Da orelha do nova edição, o texto de Lincoln Secco – Professor de História Contemporânea da USP:
"General de Brigada do Exército, crítico literário, filósofo, geógrafo e, sobretudo, um historiador intelectualmente honesto. É difícil resumir a multiplicidade de talentos e vocações de Nelson Werneck Sodré.
Ele foi pioneiro em inúmeros campos que só mais tarde seriam reconhecidos pela historiografia universitária. A História da literatura brasileira: seus fundamentos econômicos, publicada em 1938 (!), foi escrita com um invejável rigor acadêmico antes que qualquer estudo comparável fosse produzido na Universidade de São Paulo (USP), por exemplo. Podemos dizer o mesmo de sua História da imprensa no Brasil.
No campo da História Econômica, suas teses foram objeto de contestação, mas ainda assim sua Formação Histórica do Brasil inunda os olhos do leitor com páginas brilhantes sobre a invasão holandesa e, especialmente, sobre o chamado ciclo da mineração.
Todavia, no conjunto de sua obra, a História Militar do Brasil é um livro sui generis. O autor pôde conhecer uma massa de documentos primários à qual só um oficial da sua geração poderia ter tido acesso. Depois, nenhum historiador (civil ou militar) teve as mesmas possibilidades. O leitor, certamente, ficará surpreso com a veemência dos debates no Clube Militar no início dos anos de 1920e compreenderá as razões da rebeldia de jovens oficiais que escreveram a mais digna página da história militar brasileira: o “tenentismo”.
Nelson Werneck Sodré não só estudou aqueles fatos. Em parte, ele mesmo os testemunhou. E ainda foi além: reconstituiu as bases sociais de uma insatisfação no interior das Forças Armadas e suas raízes democráticas.
O golpe civil-militar de 1964 obscureceu aquelas tendências democráticas. Quando o livro de Werneck Sodré foi lançado (1965), o país entrava na noite mais tenebrosa de sua história e os militares apareciam como os carrascos do nosso povo. O livro é, porém, mais do que um documento de sua época. Ele enfrentou bem o tempo devido ao seu método. Afinal, como dizia Nelson Werneck Sodré, “o marxismo é uma ciência avançada”."
quinta-feira, 29 de abril de 2010
quarta-feira, 28 de abril de 2010
Estreia nova coluna: Estação Brasília
Eleição malandra
O novo governador do DF, Rogério Rosso, é cria política de Joaquim Roriz. Depois de um tempo, se aliou ao governador José Roberto Arruda e foi administrador da Ceilândia e presidente da Companhia de Planejamento do DF, a Codeplan.
Foi na Codeplan que se iniciaram os escândalos da Caixa de Pandora – ainda que nada tenha sido achado contra Rosso. Dos treze votos que Rosso teve, oito vieram de deputados distritais envolvidos nas investigações de corrupção, inclusive Geraldo Naves, que era do DEM e estava preso do ladinho de Arruda. Naves foi solto e correu pra Câmara, tomar de volta sua cadeira de distrital e votar em Rosso.
Do outro lado, Joaquim Roriz, o “pai dos pobres” de Brasília segue sendo um nome fortíssimo para a eleição de governador. Ele detona adversários como quem atira de bazuca em patos mancos, sendo Agnelo Queiróz, candidato do PT ao governo, sua provável próxima vítima.
Cinquentona
Uma beleza ver a emoção da população daqui, de todas as camadas sociais e orientações políticas, tendo orgulho de Brasília pelos seus 50 anos. A festa de aniversário, de fato, foi “curtida” pela população, desde assentados de quase-na-divisa-com-goiás até a classe média esclarecida do Sudoeste. Sentimento de orgulho de viver aqui, da cultura que hoje se produz aqui, xingamentos aos políticos que fazem o resto do país associar a cidade a corrupção. Mas sem ufanismo.
Pra lembrar
Guardem o nome: Ellen Oléria. Vinda da Ceilândia, a moça canta muito e tem as manhas de compor, diferente da imensa maioria dos nomes da “nova MPB”. E já tem legião de fãs por aqui.
Festas distintas
Ellen e mais de mil outros artistas tocaram por três dias na Funarte, no “Brasília Outros 50”, festa que foi realizada em contrapartida à da Esplanada dos Ministérios, que foi paga com dinheiro de contratos irregulares de Paulo Octávio e Arruda. Vários palcos e milhares de pessoas.
