que os jornalistas independentes se restrinjam ao papel subalterno de combater as infinitas distorções da grande mídia. Estar atento para o que acontece no main stream sempre foi e continuará sendo importante. Afinal, é através do Jornal Nacional, da Veja e dos jornalões que se constrói o senso comum no país. E, ao desconstruir a visão de mundo que diariamente penetra nos lares brasileiros, o jornalismo alternativo oferece novas maneiras de enxergar os fatos, as fotos e as declarações.
Continuar nesta trilha, porém, é ficar à reboque da pauta tradicional – ainda que seja um reboque às avessas. Assim, os veículos da imprensa alternativa correm o risco de se transformar em observatórios de mídia: darão um passo para fora do jornalismo e assumirão funções de críticos, o que já é feito há muito tempo por alguns acadêmicos e, claro, pelo Observatório da Imprensa.
O salto da reportagem
Chegamos ao limite da crítica. O jornalismo alternativo precisa mudar de patamar se quiser continuar existindo de maneira independente e cercar-se de legitimidade social. Porque o melhor combate à grande imprensa se dá oferecendo ao público um conteúdo melhor, que traz em cada manchete o ideal que se revela nas entrelinhas da crítica: opiniões menos superficiais, matérias mais completas, pautas que problematizem a realidade ao invés de simplesmente reproduzi-la ou contrapô-la pelo automatismo cotidiano.
O grande filão do jornalismo independente é a reportagem, que hoje em dia foi colocada em segundo plano pela imensa maioria dos meios de comunicação tradicionais. E por um motivo bastante simples: realizar investigações jornalísticas é muito caro e traz pouco resultado comercial. Aliás, uma boa reportagem muitas vezes atenta contra o mercado publicitário, pois tem a nobre vocação de chafurdar fundo nas mazelas sociais que via de regra põem em xeque o interesse de empresas, instituições ou governos — enfim, os anunciantes em potencial. A reportagem precisa de dinheiro tanto quanto tem o potencial de repeli-lo. Eis a grande sinuca de bico do jornalismo independente hoje.
Assumir uma postura governista durante a gestão do PT pode dar sobrevida econômica aos meios de comunicação alternativos. Não foi à toa que, durante o governo Lula, o Brasil assistiu à diversificação política da imprensa. Antes dominado por conglomerados empresariais, hoje o noticiário brasileiro é mais plural. Os últimos 8 anos ampliaram a liberdade de comunicação e expressão no país, o que é motivo de comemoração, mas ainda estamos longe do ideal.
Nenhum cidadão ficará satisfeito com a divisão da comunicação social entre veículos pró-PT, pró-PSDB ou pró-qualquer-coisa. O jornalismo independente é um serviço público e deve advogar em causa própria. E a causa da imprensa livre foi e sempre será o interesse da maioria da população — ou da fatia social que ela se diz representar. Direitos humanos, justiça social, preservação do meio-ambiente, bem-estar coletivo e liberdades civis são alguns dos valores que podem nortear o ofício de informar.
É a partir deles – e, eventualmente, de sua ampliação e radicalização – que o jornalismo pode escolher criticar ou elogiar governos e desgovernos pelo mundo afora. Elogiar, porém, me parece bastante complicado, já que sempre é possível para a administração pública fazer mais e melhor. Talvez seja a sina do jornalista independente estar permanentemente na oposição, não porque desprecie tudo o que existe ou não seja capaz de reconhecer avanços, mas porque não deve descansar enquanto houver qualquer rastro de injustiça e desigualdade no planeta. É longo o trabalho que tem pela frente: revelar o que está escondido, trazer à tona o que foi submerso pela indiferença cotidiana, discutir o que normalmente não se discute.
Felizmente, a internet está aí para servir-nos. O grande desafio, quem sabe, seja saber como podemos remunerar e possibilitar vida digna aos jornalistas capazes e dispostos a serem independentes. Afinal, por mais autônomo que consiga ser, ninguém escapa da ditadura das contas.
Tadeu Breda é jornalista, colunista do NR. Mantém o blog Latitude Sul.
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
A valorização e o dia da Consciência Negra em Brasília
Eu já estava acostumado a ser feriado no dia 20 de novembro, dia da Consciência Negra, em São Paulo. Mas Brasília, assim como a maioria das cidades e/ ou unidades da federação, ainda não transformou esse dia em feriado. Sinto falta não só porque é um feriado, eba, piscina, mas também porque vi que, pelo menos, as pessoas param para saber do que se trata.
Tenho percebido e valorizado a importância da sensibilização, ou seja, das pessoas pelo menos saberem que aquilo se trata de uma pauta. Muitas vezes, os setores especializados, por exemplo, em Direitos Humanos, têm debates super qualificados e avançados. Mas aquilo não é uma pauta da sociedade, não ganhou corpo. Daí a importância da sensibilização, daquilo que o terceiro setor, com sua mania de produzir um jargão próprio, chama de awareness.
Eu percebia, em São Paulo, que seja pela piada (aê, feriado, viva os negão), seja pela curiosidade, haver um evento chamado de Consciência Negra, isso, de alguma forma, ainda insipiente, ainda inicial demais, chegava na cabeça das pessoas. Aqui, não teve feriado, foi só mais um dia. Em Brasília, capital federal, o dia da Consciência Negra, com o perdão do trocadilho, passou em branco.
Sô negão
Pensei nisso hoje. O presidente Lula falou do dia da Consciência Negra hoje, no seu programa semanal, dizendo que a desigualdade ainda está longe de acabar no Brasil etc. Publiquei uma matéria sobre isso (sou editor de política de um jornal diário, gratuito, distribuído majoritariamente para as classes C, D e E), com uma foto da Agência Brasil, de uma moça negra com um cartaz. Na mesma página, eu havia colocado uma matéria sobre o Senado. O diagramador, que é negro e tem o apelido nada original de “Negão”, colocou a foto do Senado como sendo a da matéria do Lula.
Pauta secundária
Isso me fez pensar, também, como há pautas que são consideradas “secundárias”, da extrema esquerda à extrema direita. A questão das mulheres e de gênero, a questão racial, a questão da infância e adolescência, a dos direitos humanos – são todas secundarizadas em detrimento do “que importa mesmo”, ou seja, a produção, o dinheiro, o poder. Vã inocência. Quem perceber que isso tudo está ligado ganha um prêmio.
Atraso
Mesmo dentro da esquerda, muitas vezes, há dificuldade em pautar essas coisas. Certas correntes de pensamento ainda, até hoje, acham que essas pautas “menores” distraem os militantes de esquerda da “real” luta, que é pelo poder.
Atraso ainda maior
Na chamada direita, então, nem se fala. Muitas vezes esse é o setor da sociedade mais atrelado a ideologias antigas, que, na minha modestíssima opinião, precisam ser desconstruídas, pois ainda fazem parte, muito fortemente, do senso comum, médio, da população.
Exemplos
Imediatamente me vêm à mente o juiz, suspenso recentemente pelo Conselho Nacional de Justiça, que não deu seguimento a um processo com base na Lei Maria da Penha por justificativas religiosas, dizendo que o mundo é masculino, que essa é a ordem divina, como está escrito na Bíblia, e que essa lei era demoníaca. Ou do deputado federal do Rio de Janeiro, reeleito mais uma vez pela orgulhosa família militar fluminense, que falou, em canal público, que está tudo bem bater em filho que está ficando “meio gay”, e que um monte de gente, hoje, agradece aos pais por terem tomando uns safanões.
Os outros e nós
Voltando à foto da moça negra que eu usei na matéria de hoje, sinto que há uma percepção generalizada, que tem a ver com tudo isso que eu escrevi da “secundarização” de determinados assuntos, de que esses temas, justamente, são secundarizados não só por quem está envolvido na política, mas pelo público em geral. O fato de, só porque a matéria falava do Lula, se colocar uma foto do Senado, porque é “dessas coisas de política”, e não da moça negra, mostra isso para mim. O que uma moça negra estaria fazendo em meio a um monte de gente “séria”, homens sisudos, de bigode, terno e gravata?
Ideologia média
Claro que, em nenhum momento, condenei o diagramador. Ele não tem obrigação nenhuma de ler a matéria, e eu que deveria ter indicado, com mais clareza, qual foto ia aonde. O erro foi meu. Só usei-o como exemplo, pois foi isso que me fez parar para pensar. Sem nenhuma intenção de expôr ninguém.
Rodrigo Mendes de Almeida, jornalista, colunista do NR é editor do Jornal da Comunidade em BSB.
Tenho percebido e valorizado a importância da sensibilização, ou seja, das pessoas pelo menos saberem que aquilo se trata de uma pauta. Muitas vezes, os setores especializados, por exemplo, em Direitos Humanos, têm debates super qualificados e avançados. Mas aquilo não é uma pauta da sociedade, não ganhou corpo. Daí a importância da sensibilização, daquilo que o terceiro setor, com sua mania de produzir um jargão próprio, chama de awareness.
Eu percebia, em São Paulo, que seja pela piada (aê, feriado, viva os negão), seja pela curiosidade, haver um evento chamado de Consciência Negra, isso, de alguma forma, ainda insipiente, ainda inicial demais, chegava na cabeça das pessoas. Aqui, não teve feriado, foi só mais um dia. Em Brasília, capital federal, o dia da Consciência Negra, com o perdão do trocadilho, passou em branco.
Sô negão
Pensei nisso hoje. O presidente Lula falou do dia da Consciência Negra hoje, no seu programa semanal, dizendo que a desigualdade ainda está longe de acabar no Brasil etc. Publiquei uma matéria sobre isso (sou editor de política de um jornal diário, gratuito, distribuído majoritariamente para as classes C, D e E), com uma foto da Agência Brasil, de uma moça negra com um cartaz. Na mesma página, eu havia colocado uma matéria sobre o Senado. O diagramador, que é negro e tem o apelido nada original de “Negão”, colocou a foto do Senado como sendo a da matéria do Lula.
Pauta secundária
Isso me fez pensar, também, como há pautas que são consideradas “secundárias”, da extrema esquerda à extrema direita. A questão das mulheres e de gênero, a questão racial, a questão da infância e adolescência, a dos direitos humanos – são todas secundarizadas em detrimento do “que importa mesmo”, ou seja, a produção, o dinheiro, o poder. Vã inocência. Quem perceber que isso tudo está ligado ganha um prêmio.
Atraso
Mesmo dentro da esquerda, muitas vezes, há dificuldade em pautar essas coisas. Certas correntes de pensamento ainda, até hoje, acham que essas pautas “menores” distraem os militantes de esquerda da “real” luta, que é pelo poder.
Atraso ainda maior
Na chamada direita, então, nem se fala. Muitas vezes esse é o setor da sociedade mais atrelado a ideologias antigas, que, na minha modestíssima opinião, precisam ser desconstruídas, pois ainda fazem parte, muito fortemente, do senso comum, médio, da população.
Exemplos
Imediatamente me vêm à mente o juiz, suspenso recentemente pelo Conselho Nacional de Justiça, que não deu seguimento a um processo com base na Lei Maria da Penha por justificativas religiosas, dizendo que o mundo é masculino, que essa é a ordem divina, como está escrito na Bíblia, e que essa lei era demoníaca. Ou do deputado federal do Rio de Janeiro, reeleito mais uma vez pela orgulhosa família militar fluminense, que falou, em canal público, que está tudo bem bater em filho que está ficando “meio gay”, e que um monte de gente, hoje, agradece aos pais por terem tomando uns safanões.
