O graffiti paulistano, em seu momento atual, ilustra com perfeição algumas frases de cunho popular como: "está na crista da onda", "nas paradas de sucesso", "na boca do povo" e tantas outras expressões utilizadas corriqueiramente para salientar determinado status de algum sujeito ou objeto.
Cobiçada por galerias de arte no mundo todo, a estética autêntica do graffiti da cidade de São Paulo tem ganhado cada vez mais espaço dentro do campo das artes contemporâneas.
Integrante de um seleto grupo de artistas nacionais reconhecidos internacionalmente, Claudio Ethos extrapola os limites da imaginação e ressignifica o conceito de arte urbana no país.
Suas pinturas são pontuais, os personagens construídos lentamente no muro formam um deleite visual capaz de impactar abruptamente as pessoas que caminham pelas ruas e os transpor para uma linha tênue entre ficção e realismo estritos ao seu universo criativo.
Nas asas do crescente interesse midiático e do mercado de arte pelo graffiti nacional se aglomeram um contingente de novos aspirantes a artistas urbanos. Se por um lado há um processo de reconhecimento das Instituições Públicas e Privadas pelo trabalho de artistas cuja trajetória no meio é louvável, por outro observamos a massificação da cultura do graffiti, protagonizada por jovens que colocam em primeiro plano o ato de pintar na rua e deixam de lado o aperfeiçoamento de seu talento e suas habilidades artísticas.
Na contramão deste movimento, Ethos mostra sabedoria ao optar pelo refino do traço e paciência ao trabalhar insistentemente no aperfeiçoamento de seus personagens.
Foi um processo longo de concentração e produção interna (dentro de seu ateliê, fora das ruas) que perdurou durante anos até atingir um nível de exigência e satisfação pessoal específico antes de ganhar os muros da cidade com suas pinturas.
Victor Moriyama, 26 anos, é repórter fotográfico do Jornal O Vale, em São José dos Campos, cidade que reside atualmente. Mantém coluna Fotógrafo-escreve no NR.
terça-feira, 30 de agosto de 2011
segunda-feira, 29 de agosto de 2011
Sinhá (de Chico Buarque)
Para quem não ouviu e para os que pretendem ouvir o novo cd do Chico Buarque, peço atenção a letra que encerra o disco, Sinhá, a canção mais longa do cd, com quatro minutos.
Trata-se de uma história da escravidão. Um primor. Abaixo, Chico canta a música com João Bosco.
Sinhá
Chico Buarque
Se a dona se banhou
Eu não estava lá
Por Deus Nosso Senhor
Eu não olhei Sinhá
Estava lá na roça
Sou de olhar ninguém
Não tenho mais cobiça
Nem enxergo bem
Para que me pôr no tronco
Para que me aleijar
Eu juro a vosmecê
Que nunca vi Sinhá
Por que me faz tão mal
Com olhos tão azuis
Me benzo com o sinal
Da santa cruz
Eu só cheguei no açude
Atrás da sabiá
Olhava o arvoredo
Eu não olhei Sinhá
Se a dona se despiu
Eu já andava além
Estava na moenda
Estava para Xerém
Por que talhar meu corpo
Eu não olhei Sinhá
Para que que vosmincê
Meus olhos vai furar
Eu choro em iorubá
Mas oro por Jesus
Para que que vassuncê
Me tira a luz
E assim vai se encerrar
O conto de um cantor
Com voz do pelourinho
E ares de senhor
Cantor atormentado
Herdeiro sarará
Do nome e do renome
De um feroz senhor de engenho
E das mandingas de um escravo
Que no engenho enfeitiçou Sinhá
Trata-se de uma história da escravidão. Um primor. Abaixo, Chico canta a música com João Bosco.
Sinhá
Chico Buarque
Se a dona se banhou
Eu não estava lá
Por Deus Nosso Senhor
Eu não olhei Sinhá
Estava lá na roça
Sou de olhar ninguém
Não tenho mais cobiça
Nem enxergo bem
Para que me pôr no tronco
Para que me aleijar
Eu juro a vosmecê
Que nunca vi Sinhá
Por que me faz tão mal
Com olhos tão azuis
Me benzo com o sinal
Da santa cruz
Eu só cheguei no açude
Atrás da sabiá
Olhava o arvoredo
Eu não olhei Sinhá
Se a dona se despiu
Eu já andava além
Estava na moenda
Estava para Xerém
Por que talhar meu corpo
Eu não olhei Sinhá
Para que que vosmincê
Meus olhos vai furar
Eu choro em iorubá
Mas oro por Jesus
Para que que vassuncê
Me tira a luz
E assim vai se encerrar
O conto de um cantor
Com voz do pelourinho
E ares de senhor
Cantor atormentado
Herdeiro sarará
Do nome e do renome
De um feroz senhor de engenho
E das mandingas de um escravo
Que no engenho enfeitiçou Sinhá
Diálogo entre Carlos e João
Ouvi dizer que dois grandes poetas, um chamado Carlos e outro João, se encontraram e travaram, em verso, o diálogo que agora reproduzo, por ouvir dizer.
- Difícil ser funcionário nesta segunda-feira. Eu te peço conselho, Carlos.
- Chega um tempo em que a vida é uma ordem, João. Trabalhas sem alegria para um mundo caduco…
- Não é lá fora o dia que me deixa assim, é a dor das coisas…
- Teus ombros suportam o mundo, meu caro. E ele não pesa mais que a mão de uma criança.
- Não me sinto correto de gravata de cor, e na cabeça uma moça em forma de lembrança.
- Oh, abre os vidros de loção e abafa o insuportável mau cheiro da memória.
- O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. Comeu minha genealogia, meu endereço.
- De tudo, terrível, fica um pouco: às vezes um botão, às vezes um rato.
- O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta…
- O amor resultou inútil. Os olhos não choram, as mãos tecem apenas o rude trabalho e o coração está seco… E agora, João?
- Não há melhor resposta que o espetáculo da vida…
- Alguns, achando bárbaro o espetáculo, prefeririam (os delicados) morrer.
- Morrer? O amor voltou para comer os anos que as linhas de minha mão asseguravam…
- Chega um tempo em que não adianta morrer.
- Comeu meu silêncio, meu medo da morte!
- O ódio é o melhor de mim. Com ele me salvo e dou a poucos uma esperança mínima.
- Mas Carlos, dessa náusea, como colher a flor?
- Completo silêncio! Paralise os negócios! Garanto que uma flor nasceu. É feia, mas é realmente uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
- Te telefono, Carlos, pedindo conselho…
- Eu não devia te dizer, mas essa lua, esse conhaque botam a gente comovido como o diabo.
Ricardo Viel, jornalista, colunista do NR e do Purgatório. Escreve às segundas.
- Difícil ser funcionário nesta segunda-feira. Eu te peço conselho, Carlos.
- Chega um tempo em que a vida é uma ordem, João. Trabalhas sem alegria para um mundo caduco…
- Não é lá fora o dia que me deixa assim, é a dor das coisas…
- Teus ombros suportam o mundo, meu caro. E ele não pesa mais que a mão de uma criança.
- Não me sinto correto de gravata de cor, e na cabeça uma moça em forma de lembrança.
- Oh, abre os vidros de loção e abafa o insuportável mau cheiro da memória.
- O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. Comeu minha genealogia, meu endereço.
- De tudo, terrível, fica um pouco: às vezes um botão, às vezes um rato.
- O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta…
- O amor resultou inútil. Os olhos não choram, as mãos tecem apenas o rude trabalho e o coração está seco… E agora, João?
- Não há melhor resposta que o espetáculo da vida…
- Alguns, achando bárbaro o espetáculo, prefeririam (os delicados) morrer.
- Morrer? O amor voltou para comer os anos que as linhas de minha mão asseguravam…
- Chega um tempo em que não adianta morrer.