Rodrigo Mendes é jornalista e estreia hoje a coluna Estação Brasília neste Nota de Rodapé
Primeiro casamento entre mulheres da história da América do Sul
O Superior Tribunal de Justiça deu uma tremenda bola dentro ao decidir, de forma inédita e unânime, a legalidade da adoção de duas crianças por um casal homossexual da cidade de Bagé, no Rio Grande do Sul. Agora, os menores adotados por mulheres terão no documento o nome das duas mães. "Não se pode supor que o fato de os adotantes serem duas mulheres possa causar algum dano (à formação das crianças). Dano ao menor seria a não adoção", disse o ministro João Otávio de Noronha, presidente da 4.ª Turma, ao jornal Estado de S. Paulo.
A decisão deve influenciar outras que pipocarem pelo país, o que eleva o debate a outro patamar, digamos, menos homofóbico. Por falar no tema, nosso colega de Nota de Rodapé, João Peres, foi a Argentina recentemente e fez uma série de matérias sobre o primeiro casamento entre mulheres da história da América do Sul. Intitulada "A várias vistas", os textos abordam a história de Norma Castillo e Romana Arévalo, ambas com 67 anos, que casaram-se em abril deste ano, em Buenos Aires, depois de 30 anos de vida conjunta. Mas como o próprio João escreveu, "nem tudo são flores nessa história, e ainda deve haver mais resistência à oficialização do casamento." Leia mais na Rede Brasil Atual.
Documentário da HBO
Um outro lado daqueles que discriminam os homossexuais.
A decisão deve influenciar outras que pipocarem pelo país, o que eleva o debate a outro patamar, digamos, menos homofóbico. Por falar no tema, nosso colega de Nota de Rodapé, João Peres, foi a Argentina recentemente e fez uma série de matérias sobre o primeiro casamento entre mulheres da história da América do Sul. Intitulada "A várias vistas", os textos abordam a história de Norma Castillo e Romana Arévalo, ambas com 67 anos, que casaram-se em abril deste ano, em Buenos Aires, depois de 30 anos de vida conjunta. Mas como o próprio João escreveu, "nem tudo são flores nessa história, e ainda deve haver mais resistência à oficialização do casamento." Leia mais na Rede Brasil Atual.
Documentário da HBO
Um outro lado daqueles que discriminam os homossexuais.
terça-feira, 27 de abril de 2010
Alguns critérios
Mais de uma vez fui a restaurantes mais “renomados” - também conhecidos como “caros” - e me decepcionei. De fato, é muito fácil se decepcionar com algum restaurante que seja famoso e tenha preços igualmente astronômicos.
Talvez uma das razões seja que, mais fácil que se decepcionar, é ter a “caruda” de dizer que a comida está ruim. Ou seja, tem muito chef que se acomoda no seu bom nome, ou no nome do restaurante, ou simplesmente no fato de ter uma casa bonita, uma formação decente e um punhado de pessoas que topem pagar os preços por eles pedidos.
Um chef deveria provar tudo que sai da sua cozinha. Despoje-se da sua timidez ou dos seus receios em criticar, sem, contudo, se imbuir do mal “jornalístico” de se achar acima do bem e do mal e, da próxima vez que provar um prato, reflita sobre se o cara provou aquilo.
Outra, eu tenho a tendência de não confiar muito em cardápios extensos. Sou mais um restaurante que tenha dois, até mesmo UM prato do menu do que um que tenha páginas e páginas de carnes, frango, massa, peixes, camarões... Se um chef se propõe a servir, em seu restaurante, dois pratos, é muito, muito provável que a receita, a execução, a apresentação sejam exímios.
Rodrigo Mendes é jornalista e chef de cozinha sem diploma; alçado ao posto pelos amigos que curtem suas misturebas gastronômicas. Mantém a coluna O melhor lugar da casa neste Nota de Rodapé.
Talvez uma das razões seja que, mais fácil que se decepcionar, é ter a “caruda” de dizer que a comida está ruim. Ou seja, tem muito chef que se acomoda no seu bom nome, ou no nome do restaurante, ou simplesmente no fato de ter uma casa bonita, uma formação decente e um punhado de pessoas que topem pagar os preços por eles pedidos.
Um chef deveria provar tudo que sai da sua cozinha. Despoje-se da sua timidez ou dos seus receios em criticar, sem, contudo, se imbuir do mal “jornalístico” de se achar acima do bem e do mal e, da próxima vez que provar um prato, reflita sobre se o cara provou aquilo.
Outra, eu tenho a tendência de não confiar muito em cardápios extensos. Sou mais um restaurante que tenha dois, até mesmo UM prato do menu do que um que tenha páginas e páginas de carnes, frango, massa, peixes, camarões... Se um chef se propõe a servir, em seu restaurante, dois pratos, é muito, muito provável que a receita, a execução, a apresentação sejam exímios.