Os outros e nós
Voltando à foto da moça negra que eu usei na matéria de hoje, sinto que há uma percepção generalizada, que tem a ver com tudo isso que eu escrevi da “secundarização” de determinados assuntos, de que esses temas, justamente, são secundarizados não só por quem está envolvido na política, mas pelo público em geral. O fato de, só porque a matéria falava do Lula, se colocar uma foto do Senado, porque é “dessas coisas de política”, e não da moça negra, mostra isso para mim. O que uma moça negra estaria fazendo em meio a um monte de gente “séria”, homens sisudos, de bigode, terno e gravata?
Ideologia média
Claro que, em nenhum momento, condenei o diagramador. Ele não tem obrigação nenhuma de ler a matéria, e eu que deveria ter indicado, com mais clareza, qual foto ia aonde. O erro foi meu. Só usei-o como exemplo, pois foi isso que me fez parar para pensar. Sem nenhuma intenção de expôr ninguém.
Rodrigo Mendes de Almeida, jornalista, colunista do NR é editor do Jornal da Comunidade em BSB.
Jornalismo Investigativo dos bons nos EUA
Um texto da Revista Piauí (Caro, trabalhoso e chato) que indico a leitura, sobre o jornalismo investigativo nos EUA. O texto de Branca Vianna fala que o jornalismo investigativo luta para sobreviver naquele país. Fantástico, no entanto, a história do Pro Publica, que faz jornalismo dos melhores sem visar o lucro, só com feras (que ganham bem, trabalham numa pauta anos, se for preciso, e podem não publicar se o resultado não for satisfatório. Chegam a investir 300 mil dólares numa única pauta, tudo bancado por uma fundação que parece estar afim de gastar com coisas relevantes). Taí o meu sonho de consumo na profissão. O legal é que os caras trabalham em parcerias com outras publicações, como New Yorker, New York Times e afins que se interessam, óbvio, em publicar o material. Além do Pro Publica, tem o http://www.publicintegrity.org/ que também faz jornalismo investigativo. Dou um doce para quem topar traduzir as matérias, todas em inglês. (Thiago Domenici)
Brasília é o futuro do Brasil
Talvez seja pela cidade ser um microcosmo do Brasil. Brasília tem apenas 50 anos, e se compõe, basicamente, de gente vinda de outros estados. Hoje, já há gerações de adultos (mais de 20 anos) cujos pais são brasilienses, mas eles ainda são raros. A cidade é meio que um simulacro do Brasil.
A verdade é que Brasília antecipa tendências, comportamentos e etc., que ainda vão acontecer de maneira ampliada. Reparei isso nas eleições presidenciais. Todas as oscilações entre Dilma, Serra, Marina e Plínio puderam ser percebidas, via de regra, poucas semanas antes na capital federal.
Isso, de maneira nenhuma, quer dizer que a cidade é mais “avançada” do que a média do país. Não se pode dizer isso de uma unidade da federação que levou para o segundo turno dona Weslian Roriz, a mulher-laranja que se tornou candidata a nove dias do primeiro turno por “amor” ao marido que estava sendo “humilhado”.
Além disso, no Distrito Federal a primeira colocada foi Marina Silva. Dilma ficou em segundo e Serra, em terceiro. No segundo turno, muito mais movidos pelo desejo, analistas estomacais afirmaram que, com essa característica de Brasília, provavelmente Serra ganharia no segundo turno. Quebraram a cara – os analistas e o Serra. Dilma ganhou aqui, no Brasil e foi eleita.
De fato, equipes de campanha que queiram fazer a sintonia fina de suas táticas, verificando os reflexos de suas peças publicitárias e o tom dos discursos dos candidatos, devem usar o DF como tubo de ensaio. Quem sabe daqui a quatro anos?
GDF
Em total sintonia com seus pares e lideranças nacionais, o PT, com Agnelo Queiroz, encabeçou a chapa que se elegeu para o governo do DF, derrotando pela primeira vez o rorizismo, tendo como vice um cacique do PMDB, Tadeu Filippelli.
Mudança
Agnelo, assim como Dilma, era de outro partido (Agnelo do PCdoB, Dilma do PDT), mas migraram para alçar voos mais altos em termos eleitorais.
PMDB
Os dois vices, Temer e Filippelli, são tidos como extremamente habilidosos, astuciosos e mestres da articulação política. Temer é presidente nacional do partido. Filippelli é presidente do PMDB-DF.
Hábitos semelhantes
Agnelo e Filippelli mostravam sintonia desde o começo da campanha. Os dois usam o mesmo modelo de celular e têm o mesmo protetor e fundo de tela no computador!
Política local
Estranhamente, não consigo encaixar o rorizismo na tese de que Brasília antecipa tendências. A força de Joaquim Roriz, hoje no nanico PSC – depois de perder batalha interna justamente para Tadeu Filippelli –, é impressionante. A origem disso está em uma geração de pessoas, muito pobres e sem recursos materiais, que ganhou lotes de terra de Roriz. Ele criou uma cultura e um vício. Hoje, ganha eleição quem disser que vai dar lote.
Curral
Roriz tem um eleitorado cativo, de aproximadamente um terço da população, que só vai se reduzir à medida em que as pessoas envelhecerem, morrerem e outras gerações forem se formando, sem a cultura clientelista e patronalista da doação do lote. Roriz nunca, nem em pesquisas nem em eleição nenhuma, teve menos de 30% dos votos.
Fim de uma era
Weslian, a senhorinha católica que virou candidata arrojada, conseguiu herdar todos os votos do marido. E não teve NADA além dos votos do marido. No primeiro turno, teve um terço dos votos válidos, ou 440 mil votos. No segundo turno, depois de um mês de campanha violenta, virulenta, que botou a baixaria entre Serra e Dilma no chinelo, ela teve 449 mil votos. Um crescimento insignificante. É o fim de uma era.
Rodrigo Mendes de Almeida, jornalista, colunista do NR é editor do Jornal da Comunidade em BSB.
O casal Roriz |
Isso, de maneira nenhuma, quer dizer que a cidade é mais “avançada” do que a média do país. Não se pode dizer isso de uma unidade da federação que levou para o segundo turno dona Weslian Roriz, a mulher-laranja que se tornou candidata a nove dias do primeiro turno por “amor” ao marido que estava sendo “humilhado”.
Além disso, no Distrito Federal a primeira colocada foi Marina Silva. Dilma ficou em segundo e Serra, em terceiro. No segundo turno, muito mais movidos pelo desejo, analistas estomacais afirmaram que, com essa característica de Brasília, provavelmente Serra ganharia no segundo turno. Quebraram a cara – os analistas e o Serra. Dilma ganhou aqui, no Brasil e foi eleita.
De fato, equipes de campanha que queiram fazer a sintonia fina de suas táticas, verificando os reflexos de suas peças publicitárias e o tom dos discursos dos candidatos, devem usar o DF como tubo de ensaio. Quem sabe daqui a quatro anos?
Agnelo e Filippelli. |
Em total sintonia com seus pares e lideranças nacionais, o PT, com Agnelo Queiroz, encabeçou a chapa que se elegeu para o governo do DF, derrotando pela primeira vez o rorizismo, tendo como vice um cacique do PMDB, Tadeu Filippelli.
Mudança
Agnelo, assim como Dilma, era de outro partido (Agnelo do PCdoB, Dilma do PDT), mas migraram para alçar voos mais altos em termos eleitorais.
PMDB
Os dois vices, Temer e Filippelli, são tidos como extremamente habilidosos, astuciosos e mestres da articulação política. Temer é presidente nacional do partido. Filippelli é presidente do PMDB-DF.
Hábitos semelhantes
Agnelo e Filippelli mostravam sintonia desde o começo da campanha. Os dois usam o mesmo modelo de celular e têm o mesmo protetor e fundo de tela no computador!
Política local
Estranhamente, não consigo encaixar o rorizismo na tese de que Brasília antecipa tendências. A força de Joaquim Roriz, hoje no nanico PSC – depois de perder batalha interna justamente para Tadeu Filippelli –, é impressionante. A origem disso está em uma geração de pessoas, muito pobres e sem recursos materiais, que ganhou lotes de terra de Roriz. Ele criou uma cultura e um vício. Hoje, ganha eleição quem disser que vai dar lote.
Curral
Roriz tem um eleitorado cativo, de aproximadamente um terço da população, que só vai se reduzir à medida em que as pessoas envelhecerem, morrerem e outras gerações forem se formando, sem a cultura clientelista e patronalista da doação do lote. Roriz nunca, nem em pesquisas nem em eleição nenhuma, teve menos de 30% dos votos.
Fim de uma era
Weslian, a senhorinha católica que virou candidata arrojada, conseguiu herdar todos os votos do marido. E não teve NADA além dos votos do marido. No primeiro turno, teve um terço dos votos válidos, ou 440 mil votos. No segundo turno, depois de um mês de campanha violenta, virulenta, que botou a baixaria entre Serra e Dilma no chinelo, ela teve 449 mil votos. Um crescimento insignificante. É o fim de uma era.
Rodrigo Mendes de Almeida, jornalista, colunista do NR é editor do Jornal da Comunidade em BSB.
A cada um a sua democracia
Não é curioso, amigo leitor, que ao terminar a primeira década do século XXI, a velha imprensa brasileira (aqui no sentido de antiga mesmo e carcomida) insista em não querer aceitar a vitória da presidente Dilma Roussef? Ou melhor: insista em “investigar” o passado da candidata eleita, substituindo a polícia da ditadura civil/militar que infelicitou o país nos anos 60?
Porque não é outra a atitude do jornal Folha de São Paulo ao se regozijar com a abertura dos arquivos de posse do Superior Tribunal Militar, pomposamente recebida como uma “vitória da sociedade brasileira”, para bisbilhotar sobre o passado de uma ex-presa política.
Vitória da sociedade brasileira? A quem quer enganar mais uma vez a FSP? O que quer o jornal do Sr. Otávio Frias Filho? Dependurar a presidente Dilma Roussef no pau de arara novamente em nome da sua democracia? Já não basta o sofrimento do passado? Quer o jornal, na sua arrogância e ignomínia, mostrar aos milhões de brasileiros que votaram no futuro e repudiaram o passado, que a candidata que escolheram não era a melhor opção para o Brasil pós-Lula?
Querem limpar a barra com a ficha falsa que publicaram e nunca desmentiram? Bobagem, não deveriam perder tempo com isso. À exceção daqueles que ainda não perceberam que tipo de democracia a Folha defende, o jornal perde a cada dia que passa a credibilidade daqueles que ainda a lêem. Seria bom que os seus anunciantes começassem a pensar seriamente nisto.
O Brasil da Folha de São Paulo (e de outros órgãos de imprensa muito bem identificados) insistem na tática da desinformação, da meia verdade ou da meia mentira, o que vem dar no mesmo, usando aquilo a que chamam de liberdade de imprensa, da sua liberdade de imprensa, bem entendido, como uma espécie de chantagem moral (aqui sim) sobre toda a sociedade brasileira. Uma chantagem que ainda conta com o beneplácito de muitos de seus incautos leitores ou do apoio daqueles que insistem em querer dividir o país através do preconceito, do ódio, da intolerância.