- Comeu meu silêncio, meu medo da morte!
- O ódio é o melhor de mim. Com ele me salvo e dou a poucos uma esperança mínima.
- Mas Carlos, dessa náusea, como colher a flor?
- Completo silêncio! Paralise os negócios! Garanto que uma flor nasceu. É feia, mas é realmente uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
- Te telefono, Carlos, pedindo conselho…
- Eu não devia te dizer, mas essa lua, esse conhaque botam a gente comovido como o diabo.
Ricardo Viel, jornalista, colunista do NR e do Purgatório. Escreve às segundas.
quinta-feira, 25 de agosto de 2011
Brasília: uma sinfonia decadente ao excesso
Em uma sociedade, a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante. Não sou eu quem está dizendo, e sim um tal de Carlo Marques, algo assim. Mas se a ideologia dominante é a da classe dominante, a vida das pessoas orbita, então, em torno do que as pessoas do centro consideram importante em sua vida.
Pois bem, vejo isso com uma clareza cruel em Brasília. Tenho certeza que não é um privilégio dessa cidade tão atípica, mas aqui percebo com uma crueza que me espanta genuinamente que o principal eixo em torno da qual gira a vida de muita gente é o excesso. Nada mais decadente.
Tem gente que considera que é um axioma da sofisticação aquele paradigma de que “menos é mais”. Ou seja, que os excessos são cafona. Que você usar um salto de 15 centímetros para ir à padaria, ostentar 25 carros de luxo na garagem, ou outras demonstrações ostensivas de poder econômico é, resumidamente, algo muito brega.
Em Brasília esse axioma não vale. A matemática por aqui é mais simples. “Mais é mais”. Novamente, imagino que isso não exclusividade da cidade. Mas em Brasília, isso é muito mais evidente, e é jogado na cara das pessoas de maneira muito mais aberta, do que eu já percebi em outros lugares.
Não por acaso, um monte de gente considera Brasília uma “ilha da fantasia”. Ok, as coisas aqui são muito diferentes, a vida gira muito em torno da agenda política e do funcionalismo público. Isso acarretou que houvesse a criação de uma classe média forte e pujante. A cidade foi planejada para isso, tanto que era pras asas serem a moradia do grosso da população. E entre as quadras 400, consideradas as mais populares das asas, e os conjuntos mais caros, não deveria haver uma grande diferença. Algo meio social-democracia aplicada.
Mas isso não teria como dar certo na sociedade que se desenvolveu aqui. A camada de cima precisa, de forma muito expressiva, se destacar. Precisa mostrar com todo o esplendor que faz parte de uma elite muito elite.
É consenso que um bom investimento, para quem quer fazer dinheiro, é o mercado de alto luxo de Brasília. Provavelmente fará mais sucesso aqui uma loja que venda snowboards da mais alta qualidade e do mais alto preço do que uma livraria que não tenha grandes atrativos além de um bom acervo de livros.
Um tiro certo é abrir uma loja de lanchas e barcos de luxo. Pois, mesmo estando a centenas de quilômetros do mar, Brasília tem a segunda maior frota de barcos pessoais do país. Eles ficam circulando pelo Lago Paranoá, de preferência próximos às margens, com um monte de gente seminua. Parecem querer emular um clipe do Snoopy Doggy Dog, mas com todo mundo branco.
Claro, pois se quanto mais melhor, se ostentação é elegância e chique é sinônimo de caro, você pode perfeitamente presenciar cenas do tipo, em um almoço em casa, um garçom (porque aqui, quando alguém oferece um almoço, contrata serviços de garçom) oferece um uísque black label pro sujeito, que responde, em altos brados “não, black pra mim é merda. Black é o cara que cuida do meu garden”. Digamos que eu tenha inventado essa cena. Digamos, é melhor assim. Ah, é claro, black também era a colour do waiter que servia o scotch. Fora a grosseria com o suposto dono da casa.
É cara porque é
vemelha ou...
Li a notícia sobre a “perda” que a Louboutin sofreu. Resumidamente, a Louboutin é uma marca de sapato, desenhados pelo tal Louboutin, que são super exclusivos e caros. Muito, muito caros. Tipo, quanto você pagaria, no máximo, por um sapato? E se você tivesse muito, muito dinheiro? Quanto você pagaria? Pensou num número? Multiplica por dez. É por aí que custa um Louboutin.
E uma das “marcas” do Louboutin é a sola vermelha. Uma ideia simples, sola vermelha. Só que o tal Louboutin foi lá e patenteou os sapatos de sola vermelha, determinando assim que ninguém mais podia fazer sapato de sola vermelha. Veja bem, sola vermelha não é uma expressão para designar algum conceito inovador ou algo que dê uma nova funcionalidade ao sapato. É só uma sola de sapato, normal, mas da cor vermelha!
É pra isso que deveria servir a ideia de propriedade intelectual? Em princípio, para proteger autores de boas ideias. Mas patentear a cor de uma sola e dizer que só você pode usar, é meio o cúmulo. Agora, isso demonstra também o valor que os simbolismos têm numa sociedade de culto extremo ao excesso. Uma sola vermelha não tem, na prática, nenhuma vantagem ou diferença para uma azul, preta, amarela...
Ainda assim, a sola vermelha é cultuada. E ela só serve como forma de dizer que a pessoa não tem problemas em gastar, em dólares, uma quantia de cinco dígitos para comprar um sapato.
Ganha um doce quem adivinhar por qual cidade o senhor Louboutin resolveu desembarcar no Brasil... claro, a que ele seria mais bem recebido e teria a maior chance de ganhar dinheiro.
Rodrigo Mendes de Almeida é jornalista, especial para o Nota de Rodapé
Ex-BBB´s curtem o domingo ensolarado no lago Paranoá |
Tem gente que considera que é um axioma da sofisticação aquele paradigma de que “menos é mais”. Ou seja, que os excessos são cafona. Que você usar um salto de 15 centímetros para ir à padaria, ostentar 25 carros de luxo na garagem, ou outras demonstrações ostensivas de poder econômico é, resumidamente, algo muito brega.
Em Brasília esse axioma não vale. A matemática por aqui é mais simples. “Mais é mais”. Novamente, imagino que isso não exclusividade da cidade. Mas em Brasília, isso é muito mais evidente, e é jogado na cara das pessoas de maneira muito mais aberta, do que eu já percebi em outros lugares.
Provavelmente fará mais sucesso aqui uma loja que venda snowboards da mais alta qualidade e do mais alto preço do que uma livraria que não tenha grandes atrativos além de um bom acervo de livros.
Não por acaso, um monte de gente considera Brasília uma “ilha da fantasia”. Ok, as coisas aqui são muito diferentes, a vida gira muito em torno da agenda política e do funcionalismo público. Isso acarretou que houvesse a criação de uma classe média forte e pujante. A cidade foi planejada para isso, tanto que era pras asas serem a moradia do grosso da população. E entre as quadras 400, consideradas as mais populares das asas, e os conjuntos mais caros, não deveria haver uma grande diferença. Algo meio social-democracia aplicada.
Mas isso não teria como dar certo na sociedade que se desenvolveu aqui. A camada de cima precisa, de forma muito expressiva, se destacar. Precisa mostrar com todo o esplendor que faz parte de uma elite muito elite.
É consenso que um bom investimento, para quem quer fazer dinheiro, é o mercado de alto luxo de Brasília. Provavelmente fará mais sucesso aqui uma loja que venda snowboards da mais alta qualidade e do mais alto preço do que uma livraria que não tenha grandes atrativos além de um bom acervo de livros.
