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Apenas o mundo da fantasia pode explicar os gastos de mais de 12 bilhões de reais, anunciados pelo Brasil, para adquirir aviões de guerra fabricados na França. No seu delírio, o governo tenta justificar a negociação dizendo que não vai comprar apenas caças, mas sim transferência de tecnologia. Só que os próprios jornais parisienses deixam claro que estamos caindo no conto do vigário. Destacam que o ciclo de vida de um avião de combate é de 40 anos. Dizem que, com os 36 caças que devem ser comprados, o Brasil estará equipado até 2050 e, até lá, a tecnologia das aeronaves estará mais do que superada.
A Dassault Aviation, companhia que fabrica os aviões, foi profundamente atingida pela crise e os franceses ficaram impressionados com os frutos do potente lobby de Sarkozy. Ele conseguiu do presidente Lula uma garantia diplomática de preferência, em detrimento aos dois outros concorrentes, os Estados Unidos e a Suécia, que apresentaram propostas mais baratas e tecnicamente melhores, conforme relatório da própria Força Aérea Brasileira. Com a transação em vias de ser concluída, não apenas a empresa será salva de um grande colapso, mas também será garantida a geração de 5 mil empregos na França, com o dinheiro suado dos brasileiros.
Com o valor a ser gasto, o Brasil poderia contratar a mais competente equipe de técnicos e pesquisadores do mundo, para desenvolver uma tecnologia própria. Poderia ainda investir na formação de cientistas brasileiros, projetando o futuro do país com base em educação e não em ilusões militares, que parecem vindas dos filmes de guerra de Hollywood. Algo completamente distante da vocação brasileira.
A guerra que o Brasil tem que vencer é contra os seus traumas, a sua polícia corrupta, as fronteiras mal vigiadas - por onde passam drogas e contrabando, a violência e a corrupção política. Mas, no super Brasil, propagado por um marketing com base em números e não em dados sociais, os nossos grandes problemas são meros detalhes. Nas tabelas dos economistas estamos à frente de muitos países desenvolvidos e precisamos deixar isso claro, posando para a foto com a Torre Eiffel ao fundo. Portanto, é melhor esquecermos os relatórios técnicos, pois o que importa mesmo é que os bebês brasileiros também venham de Paris.
Sergio Denicoli é jornalista e pesquisador de mídias digitais na Universidade do Minho, em Portugal. Estreia hoje sua coluna Território Europa no Nota de Rodapé
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