Não foi por acaso que o jornal defendeu até onde pôde a candidatura de José Serra, político supostamente de passado esquerdista e a quem coube destampar o caldeirão do fascismo adormecido em mentes e corações que não suportam ainda a possibilidade de milhões de brasileiros ascenderem socialmente, ainda que essa ascensão seja modesta, não só àquilo que merece qualquer ser humano, mas em relação ao padrão de vida que levam tais intolerantes e antidemocratas.
A Folha insiste em caminhar na contramão da História. Na mesma semana em que as Forças Armadas bolivianas se declaram socialistas, nacionalistas e antiimperialistas, num país que carregou durante anos e anos o anátema de ter o maior índice de golpes de estado na América Latina, o jornal paulista alegra-se em conseguir abrir parcialmente alguns arquivos da ditadura e com isso, julga, poder mostrar o “passado negro” da nova presidente da República.
Triste jornalismo esse, feito de frustração, raiva, incompetência, tentativa de manipulação, desrespeito aos próprios leitores e – sobretudo – desprezo aos valores democráticos que, cinicamente, transfere aos seus adversários.
Não sei, e penso que poucos saberão, o que fará o jornal com aquilo que encontrar nos tais arquivos. Se ainda restar um pouco de dignidade ao seu conselho editorial, honrando a memória de alguns grandes e sérios jornalistas que por lá passaram, como Cláudio Abramo, por exemplo, deixarão de lado prováveis ressentimentos pessoais com o presidente Lula e com a presidente eleita e talvez reconheçam que um processo montado com “verdades’ e confissões sob tortura não é necessariamente uma peça íntegra e confiável de testemunho histórico. Afirmo-o com a convicção de quem passou pela mesma situação e, após dois anos de prisão, foi absolvido pela Justiça Militar.
Caso contrário, o jornal mostrará em definitivo qual é a democracia que defende e de qual liberdade de imprensa se utiliza, humilhando mais uma vez toda uma geração que lutou por liberdade, respeito e igualdade entre seus semelhantes. Com isso, mostrará também às novas gerações que o uso de seus veículos para conduzir presos naqueles anos de chumbo foi mais do que uma ajuda interesseira e circunstancial, concedendo-lhes nós o benefício da dúvida.
Será essa “a grande vitória da sociedade brasileira”? Ou será aquela configurada nas urnas no último 31 de outubro?
Izaías Almada é escritor e dramaturgo, colunista do Nota de Rodapé e do site Escrivinhador.
Porque não é outra a atitude do jornal Folha de São Paulo ao se regozijar com a abertura dos arquivos de posse do Superior Tribunal Militar, pomposamente recebida como uma “vitória da sociedade brasileira”, para bisbilhotar sobre o passado de uma ex-presa política.
Vitória da sociedade brasileira? A quem quer enganar mais uma vez a FSP? O que quer o jornal do Sr. Otávio Frias Filho? Dependurar a presidente Dilma Roussef no pau de arara novamente em nome da sua democracia? Já não basta o sofrimento do passado? Quer o jornal, na sua arrogância e ignomínia, mostrar aos milhões de brasileiros que votaram no futuro e repudiaram o passado, que a candidata que escolheram não era a melhor opção para o Brasil pós-Lula?
Querem limpar a barra com a ficha falsa que publicaram e nunca desmentiram? Bobagem, não deveriam perder tempo com isso. À exceção daqueles que ainda não perceberam que tipo de democracia a Folha defende, o jornal perde a cada dia que passa a credibilidade daqueles que ainda a lêem. Seria bom que os seus anunciantes começassem a pensar seriamente nisto.
O Brasil da Folha de São Paulo (e de outros órgãos de imprensa muito bem identificados) insistem na tática da desinformação, da meia verdade ou da meia mentira, o que vem dar no mesmo, usando aquilo a que chamam de liberdade de imprensa, da sua liberdade de imprensa, bem entendido, como uma espécie de chantagem moral (aqui sim) sobre toda a sociedade brasileira. Uma chantagem que ainda conta com o beneplácito de muitos de seus incautos leitores ou do apoio daqueles que insistem em querer dividir o país através do preconceito, do ódio, da intolerância.
Não foi por acaso que o jornal defendeu até onde pôde a candidatura de José Serra, político supostamente de passado esquerdista e a quem coube destampar o caldeirão do fascismo adormecido em mentes e corações que não suportam ainda a possibilidade de milhões de brasileiros ascenderem socialmente, ainda que essa ascensão seja modesta, não só àquilo que merece qualquer ser humano, mas em relação ao padrão de vida que levam tais intolerantes e antidemocratas.
A Folha insiste em caminhar na contramão da História. Na mesma semana em que as Forças Armadas bolivianas se declaram socialistas, nacionalistas e antiimperialistas, num país que carregou durante anos e anos o anátema de ter o maior índice de golpes de estado na América Latina, o jornal paulista alegra-se em conseguir abrir parcialmente alguns arquivos da ditadura e com isso, julga, poder mostrar o “passado negro” da nova presidente da República.
Triste jornalismo esse, feito de frustração, raiva, incompetência, tentativa de manipulação, desrespeito aos próprios leitores e – sobretudo – desprezo aos valores democráticos que, cinicamente, transfere aos seus adversários.
Não sei, e penso que poucos saberão, o que fará o jornal com aquilo que encontrar nos tais arquivos. Se ainda restar um pouco de dignidade ao seu conselho editorial, honrando a memória de alguns grandes e sérios jornalistas que por lá passaram, como Cláudio Abramo, por exemplo, deixarão de lado prováveis ressentimentos pessoais com o presidente Lula e com a presidente eleita e talvez reconheçam que um processo montado com “verdades’ e confissões sob tortura não é necessariamente uma peça íntegra e confiável de testemunho histórico. Afirmo-o com a convicção de quem passou pela mesma situação e, após dois anos de prisão, foi absolvido pela Justiça Militar.
Caso contrário, o jornal mostrará em definitivo qual é a democracia que defende e de qual liberdade de imprensa se utiliza, humilhando mais uma vez toda uma geração que lutou por liberdade, respeito e igualdade entre seus semelhantes. Com isso, mostrará também às novas gerações que o uso de seus veículos para conduzir presos naqueles anos de chumbo foi mais do que uma ajuda interesseira e circunstancial, concedendo-lhes nós o benefício da dúvida.
Será essa “a grande vitória da sociedade brasileira”? Ou será aquela configurada nas urnas no último 31 de outubro?
Izaías Almada é escritor e dramaturgo, colunista do Nota de Rodapé e do site Escrivinhador.
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
DataNR: Educação deve ser prioridade no primeiro ano
No DataNR da semana passada perguntamos o que a presidente eleita Dilma Rousseff (PT) deveria priorizar no seu primeiro ano de mandato. Do total de 32 votos computados, a maioria optou pela Educação, 40%. Saúde vem logo em seguida com 25%. Economia, 18%, Cultura, 9% e Segurança Pública, 2%, fecharam a enquete.
quarta-feira, 17 de novembro de 2010
Passageira da linha vermelha
Ser uma das 3,4 milhões de pessoas que diariamente embarcam nos trens do metrô de São Paulo tem se revelado uma experiência surpreendente – no bom e no mau sentido. Desde agosto, quando passei a ir para o trabalho por baixo da cidade, descobri que a precariedade do serviço apregoado pelo governo de São Paulo como “o melhor do Brasil, um dos melhores do mundo” é enfrentada pela multidão com uma solidariedade, por vezes “atropelada”, que desmente outro clichê – o da indiferença urbana.
O trecho que me cabe vencer de segunda à sexta-feira é o Barra-Funda-Centro (ida e volta), na mal afamada linha vermelha, a mais lotada de nosso superlotado metrô, onde se espremem diariamente 1,2 milhão de pessoas. Não é, no entanto, o pior percurso: quando espero o metrô para voltar para casa, por volta das 6 e meia da tarde na estação da Praça da Sé, vejo na plataforma oposta a aglomeração ainda maior de meus companheiros de linha vermelha do trecho Centro-Itaquera, esse sim o campeão de superlotação.
Aqui, devo fazer um parêntesis para explicar porque embarco na estação da Sé, sabidamente o pior ponto do metrô paulistano. Trabalho na rua São Bento, a uns 400 metros de uma das entradas da estação Anhagabaú, já na linha vermelha, e a não ser pela preguiça – a estação São Bento, da linha azul, fica a pouco mais de 100 metros do prédio – não haveria por que pegar a linha azul e baldear para a linha vermelha na temível Sé, onde se concentra o movimento do nosso ridículo metrô – as únicas linhas realmente prontas, a vermelha e azul, se encontram abaixo do ponto zero da cidade.
Mas, como avisei, o metrô paulistano sempre surpreende. Depois de algumas tentativas de embarcar na estação do Vale do Anhagabaú, descobri que existe sim algo pior que baldear na Sé: tentar entrar em uma das estações da linha vermelha na hora do rush (das 17h30 às 19h). São 15, 20 minutos de fila apenas para passar a catraca. Em um dia normal. Desisti definitivamente de tentar acessar a estação Anhagabaú no dia 21 de setembro de 2010, um marco na vida dos frequentadores da linha vermelha. Nesse dia, o metrô parou inexplicavelmente às 7h50 e depois de quase uma hora de sofrimento sem nenhum tipo de socorro, a multidão sufocada evadiu-se dos vagões pelos trilhos até a estação Tatuapé. Não participei desse horror – que pode voltar a acontecer a qualquer momento como veremos na próxima coluna – mas 11 horas depois desse episódio as filas para entrar nas estações da linha vermelha ultrapassavam 60 minutos de espera. Esse é o metrô de São Paulo. Vamos contar a verdade sobre ele. Desabafem aqui.
Marina Amaral é jornalista, mora em Perdizes e trabalha na R. São Bento, na Rede Brasil Atual. Estreia hoje no Nota de Rodapé com a coluna Passageira da Linha Vermelha.
O trecho que me cabe vencer de segunda à sexta-feira é o Barra-Funda-Centro (ida e volta), na mal afamada linha vermelha, a mais lotada de nosso superlotado metrô, onde se espremem diariamente 1,2 milhão de pessoas. Não é, no entanto, o pior percurso: quando espero o metrô para voltar para casa, por volta das 6 e meia da tarde na estação da Praça da Sé, vejo na plataforma oposta a aglomeração ainda maior de meus companheiros de linha vermelha do trecho Centro-Itaquera, esse sim o campeão de superlotação.
Aqui, devo fazer um parêntesis para explicar porque embarco na estação da Sé, sabidamente o pior ponto do metrô paulistano. Trabalho na rua São Bento, a uns 400 metros de uma das entradas da estação Anhagabaú, já na linha vermelha, e a não ser pela preguiça – a estação São Bento, da linha azul, fica a pouco mais de 100 metros do prédio – não haveria por que pegar a linha azul e baldear para a linha vermelha na temível Sé, onde se concentra o movimento do nosso ridículo metrô – as únicas linhas realmente prontas, a vermelha e azul, se encontram abaixo do ponto zero da cidade.