Um tiro certo é abrir uma loja de lanchas e barcos de luxo. Pois, mesmo estando a centenas de quilômetros do mar, Brasília tem a segunda maior frota de barcos pessoais do país. Eles ficam circulando pelo Lago Paranoá, de preferência próximos às margens, com um monte de gente seminua. Parecem querer emular um clipe do Snoopy Doggy Dog, mas com todo mundo branco.
Claro, pois se quanto mais melhor, se ostentação é elegância e chique é sinônimo de caro, você pode perfeitamente presenciar cenas do tipo, em um almoço em casa, um garçom (porque aqui, quando alguém oferece um almoço, contrata serviços de garçom) oferece um uísque black label pro sujeito, que responde, em altos brados “não, black pra mim é merda. Black é o cara que cuida do meu garden”. Digamos que eu tenha inventado essa cena. Digamos, é melhor assim. Ah, é claro, black também era a colour do waiter que servia o scotch. Fora a grosseria com o suposto dono da casa.
É cara porque é
vemelha ou...
Li a notícia sobre a “perda” que a Louboutin sofreu. Resumidamente, a Louboutin é uma marca de sapato, desenhados pelo tal Louboutin, que são super exclusivos e caros. Muito, muito caros. Tipo, quanto você pagaria, no máximo, por um sapato? E se você tivesse muito, muito dinheiro? Quanto você pagaria? Pensou num número? Multiplica por dez. É por aí que custa um Louboutin.
E uma das “marcas” do Louboutin é a sola vermelha. Uma ideia simples, sola vermelha. Só que o tal Louboutin foi lá e patenteou os sapatos de sola vermelha, determinando assim que ninguém mais podia fazer sapato de sola vermelha. Veja bem, sola vermelha não é uma expressão para designar algum conceito inovador ou algo que dê uma nova funcionalidade ao sapato. É só uma sola de sapato, normal, mas da cor vermelha!
É pra isso que deveria servir a ideia de propriedade intelectual? Em princípio, para proteger autores de boas ideias. Mas patentear a cor de uma sola e dizer que só você pode usar, é meio o cúmulo. Agora, isso demonstra também o valor que os simbolismos têm numa sociedade de culto extremo ao excesso. Uma sola vermelha não tem, na prática, nenhuma vantagem ou diferença para uma azul, preta, amarela...
Ainda assim, a sola vermelha é cultuada. E ela só serve como forma de dizer que a pessoa não tem problemas em gastar, em dólares, uma quantia de cinco dígitos para comprar um sapato.
Ganha um doce quem adivinhar por qual cidade o senhor Louboutin resolveu desembarcar no Brasil... claro, a que ele seria mais bem recebido e teria a maior chance de ganhar dinheiro.
Rodrigo Mendes de Almeida é jornalista, especial para o Nota de Rodapé
quarta-feira, 24 de agosto de 2011
Homenagem aos ritmos brasileiros
Bisavó Madalena
(Wilson das Neves e Paulo César Pinheiro)
Nunca vi vou contar para vocês
Dançarina igual minha bisavó
Madalena com cento e dezesseis
Não perdia a pisada do Forró
Dançou Coco de roda e Xenhenhém
Quando andou no sertão de Maceió
Aprendeu nos fandangos de Belém
Caboclinho, Lambada e Caribó
Dançou no Maranhão Bumba-meu-boi
Gemedera e Embolada em Mossoró
Aprendeu Marujada quando foi
Num natal na Ilha de Marajó
Dançou Jongo,Catira e Caxambu
No batuque do chão levantou pó
Dançou frevo, Baião, Maracatu
Capoeira e Afoxé como ela só
Nunca vi vou contar para vocês
Dançarina igual minha bisavó
Madalena com cento e dezesseis
Não perdia a pisada do Forró
Dançou Xote, Xaxado e Cirandou
E no Samba era boa de gogó
De Criolo e de Mina no tambor
Madalena no corpo dava nó
Na Bahia bateu Batucajé
Fez cabeça no toque do Roncó
Também foi Iaô de Candomblé
De Tomas, de Tobias, de Timbó.
Chula, Xiba, Rojão, Cateretê
Já dançou nos Confins, no Cafundó
Catobé, Catumbi, Maculelê
Nunca mais vi ninguém dançar melhor
Caco Bressane, arquiteto e ilustrador, colaborador do NR
segunda-feira, 22 de agosto de 2011
Mais axé, Jesus
Tenho saudades do Brasil carola com suas barrocas imagens, seus santinhos e santinhas de barro e do pau oco. O Brasil carola com infinitas nossas senhoras: Achiropita, Aparecida, Fátima, Lourdes. Do Bom Parto, Da Boa Morte, Desatadora dos Nós, Da Guia, Da Penha, Dos Navegantes.
As pessoas, então, podiam eleger o santo de devoção. Acender velas para Santa Clara ou São Jorge. São Cristovão ou São João do Carneirinho. Inundar as ruas com impressos do Santo Expedito, o das causas urgentes, o armênio mais brasileiro que existe.
Sinto saudades do Brasil macumbeiro com seus passes, búzios, encruzilhadas, oferendas, mães e pais de santo. O Brasil dos tambores, do corpo fechado, da comida com pinga, da carne de porco com farofa apimentada, dos cheiros, das cores. Saudades dos orixás: Ogum, Iansã, Xangó, Oxumaré, Nanã, Obá, Oxalá. E de Iemanjá - rainha das águas e musa dos réveillons nas praias de areias moles e duras. Brasil zombeteiro. Mescladão. Sem terno e gravata.
Pois agora o Brasil está cada vez mais evangélico, refém de versículos e mandamentos. Os irmãos e irmãs tocam a campainha às oito horas do domingo para nos enfiar alma abaixo a palavra do Senhor. Brandem a Bíblia como espada contra os ímpios, consumistas, sexualizados, conectados. Até os taxistas - que, na maioria, já foram malufistas, janioquadristas, malufistas - estão cada vez mais por Jesus. Se antes eram mestres nas frases feitas pelo povo, hoje são alunos das frases feitas dos apóstolos.
Agnóstica que sou, nada tenho contra evangélicos, católicos, candomblecistas, umbandistas, espíritas, zen-budistas, zens, israelitas, mulçumanos. Religião é como dança, cada um requebra como pode. O que me incomoda com os evangélicos é a monotonia do discurso: Jesus é a palavra, o parágrafo, o capítulo. O romance inteiro. Quem não está com ele está no desvio, na beira do precipício, no elevador quando acaba a luz.
Jesus virou marca. Muito mais poderosa que Apple, Petrobrás, Honda, Mercedes-Benz, Smith & Wesson juntas. Seu nome está na traseira de carros, motos, bicicletas, carroças, caminhões. Está na tira de alpargatas, na aba de mochilas. Bordado em panos de prato, fuxicos, toalhas de banho e de mesa. Gravado em xícaras, canetas, chaveiros, canivetes, porta-retratos, ursinhos de pelúcia. Seu rosto, com espantosos olhos azuis, está estampado em camisetas, protetores de tela, capas de caderno, papéis de jornal, couche, reciclados.
Na minha infância, evangélicos eram chamados de crentes. A primeira crente que conheci foi a Isabel. Ela morava na suburbana Nova Iguaçu. Todos os dias, viajava de trem, descia na Central do Brasil, pegava o ônibus para cozinhar na casa da minha avó na Tijuca. Isabel usava saia comprida. Seus cabelos eram longos e presos. Não fumava, não bebia, não falava palavrão. Ela nunca sorria para nós. Mas também nunca tentou nos ganhar para Jesus. Tenho saudades da Isabel.
Fernanda Pompeu, escritora, estreia hoje a coluna Observatório da Esquina. Mantem também o blog CapimLetrado.
As pessoas, então, podiam eleger o santo de devoção. Acender velas para Santa Clara ou São Jorge. São Cristovão ou São João do Carneirinho. Inundar as ruas com impressos do Santo Expedito, o das causas urgentes, o armênio mais brasileiro que existe.
