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30 de Julho de 1929, jovens velejadoras no porto de Deauville, França (Getty Images)

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Cada vez mais patético

A cada dia do governo Dilma Rouselff, fica mais patético o patético vídeo pit bull da patética campanha do PSDB

Transcorridos 150 dias do governo Dilma Rousseff, a esquerda aguarda sentada por sinais de que os rumos mudarão. Enquanto isso, assiste de camarote ao avanço conservador no Palácio do Planalto. Comissão da Verdade e regulação da comunicação, consensos ocos de primeira hora, são tratados a banho maria.

A esta altura, o apocalíptico vídeo lançado “na miúda” pelo PSDB durante a campanha eleitoral de 2010 soa cada vez mais digno de gargalhadas. Se há ainda algum motivo para rir em relação ao governo Dilma, eis-lo. As imagens que mostravam que o presidente Lula não conseguiria segurar os pit bulls do PT, uma alusão aos “radicais” do partido, soam a cada dia mais patéticas.

Se àquela altura não havia motivo para acreditar na estapafúrdia hipótese, hoje a peça publicitária poderia ser refeita para mostrar que o difícil é segurar os exaltados do PMDB, do PR, do PTB, do PSC, do PDT e de tudo quanto é P, mais ou menos conservador, que integra a base aliada.

Colocado em posição incômoda pelos próprios erros, pelos erros do PT e pelo erro de acreditar na aliança com partidos que representam o que há de pior no país, Dilma vai desenhando um primeiro ano de gestão absolutamente conservador. Não faz falta falar sobre a decisão de privatizar aeroportos.

A essa altura, um vídeo igualmente patético que quisesse parecer verossímil poderia mostrar a presidenta rompendo com Lula, mas não para instalar o “autoritarismo de esquerda” no país, como queriam fazer crer os tucanos, e sim para reforçar a agenda ultraconservadora do PSDB, apenas parcialmente alijada do centro das propostas para o país durante o governo anterior.

No campo econômico, prevalece a ortodoxia, aceitando quase tudo quanto é imposto pelo mercado e pela imprensa comercial, em sua criminosa campanha a favor da inflação. No campo social, reafirma-se a crença na mitigação dos deletérios efeitos do capitalismo, como demonstrado no lançamento do Brasil Sem Miséria, em detrimento da construção de modelos alternativos baseados na economia solidária e na superação das contradições inerentes ao atual sistema.

Foi de assustar não apenas a decisão de vetar o kit para combater a homofobia nas escolas, mas a justificativa apresentada publicamente pela presidenta, por não achar correto “nenhum órgão do governo fazer propaganda de opções sexuais”, discurso é idêntico ao da bancada religiosa no Congresso, responsável direta pela suspensão do material elaborado pelo MEC.

O erro de utilizar “opções sexuais” no lugar de “orientações” apenas reforça aquilo que já se sabe, de que Dilma não tem histórico de debate junto a movimentos que batalham por conquistas sociais. Lula devia satisfações a estas organizações e aos sindicatos, inscritos em seu DNA. Dilma não deve explicações nem mesmo ao PT, do qual jamais foi um quadro forte, histórico ou simbólico.

Ainda na seara social, o governo atual diz não ao massacre de camponeses na Amazônia Legal, mas trabalha loucamente para iniciar as obras de hidrelétricas e rodovias que resultarão em mais desmatamento, levando a novos conflitos agrários e a novos assassinatos de populações marginalizadas.

Reafirma-se o poder de coronéis locais com os quais, aliás, esta e a anterior gestão não fizeram questão de romper, como demonstra o caso de José Sarney – apenas para ficar no exemplo mais óbvio.
Ainda a este respeito, soou desmedida e descuidada a reação às críticas feitas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) sobre o processo de concessão das licenças para construção de Belo Monte.

A destacar-se a fala de Nelson Jobim, o ministro fardado, que pediu que a Organização dos Estados Americanos (OEA) vá cuidar de outros assuntos. Mais felizes as palavras de Frei Betto em entrevista a este repórter: “Se o Brasil está insatisfeito com o que seria uma ingerência da OEA em assuntos internos, siga o exemplo de Cuba: rompa. Agora, se o Brasil continua como signatário e membro da OEA, precisa respeitar as decisões da OEA.”

Preocupa também a postura do chanceler Antonio Patriota, que dá seguidas demonstrações de inclinação aos Estados Unidos e aos países ricos em geral, podendo deixar em segundo plano a tão bem sucedida política de Celso Amorim, que acertou em cheio ao priorizar a construção de relações mais sólidas dentro do Hemisfério Sul.

É curioso notar que Patriota, José Eduardo Cardozo, Gilberto Carvalho, Guido Mantega e Miriam Belchior, apenas para citar parte do núcleo central de ministros, falam todos a mesma língua. Afinar o discurso que será feito da porta para fora do Planalto pode ser acertado para evitar a lavagem de roupa suja por meio da imprensa, mas é irritante notar que Maria do Rosário e Jobim, no governo Dilma, às vezes parecem a mesma pessoa, o que – definitivamente – não são. Irrita ainda mais notar que o discurso uníssono se dá também em mão única: em direção aos conservadores. A esquerda, Dilma, aqui estamos, por vós esperamos.

João Peres é jornalista e colunista do Nota de Rodapé

Um comentário:

Raphael Tsavkko Garcia disse...

Você esqueceu da Ana de Hollanda, a primeira a causar - imensa - insatisfação no governo. Ótimo artigo.

Aliás, compartilho, reforçando a posição sobre a OEA e a vergonha brasileira - http://www.tsavkko.com.br/2011/05/brasil-e-o-multilateralismo-de.html

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