Mas, como avisei, o metrô paulistano sempre surpreende. Depois de algumas tentativas de embarcar na estação do Vale do Anhagabaú, descobri que existe sim algo pior que baldear na Sé: tentar entrar em uma das estações da linha vermelha na hora do rush (das 17h30 às 19h). São 15, 20 minutos de fila apenas para passar a catraca. Em um dia normal. Desisti definitivamente de tentar acessar a estação Anhagabaú no dia 21 de setembro de 2010, um marco na vida dos frequentadores da linha vermelha. Nesse dia, o metrô parou inexplicavelmente às 7h50 e depois de quase uma hora de sofrimento sem nenhum tipo de socorro, a multidão sufocada evadiu-se dos vagões pelos trilhos até a estação Tatuapé. Não participei desse horror – que pode voltar a acontecer a qualquer momento como veremos na próxima coluna – mas 11 horas depois desse episódio as filas para entrar nas estações da linha vermelha ultrapassavam 60 minutos de espera. Esse é o metrô de São Paulo. Vamos contar a verdade sobre ele. Desabafem aqui.
Marina Amaral é jornalista, mora em Perdizes e trabalha na R. São Bento, na Rede Brasil Atual. Estreia hoje no Nota de Rodapé com a coluna Passageira da Linha Vermelha.
terça-feira, 16 de novembro de 2010
“É absurdo que você possa ter a liberdade valendo tão pouco”
Juiz de direito e professor em São Paulo, Marcelo Semer, 44 anos, desconhece a palavra corporativismo. É um duro crítico do Poder Judiciário embora dele faça parte há 20 anos. Em entrevista ao Nota de Rodapé, o magistrado aponta falhas graves na formação dos bacharéis de direito no Brasil e alerta para o distanciamento de seus pares da realidade do país. Por Ricardo Viel, jornalista e colunista do NR.
NR - Por que em algumas situações como nos crimes de bagatela, os juízes e tribunais inferiores não seguem o entendimento pacificado pelo Supremo Tribunal Federal que beneficia o réu?
Marcelo Semer - O STF é, hoje, um tribunal muito mais garantista, muito mais liberal do que os tribunais de justiça e os juízes. Nem sempre foi assim. Acho que o ponto central foi a eleição do Lula e a renovação. Alguns ministros que estavam lá já eram mais liberais. Quando eles foram se agrupando, acaba puxando uma linha ainda mais garantista. O tribunal não tinha, até então, uma postura assim. Isso acontece, também, com o passar do tempo. Vem a Constituição e as pessoas vão incorporando os princípios constitucionais com o tempo. Você vai apurando, vai pensando sobre aquilo, escrevendo, e entendendo melhor o que ela quer dizer.
NR – E por que essa mudança não acontece com quem está abaixo dos ministros?
Os juízes, como quase todas as pessoas formadas em direito, tem uma perspectiva muito legalista. Eles se preocupam exageradamente com a lei e muito pouco com o princípio constitucional. Assim, a regra acaba valendo mais do que o princípio. Mas o princípio é superior, ele é quem informa e direciona as regras. Mas a regra é mais fácil de aplicar, enquanto o princípio você tem que depreender. O ensino do direito sempre foi positivista, técnico. É o que está ali escrito. Isso não dá vazão para entender os princípios.
NR – Esse pensamento influência de que forma no julgamento de crimes pequenos, como roubo de um desodorante, por exemplo?
Os juízes dizem que não existe uma regra que permita reconhecer o crime de bagatela, porque não está escrito no Código Penal. Então você chega a um absurdo em que a liberdade de uma pessoa possa ser colocada em risco por uma fração de real, como aconteceu comigo, que tive que julgar um caso de um rapaz que roubou um pincel que valia 1,67 reais. Isso é um contra-senso. Em certas situações aplicar certa regra infringe a dignidade da pessoa humana, que é um princípio superior. Só que a Constituição não diz, exatamente, o que é a dignidade da pessoa humana, você tem que aprender isso. Eles não conseguem entender que o direito é mais do que a lei, a lei não esgota o direito. É absurdo que você possa ter a liberdade valendo tão pouco.
NR – Nas faculdades os alunos não aprendem a pensar o direito como um sistema?
O que precisa ser entendido é que há certos limites para a lei. A barbárie é barbárie mesmo estando na lei. O nazismo era lei, o apartheid era lei também. Há certas situações em que você afirma um direito negando a lei. A lei não pode tudo. Há uma série de princípios, garantias e direitos fundamentais que não podem ser feridos pela lei, mas a gente passou anos e anos nessa mentalidade positivista: só interessa o que está na lei, o que não está na lei não faz parte do direito.Você desidratando a lei, ela serve para tudo, até para justificar o nazismo. O direito não se esgota na lei, o caso de bagatela é um exemplo disso.
NR – Ou seja, se o direito fosse só uma fórmula que você coloca no computador, quem furta um xampu ou um pedaço de carne comete crime, mas dentro de uma lógica maior, não é crime...
Tipicamente a conduta se adequa ao que está disposto no código: subtrair coisa alheia móvel. Mas se você for levar o direito penal para esse lado, fica impossível. O direito penal é seletivo, ele escolhe algumas condutas para proteger e em certas situações. Xingar é injúria, mas, por exemplo, no futebol você não vai aplicar isso. O sistema é seletivo. Você não pode fazer o direito penal proteger o ínfimo, o irrisório, porque senão você vai viver num estado de polícia. E tem outra coisa, boa parte desses crimes são furtos em supermercados e muitos deles são crimes impossíveis.
NR – Por que?
Porque as pessoas ficam vigiadas. Tem seguranças a paisana, as pessoas são vigiadas e fiscalizadas. É impossível porque não dá para consumar. Via de regra, são crimes tentados. Peguei um caso de um cidadão que entrou em um supermercado de um shopping chique de São Paulo. Estava embriagado e maltrapilho. Ele nunca ia conseguir furtar. Esperam ele pegar o produto, dão o flagrante e chamam a polícia.
NR – Os seguranças não poderiam ser instruídos a fazer uma segurança que inibisse o furto?
Eles dizem que isso pode constranger o cliente, pode gerar uma ação por danos morais. Mas você imagina que o cidadão pega e coloca uma garrafa na calça, o funcionário pode chegar e falar: “O senhor quer que eu traga uma cestinha para o senhor acomodar melhor o produto?” Pronto.
NR – Essa postura do Poder Judiciário de punir de forma pesada crimes irrisórios não estão, também, baseadas numa sensação de insegurança que tem a classe média, da qual os magistrados fazem parte?
Tem uma dimensão política também. As pessoas acham que se aumenta o número de crimes as penas devem ficar mais severas. Mas na verdade, se a pessoa chega no crime é porque alguns dos outros controles já falharam: a família, os amigos, o emprego. E quando essa pessoa volta da cadeia, a possibilidade dela reconstruir esses laços é menor ainda. O laço do emprego já foi, por exemplo. Olha só, o direito penal, via de regra, tutela os interesses dominantes. Qual o forte do nosso direito penal? O patrimonial. Talvez hoje esteja mais mesclado, mas se você pegar o Código Penal de 1940, o centro dele é o patrimônio. O sequestro, por exemplo, é um crime grave ou leve? É leve. Pena mínima de um ano. Grave é quando você exige dinheiro, porque então é extorsão mediante sequestro. Se você sequestrar para fim libidinoso, é rápido. Por exemplo, se eu e você entrarmos num lugar com a mão debaixo da blusa pra roubar, são cinco anos e quatro meses. Ao passo que o crime de corrupção é menos do que isso. Lesão corporal grave a pena é de dois anos. É por isso que só tem pobre na cadeia, porque os crimes praticados pelos pobres são mais severamente apenados.
NR - O Poder Judiciário tem um ranço pelo pobre?
Não tem jeito, o Estado privilegia quem tem mais. Pensa comigo, todos esses clubes de São Paulo, nenhum deles comprou seu terreno. Todos são públicos e estão cedidos para a diversão da classe média. Quantos clubes públicos você tem em São Paulo? Para aquele que precisa? Isso é em todas as esferas. Não tem pobre na magistratura, mas também não tem rico. Não é por isso que você deve desatentar para as questões sociais. Por isso que deve dosar estudo com o conhecimento da realidade social. Parece que a gente é reprimido quando quer ter contato com movimento social, conhecer a realidade social. O juiz encontra com banqueiro, participa de congressos de banqueiro, é normal, mas se encontra com movimento social está participando de ato ilícito.
Ricardo Viel, jornalista e colunista do Nota de Rodapé
NR - Por que em algumas situações como nos crimes de bagatela, os juízes e tribunais inferiores não seguem o entendimento pacificado pelo Supremo Tribunal Federal que beneficia o réu?
Marcelo Semer - O STF é, hoje, um tribunal muito mais garantista, muito mais liberal do que os tribunais de justiça e os juízes. Nem sempre foi assim. Acho que o ponto central foi a eleição do Lula e a renovação. Alguns ministros que estavam lá já eram mais liberais. Quando eles foram se agrupando, acaba puxando uma linha ainda mais garantista. O tribunal não tinha, até então, uma postura assim. Isso acontece, também, com o passar do tempo. Vem a Constituição e as pessoas vão incorporando os princípios constitucionais com o tempo. Você vai apurando, vai pensando sobre aquilo, escrevendo, e entendendo melhor o que ela quer dizer.
NR – E por que essa mudança não acontece com quem está abaixo dos ministros?
Os juízes, como quase todas as pessoas formadas em direito, tem uma perspectiva muito legalista. Eles se preocupam exageradamente com a lei e muito pouco com o princípio constitucional. Assim, a regra acaba valendo mais do que o princípio. Mas o princípio é superior, ele é quem informa e direciona as regras. Mas a regra é mais fácil de aplicar, enquanto o princípio você tem que depreender. O ensino do direito sempre foi positivista, técnico. É o que está ali escrito. Isso não dá vazão para entender os princípios.
NR – Esse pensamento influência de que forma no julgamento de crimes pequenos, como roubo de um desodorante, por exemplo?
Os juízes dizem que não existe uma regra que permita reconhecer o crime de bagatela, porque não está escrito no Código Penal. Então você chega a um absurdo em que a liberdade de uma pessoa possa ser colocada em risco por uma fração de real, como aconteceu comigo, que tive que julgar um caso de um rapaz que roubou um pincel que valia 1,67 reais. Isso é um contra-senso. Em certas situações aplicar certa regra infringe a dignidade da pessoa humana, que é um princípio superior. Só que a Constituição não diz, exatamente, o que é a dignidade da pessoa humana, você tem que aprender isso. Eles não conseguem entender que o direito é mais do que a lei, a lei não esgota o direito. É absurdo que você possa ter a liberdade valendo tão pouco.
NR – Nas faculdades os alunos não aprendem a pensar o direito como um sistema?
O que precisa ser entendido é que há certos limites para a lei. A barbárie é barbárie mesmo estando na lei. O nazismo era lei, o apartheid era lei também. Há certas situações em que você afirma um direito negando a lei. A lei não pode tudo. Há uma série de princípios, garantias e direitos fundamentais que não podem ser feridos pela lei, mas a gente passou anos e anos nessa mentalidade positivista: só interessa o que está na lei, o que não está na lei não faz parte do direito.Você desidratando a lei, ela serve para tudo, até para justificar o nazismo. O direito não se esgota na lei, o caso de bagatela é um exemplo disso.
NR – Ou seja, se o direito fosse só uma fórmula que você coloca no computador, quem furta um xampu ou um pedaço de carne comete crime, mas dentro de uma lógica maior, não é crime...