Rodrigo Mendes é jornalista e chef de cozinha sem diploma; alçado ao posto pelos amigos que curtem suas misturebas gastronômicas. Mantém a coluna O melhor lugar da casa neste Nota de Rodapé.
Na casa de veraneio do Tango, Paris, nasceu o Gotan Project
Se a Argentina também é o país do tango, é na França onde ele passa as férias, descansa e volta à terra natal renovado. Assim foi desde o começo, quando o ritmo precisou chegar de barco a Paris para então ser aceito em Buenos Aires. “Se os europeus dançam, então não é coisa da plebe”, pensou a fresca burguesia portenha.
Restrito aos “sem classe”, foi na cidade luz que Astor Piazzolla - um incompreendido na Argentina por seu estilo de tocar - pôde desenvolver seu talento. Na capital francesa conheceu o jazz sob influência de Gerry Mulligan – e teve tempo e espaço para se descobrir. Quando voltou a Buenos Aires, e após lutar contra um batalhão de críticos, revolucionou o ritmo com seus arranjos e timbres próprios.
Ira dos puristas
Mesmo reconhecido, Piazzolla conviveu a vida toda com a ira dos puristas. Conta a lenda que em um concerto, já quase no final, um senhor de chapéu, depois dos aplausos do público, bradou: “Muito bem, agora o senhor poderia tocar um tango?”.
Portanto, não é pura casualidade que no final do século passado um suíço (Chirstoph Muller), um argentino (Eduardo Makaroff) e um francês (Philippe Cohen) tenham se encontrado em Paris para criar um conjunto que deu início à segunda renovação do tango. O primeiro disco do Gotan Project se chama La Revancha del Tango (a Revanche do Tango). Pode soar presunçoso, mas foi profético. Aberto o caminho, diversas bandas ingressaram na onda de misturar o velho tango com samplers e música eletrônica.
O primeiro álbum do grupo, de 2001, é inovador não só no som, mas no conceito. Além disso, há em Gotan Project uma questão estética muito forte. Preocupação com cenário e vestuário que realmente impressiona quando visto ao vivo.
Por fim, e seguramente por influência de Makaroff, o argentino do trio, as músicas do grupo estão carregadas de mensagens que fazem referência à Argentina.
Em Queremos Paz, música que abre o álbum, a voz de Che Guevara no famoso discurso que fez na ONU em 1964: “Queremos paz, queremos construir uma vida melhor para nosso povo”.
A música Época fala do fenômeno das “desaparições”, horror praticado pela ditadura argentina:
Vide Arrabal, do segundo disco:
O que esperar então do terceiro álbum que acaba de sair do forno? Ainda não escutei com a devida atenção, mas vejo um Gotan Project ainda mais cuidadoso com os arranjos e os detalhes - que fazem a diferença. As inserções de temas argentinos seguem vivas e funcionando. Como em La Glória, em que o narrador esportivo Victor Hugo Morales (figura conhecidíssima e lendária na Argentina), descreve uma linha de passe em que todos os músicos da banda participam – e que termina em “Goooootan”.
Em Rayuela (jogo da amarelinha), Cortázar (escritor argentino que viveu anos em Paris) surge lendo o capítulo 7 de seu livro que tem o mesmo título da música. Em seguida, um coro de crianças canta:
Deixo de bônus a música Diferente, do segundo disco, e que tem um clip tão lindo quando a canção.
Ricardo Viel é jornalista e mantém a coluna Conexsom Latina neste Nota de Rodapé.
Restrito aos “sem classe”, foi na cidade luz que Astor Piazzolla - um incompreendido na Argentina por seu estilo de tocar - pôde desenvolver seu talento. Na capital francesa conheceu o jazz sob influência de Gerry Mulligan – e teve tempo e espaço para se descobrir. Quando voltou a Buenos Aires, e após lutar contra um batalhão de críticos, revolucionou o ritmo com seus arranjos e timbres próprios.
Ira dos puristas
Mesmo reconhecido, Piazzolla conviveu a vida toda com a ira dos puristas. Conta a lenda que em um concerto, já quase no final, um senhor de chapéu, depois dos aplausos do público, bradou: “Muito bem, agora o senhor poderia tocar um tango?”.
Portanto, não é pura casualidade que no final do século passado um suíço (Chirstoph Muller), um argentino (Eduardo Makaroff) e um francês (Philippe Cohen) tenham se encontrado em Paris para criar um conjunto que deu início à segunda renovação do tango. O primeiro disco do Gotan Project se chama La Revancha del Tango (a Revanche do Tango). Pode soar presunçoso, mas foi profético. Aberto o caminho, diversas bandas ingressaram na onda de misturar o velho tango com samplers e música eletrônica.