Sinto saudades do Brasil macumbeiro com seus passes, búzios, encruzilhadas, oferendas, mães e pais de santo. O Brasil dos tambores, do corpo fechado, da comida com pinga, da carne de porco com farofa apimentada, dos cheiros, das cores. Saudades dos orixás: Ogum, Iansã, Xangó, Oxumaré, Nanã, Obá, Oxalá. E de Iemanjá - rainha das águas e musa dos réveillons nas praias de areias moles e duras. Brasil zombeteiro. Mescladão. Sem terno e gravata.
Pois agora o Brasil está cada vez mais evangélico, refém de versículos e mandamentos. Os irmãos e irmãs tocam a campainha às oito horas do domingo para nos enfiar alma abaixo a palavra do Senhor. Brandem a Bíblia como espada contra os ímpios, consumistas, sexualizados, conectados. Até os taxistas - que, na maioria, já foram malufistas, janioquadristas, malufistas - estão cada vez mais por Jesus. Se antes eram mestres nas frases feitas pelo povo, hoje são alunos das frases feitas dos apóstolos.
Agnóstica que sou, nada tenho contra evangélicos, católicos, candomblecistas, umbandistas, espíritas, zen-budistas, zens, israelitas, mulçumanos. Religião é como dança, cada um requebra como pode. O que me incomoda com os evangélicos é a monotonia do discurso: Jesus é a palavra, o parágrafo, o capítulo. O romance inteiro. Quem não está com ele está no desvio, na beira do precipício, no elevador quando acaba a luz.
Jesus virou marca. Muito mais poderosa que Apple, Petrobrás, Honda, Mercedes-Benz, Smith & Wesson juntas. Seu nome está na traseira de carros, motos, bicicletas, carroças, caminhões. Está na tira de alpargatas, na aba de mochilas. Bordado em panos de prato, fuxicos, toalhas de banho e de mesa. Gravado em xícaras, canetas, chaveiros, canivetes, porta-retratos, ursinhos de pelúcia. Seu rosto, com espantosos olhos azuis, está estampado em camisetas, protetores de tela, capas de caderno, papéis de jornal, couche, reciclados.
Na minha infância, evangélicos eram chamados de crentes. A primeira crente que conheci foi a Isabel. Ela morava na suburbana Nova Iguaçu. Todos os dias, viajava de trem, descia na Central do Brasil, pegava o ônibus para cozinhar na casa da minha avó na Tijuca. Isabel usava saia comprida. Seus cabelos eram longos e presos. Não fumava, não bebia, não falava palavrão. Ela nunca sorria para nós. Mas também nunca tentou nos ganhar para Jesus. Tenho saudades da Isabel.
Fernanda Pompeu, escritora, estreia hoje a coluna Observatório da Esquina. Mantem também o blog CapimLetrado.
quinta-feira, 18 de agosto de 2011
Entrevista de Fernando Morais para a Revista do Brasil
Bacana a entrevista do escritor Fernando Morais na Revista do Brasil de agosto. O escritor fala sobre "Os Últimos Soldados da Guerra Fria" (Companhia das Letras), lançamento recentemente. O livro-reportagem investiga a missão secreta dos agentes cubanos infiltrados em organizações de ultradireita da Flórida para prevenir seu país de ações de sabotagem. Cinco deles estão condenados nos EUA com penas de 15 anos a prisão perpétua. Leia lá e veja o vídeo abaixo.
Lançamento do Livro Saci, de Paulo Pepe e outros autores
"Vocês todos sabem que os sacis estão por ai, esperando o momento de nos pregar uma boa peça. Pois bem. Escrevo para avisá-los que no próximo dia 27/08 todo o cuidado é pouco.
Eu e mais seis autores lançaremos o livro infanto juvenil SACI, pela Editora Mundo Mirim. Além de relatos de aparições desse perneta, o livro trás receitas dos pratos preferidos dele. Delícia! Envio o convite aqui, será uma alegria recebê-los lá. Mas vá com atenção e cuidado com a ventania!".
Taí o recado do amigo e fotógrafo Paulo Pepe. Abaixo o convite.
Eu e mais seis autores lançaremos o livro infanto juvenil SACI, pela Editora Mundo Mirim. Além de relatos de aparições desse perneta, o livro trás receitas dos pratos preferidos dele. Delícia! Envio o convite aqui, será uma alegria recebê-los lá. Mas vá com atenção e cuidado com a ventania!".
Taí o recado do amigo e fotógrafo Paulo Pepe. Abaixo o convite.
quarta-feira, 17 de agosto de 2011
O pato, o ganso e o cisne
Sessenta e quatro anos após o trauma vivido no Maracanã, o Brasil volta a sediar uma copa mundial de futebol. E isso num momento em que por variados motivos vamos adquirindo ares de sermos mais do que um país apenas emergente.
O Brasil desperta no mundo atual uma nova admiração que ultrapassa o velho chavão do país do futebol. Políticas sociais mais acertadas, economia minimamente planificada e que consegue vencer a crise do capitalismo neoliberal que vaza água por muitos lados, política externa independente, ampliação e solidificação de seu mercado interno, proteção à indústria nacional, enfim, um conjunto de ações que têm despertado a curiosidade de políticos, economistas e jornais do mundo inteiro.
Curiosamente, onde estamos perdendo alguns pontos é exatamente na classificação mundial de futebol feito pela FIFA. Aquele velho e bobo orgulho da ‘pátria em chuteiras’. E parte desse declínio tem a ver com alguns inexpressivos resultados na nossa seleção canarinho.
Com a criação, ampliação e sofisticação do chamado mercado do futebol europeu há alguns anos, o Brasil tornou-se naturalmente um dos maiores fornecedores de bons jogadores para aquele continente. Mas isso virou a farra do boi. Hoje, as escolinhas de futebol espalhadas pelos quatro cantos do país preparam meninos para se tornarem os grandes astros de amanhã. E são preparados como mercadoria de luxo.
O principal modelo, embora existam muitos outros, é Neymar que, em apenas dois anos foi elevado à categoria de um dos principais jogadores brasileiros, com grandes verbas publicitárias ao redor do seu nome e desempenho, promessas de salários astronômicos e possibilidade de vendas para o exterior por preços estratosféricos. Um verdadeiro cisne ao lado de patos e gansos.
Contudo, o futebol apresentado por esse jogador tem deixado a desejar, seja no seu time, o tradicional Santos Futebol Clube da Vila Belmiro, e principalmente pela seleção nacional. Não só ele, mas os inúmeros talentos que jogam fora do Brasil e seus salários astronômicos. Todos transformados em celebridades nos países em que atuam e no Brasil, incensados e idolatrados além daquilo que realmente merecem.
Alguns, depois de algum tempo, já “bichados”, para usar a linguagem do futebol, voltam para cá, contratados por salários irreais por alguns de nossos grandes clubes. Não jogam, pois estão se recuperando fisicamente: gordos, fora de forma, desinteressados, cansados do futebol, velhos para o esporte aos trinta e poucos anos.
FIFA, CBF, diretores de clubes, empresários, técnicos, patrocinadores, imprensa esportiva, canais de televisão, armam uma ciranda onde o que menos importa é o futebol, o bom futebol, o esporte que sempre encantou milhões pelo mundo afora.
Feira de vaidades, mercado de transações comerciais lícitas e ilícitas, valhacouto de mafiosos, o futebol vai deixando de ser um esporte emocionante na sua prática dentro dos gramados, para se tornar uma atração das páginas policiais e das fofocas jornalísticas.
Por aqui, uno minha voz a de tantos outros que ainda gostam do futebol arte: FORA RICARDO TEIXEIRA!