Tipicamente a conduta se adequa ao que está disposto no código: subtrair coisa alheia móvel. Mas se você for levar o direito penal para esse lado, fica impossível. O direito penal é seletivo, ele escolhe algumas condutas para proteger e em certas situações. Xingar é injúria, mas, por exemplo, no futebol você não vai aplicar isso. O sistema é seletivo. Você não pode fazer o direito penal proteger o ínfimo, o irrisório, porque senão você vai viver num estado de polícia. E tem outra coisa, boa parte desses crimes são furtos em supermercados e muitos deles são crimes impossíveis.
NR – Por que?
Porque as pessoas ficam vigiadas. Tem seguranças a paisana, as pessoas são vigiadas e fiscalizadas. É impossível porque não dá para consumar. Via de regra, são crimes tentados. Peguei um caso de um cidadão que entrou em um supermercado de um shopping chique de São Paulo. Estava embriagado e maltrapilho. Ele nunca ia conseguir furtar. Esperam ele pegar o produto, dão o flagrante e chamam a polícia.
NR – Os seguranças não poderiam ser instruídos a fazer uma segurança que inibisse o furto?
Eles dizem que isso pode constranger o cliente, pode gerar uma ação por danos morais. Mas você imagina que o cidadão pega e coloca uma garrafa na calça, o funcionário pode chegar e falar: “O senhor quer que eu traga uma cestinha para o senhor acomodar melhor o produto?” Pronto.
NR – Essa postura do Poder Judiciário de punir de forma pesada crimes irrisórios não estão, também, baseadas numa sensação de insegurança que tem a classe média, da qual os magistrados fazem parte?
Tem uma dimensão política também. As pessoas acham que se aumenta o número de crimes as penas devem ficar mais severas. Mas na verdade, se a pessoa chega no crime é porque alguns dos outros controles já falharam: a família, os amigos, o emprego. E quando essa pessoa volta da cadeia, a possibilidade dela reconstruir esses laços é menor ainda. O laço do emprego já foi, por exemplo. Olha só, o direito penal, via de regra, tutela os interesses dominantes. Qual o forte do nosso direito penal? O patrimonial. Talvez hoje esteja mais mesclado, mas se você pegar o Código Penal de 1940, o centro dele é o patrimônio. O sequestro, por exemplo, é um crime grave ou leve? É leve. Pena mínima de um ano. Grave é quando você exige dinheiro, porque então é extorsão mediante sequestro. Se você sequestrar para fim libidinoso, é rápido. Por exemplo, se eu e você entrarmos num lugar com a mão debaixo da blusa pra roubar, são cinco anos e quatro meses. Ao passo que o crime de corrupção é menos do que isso. Lesão corporal grave a pena é de dois anos. É por isso que só tem pobre na cadeia, porque os crimes praticados pelos pobres são mais severamente apenados.
NR - O Poder Judiciário tem um ranço pelo pobre?
Não tem jeito, o Estado privilegia quem tem mais. Pensa comigo, todos esses clubes de São Paulo, nenhum deles comprou seu terreno. Todos são públicos e estão cedidos para a diversão da classe média. Quantos clubes públicos você tem em São Paulo? Para aquele que precisa? Isso é em todas as esferas. Não tem pobre na magistratura, mas também não tem rico. Não é por isso que você deve desatentar para as questões sociais. Por isso que deve dosar estudo com o conhecimento da realidade social. Parece que a gente é reprimido quando quer ter contato com movimento social, conhecer a realidade social. O juiz encontra com banqueiro, participa de congressos de banqueiro, é normal, mas se encontra com movimento social está participando de ato ilícito.
Ricardo Viel, jornalista e colunista do Nota de Rodapé
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Exposição “Orixás" de Caco Bressane, colaborador do NR
Nosso colaborador, o ilustrador Caco Bressane, convida para sua primeira exposição: “Orixás”, que faz parte do evento “Identidade Cecilia”, em comemoração ao dia da consciência negra no dia 20 de novembro. Além da exposição, que ocorre no sábado (20), a partir das 16h, cinco reais a entrada, o visitante terá:
- exposição do ensaio fotográfico "ÁFRICA" de Roberto Andreoli e Helena Rios.
- apresentação da peça "Ensaio de um documentário".
- maracatu do Grupo Cangarussu.
- a música de BOOKA MUTOTO.
Endereço: Rua Vitorino Carmilo, 449 - 01153-000 - Santa Cecília - 11 3667 0262, na Associação Cultural Cecilia. Segue o convite abaixo. Prestigiem!
- exposição do ensaio fotográfico "ÁFRICA" de Roberto Andreoli e Helena Rios.
- apresentação da peça "Ensaio de um documentário".
- maracatu do Grupo Cangarussu.
- a música de BOOKA MUTOTO.
Endereço: Rua Vitorino Carmilo, 449 - 01153-000 - Santa Cecília - 11 3667 0262, na Associação Cultural Cecilia. Segue o convite abaixo. Prestigiem!
O homem do Baú
O Homem do Baú da Felicidade, Sílvio Santos, por Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista para o Nota de Rodapé. Conheça também seu blog: ONG PI.
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Como lidar com a simpatia suspeita (e o caso do Miguel do sebo)
O termo não é meu. Foi cunhado por um amigo ou ele roubou de alguém. Fato é que posso me considerar o responsável por desenvolver a teoria sobre essa curiosa espécie: os simpáticos suspeitos. Grosso modo, são aquelas pessoas – normalmente totais desconhecidas – que, sem motivo aparente, demonstram, já no primeiro contato, uma amabilidade e carinho desproporcional para a situação posta.
Após meses de análises e estudos de caso, identifiquei duas espécies clássicas de simpáticos suspeitos, com igual nível de periculosidade social. Desenvolvi, com base na pesquisa realizada, um protocolo de atuação em caso de abordagem.
Classe de simpáticos suspeitos
1) Simpáticos por profissão
Por pura necessidade - diria até, sobrevivência -, algumas pessoas desenvolvem esse tipo de simpatia. Justamente por ser imposta, ela é falsa e condicionada a uma possível retribuição. Exemplo clássico dos simpáticos por profissão são os vendedores.
Modus operandi: São ágeis e perspicazes. Aguardam um primeiro contato visual para a abordagem, e têm um tom amável, mas firme. Costumam falar no plural – muitas vezes aplicam o gerúndio (e de modo equivocado) - além de demonstrar interesse exagerado seja qual for sua resposta.
Como agir: Ao perceber sua presença, mantenha o passo firme, decidido e jamais estabeleça contato visual. Utilize todas as armas a seu alcance: comece a falar no celular, leia o que estiver à mão ou faça uma cara de dor - é permitido simular um problema estomacal e andar mais rápido).
Alerta: Essa espécie não consegue esconder a reação quando contrariada e pode demonstrar certa agressividade quando não atingem o objetivo. Esteja preparado.
2) Simpáticos por vocação (ou carência)
A simpatia, nesse caso, não se trata de algo desenvolvido, aprendido, mas um dom. Até por isso, é mais difícil de identificar, no primeiro momento, a presença dessa espécie. Podem tomar formas variadas, como a de uma sorridente senhora, um alinhado executivo ou até mesmo uma inofensiva enfermeira.
Modus operandi: Costumam iniciar uma conversa banal, muitas vezes em uma situação em que você e ela não estão sozinhos. Agem em filas de banco, viagens longas (de trem, ônibus ou avião) ou qualquer outra situação em que haja espera.
Como agir: Jamais responda ao contato, que pode ser um simples: “Que fila demorada, não?”; “Será que o ar condicionado está quebrado”, ou qualquer coisa do gênero. Alguns utilizam-se do contato físico, como uma cutucada nos ombros. No último dos casos, faça-se de estrangeiro ou surdo-mudo para não dar andamento à conversa.
Alerta: Não tenha piedade. Uma simples resposta, inocente e monossilábica que seja, pode significar horas e horas de conversa, que na maioria dos casos se converte em monólogo, já que essa espécie não está acostumada a ouvir, mas a falar.
O caso do Miguel do sebo
Se você estiver cansado das abordagens dos simpáticos suspeitos, sugiro uma ida ao Sebo do Miguel, em Perdizes, São Paulo. Não se assuste com a centena de livros aparentemente espalhados de qualquer maneira e prestes a caírem das prateleiras. Há uma ordem, e ela se chama caos. Miguel fingirá que não notou a sua presença. Após 20 minutos de procura de um livro, você se dará conta de que não encontrará nada sem o auxílio do Miguel. Pule a parte do protocolo de iniciação da conversa (“bom dia” ou “boa tarde”) e vá direto ao ponto. Não pergunte se tem um livro de tal autor. Pergunte se tem tal livro. Ele dirá que sim. Se você não pedir para ele te mostrar ou dizer onde está, a conversa vai terminar por aí. Se for um livro mais trabalhoso de achar, Miguel vai perguntar: “Você vai comprar?”. Só diga que sim se realmente for comprar. Se o primeiro contato foi bem-sucedido e Miguel tiver ido com a sua cara (ele deixa isso claro já no primeiro momento), peça a ela para, um dia, quem sabe, lhe mostrar os vinis. A resposta será: “Tudo bem, venha um dia com tempo e dinheiro”. Mesmo que você estiver com tempo e dinheiro naquele dia, não insista, porque ele não terá tempo – mesmo que aparentemente (e provavelmente) não esteja fazendo nada naquele momento.
Com o tempo e as constantes idas ao sebo, você vai se dar conta de que Miguel só trata dessa forma quem ele realmente gosta. Vai perceber que entrarão outras pessoas no local e que ele dirá que não tem um livro que tem, ou que está fechando (mesmo sendo três horas da tarde).
Se Miguel tiver gostado muito de você, um dia vai sugerir livros e até brincar com a sua namorada – que você levou pela primeira vez para conhecer a figura e o local. Frases do tipo “o que uma mulher tão bonita e educada como você está fazendo com um rapaz como ele?” são prêmios que poucos que frequentam o sebo podem se vangloriar de ter recebido. Se acontecer contigo, comemore: você fará parte do seleto grupo de pessoas que Miguel gosta de receber.
Henrique de Melo Sabines, mineiro, 30 anos, trabalha na ECT e se dedica à astronomia nos fins de semana. Fã de Drummond, começou a escrever por recomendações médicas. É um dos autores do espaço Cronetas no NR.
Após meses de análises e estudos de caso, identifiquei duas espécies clássicas de simpáticos suspeitos, com igual nível de periculosidade social. Desenvolvi, com base na pesquisa realizada, um protocolo de atuação em caso de abordagem.
Classe de simpáticos suspeitos
1) Simpáticos por profissão
Por pura necessidade - diria até, sobrevivência -, algumas pessoas desenvolvem esse tipo de simpatia. Justamente por ser imposta, ela é falsa e condicionada a uma possível retribuição. Exemplo clássico dos simpáticos por profissão são os vendedores.
Modus operandi: São ágeis e perspicazes. Aguardam um primeiro contato visual para a abordagem, e têm um tom amável, mas firme. Costumam falar no plural – muitas vezes aplicam o gerúndio (e de modo equivocado) - além de demonstrar interesse exagerado seja qual for sua resposta.
Como agir: Ao perceber sua presença, mantenha o passo firme, decidido e jamais estabeleça contato visual. Utilize todas as armas a seu alcance: comece a falar no celular, leia o que estiver à mão ou faça uma cara de dor - é permitido simular um problema estomacal e andar mais rápido).