O primeiro álbum do grupo, de 2001, é inovador não só no som, mas no conceito. Além disso, há em Gotan Project uma questão estética muito forte. Preocupação com cenário e vestuário que realmente impressiona quando visto ao vivo.
Por fim, e seguramente por influência de Makaroff, o argentino do trio, as músicas do grupo estão carregadas de mensagens que fazem referência à Argentina.
Em Queremos Paz, música que abre o álbum, a voz de Che Guevara no famoso discurso que fez na ONU em 1964: “Queremos paz, queremos construir uma vida melhor para nosso povo”.
A música Época fala do fenômeno das “desaparições”, horror praticado pela ditadura argentina:
Desapareceu, e em mim reapareceráO primeiro álbum foi um sucesso e o grupo rodou o mundo para se apresentar. Demorou cinco anos para que viesse o segundo disco (Lunático), que tem como característica uma mistura ainda mais acentuada com outros ritmos, como o candombe (ritmo trazido para a região do Rio da Prata pelos escravos negros e carregada por batuques).
Acreditam que morreu, mas renascerá
Não eram boas essas épocas,
Eram maus esses ares,
Foi há 25 anos,
E você existia sem existir ainda
Vide Arrabal, do segundo disco:
O negro bebeu, bailando CandombeMas Gotan Project foi mais longe e flertou com o rap, nesta maravilhosa canção Mi Confesión:
Lágrimas de seu tambo/Genial
Esses coros levam sonhos
Ao outro lado do mar
E um vento de arrabalde
Assobiou à noite
E no meu país se escutou/Cantar
O que esperar então do terceiro álbum que acaba de sair do forno? Ainda não escutei com a devida atenção, mas vejo um Gotan Project ainda mais cuidadoso com os arranjos e os detalhes - que fazem a diferença. As inserções de temas argentinos seguem vivas e funcionando. Como em La Glória, em que o narrador esportivo Victor Hugo Morales (figura conhecidíssima e lendária na Argentina), descreve uma linha de passe em que todos os músicos da banda participam – e que termina em “Goooootan”.
Em Rayuela (jogo da amarelinha), Cortázar (escritor argentino que viveu anos em Paris) surge lendo o capítulo 7 de seu livro que tem o mesmo título da música. Em seguida, um coro de crianças canta:
Um, dois, três: Terra, CéuNão posso participar da promoção que o Nota de Rodapé lançou. Deixo aqui um conselho aos três sortudos que ganharem o novo disco de Gotan Project. Procure encontrar nas músicas o que não é visível (ou audível) a primeira impressão. É um trabalho de artesão e o resultado é de quitar o sombrero, quase uma viagem a Buenos Aires (com escala em Paris).
Cinco, seis: Paraíso, Inferno
Sete, oito, nove, dez: É preciso saber mover os pés
Na amarelinha ou na vida
Você pode escolher um dia
Por qual costado?
De que lado saltará?
Deixo de bônus a música Diferente, do segundo disco, e que tem um clip tão lindo quando a canção.
Ricardo Viel é jornalista e mantém a coluna Conexsom Latina neste Nota de Rodapé.
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segunda-feira, 26 de abril de 2010
Promoção Cultural Nota de Rodapé no espaço Parlapatões
São 2 (dois) pares de ingresso por dia de apresentação do premiado espetáculo “Por que a criança cozinha na polenta”, que faz temporada no Espaço dos Parlapatões todas as terças-feiras às 21h (até 25/05) em SP.
A promoção
A Cia. Mungunzá de Teatro e o Nota de Rodapé vão sortear dois pares de ingresso por dia de espetáculo (4, 11, 18 e 25) aos leitores que deixarem nome completo, telefone e e-mail na postagem dessa promoção ou escrever para promocao@notaderodape.com.br com essas informações e assunto do e-mail “promoção de teatro”. O sorteios serão em duas etapas: o primeiro, sexta-feira, 30 de abril (dois pares de ingresso serão sorteados para 4 e também 11) e sexta-feira, 7 de maio (mais dois pares de ingresso serão sorteados para os dias 18 e também 25). A confirmação do sorteado precisa ser realizada no máximo até meio dia da segunda-feira subsequente, para que haja tempo de passar os nomes à bilheteria.