Izaías Almada, escritor e dramaturgo, colunista do NR
O Brasil desperta no mundo atual uma nova admiração que ultrapassa o velho chavão do país do futebol. Políticas sociais mais acertadas, economia minimamente planificada e que consegue vencer a crise do capitalismo neoliberal que vaza água por muitos lados, política externa independente, ampliação e solidificação de seu mercado interno, proteção à indústria nacional, enfim, um conjunto de ações que têm despertado a curiosidade de políticos, economistas e jornais do mundo inteiro.
Curiosamente, onde estamos perdendo alguns pontos é exatamente na classificação mundial de futebol feito pela FIFA. Aquele velho e bobo orgulho da ‘pátria em chuteiras’. E parte desse declínio tem a ver com alguns inexpressivos resultados na nossa seleção canarinho.
Com a criação, ampliação e sofisticação do chamado mercado do futebol europeu há alguns anos, o Brasil tornou-se naturalmente um dos maiores fornecedores de bons jogadores para aquele continente. Mas isso virou a farra do boi. Hoje, as escolinhas de futebol espalhadas pelos quatro cantos do país preparam meninos para se tornarem os grandes astros de amanhã. E são preparados como mercadoria de luxo.
O principal modelo, embora existam muitos outros, é Neymar que, em apenas dois anos foi elevado à categoria de um dos principais jogadores brasileiros, com grandes verbas publicitárias ao redor do seu nome e desempenho, promessas de salários astronômicos e possibilidade de vendas para o exterior por preços estratosféricos. Um verdadeiro cisne ao lado de patos e gansos.
Contudo, o futebol apresentado por esse jogador tem deixado a desejar, seja no seu time, o tradicional Santos Futebol Clube da Vila Belmiro, e principalmente pela seleção nacional. Não só ele, mas os inúmeros talentos que jogam fora do Brasil e seus salários astronômicos. Todos transformados em celebridades nos países em que atuam e no Brasil, incensados e idolatrados além daquilo que realmente merecem.
Alguns, depois de algum tempo, já “bichados”, para usar a linguagem do futebol, voltam para cá, contratados por salários irreais por alguns de nossos grandes clubes. Não jogam, pois estão se recuperando fisicamente: gordos, fora de forma, desinteressados, cansados do futebol, velhos para o esporte aos trinta e poucos anos.
FIFA, CBF, diretores de clubes, empresários, técnicos, patrocinadores, imprensa esportiva, canais de televisão, armam uma ciranda onde o que menos importa é o futebol, o bom futebol, o esporte que sempre encantou milhões pelo mundo afora.
Feira de vaidades, mercado de transações comerciais lícitas e ilícitas, valhacouto de mafiosos, o futebol vai deixando de ser um esporte emocionante na sua prática dentro dos gramados, para se tornar uma atração das páginas policiais e das fofocas jornalísticas.
Por aqui, uno minha voz a de tantos outros que ainda gostam do futebol arte: FORA RICARDO TEIXEIRA!
Izaías Almada, escritor e dramaturgo, colunista do NR
sexta-feira, 12 de agosto de 2011
Relógios
Conto do escritor Ferréz, publicado originalmente em seu blog.
As garras do sol entravam pelos vãos das telhas.
O calor então se espalhava e era hora de levantar.
A pesada coberta, que ganhara no casamento há alguns anos não combinava com nenhum lençol nem forro de travesseiro, mas sua esposa também não deixava de dormir por isso.
Era um dia especial, iriam estalar os relógios para controle de luz.
Chegou como todo mundo, foi logo morando em casa de parente, levantava cedo, fazia bico de pedreiro, fazia compra e venda de coisas usadas, vivia com relógio no bolso e oferecia pra quem chegava perto, isso tudo durou uns anos, até Matheus montar seu bar e construir seu barraquinho.
A favela não tinha iluminação em suas vielas, os moradores então colocavam bocais do lado de fora da casa e assim iluminavam as estreitas ruas, enquanto de quatro em quatro anos, alguns vampiros saiam de seus grandes castelos para prometer que a iluminação chegaria em breve.
Os moradores foram aprendendo aos poucos, que o máximo que iriam ganhar era um show nessas épocas de eleição.
Sempre ouve uma discussão na comunidade, quanto a não ser cobrado corretamente o valor da água e da luz na favela, como se todos ali vivessem de favor. Um dia teve um grande debate, pessoas da rua de cima, que tinham terrenos legalizados, e por isso se achavam melhor que todo mundo, reclamavam que a favela não pagava seus impostos corretamente, era tudo tacha mínima.
Matheus morador da favela e vindo do Piauí definiu tudo quando disse bem alto, que pra morar do lado de córrego e viver com bandido e traficante, eles não tinham que pagar nada, tinham sim que ser reembolsados por tão precária vida, o silêncio definiu o argumento certo.
Os moradores da rua de cima, voltaram para suas casas particulares, mas quando faltava luz, faltava lá também, quando tinha tiro, lá escutava também, quando havia cheiro de maconha era de lá que vinha também, mas quando a polícia envadia os barracos, lá na rua de cima ninguém mexia.
Começaram a chegar os homens, seus macacões, seus empregos invejados, suas botas isolantes, seus equipamentos, tal qual pendurados ao ponto de uma criança chamar de super herói um daqueles homens.
Enrolaram as cordas em volta das barrigas, pegaram as escadas, começaram a subir e em seguida desligaram toda a energia.
Os meninos viam os cabos no chão brilhando, o alumínio de repente virou brinquedo, depois pães, doces, e muitos outros desejos.
Era só levar no lugar onde se compra de tudo, onde tem um monte de coisa jogada, onde o homem vive sujo e suado, um ferro-velho.
Mas os homens de azul estavam bem atentos.
Até que Matheus saiu do seu bar nervoso, com um serrinha dessas de cortar cano começou a picotar os cabos, um dos técnicos tentou descer da escada e Matheus avisou.
- fica aí, se descer é pior.
O homem voltou o passo e ficou observando, não antes de dizer baixinho.
- ai é bagunça porra, na nossa cara!
E Matheus continuava a picotar os pesados cabos de alumínio e como um desabafo disse alto para que os homens nas escadas ouvissem.
- to sem luz no meu bar, todo mundo vem aqui quando quer, vão por conta cara pra pagar, então que se dane tudo.
Os meninos faltavam pular em Matheus, atento aos pedaços, e em alguns instantes quando um dos técnicos decidiu descer e segurar uma ponta dos cabos, Matheus gritou.
- pega aí molecada, pode pegar, leva e vende, é tudo nosso dinheiro mesmo.
O técnico continuava com a ponta do cabo na mão e falava baixinho.
- pô, ai já é bagunça, para por favor, vai complicar a gente depois.
Os meninos saíram dos barracos, como se fossem convocados para um grande carnaval e cada um pegou seu pedaço de cabo.
No outro dia, após o dono do ferro velho ser preso por comprar produto roubado, no caso os cabos de energia, não era difícil ver os moradores todos eufóricos comentando.
- Cê viu que relógio bonito? todo transparente, parece até uma coisa do futuro.
- Mas dizem que é assim pra gente num emendar cabo, num adulterar.
- Deve ser mentira menina, é assim pra ficar bonito, todo de acrídico.
- Num é acrídico, é acrílico sua boba.
- O seu gira como?
- Num sei, vamos lá ver, mas dizem que cada um gira diferente do outro.
- E você percebeu que a luz num mudou nada, ficou a mesma coisa, num pode tomar banho depois das sete senão apaga tudo, que nem era antes?
Mateus voltando do açougue, com um saquinho com alguns bifes, passou pela viela principal, pulou alguns buracos, molhou a ponta do pé na fossa estourada há meses, e percebeu que todos olhavam pros seus relógios, encantados, como um grande presente da prefeitura.
Dali alguns dias, quando um outro homem de azul lesse os números, tirasse uma máquina da bolsa e cuspisse a primeira conta, o encanto se acabaria.