Alerta: Essa espécie não consegue esconder a reação quando contrariada e pode demonstrar certa agressividade quando não atingem o objetivo. Esteja preparado.
2) Simpáticos por vocação (ou carência)
A simpatia, nesse caso, não se trata de algo desenvolvido, aprendido, mas um dom. Até por isso, é mais difícil de identificar, no primeiro momento, a presença dessa espécie. Podem tomar formas variadas, como a de uma sorridente senhora, um alinhado executivo ou até mesmo uma inofensiva enfermeira.
Modus operandi: Costumam iniciar uma conversa banal, muitas vezes em uma situação em que você e ela não estão sozinhos. Agem em filas de banco, viagens longas (de trem, ônibus ou avião) ou qualquer outra situação em que haja espera.
Como agir: Jamais responda ao contato, que pode ser um simples: “Que fila demorada, não?”; “Será que o ar condicionado está quebrado”, ou qualquer coisa do gênero. Alguns utilizam-se do contato físico, como uma cutucada nos ombros. No último dos casos, faça-se de estrangeiro ou surdo-mudo para não dar andamento à conversa.
Alerta: Não tenha piedade. Uma simples resposta, inocente e monossilábica que seja, pode significar horas e horas de conversa, que na maioria dos casos se converte em monólogo, já que essa espécie não está acostumada a ouvir, mas a falar.
O caso do Miguel do sebo
Se você estiver cansado das abordagens dos simpáticos suspeitos, sugiro uma ida ao Sebo do Miguel, em Perdizes, São Paulo. Não se assuste com a centena de livros aparentemente espalhados de qualquer maneira e prestes a caírem das prateleiras. Há uma ordem, e ela se chama caos. Miguel fingirá que não notou a sua presença. Após 20 minutos de procura de um livro, você se dará conta de que não encontrará nada sem o auxílio do Miguel. Pule a parte do protocolo de iniciação da conversa (“bom dia” ou “boa tarde”) e vá direto ao ponto. Não pergunte se tem um livro de tal autor. Pergunte se tem tal livro. Ele dirá que sim. Se você não pedir para ele te mostrar ou dizer onde está, a conversa vai terminar por aí. Se for um livro mais trabalhoso de achar, Miguel vai perguntar: “Você vai comprar?”. Só diga que sim se realmente for comprar. Se o primeiro contato foi bem-sucedido e Miguel tiver ido com a sua cara (ele deixa isso claro já no primeiro momento), peça a ela para, um dia, quem sabe, lhe mostrar os vinis. A resposta será: “Tudo bem, venha um dia com tempo e dinheiro”. Mesmo que você estiver com tempo e dinheiro naquele dia, não insista, porque ele não terá tempo – mesmo que aparentemente (e provavelmente) não esteja fazendo nada naquele momento.
Com o tempo e as constantes idas ao sebo, você vai se dar conta de que Miguel só trata dessa forma quem ele realmente gosta. Vai perceber que entrarão outras pessoas no local e que ele dirá que não tem um livro que tem, ou que está fechando (mesmo sendo três horas da tarde).
Se Miguel tiver gostado muito de você, um dia vai sugerir livros e até brincar com a sua namorada – que você levou pela primeira vez para conhecer a figura e o local. Frases do tipo “o que uma mulher tão bonita e educada como você está fazendo com um rapaz como ele?” são prêmios que poucos que frequentam o sebo podem se vangloriar de ter recebido. Se acontecer contigo, comemore: você fará parte do seleto grupo de pessoas que Miguel gosta de receber.
Henrique de Melo Sabines, mineiro, 30 anos, trabalha na ECT e se dedica à astronomia nos fins de semana. Fã de Drummond, começou a escrever por recomendações médicas. É um dos autores do espaço Cronetas no NR.
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
Protógenes Queiroz é condenado por abusos na Satiagraha
O Estadão de hoje traz informação de que o delegado (e também deputado federal pelo PcdoB) Protógenes Queiroz foi condenado pela Justiça Federal a três anos e quatro meses de prisão. Seus crimes: violação de sigilo funcional e fraude processual. “A pena foi substituída por restrições de direitos - Protógenes terá que prestar serviços à comunidade em um hospital público ou privado, "preferencialmente de atendimento a queimados", e fica proibido de exercer mandato eletivo, cargo, função ou atividade pública. Ele pode recorrer.”, escreveu Fausto Macedo, que assina o texto, completo aqui.
Sigilo da fonte & Mentira
Em outubro, Raimundo Rodrigues Pereira, supervisor editorial da revista mensal Retrato do Brasil fez longa reportagem em três capítulos sobre o tema. A investigação resultou no livro Escândalo Daniel Dantas: duas investigações, a ser lançado amanhã, na Fnac Pinheiros, informado aqui neste Nota de Rodapé. Há dois anos, Retrato do Brasil declarou que a então famosa Operação Satiagraha, conduzida por Queiroz, delegado da Polícia Federal (PF), mais escondia do que revelava informações sobre o misterioso processo de privatização da telefonia brasileira. Agora, a investigação da própria PF – e com a sentença do juiz saindo hoje - sobre os desmandos do delegado naquela ação ajuda a revelar o que o grande escândalo criado com a perseguição do financista Daniel Dantas encobria. No site da Retrato, inclusive, trechos do Jornal Nacional e áudios dos grampos. No entanto, para entender a história cabeluda, é preciso ler com atenção todo o material, parte dele, publicado no Ponto de Vista da revista, disponível aqui em PDF. A reportagem de capa na íntegra, "Escândalo esclarecido" baixe aqui.
Sigilo da fonte & Mentira
Em outubro, Raimundo Rodrigues Pereira, supervisor editorial da revista mensal Retrato do Brasil fez longa reportagem em três capítulos sobre o tema. A investigação resultou no livro Escândalo Daniel Dantas: duas investigações, a ser lançado amanhã, na Fnac Pinheiros, informado aqui neste Nota de Rodapé. Há dois anos, Retrato do Brasil declarou que a então famosa Operação Satiagraha, conduzida por Queiroz, delegado da Polícia Federal (PF), mais escondia do que revelava informações sobre o misterioso processo de privatização da telefonia brasileira. Agora, a investigação da própria PF – e com a sentença do juiz saindo hoje - sobre os desmandos do delegado naquela ação ajuda a revelar o que o grande escândalo criado com a perseguição do financista Daniel Dantas encobria. No site da Retrato, inclusive, trechos do Jornal Nacional e áudios dos grampos. No entanto, para entender a história cabeluda, é preciso ler com atenção todo o material, parte dele, publicado no Ponto de Vista da revista, disponível aqui em PDF. A reportagem de capa na íntegra, "Escândalo esclarecido" baixe aqui.
terça-feira, 9 de novembro de 2010
Retrato do Brasil de novembro
A revista mensal Retrato do Brasil traz, neste mês de novembro, reportagens sobre condições de vida, política, economia, ciência e cultura. A reportagem de capa traz um tema de interesse geral, a saúde. Intitulada “À beira da internação”, oito páginas indicam diferentes diagnósticos na primeira de duas reportagens sobre o caso do Sistema Único de Saúde, o SUS. Você já se perguntou quanto vale a liberdade? O repórter Ricardo Viel explica o que são os “crimes de bagatela”, que envolvem furtos de pequeno valor, tratados, em sua maioria, com penas muito severas. As ilustrações para a reportagem são de Caco Bressane.
A repressão a usuários de drogas fracassou, dizem especialistas. O debate agora é pautado por saúde pública e direitos humanos, é o que reporta Júlio Delmanto. Tadeu Breda explica que após confronto com policiais rebelados, Rafael Correa, do Equador, vai às ruas defender seu governo e ganha popularidade. De Buenos Aires, Mariana Camaroti, conta a Guerra da Mídia: o kirchnerismo, de olho na eleição de 2011, trava uma batalha para reduzir o poder dos grandes jornais como o Clarín.
Crise e revolta em Moçambique: protesto popular contra o aumento do custo de vida surpreende o governo e aumenta a tensão na região, detalha Yuri Martins Fontes. Rafael Hernandes explica porque as empreiteiras estão bombando. Grupos econômicos que controlam as grandes empreiteiras se dão muito bem atuando, inclusive, na ultralucrativa exploração de rodovias. Na praia da ciência, Flávio de Carvalho Serpa resenha a mais recente obra de Stephen Hawking que diz que Deus não é necessário na criação do Universo, mas, contraditoriamente, baseia suas análises na fé.
Em cultura, livro traça um panorama histórico da realidade econômico-cultural do cangaço após seu desaparecimento e Jean Rodrigues Sales resenha aos interessados em saber mais sobre a trajetória do Partido Comunista do Brasil, o PcdoB. Beatriz Rangel, fechando a edição, conta a história da Ação Griô Nacional, uma rica experiência cultural que vai servir de base para uma política pública permanente.
Lançamento quinta-feira:
A repressão a usuários de drogas fracassou, dizem especialistas. O debate agora é pautado por saúde pública e direitos humanos, é o que reporta Júlio Delmanto. Tadeu Breda explica que após confronto com policiais rebelados, Rafael Correa, do Equador, vai às ruas defender seu governo e ganha popularidade. De Buenos Aires, Mariana Camaroti, conta a Guerra da Mídia: o kirchnerismo, de olho na eleição de 2011, trava uma batalha para reduzir o poder dos grandes jornais como o Clarín.
Crise e revolta em Moçambique: protesto popular contra o aumento do custo de vida surpreende o governo e aumenta a tensão na região, detalha Yuri Martins Fontes. Rafael Hernandes explica porque as empreiteiras estão bombando. Grupos econômicos que controlam as grandes empreiteiras se dão muito bem atuando, inclusive, na ultralucrativa exploração de rodovias. Na praia da ciência, Flávio de Carvalho Serpa resenha a mais recente obra de Stephen Hawking que diz que Deus não é necessário na criação do Universo, mas, contraditoriamente, baseia suas análises na fé.
Em cultura, livro traça um panorama histórico da realidade econômico-cultural do cangaço após seu desaparecimento e Jean Rodrigues Sales resenha aos interessados em saber mais sobre a trajetória do Partido Comunista do Brasil, o PcdoB. Beatriz Rangel, fechando a edição, conta a história da Ação Griô Nacional, uma rica experiência cultural que vai servir de base para uma política pública permanente.
Lançamento quinta-feira:
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Cultura Digital e Jornalismo on-line
A Cinemateca de São Paulo vai abrigar o II Fórum da Cultura Digital 2010, evento importante e necessário para entender o que rola hoje e os rumos da Cultura Digital. Dia 14 de novembro, véspera do feriado, a abertura terá música boa: Gilberto Gil, Macaco Bong, DJ Tudo e a Banda de Pife Princesa do Agreste, no Auditório do Ibirapuera. No dia seguinte, aí já na Cinemateca Brasileira as discussões serão dividas em seis espaços, tudo simultaneamente:
O evento é aberto ao público e gratuito. As inscrições serão feitas na própria entrada da Cinemateca, na manhã de segunda-feira 15 de novembro (a partir das 9h), e durante todo o evento, sempre sujeita à lotação das atividades. A Cinemateca fica no Largo Senador Raul Cardoso, 207 – Vila Clementino – São Paulo. Veja o mapa.