O espetáculo
A história gira em torno de uma menina romena cujos pais são artistas circenses exilados de seu país. A mãe se pendura no trapézio pelos cabelos todas as noites. O pai é um palhaço que não acredita em Deus, pois “Os homens acreditam menos em Deus do que as mulheres e as crianças, por causa da concorrência”. Narrado por uma adolescente que se defende da degradação pela ótica infantil, o espetáculo é ao mesmo tempo lírico e cruel. Enquanto, em seu exílio, excursiona pela Europa Central, a menina, ao lado da irmã mais velha, é arremessada de encontro ao despedaçamento de todos os seus ideais, bem como o preço por cada um deles. “A criança cozinhando na polenta” é um dito romeno, equivalente ao “bicho papão” no Brasil. Esse dito assombrará a menina nos momentos cruciais de sua vida. Não é um espetáculo sobre comida nem também uma história infantil. Ou talvez seja. Mas é diferente: não é para crianças. Encenado pela Cia. Mungunzá de Teatro, o texto autobiográfico da romena Aglaja Veteranyi conquistou mais de 24 prêmios no segundo semestre de 2009 em diversos festivais!
POR QUE A CRIANÇA COZINHA NA POLENTA
Texto: Aglaja Veteranyi Tradução: Fabiana Macchi Direção e adaptação: Nelson Baskerville Elenco: Verônica Gentilin, Sandra Modesto, Virgínia Iglesias, Marcos Felipe e Lucas Beda.
Serviço:
Quando: 4, 11, 18 e 25 de maio (sempre às terças, 21 horas)
Onde: Espaço dos Parlapatões. Praça Franklin Roosevelt, nº 158
Centro / São Paulo. Fone: 3258-4449
Duração: 80 minutos.
Faixa etária 16 anos
Vinicius de Moraes total e digital
Agora você pode ter acesso a todo o acervo de Vinicius de Moraes (1913-1980). É que o falecido bibliófilo José Mindlin, doou 15 livros a Biblioteca Brasiliana da Universidade de São Paulo (USP). A publicação digital foi possível após a autorização da VM Empreendimentos Artísticos e Culturais, detentora dos direitos autorais do poeta. Entre as obras, O Caminho para a Distância (1933) e a primeira edição de Orfeu da Conceição (1956). Numa entrevista para Edla van Steen, Vinicius respondeu a uma das perguntas: "Não sou um ser particularmente político, porque não tenho vocação. Sou um cara de esquerda e devo carregar o ônus de ser um cara de esquerda num mundo de direita. Um mundo tão injusto...vamos mudar de pergunta?" Acesse o acervo AQUI.
Utopia e Barbárie
Assisti ao documentário caleidoscópico do cineasta que admiro muito, Silvio Tendler. Segundo o próprio, foram 18 anos para concluir o trabalho recheado de cenas preciosas de um arquivo de imagens de dar inveja a qualquer um. Interessante é a quantidade de boas entrevistas que Silvio conseguiu reunir. Em linhas gerais, o filme expõe os principais fatos dos últimos 60 anos e reflete sobre a capacidade humana de sonhar e destruir, sempre com a visão pessoal do próprio cineasta que tinha 18 anos quando veio o AI-5 em 1968. Deixo a análise por conta de Vitor Nuzzi da Rede Brasil Atual (com entrevista).
Utopia e Barbárie
Assisti ao documentário caleidoscópico do cineasta que admiro muito, Silvio Tendler. Segundo o próprio, foram 18 anos para concluir o trabalho recheado de cenas preciosas de um arquivo de imagens de dar inveja a qualquer um. Interessante é a quantidade de boas entrevistas que Silvio conseguiu reunir. Em linhas gerais, o filme expõe os principais fatos dos últimos 60 anos e reflete sobre a capacidade humana de sonhar e destruir, sempre com a visão pessoal do próprio cineasta que tinha 18 anos quando veio o AI-5 em 1968. Deixo a análise por conta de Vitor Nuzzi da Rede Brasil Atual (com entrevista).
domingo, 25 de abril de 2010
Promoção Musical Nota de Rodapé e gravadora MCD
A nova promoção Nota de Rodapé e MCD vai sortear o novo álbum do grupo argentino Gotan Project, Tango 3.0, lançado mundialmente no último 19 de abril
A gravadora MCD oferece 3 (três) cds do novo álbum do Gotan Project intitulado Tango 3.0.
Para participar responda a pergunta: “Antes do Gotan Project, dois integrantes tiveram um grupo que tinha em seu nome uma referência ao Brasil. Quem são os integrantes e qual o nome da banda?” Escreva a resposta com seu nome completo, e-mail, endereço e telefone para promocao@notaderodape.com.br e concorra no sorteio do dia 30 de maio. Boa sorte!