Ferréz é autor dos romances: Capão Pecado, Manual prático do ódio e dos contos: Ninguém é inocente em São Paulo, Amanhecer esmeralda (infantil): todos da editora Objetiva e Cronista de um tempo ruim (crônicas, da editora Selo Povo). Esse ano lança o livro Deus foi almoçar.
As garras do sol entravam pelos vãos das telhas.
O calor então se espalhava e era hora de levantar.
A pesada coberta, que ganhara no casamento há alguns anos não combinava com nenhum lençol nem forro de travesseiro, mas sua esposa também não deixava de dormir por isso.
Era um dia especial, iriam estalar os relógios para controle de luz.
Chegou como todo mundo, foi logo morando em casa de parente, levantava cedo, fazia bico de pedreiro, fazia compra e venda de coisas usadas, vivia com relógio no bolso e oferecia pra quem chegava perto, isso tudo durou uns anos, até Matheus montar seu bar e construir seu barraquinho.
A favela não tinha iluminação em suas vielas, os moradores então colocavam bocais do lado de fora da casa e assim iluminavam as estreitas ruas, enquanto de quatro em quatro anos, alguns vampiros saiam de seus grandes castelos para prometer que a iluminação chegaria em breve.
Os moradores foram aprendendo aos poucos, que o máximo que iriam ganhar era um show nessas épocas de eleição.
Sempre ouve uma discussão na comunidade, quanto a não ser cobrado corretamente o valor da água e da luz na favela, como se todos ali vivessem de favor. Um dia teve um grande debate, pessoas da rua de cima, que tinham terrenos legalizados, e por isso se achavam melhor que todo mundo, reclamavam que a favela não pagava seus impostos corretamente, era tudo tacha mínima.
Matheus morador da favela e vindo do Piauí definiu tudo quando disse bem alto, que pra morar do lado de córrego e viver com bandido e traficante, eles não tinham que pagar nada, tinham sim que ser reembolsados por tão precária vida, o silêncio definiu o argumento certo.
Os moradores da rua de cima, voltaram para suas casas particulares, mas quando faltava luz, faltava lá também, quando tinha tiro, lá escutava também, quando havia cheiro de maconha era de lá que vinha também, mas quando a polícia envadia os barracos, lá na rua de cima ninguém mexia.
Começaram a chegar os homens, seus macacões, seus empregos invejados, suas botas isolantes, seus equipamentos, tal qual pendurados ao ponto de uma criança chamar de super herói um daqueles homens.
Enrolaram as cordas em volta das barrigas, pegaram as escadas, começaram a subir e em seguida desligaram toda a energia.
Os meninos viam os cabos no chão brilhando, o alumínio de repente virou brinquedo, depois pães, doces, e muitos outros desejos.
Era só levar no lugar onde se compra de tudo, onde tem um monte de coisa jogada, onde o homem vive sujo e suado, um ferro-velho.
Mas os homens de azul estavam bem atentos.
Até que Matheus saiu do seu bar nervoso, com um serrinha dessas de cortar cano começou a picotar os cabos, um dos técnicos tentou descer da escada e Matheus avisou.
- fica aí, se descer é pior.
O homem voltou o passo e ficou observando, não antes de dizer baixinho.
- ai é bagunça porra, na nossa cara!
E Matheus continuava a picotar os pesados cabos de alumínio e como um desabafo disse alto para que os homens nas escadas ouvissem.
- to sem luz no meu bar, todo mundo vem aqui quando quer, vão por conta cara pra pagar, então que se dane tudo.
Os meninos faltavam pular em Matheus, atento aos pedaços, e em alguns instantes quando um dos técnicos decidiu descer e segurar uma ponta dos cabos, Matheus gritou.
- pega aí molecada, pode pegar, leva e vende, é tudo nosso dinheiro mesmo.
O técnico continuava com a ponta do cabo na mão e falava baixinho.
- pô, ai já é bagunça, para por favor, vai complicar a gente depois.
Os meninos saíram dos barracos, como se fossem convocados para um grande carnaval e cada um pegou seu pedaço de cabo.
No outro dia, após o dono do ferro velho ser preso por comprar produto roubado, no caso os cabos de energia, não era difícil ver os moradores todos eufóricos comentando.
- Cê viu que relógio bonito? todo transparente, parece até uma coisa do futuro.
- Mas dizem que é assim pra gente num emendar cabo, num adulterar.
- Deve ser mentira menina, é assim pra ficar bonito, todo de acrídico.
- Num é acrídico, é acrílico sua boba.
- O seu gira como?
- Num sei, vamos lá ver, mas dizem que cada um gira diferente do outro.
- E você percebeu que a luz num mudou nada, ficou a mesma coisa, num pode tomar banho depois das sete senão apaga tudo, que nem era antes?
Mateus voltando do açougue, com um saquinho com alguns bifes, passou pela viela principal, pulou alguns buracos, molhou a ponta do pé na fossa estourada há meses, e percebeu que todos olhavam pros seus relógios, encantados, como um grande presente da prefeitura.
Dali alguns dias, quando um outro homem de azul lesse os números, tirasse uma máquina da bolsa e cuspisse a primeira conta, o encanto se acabaria.
Ferréz é autor dos romances: Capão Pecado, Manual prático do ódio e dos contos: Ninguém é inocente em São Paulo, Amanhecer esmeralda (infantil): todos da editora Objetiva e Cronista de um tempo ruim (crônicas, da editora Selo Povo). Esse ano lança o livro Deus foi almoçar.
Expressões do mês do Hamadã em Nova Delhi, na Índia
Kevin Frayer da Associated Press captou com talento as expressões de mulçulmanos indianos em frente a um restaurante em busca de alimentos antes de quebrar o jejum do Ramadã, em Nova Delhi.
Do amanhecer ao pôr do Sol, todos os dias durante o mês de Ramadã, considerado um período de renovação espiritual, os muçulmanos se abstem totalmente de comer, beber e de atividades sexuais com seus cônjuges.
Do amanhecer ao pôr do Sol, todos os dias durante o mês de Ramadã, considerado um período de renovação espiritual, os muçulmanos se abstem totalmente de comer, beber e de atividades sexuais com seus cônjuges.
5 x Cultura Digital
Pessoal da Casa de Cultura Digital tem mais uma bom projeto a área. "Cultura livre, vídeo livre, imaginação livre: Cinco Vezes Cultura Digital reúne cinco ensaios audiovisuais produzidos a partir de uma provocação feita pela Casa da Cultura Digital a cinco coletivos de realizadores. Seu ponto de partida é a ideia de #culturadigitalbr. O resultado é a reunião de investigações sobre as transformações que estão em curso no nosso país e no mundo."
Remixofagia - Alegorias de uma revolução from FLi Multimídia on Vimeo.
Remixofagia - Alegorias de uma revolução from FLi Multimídia on Vimeo.
quarta-feira, 10 de agosto de 2011
Exibição do curta-metragem Terminal Santo Ângelo
Pessoal, o amigo Julio Cruz Neto convida para a sessão do documentário Terminal Santo Ângelo, realizado pelo seu grupo, "sobre um lugar que você não imagina que ainda exista nos dias de hoje."
Além do Termina Santo Ângelo, serão exibidos outros 4 curta-metragens produzidos no último curso de documentário da AIC (Academia Internacional de Cinema). A entrada é franca no dia 17 de agosto, quarta-feira, das 20h às 21h 30, no MIS (Museu da Imagem e do Som), na Avenida Europa, 158.
Além do Termina Santo Ângelo, serão exibidos outros 4 curta-metragens produzidos no último curso de documentário da AIC (Academia Internacional de Cinema). A entrada é franca no dia 17 de agosto, quarta-feira, das 20h às 21h 30, no MIS (Museu da Imagem e do Som), na Avenida Europa, 158.