Nesta semana no Itaú Cultural,
também de graça
Amanhã, no Itaú Cultural, ali na Av. Paulista, começa o quarto seminário internacional de jornalismo on-line, Mediaon, confira a programação. O evento discute jornalismo digital e novas mídias e também é de graça.
-Seminário Internacional
-Experiências de Cultura Digital
-Arena da Cultura Digital
-Deck
-Cultura Digital Mão na Massa
-Encontros de Redes
-Experiências de Cultura Digital
-Arena da Cultura Digital
-Deck
-Cultura Digital Mão na Massa
-Encontros de Redes
O evento é aberto ao público e gratuito. As inscrições serão feitas na própria entrada da Cinemateca, na manhã de segunda-feira 15 de novembro (a partir das 9h), e durante todo o evento, sempre sujeita à lotação das atividades. A Cinemateca fica no Largo Senador Raul Cardoso, 207 – Vila Clementino – São Paulo. Veja o mapa.
Nesta semana no Itaú Cultural,
também de graça
Amanhã, no Itaú Cultural, ali na Av. Paulista, começa o quarto seminário internacional de jornalismo on-line, Mediaon, confira a programação. O evento discute jornalismo digital e novas mídias e também é de graça.
José Dirceu no Roda Viva
José Dirceu, do PT, hoje em sua direção nacional, volta ao cenário político em dois atos: primeiro, como homem forte atuando nos bastidores da campanha de Dilma, eleita, ao amarrar as alianças do PT com o PMDB em alguns Estados. Segundo, pois no ano que vem será julgado pelo Supremo Tribunal Federal, no que se convencionou chamar na imprensa de “mensalão”. Acusado de Chefe de Quadrilha, o ex-ministro da Casa Civil de Lula, quer queiram ou não os desgostosos, apareceu bem seguro nesta entrevista ao programa Roda Viva do começo de novembro. Os 4 blocos do programa estão aqui para quem tiver interesse em assistir e opinar.
O que te marcou nas eleições?
Na enquete do NR, 49% opinaram que as baixarias eleitorais e a posição da grande imprensa foram as situações mais marcantes.
Essa foi a questão posta aos leitores do Nota de Rodapé durante a semana passada, assim que o pleito terminou. Do total de 77 votos distribuídos em 13 situações, 20 responderam que as “Baixarias e boatarias eleitorais” foi o que mais os marcou no período; 18 assinalaram a “posição da grande imprensa”; 10 a “atuação da blogosfera”; 8 “figurões políticos não reeleitos”; 7 “a bolinha de papel ou...”; 5 a “eleição de tiririca”; 2 “o caso Erenice Guerra”; 2 “a aplicação do ficha limpa”; 2 a “candidatura Weslian Roriz”; 2 “outras situações não relatadas” e 1 a “votação de Marina Silva”.
Essa foi a questão posta aos leitores do Nota de Rodapé durante a semana passada, assim que o pleito terminou. Do total de 77 votos distribuídos em 13 situações, 20 responderam que as “Baixarias e boatarias eleitorais” foi o que mais os marcou no período; 18 assinalaram a “posição da grande imprensa”; 10 a “atuação da blogosfera”; 8 “figurões políticos não reeleitos”; 7 “a bolinha de papel ou...”; 5 a “eleição de tiririca”; 2 “o caso Erenice Guerra”; 2 “a aplicação do ficha limpa”; 2 a “candidatura Weslian Roriz”; 2 “outras situações não relatadas” e 1 a “votação de Marina Silva”.
domingo, 7 de novembro de 2010
Ao contrário do agourado, morte de Néstor não enfraqueceu Cristina
O jornal Página12 desfaz, em suas páginas deste domingo (7), uma das teses criadas pela imprensa comercial argentina – e rapidamente reproduzida pela mídia nativa brasileira – sobre a morte de Néstor Kirchner.
Enquanto aves de agouro deste lado da fronteira apressavam-se em dizer que a presidente Cristina não aguentaria, nos moldes do que alguns querem machisticamente fazer com a presidente eleita do Brasil, do outro lado o povo acorria à mítica Praça de Maio para prestar seu apoio ao governo constitucional. Enquanto muita gente corria ao mercado de ações para comprar papéis do Clarín, apostando que Cristina não teria força para continuar enfrentando o braço-forte da imprensa argentina, milhões de pessoas reavaliavam o legado das gestões Kirchner.
O resultado está registrado pelo Página12: a morte de Néstor, por pior e lamentável que seja, acelerou o processo de recuperação da imagem da presidente. O imenso apoio popular agora se consolida em diferentes pesquisas, revertendo definitivamente a deterioração registrada entre 2008 e o começo de 2009, quando os governos Kirchner peitaram os interesses da elite rural. De acordo com o levantamento feito por Ricardo Rouvier & Asociados, 65% dos argentinos têm imagem positiva do governo, contra 35% que o avaliam como negativo.
Saiba mais:
- Aquele homem, Néstor Kirchner (Rodrigo Menitto)
- Kirchner deixa país órfão e muitas incógnitas (Mariana Camaroti, de Buenos Aires)
Mais que isso, aumentou bastante a vantagem de Cristina sobre os demais concorrentes nas eleições presidenciais do próximo ano. Se antes o cenário estava indefinido, e poderia ser Néstor o candidato, agora a chefe de Estado figura com chances de liquidar a fatura no primeiro turno. Nos dois cenários analisados, tem 45% dos votos totais, bem à frente de Maurício Macri (PRO), atual administrador de Buenos Aires, e de qualquer dos candidatos da União Cívica Radical. A situação pode mudar bastante até 2011, mas já se configura extremamente positiva levando-se em conta que, há pouco mais de um ano, este governo parecia agonizante.
Na outra mão, aqueles que esperavam abreviar este governo, agora, continuam podendo fazê-lo, mas já não contarão com o apoio das massas: 74% apoiam que a presidente possa governar. Ou seja, deixa a mulher trabalhar.
Dignas de nota:
− Júlio Cobos, vice-dissidente, foi indicado por um dos secadores brasileiros como rival de Cristina no próximo ano. O rapaz desconhece que o nome que vem vencendo as préviasda União Cívica Radical é Ricardo Alfonsín, filho de Raul, ex-presidente morto no ano passado. É possível que a rara figura de Cobos saia candidato, mas não se pode descartar a influência da herança alfonsinista sobre a UCR.
− Fernando “Pino” Solanas tem em torno de 6% das intenções de votos. Percentual bastante expressivo para um cineasta de ascendência socialista e que apenas recentemente obteve cargo político, sendo agora deputado.
João Peres é jornalista, colunista do Nota de Rodapé
Enquanto aves de agouro deste lado da fronteira apressavam-se em dizer que a presidente Cristina não aguentaria, nos moldes do que alguns querem machisticamente fazer com a presidente eleita do Brasil, do outro lado o povo acorria à mítica Praça de Maio para prestar seu apoio ao governo constitucional. Enquanto muita gente corria ao mercado de ações para comprar papéis do Clarín, apostando que Cristina não teria força para continuar enfrentando o braço-forte da imprensa argentina, milhões de pessoas reavaliavam o legado das gestões Kirchner.
O resultado está registrado pelo Página12: a morte de Néstor, por pior e lamentável que seja, acelerou o processo de recuperação da imagem da presidente. O imenso apoio popular agora se consolida em diferentes pesquisas, revertendo definitivamente a deterioração registrada entre 2008 e o começo de 2009, quando os governos Kirchner peitaram os interesses da elite rural. De acordo com o levantamento feito por Ricardo Rouvier & Asociados, 65% dos argentinos têm imagem positiva do governo, contra 35% que o avaliam como negativo.
Saiba mais:
- Aquele homem, Néstor Kirchner (Rodrigo Menitto)
- Kirchner deixa país órfão e muitas incógnitas (Mariana Camaroti, de Buenos Aires)
Mais que isso, aumentou bastante a vantagem de Cristina sobre os demais concorrentes nas eleições presidenciais do próximo ano. Se antes o cenário estava indefinido, e poderia ser Néstor o candidato, agora a chefe de Estado figura com chances de liquidar a fatura no primeiro turno. Nos dois cenários analisados, tem 45% dos votos totais, bem à frente de Maurício Macri (PRO), atual administrador de Buenos Aires, e de qualquer dos candidatos da União Cívica Radical. A situação pode mudar bastante até 2011, mas já se configura extremamente positiva levando-se em conta que, há pouco mais de um ano, este governo parecia agonizante.
Na outra mão, aqueles que esperavam abreviar este governo, agora, continuam podendo fazê-lo, mas já não contarão com o apoio das massas: 74% apoiam que a presidente possa governar. Ou seja, deixa a mulher trabalhar.
Dignas de nota:
− Júlio Cobos, vice-dissidente, foi indicado por um dos secadores brasileiros como rival de Cristina no próximo ano. O rapaz desconhece que o nome que vem vencendo as préviasda União Cívica Radical é Ricardo Alfonsín, filho de Raul, ex-presidente morto no ano passado. É possível que a rara figura de Cobos saia candidato, mas não se pode descartar a influência da herança alfonsinista sobre a UCR.
− Fernando “Pino” Solanas tem em torno de 6% das intenções de votos. Percentual bastante expressivo para um cineasta de ascendência socialista e que apenas recentemente obteve cargo político, sendo agora deputado.
João Peres é jornalista, colunista do Nota de Rodapé
Ganhadores da Promoção do livro Escândalo Daniel Dantas
Ganhadores do Twitter do livro Escândalo Daniel Dantas: duas investigações:
- @lavinia_talita
- @kelidacosta
No blogue, o ganhador foi:
- Nilo Dias Cabral
Vocês têm até terça-feira para me enviar o endereço completo em contato@notaderodape.com.br
Caso contrário, novo sorteio será realizado.
Obrigado a todos que participaram de mais essa promoção do NR.
Thiago Domenici, editor e coordenador.
- @lavinia_talita
- @kelidacosta
No blogue, o ganhador foi:
- Nilo Dias Cabral
Vocês têm até terça-feira para me enviar o endereço completo em contato@notaderodape.com.br
Caso contrário, novo sorteio será realizado.
Obrigado a todos que participaram de mais essa promoção do NR.
Thiago Domenici, editor e coordenador.
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
A dor moral é maior que a dor física
Estou com um sentimento ruim que não passa. Antes de quarta-feira, 3, era uma dor no peito, que começou a me preocupar por ser crescente e com reflexos físicos aparentes. Odeio ir ao médico e consultórios me dão arrepios. Por insistência da família e amigos resolvi acionar o meu plano de saúde com o qual gasto, mensalmente, há quase um ano, 155 reais; Dix20 da Amil, utilizado duas vezes (sendo essa da história a seguir a segunda).
É por estar indignado que compartilho com vocês essa infeliz experiência, a maior humilhação da minha vida. Temos que refletir e agir, afinal, sou um caso entre centenas, talvez milhares...
No meu primeiro contato com a atendente do plano de saúde fui informado que apenas para dali a duas semanas haveria agenda disponível. Sem alternativa, aceitei. Marquei a consulta na Zona Leste, na Avenida Pires do Rio (perto da minha casa). Para esse dia desmarquei meus compromissos profissionais, queria apenas resolver essa dor. Quando se trabalha com jornalismo você se depara com pessoas e histórias de saúde fatídicas e, mesmo não sendo um hipocondríaco, a sua mente começa a criar ideias nada agradáveis sobre a provável origem do problema.