Sobre o grupo
Em 2000, o Gotan Project, trio formado por Philippe Cohen Solal, Eduardo Makaroff e Christoph H. Müller, lançou seu primeiro álbum, “La Revancha del Tango”. Com ele, o grupo conseguiu a mais doce vingança para o tango, levando esta música sexy e o som da Argentina para o mundo. Hoje, o som do Gotan é sinônimo de chique e descolado, tanto nas casas noturnas de Nova Iorque como nas praias do Rio de Janeiro. Em seu segundo álbum, “Lunático” (2006), o Gotan Project injetou mais gravações ao vivo e uma maior influência do jazz na sua sonoridade. Muito imitado, o Gotan Project aprendeu a apreciar o elogio e após mais de 2 milhões de discos vendidos e 400 shows, eles estão de volta com seu 3º álbum de estúdio, o magnífico “Tango 3.0”. “La Revancha del Tango” entrou na lista dos 100 melhores álbuns da década feita pelo jornal inglês “The Guardian”. Agora, “Tango 3.0” abre o caminho para uma nova década com sua visão cinematográfica e invocações não apenas de Buenos Aires, como também do delta do Mississipi, de Nova Orleans, Nashville e até dos becos de Nova Iorque.
Sobre o grupo
Em 2000, o Gotan Project, trio formado por Philippe Cohen Solal, Eduardo Makaroff e Christoph H. Müller, lançou seu primeiro álbum, “La Revancha del Tango”. Com ele, o grupo conseguiu a mais doce vingança para o tango, levando esta música sexy e o som da Argentina para o mundo. Hoje, o som do Gotan é sinônimo de chique e descolado, tanto nas casas noturnas de Nova Iorque como nas praias do Rio de Janeiro. Em seu segundo álbum, “Lunático” (2006), o Gotan Project injetou mais gravações ao vivo e uma maior influência do jazz na sua sonoridade. Muito imitado, o Gotan Project aprendeu a apreciar o elogio e após mais de 2 milhões de discos vendidos e 400 shows, eles estão de volta com seu 3º álbum de estúdio, o magnífico “Tango 3.0”. “La Revancha del Tango” entrou na lista dos 100 melhores álbuns da década feita pelo jornal inglês “The Guardian”. Agora, “Tango 3.0” abre o caminho para uma nova década com sua visão cinematográfica e invocações não apenas de Buenos Aires, como também do delta do Mississipi, de Nova Orleans, Nashville e até dos becos de Nova Iorque.
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Prefeitura de Atibaia responde ao NR e troca telhas de amianto
Após reportagem de Moriti Neto neste Nota de Rodapé denunciando com exclusividade o uso de telhas de amianto (substância tóxica e proibida desde 2007) na construção de casas de madeira para desabrigados das enchentes de janeiro no bairro da Vila São José, em Atibaia, São Paulo, a prefeitura do município emitiu nota oficial e respondeu às perguntas enviadas pela reportagem. A prefeitura admitiu saber dos riscos e da proibição do uso do amianto e afirmou ter constatado a irregularidade no dia 20 de abril quando, então, notificou a empresa responsável pela obra. “Quando foi verificada a instalação de telhas de amianto na obra, a Prefeitura exigiu da empresa contratada a substituição por telhas de fibrocimento onduladas (CRFS), conforme o memorial descritivo fornecido à empresa na contratação dos serviços. A notificação foi emitida à empresa no dia 20 de abril”, respondeu a assessoria da Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente, responsável pela fiscalização da obra. Como se vê nas imagens da retirada das telhas, os trabalhadores não usam nem um tipo de material (máscara, luvas etc) de proteção. (Imagens cedidas pelo Jornal Atibaia Hoje)
A Prefeitura, por meio da Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente, exigiu a troca das telhas de amianto que estavam sendo utilizadas, por parte da empreiteira, nas obras do alojamento no campo Santa Clara, bairro Caetetuba. As telhas de amianto são proibidas por lei estadual e municipal.
A irregularidade na obra foi verificada em fiscalização no dia 20 de abril, terça-feira, quando a empresa foi notificada a realizar a troca do material. “Emitimos a notificação à empresa contratada exigindo a instalação de telhas de fibrocimento onduladas, que não contém amianto, conforme o memorial descritivo da obra”, diz a secretária de Urbanismo e Meio Ambiente, Ticiane d’Aloia.
Ainda segundo a secretária, o alojamento está sendo construído dentro da proposta inicial, para abrigar as famílias que foram vítimas das enchentes que hoje estão em abrigos em ginásios e contêineres durante o tempo necessário para a construção de casas populares definitivas. A proposta pressupõe uma obra rápida e com custos baixos, sem descartar a qualidade.
A obra prevê a utilização de estrutura de madeira pontaletada e sarrafos. “Toda madeira utilizada é de pinus e eucalipto reflorestados. Para o fechamento lateral serão utilizadas chapas de madeira compensada de 10 mm, que posteriormente receberão fundo preparador e 2 ou 3 demãos de tinta esmalte, assegurando sua impermeabilidade”, explica a secretária Ticiane.