Enquanto isso no...
Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista, especial para o Nota de Rodapé. Conheça também seu blog: ONG PI.
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
Doc. Sangue Latino chega à segunda temporada
Depois de percorrer o continente em busca de desvendar o DNA latino, o escritor e jornalista Eric Nepomuceno se volta para o Brasil na segunda temporada do Sangue Latino.
Nesta terça-feira (9), às 21h, no Canal Brasil, tem início a nova série de entrevistas. O primeiro convidado é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Músicos, cineastas e poetas também estarão sentados diante de Nepomuceno nesta segunda fase do programa.
Além do quilate dos entrevistados e da importância do tema debatido, o que me chamou atenção na primeira temporada foi o cuidado com a edição das entrevistas e com a fotografia. É louvável também a preocupação de Nepomuceno em deixar o personagem falar, respirar, pensar no que falou e concluir seu pensamento (algo cada vez mais raro nas conversas televisionadas).
A TV Cultura exibiu a primeira temporada no programa. Agora é torcer para que a segunda também seja exibida pela tv aberta, tão carentes de programas que nos fazem pensar.
Veja entrevista de Nepomuceno sobre a série de documentários:
Nesta terça-feira (9), às 21h, no Canal Brasil, tem início a nova série de entrevistas. O primeiro convidado é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Músicos, cineastas e poetas também estarão sentados diante de Nepomuceno nesta segunda fase do programa.
Além do quilate dos entrevistados e da importância do tema debatido, o que me chamou atenção na primeira temporada foi o cuidado com a edição das entrevistas e com a fotografia. É louvável também a preocupação de Nepomuceno em deixar o personagem falar, respirar, pensar no que falou e concluir seu pensamento (algo cada vez mais raro nas conversas televisionadas).
A TV Cultura exibiu a primeira temporada no programa. Agora é torcer para que a segunda também seja exibida pela tv aberta, tão carentes de programas que nos fazem pensar.
Veja entrevista de Nepomuceno sobre a série de documentários:
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Retrato do Brasil de agosto
A revista Retrato do Brasil de agosto já está disponível. A capa é sobre as mulheres da Arábia Saudita. Pela segunda vez, elas reivindicam o direito de dirigir seus carros, mas as autoridades daquele reino se sentem ameaçadas e temem fazer concessões. O texto é de Armando Sartori.
No Ponto de Vista, com uma economia a cada ano mais dependente e assolado pelas ideias liberais, nunca antes na história deste pais foi tão necessário refletir sobre a crise e a dívida dos Estados Unidos.
João Peres escreve sobre uma coleção de depoimentos em DVD, Resistir é preciso, e o livro Jornal Movimento – uma reportagem, que registram episódios do jornalismo que se tornou um instrumento de luta contra a ditadura.
No texto As Batalhas da Al Jazeera, Tomás Chiaverini conta as histórias da emissora árabe que ficou famosa ao divulgar vídeos de bin Laden, foi bombardeada pelos EUA, teve um cinegrafista preso por sete anos e um papel determinante nas revoltas do Oriente Médio.
Spensy Pimentel esteve em Cuba, e nos conta como o regime cubano busca, uma vez mais, saída para seu socialismo, agora falando em “respeito ao mercado”, “descentralização” e em incentivar seus empresários a não terem medo de arriscar.
Em ciência, uma resenha sobre o livro Muito além do nosso eu, de Miguel Nicolelis, que tentará uma proeza tecnológica: permitir que um tetraplégico dê o pontapé inicial da Copa de 2014.
E fechando a série, um dos maiores escritores latino-americanos do século 20, Juan Rulfo foi também um fotógrafo de excepcional talento. 100 de suas fotografias falam da quietude que seus mortos escondiam.
No Ponto de Vista, com uma economia a cada ano mais dependente e assolado pelas ideias liberais, nunca antes na história deste pais foi tão necessário refletir sobre a crise e a dívida dos Estados Unidos.
João Peres escreve sobre uma coleção de depoimentos em DVD, Resistir é preciso, e o livro Jornal Movimento – uma reportagem, que registram episódios do jornalismo que se tornou um instrumento de luta contra a ditadura.
No texto As Batalhas da Al Jazeera, Tomás Chiaverini conta as histórias da emissora árabe que ficou famosa ao divulgar vídeos de bin Laden, foi bombardeada pelos EUA, teve um cinegrafista preso por sete anos e um papel determinante nas revoltas do Oriente Médio.
Spensy Pimentel esteve em Cuba, e nos conta como o regime cubano busca, uma vez mais, saída para seu socialismo, agora falando em “respeito ao mercado”, “descentralização” e em incentivar seus empresários a não terem medo de arriscar.
Em ciência, uma resenha sobre o livro Muito além do nosso eu, de Miguel Nicolelis, que tentará uma proeza tecnológica: permitir que um tetraplégico dê o pontapé inicial da Copa de 2014.
E fechando a série, um dos maiores escritores latino-americanos do século 20, Juan Rulfo foi também um fotógrafo de excepcional talento. 100 de suas fotografias falam da quietude que seus mortos escondiam.
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
Ganhe exemplares do livro sobre o jornal O Movimento
Nota de Rodapé e editora Manifesto vão sortear três livros Jornal Movimento, uma reportagem. Os três exemplares autografados pelo jornalista Carlos Azevedo. Os vencedores serão conhecidos no dia 18 de setembro.
O livro conta a história do jornal, formado Raimundo Pereira, Tonico Ferreira, Bernardo Kucinski e apoiado por mais de 300 “membros”, num exercício de democracia em pleno regime militar. O destino do jornal era decidio em assembleias que varavam a noite, e o jornalismo de qualidade era levado por uma centena de jornalistas, estudantes, profissionais liberais, que trabalhavam por pouco, ou nada, para trazer ao público notícias raramente cobertas pela imprensa pressionada pela censura.
Capa do livro |
Em seis anos de existência, de 1975 a 1981, Movimento sofreu a censura brutal, pressões econômicas, violência e repressão do regime. Mesmo assim, capitaneou as campanhas pela anistia, pela constituinte, e fez coberturas memoráveis das torturas, das greves do ABC, dos rachas internos do regime militar, da volta dos anistiados. O livro já está a venda e custa 59 reais.
JORNAL MOVIMENTO, UMA REPORTAGEM
De Carlos Azevedo, com reportagem de Marina Amaral e Natalia Viana. Manifesto Editora. Patrocínio Petrobras, 336 páginas. Acompanha DVD com as 334 edições do jornal.
O que já saiu sobre o livro:
De Carlos Azevedo, com reportagem de Marina Amaral e Natalia Viana. Manifesto Editora. Patrocínio Petrobras, 336 páginas. Acompanha DVD com as 334 edições do jornal.
O que já saiu sobre o livro:
- Portal Vermelho: Publicado livro sobre o Jornal Movimento
- Pública: Movimento, um grito de resistência a ditadura
- Pública: Movimento, um grito de resistência a ditadura
COMO PARTICIPAR
Primeiramente, retuite essa mensagem no Twitter e publique no Facebook:
Promoção @notaderodape: ganhe exemplares do livro Jornal Movimento, uma reportagem: http://bit.ly/oy5ZmW
Em seguida, acrescente seus dados abaixo e em até 500 caracteres responda:
"Por que a imprensa independente é cada vez mais importante nos dias atuais?"
As três melhores respostas, julgadas pelos editores e colunistas do NR, serão as vencedoras.
quinta-feira, 4 de agosto de 2011
CBF e AFA mantêm homenagem ao exterminador de indígenas
As seleções nacionais de futebol de Brasil e de Argentina disputam nos dias 14 e 28 de setembro a Copa Roca, torneio amistoso que, após mais de trinta anos de intervalo, volta a ser disputado. Para os saudosistas do futebol, um momento para relembrar grandes partidas. Para as sociedades das duas nações, um fato a ser lamentado.