No esperado dia da consulta, às 14h, estava no meu carro ao lado da minha namorada, hoje meu braço direito nos processos de captação de recursos para projetos culturais. O trânsito estava infernal. Ao sairmos do bairro do Belém, o combinado era ficar no consultório, nesse interim, minha namorada iria para uma reunião na Av. Paulista.
Apenas para confirmar a consulta e o endereço liguei para o médico que me atenderia: José T.C. Uma atendente de nome Isaura afirmou que o consultório (para o qual eu havia ligado há duas semanas) atendia somente na Avenida Paulista e não na Pires do Rio. Fora esse erro de informação, Isaura zombou do fato de eu precisar de um médico numa região afastada. São Miguel Paulista, segundo ela "é quase no fim de tudo."
São Paulo é uma cidade enorme e pela minha profissão circulo por todas as regiões e conheço de mansões a favelas. Além disso, independentemente dos quilômetros de distância que São Miguel fique do centro, não significa que a população daqui não mereça um atendimento médico de qualidade, seja lá em qual setor.
Tenho orgulho da minha história nesse bairro. Viajei por todo o Brasil, mas amo esse lugar, além do fato de meus amigos e família estarem aqui. Em São Miguel desenvolvi meus primeiros projetos e meus primeiros textos; conheci pessoas incríveis de projeção profissional e intelectual admiráveis, desde artistas e professores de universidades públicas e particulares até escritores, documentaristas, poetas, arquitetos, pesquisadores.
Senti raiva, mas não revidei o preconceito, apenas disse "tchau" e desliguei. Confuso, liguei para o número alternativo e a mesma Izaura atendeu. Debochada, riu, e disse que eu já havia ligado. Resolvi aceitar a realidade e marquei a consulta na Av. Paulista enquanto ela me tratava como se estivesse fazendo um grande favor.
Reservado o espaço na agenda para às 15h 45, desliguei o telefone para não levar uma multa. Liguei em seguida, agora para confirmar o número da minha carteira do plano de saúde. Como não uso o plano com frequencia tinha dúvidas de onde estava o registro que precisava informar.
A dor era outra
A todo momento me chamando de “bem”, Izaura disse que não tinha tempo a perder. Foi quando perguntei se ela estava nervosa. Retrucou dizendo que não tinha obrigação de marcar a minha consulta (que havia sido marcada, repito, há duas semanas) e desligou na minha cara.
Achei que eu fosse explodir. Na minha quarta ligação apenas desabafei. Ressaltei a forma como estava insatisfeito com o atendimento. Foi quando Izaura gritou comigo. Então disse que ela era uma grossa e mal-educada e mais uma vez o telefone foi desligado. A minha dor naquele momento já era outra, estava indignado e me sentindo um lixo. Decidi com minha namorada ir ao consultório. A ideia era falar com o médico sobre o episódio.
O endereço era pomposo: Av. Paulista, 2006, conjunto 1015. Uma bela recepção no hall de entrada, com um atendimento muito melhor do que o que receberíamos a seguir.
Enquanto esperávamos vi indícios de grosseria com mais dois pacientes. O consultório era uma saleta, com espaço claustrofóbico para espera e com algumas pessoas do lado de fora.
Quando Izaura leu o meu nome nos documentos, os olhos saltaram e sua voz alterou de tal forma que parecia que a estávamos ameaçando. O que eu queria era reclamar para o médico, mas fomos insultados por Izaura que, descontrolada, ameaçou chamar a polícia e bater na minha namorada. Não éramos bem-vindos pelo simples fato de estarmos insatisfeitos.
A decepção maior foi quando o médico José T.C. saiu da sala dele, e ao nos dirigir a palavra disse: "Aqui não é um hospital público" e zombou do nosso plano de saúde na frente de todas as outras pessoas.
Fui argumentar e o “doutor” virou as costas e bateu a porta. Izaura sorriu e, num momento de fúria, minha namorada jogou todos os papéis da mesa dela para o alto. Um ato impensado, num impulso que surgiu por uma pressão social, por uma ridicularização na qual fomos, gratuitamente, expostos.
Denunciar sempre
Denunciei o médico para o Plano de Saúde e irei redigir uma carta para a ouvidoria do Conselho Regional de Medicina. Jamais passei por isso, nem durante a produção de documentários ou matérias políticas, que acarretam dificuldades de abordagem. Quando o médico riu do meu plano de saúde o que ele queria dizer? “Cara, faça um plano mais caro e te atenderei melhor. Pois sou muito importante para receber tão pouco”.
A desequilibrada Izaura é fruto de uma liderança pífia e preconceituosa, é o resultado de uma total falta de qualificação profissional. Essa trupe de mal-educados, vide o recente exemplo das baixarias sobre os nordestinos no twitter, representa o que de pior há no sucateamento ético, moral e de atendimento do setor de Saúde Brasileiro. É a falta de respeito com o direito humano a saúde, que é constitucional. No meio de todo esse barraco a minha dor física ficou pequena e problema agora é moral. E pensar que tudo isso poderia ser evitado pela bela e boa educação, coisa que vem de berço e não se aprende na universidade.
Para reclamar:
- Saiba como denunciar (Conselho Federal de Medicina)
- Lista dos Conselhos Estaduais de Medicina por Estado
- Procon - Reclamações sobre Saúde - Planos de Saúde
Daniel Reis é jornalista
É por estar indignado que compartilho com vocês essa infeliz experiência, a maior humilhação da minha vida. Temos que refletir e agir, afinal, sou um caso entre centenas, talvez milhares...
No meu primeiro contato com a atendente do plano de saúde fui informado que apenas para dali a duas semanas haveria agenda disponível. Sem alternativa, aceitei. Marquei a consulta na Zona Leste, na Avenida Pires do Rio (perto da minha casa). Para esse dia desmarquei meus compromissos profissionais, queria apenas resolver essa dor. Quando se trabalha com jornalismo você se depara com pessoas e histórias de saúde fatídicas e, mesmo não sendo um hipocondríaco, a sua mente começa a criar ideias nada agradáveis sobre a provável origem do problema.
No esperado dia da consulta, às 14h, estava no meu carro ao lado da minha namorada, hoje meu braço direito nos processos de captação de recursos para projetos culturais. O trânsito estava infernal. Ao sairmos do bairro do Belém, o combinado era ficar no consultório, nesse interim, minha namorada iria para uma reunião na Av. Paulista.
Apenas para confirmar a consulta e o endereço liguei para o médico que me atenderia: José T.C. Uma atendente de nome Isaura afirmou que o consultório (para o qual eu havia ligado há duas semanas) atendia somente na Avenida Paulista e não na Pires do Rio. Fora esse erro de informação, Isaura zombou do fato de eu precisar de um médico numa região afastada. São Miguel Paulista, segundo ela "é quase no fim de tudo."
São Paulo é uma cidade enorme e pela minha profissão circulo por todas as regiões e conheço de mansões a favelas. Além disso, independentemente dos quilômetros de distância que São Miguel fique do centro, não significa que a população daqui não mereça um atendimento médico de qualidade, seja lá em qual setor.
Tenho orgulho da minha história nesse bairro. Viajei por todo o Brasil, mas amo esse lugar, além do fato de meus amigos e família estarem aqui. Em São Miguel desenvolvi meus primeiros projetos e meus primeiros textos; conheci pessoas incríveis de projeção profissional e intelectual admiráveis, desde artistas e professores de universidades públicas e particulares até escritores, documentaristas, poetas, arquitetos, pesquisadores.
Senti raiva, mas não revidei o preconceito, apenas disse "tchau" e desliguei. Confuso, liguei para o número alternativo e a mesma Izaura atendeu. Debochada, riu, e disse que eu já havia ligado. Resolvi aceitar a realidade e marquei a consulta na Av. Paulista enquanto ela me tratava como se estivesse fazendo um grande favor.
Reservado o espaço na agenda para às 15h 45, desliguei o telefone para não levar uma multa. Liguei em seguida, agora para confirmar o número da minha carteira do plano de saúde. Como não uso o plano com frequencia tinha dúvidas de onde estava o registro que precisava informar.
A dor era outra
A todo momento me chamando de “bem”, Izaura disse que não tinha tempo a perder. Foi quando perguntei se ela estava nervosa. Retrucou dizendo que não tinha obrigação de marcar a minha consulta (que havia sido marcada, repito, há duas semanas) e desligou na minha cara.
Achei que eu fosse explodir. Na minha quarta ligação apenas desabafei. Ressaltei a forma como estava insatisfeito com o atendimento. Foi quando Izaura gritou comigo. Então disse que ela era uma grossa e mal-educada e mais uma vez o telefone foi desligado. A minha dor naquele momento já era outra, estava indignado e me sentindo um lixo. Decidi com minha namorada ir ao consultório. A ideia era falar com o médico sobre o episódio.
O endereço era pomposo: Av. Paulista, 2006, conjunto 1015. Uma bela recepção no hall de entrada, com um atendimento muito melhor do que o que receberíamos a seguir.
Enquanto esperávamos vi indícios de grosseria com mais dois pacientes. O consultório era uma saleta, com espaço claustrofóbico para espera e com algumas pessoas do lado de fora.
Quando Izaura leu o meu nome nos documentos, os olhos saltaram e sua voz alterou de tal forma que parecia que a estávamos ameaçando. O que eu queria era reclamar para o médico, mas fomos insultados por Izaura que, descontrolada, ameaçou chamar a polícia e bater na minha namorada. Não éramos bem-vindos pelo simples fato de estarmos insatisfeitos.
A decepção maior foi quando o médico José T.C. saiu da sala dele, e ao nos dirigir a palavra disse: "Aqui não é um hospital público" e zombou do nosso plano de saúde na frente de todas as outras pessoas.
Fui argumentar e o “doutor” virou as costas e bateu a porta. Izaura sorriu e, num momento de fúria, minha namorada jogou todos os papéis da mesa dela para o alto. Um ato impensado, num impulso que surgiu por uma pressão social, por uma ridicularização na qual fomos, gratuitamente, expostos.
Denunciar sempre
Denunciei o médico para o Plano de Saúde e irei redigir uma carta para a ouvidoria do Conselho Regional de Medicina. Jamais passei por isso, nem durante a produção de documentários ou matérias políticas, que acarretam dificuldades de abordagem. Quando o médico riu do meu plano de saúde o que ele queria dizer? “Cara, faça um plano mais caro e te atenderei melhor. Pois sou muito importante para receber tão pouco”.
A desequilibrada Izaura é fruto de uma liderança pífia e preconceituosa, é o resultado de uma total falta de qualificação profissional. Essa trupe de mal-educados, vide o recente exemplo das baixarias sobre os nordestinos no twitter, representa o que de pior há no sucateamento ético, moral e de atendimento do setor de Saúde Brasileiro. É a falta de respeito com o direito humano a saúde, que é constitucional. No meio de todo esse barraco a minha dor física ficou pequena e problema agora é moral. E pensar que tudo isso poderia ser evitado pela bela e boa educação, coisa que vem de berço e não se aprende na universidade.
Para reclamar:
- Saiba como denunciar (Conselho Federal de Medicina)
- Lista dos Conselhos Estaduais de Medicina por Estado
- Procon - Reclamações sobre Saúde - Planos de Saúde
Daniel Reis é jornalista
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