A secretária afasta a possibilidade de contato direto das madeiras com a água, no caso de chuva. “A obra também prevê a execução de 2 fiadas de blocos de concreto no perímetro da construção, possibilitando o afastamento das chapas de madeira do contato direto com a água. Nas áreas molhadas essa alvenaria chega a 1,20 m de altura, revestida com reboco impermeabilizado e pintura látex PVA antimofo”, considera. O projeto do abrigo provisório foi baseado no modelo construído na cidade de Jundiaí para abrigar famílias temporariamente.
A empreiteira contratada para execução da obra é a A3 Terraplenagem e Engenharia Ltda, que tem o prazo de execução de três meses a partir da Ordem de Serviço, datada de 22 de março de 2010. “Não há interesse na prorrogação do contrato por se tratar de obra emergencial. A proposta é que até o fim de maio as famílias já estejam instaladas no alojamento”, continua a secretária.
A Prefeitura adquiriu um terreno no Jardim Colonial e a proposta inicial é de fazer uma licitação contemplando a construção de unidades habitacionais por meio do programa do Governo Federal “Minha Casa, Minha Vida”. Já estão em licitação as obras de urbanização de construção de unidades habitacionais pelo Programa FINHIS, responsável pela construção de 240 unidades na Vila São José, 168 unidades no Caetetuba II e 15 unidades Guaxinduva.”"
Leia também:"Prefeitura exige troca de telhas de amianto em obra do alojamento
- EXCLUSIVO: dos contêineres ao amianto
- À margem, a Atibaia que não sai no slogan de melhor clima do mundo
- Imagens de Paula Sacchetta e dos contêineres no Campo Santa Clara
A Prefeitura, por meio da Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente, exigiu a troca das telhas de amianto que estavam sendo utilizadas, por parte da empreiteira, nas obras do alojamento no campo Santa Clara, bairro Caetetuba. As telhas de amianto são proibidas por lei estadual e municipal.
A irregularidade na obra foi verificada em fiscalização no dia 20 de abril, terça-feira, quando a empresa foi notificada a realizar a troca do material. “Emitimos a notificação à empresa contratada exigindo a instalação de telhas de fibrocimento onduladas, que não contém amianto, conforme o memorial descritivo da obra”, diz a secretária de Urbanismo e Meio Ambiente, Ticiane d’Aloia.
Ainda segundo a secretária, o alojamento está sendo construído dentro da proposta inicial, para abrigar as famílias que foram vítimas das enchentes que hoje estão em abrigos em ginásios e contêineres durante o tempo necessário para a construção de casas populares definitivas. A proposta pressupõe uma obra rápida e com custos baixos, sem descartar a qualidade.
A obra prevê a utilização de estrutura de madeira pontaletada e sarrafos. “Toda madeira utilizada é de pinus e eucalipto reflorestados. Para o fechamento lateral serão utilizadas chapas de madeira compensada de 10 mm, que posteriormente receberão fundo preparador e 2 ou 3 demãos de tinta esmalte, assegurando sua impermeabilidade”, explica a secretária Ticiane.
A secretária afasta a possibilidade de contato direto das madeiras com a água, no caso de chuva. “A obra também prevê a execução de 2 fiadas de blocos de concreto no perímetro da construção, possibilitando o afastamento das chapas de madeira do contato direto com a água. Nas áreas molhadas essa alvenaria chega a 1,20 m de altura, revestida com reboco impermeabilizado e pintura látex PVA antimofo”, considera. O projeto do abrigo provisório foi baseado no modelo construído na cidade de Jundiaí para abrigar famílias temporariamente.
A empreiteira contratada para execução da obra é a A3 Terraplenagem e Engenharia Ltda, que tem o prazo de execução de três meses a partir da Ordem de Serviço, datada de 22 de março de 2010. “Não há interesse na prorrogação do contrato por se tratar de obra emergencial. A proposta é que até o fim de maio as famílias já estejam instaladas no alojamento”, continua a secretária.