Ainda que se intitule oficialmente o encontro como Superclássico das Américas, cartolas e jornalistas têm adotado o nome de Copa Roca.Nada contra o torneio. Que seja prazeroso o futebol jogado. Tudo contra seu nome.
É de se assustar que em tempos democráticos, e superadas parcialmente duas sanguinárias ditaduras, Brasil e Argentina se coloquem a render homenagem a Julio Argentino Roca, o General Roca, como gostava de ser chamado, ministro da Guerra responsável pela “colonização” do interior argentino, particularmente da Patagônia, em uma campanha que deixou 1.300 mortos e mais de doze mil prisioneiros.
Foi ao longo de dois meses, em 1879, que Roca realizou a campanha-relâmpago destinada a povoar com argentinos – indígenas eram outra sorte de gente, na cabeça dele – as secas e frias regiões.
Estavam em jogo duas questões. A primeira, de uma nação europeizada, de acabar com a incômoda presença de nativos. A segunda, central, era a disputa territorial com o Chile pelo direito às terras patagônicas. Baseavam-se as duas nações no antigo princípio do uti possi detis – uso, logo possuo –, o que fazia premente ter habitantes pátrios nestas regiões (do lado chileno, as vítimas foram os mapuche).
“A meu ver, o melhor sistema de concluir (sic) com os índios, seja extinguindo-os ou jogando-os ao outro lado do Rio Negro, é o da guerra ofensiva (…) É necessário ir buscar o índio diretamente em sua morada, para submetê-lo ou expulsá-lo”, anotava Roca em correspondência reproduzida pelo jornalista Jorge Lanata no livro “Argentinos – quinientos años entre el cielo y el infierno”. Como prêmio, anos depois Roca ascendeu à presidência.
Obviamente, para o torcedor a Taça Roca nada tem a ver com o exterminador de indígenas, ligando-se à saudosa ideia de um futebol bem jogado e de uma rivalidade antiga. Tampouco seria de se esperar que os presidentes da CBF, Ricardo Teixeira, e da Associação de Futebol Argentino, Julio Humberto Grondona, tivessem qualquer cuidado histórico. Ainda que quisessem reconhecer a verdade sobre Roca, não é improvável que vissem com bons olhos uma atuação autoritária, haja visto as próprias gestões à frente das entidades que ocupam.
Mas as sociedades dos dois países deveriam estar preocupadas em garantir ao general o lugar que lhe cabe na história: o de genocida.
João Peres, jornalista, repórter da Rede Brasil Atual e colaborador do NR
Ainda que se intitule oficialmente o encontro como Superclássico das Américas, cartolas e jornalistas têm adotado o nome de Copa Roca.Nada contra o torneio. Que seja prazeroso o futebol jogado. Tudo contra seu nome.
É de se assustar que em tempos democráticos, e superadas parcialmente duas sanguinárias ditaduras, Brasil e Argentina se coloquem a render homenagem a Julio Argentino Roca, o General Roca, como gostava de ser chamado, ministro da Guerra responsável pela “colonização” do interior argentino, particularmente da Patagônia, em uma campanha que deixou 1.300 mortos e mais de doze mil prisioneiros.
Foi ao longo de dois meses, em 1879, que Roca realizou a campanha-relâmpago destinada a povoar com argentinos – indígenas eram outra sorte de gente, na cabeça dele – as secas e frias regiões.
Estavam em jogo duas questões. A primeira, de uma nação europeizada, de acabar com a incômoda presença de nativos. A segunda, central, era a disputa territorial com o Chile pelo direito às terras patagônicas. Baseavam-se as duas nações no antigo princípio do uti possi detis – uso, logo possuo –, o que fazia premente ter habitantes pátrios nestas regiões (do lado chileno, as vítimas foram os mapuche).
Grandona da AFA e Teixeira da CBF |
Obviamente, para o torcedor a Taça Roca nada tem a ver com o exterminador de indígenas, ligando-se à saudosa ideia de um futebol bem jogado e de uma rivalidade antiga. Tampouco seria de se esperar que os presidentes da CBF, Ricardo Teixeira, e da Associação de Futebol Argentino, Julio Humberto Grondona, tivessem qualquer cuidado histórico. Ainda que quisessem reconhecer a verdade sobre Roca, não é improvável que vissem com bons olhos uma atuação autoritária, haja visto as próprias gestões à frente das entidades que ocupam.
Mas as sociedades dos dois países deveriam estar preocupadas em garantir ao general o lugar que lhe cabe na história: o de genocida.
João Peres, jornalista, repórter da Rede Brasil Atual e colaborador do NR
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extremo ocidente,
Ricardo Teixeira
quarta-feira, 3 de agosto de 2011
Os amigos do Apolinario
O projeto do vereador Carlos Apolinario (DEM) foi aprovado por outros vereadores na lista abaixo. Será que vão dizer que assinaram sem ler? Ou todos eles querem o dia do Orgulho Hétero (no terceiro domingo de dezembro), como propõe o parlamentar?
Essa barbaridade - tem nome melhor? - ainda vai para o prefeito Kassab que, se pesar o mínimo de inteligência, vai barrar a proposta. Apolinario, só para constar, também foi favorável a outra barbaridade recente: os incentivos fiscais ao Fielzão, estádio que pode abrir a Copa de 2014. E se você quiser entender as posições do vereador, leia texto do próprio, publicado em seu site cujo título é "Não sou homofóbico".
Para quem está por fora do assunto do tal dia Hétero indico dois textos que vão ajudar a compreender melhor os fatos. O primeiro é de Natalia Mendes no seu blog TodasNós, intitulado "Orgulho nenhum de ser hétero". E o outro é do sempre lúcido Leonardo Sakamoto, intitulado, "Que vergonha de ser hétero".
Thiago Domenici, jornalista
Para quem está por fora do assunto do tal dia Hétero indico dois textos que vão ajudar a compreender melhor os fatos. O primeiro é de Natalia Mendes no seu blog TodasNós, intitulado "Orgulho nenhum de ser hétero". E o outro é do sempre lúcido Leonardo Sakamoto, intitulado, "Que vergonha de ser hétero".
Os amigos do ApolinarioAo lado deste post, temos uma enquete em andamento sobre o tema. Hum, ia esquecendo. No site do Apolinario está rolando outra enquete, sobre ser a favor ou contra o casamento gay. "A favor" vai ganhando de lavada: 71.12%.
Adilson Amadeu (PTB)
Agnaldo Timóteo (PR)
Aníbal de Freitas (PSDB)
Antonio Carlos Rodrigues (PR)
Atílio Francisco (PRB)
Aurélio Nomura (PV)
Carlos Apolinario (DEM)
Celso Jatene (PTB)
Claudinho de Souza (PSDB)
Dalton Silvano (sem partido)
David Soares (PSC)
Domingos Dissei (DEM)
Edir Sales (DEM)
Floriano Pesaro (PSDB)
Gilson Barreto (PSDB)
José Police Neto (sem partido)
José Rolim (PSDB)
Marta Costa (DEM)
Milton Ferreira (PPS)
Milton Leite (DEM)
Noemi Nonato (PSB)
Paulo Frange (PTB)
Quito Formiga (PR)
Ricardo Teixeira (sem partido)
Russomano (PP)
Sandra Tadeu (DEM)
Souza Santos (sem partido)
Tião Farias (PSDB)
Toninho Paiva (PR)
Ushitaro Kamia (DEM)
Wadih Mutran (PP)
Thiago Domenici, jornalista
segunda-feira, 1 de agosto de 2011
Obama e a Dívida Americana
Fernando Carvall, ilustrador e caricaturista, especial para o Nota de Rodapé. Conheça também seu blog: ONG PI.
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