A Prefeitura adquiriu um terreno no Jardim Colonial e a proposta inicial é de fazer uma licitação contemplando a construção de unidades habitacionais por meio do programa do Governo Federal “Minha Casa, Minha Vida”. Já estão em licitação as obras de urbanização de construção de unidades habitacionais pelo Programa FINHIS, responsável pela construção de 240 unidades na Vila São José, 168 unidades no Caetetuba II e 15 unidades Guaxinduva.”"
quarta-feira, 21 de abril de 2010
EXCLUSIVO: dos contêineres ao amianto
Moradores da Vila São José, em Atibaia, após perderem tudo nas enchentes de janeiro foram transferidos para contêineres. Ao visitar o local, nosso repórter se deparou com outro problema: o destino deles serão casas de madeirite com telhados de amianto tóxico
Texto de Moriti Neto
Fotos de Paula Sacchetta
4 de abril. Domingo de Páscoa. O dia amanhece nublado e frio em Atibaia. Chegando ao campo do Santa Clara, no bairro Caetetuba, uma imagem salta aos olhos. Ali estão contêineres de metal improvisados pela prefeitura para servir de “moradia” à parte dos desabrigados das enchentes de janeiro. Em 12 dessas “casas de lata” estão famílias que moravam na Vila São José, o bairro mais pobre do município. Esse cenário já seria suficientemente chocante até a descoberta de que as pessoas seguirão para casas à base de madeirite e cobertas por telhados de amianto, substância tóxica e proibida.
O parente de uma das famílias desabrigadas, em visita na páscoa, é quem levanta dúvidas sobre os materiais usados na obra. N.S., 28, também foi afetado pela inundação, mas não mora no local. Ele é pedreiro, trabalha desde os 14 anos na construção de casas e aponta problemas no projeto. “Primeiro, estava previsto que era pra ter blocos de cimento na altura de 1,60 m como base da estrutura. Fizeram 40 cm e já começaram a colocar tábuas. A própria prefeitura fala que as famílias vão ficar ali dois anos. Nesse tempo, vai chover muito e a água alcança fácil o emadeiramento e apodrece tudo”, critica.
Realmente, as tábuas a que N.S se refere são frágeis, finas, estruturalmente se assemelham à madeira compensada utilizada em guarda-roupas. “É chapa de madeirite. Coisa fraca. Com pouco tempo, a exposição à chuva e ao sol vai estragar e danificar as casas”, afirma.
“Você já viu as telhas?”
A madeira usada para erguer as paredes das casas não é a maior preocupação do pedreiro N.S. “Você já viu as telhas? Elas têm amianto. Nos últimos dias, veio um vento forte e o telhado levantou, bateu nos sarrafos, nos caibros e quebrou. Parecia uma casca de ovo e fez subir muita poeira”, conta.
Essas casas estão a poucos metros dos contêineres. Ao redor delas, há estilhaços de um material acinzentado, espalhado pelo chão de terra batida, a vista de quem passa no campo do Santa Clara, único local de lazer da região. Dentro e fora das habitações de madeira existem pedaços de telhas com os dizeres: “contém amianto, ao cortar ou furar não respire a poeira gerada, pois pode prejudicar gravemente a saúde”.
“Se acontece em Atibaia, é absurdo”
Em 2007, um projeto de lei, PL 12.684/07, foi aprovado na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo e sancionado pelo poder executivo, banindo a produção e comercialização de amianto no território paulista. A decisão, publicada no Diário Oficial do Estado, em 27 de julho de 2007, “proíbe o uso de produtos, materiais ou artefatos que contenham quaisquer tipos de amianto ou asbesto a partir de 1/1/2008”. Em junho de 2008, o Supremo Tribunal Federal (STF), por sete votos a três, ratificou o texto.
A lei, de autoria do deputado estadual Marcos Martins (PT), classifica como amianto ou asbesto as formas fibrosas dos anfibólios como a crisotila (asbesto branco), que é usada predominantemente em telhas e caixas d’água.
Elemento causador de várias doenças, dentre elas, câncer, o amianto é uma substância tóxica que, segundo estudos da Organização Mundial do Trabalho (OIT), mata mais de cem mil pessoas por ano no planeta. Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), as variantes do mineral, sem exceção, afetam tecidos pulmonares, gerando inflamações que levam à formação de tumores como de pulmão e pleura e, ainda, traz riscos de câncer de estômago, esôfago, intestino, rins, pâncreas, laringe e pele. Além disso, ele representa perigo ocupacional, ambiental e aos consumidores em geral, que dispõem de poucas informações de como manipulá-lo.
O autor do projeto destaca que os brasileiros têm direito de conhecer os reais malefícios provocados pelo produto, que contaminou ao menos 2.500 pessoas no país, de acordo com dados fornecidos pelos próprios fabricantes ao Ministério Público do Estado de São Paulo: “o amianto é um problema de saúde pública, usado em nosso país desde meados da década de 1930 e deve ser tratado como questão sanitária séria. Quando as multinacionais que o produziam se instalaram aqui, já reconheciam restrições médicas existentes nos países de origem. Nossas pesquisas e ações para banir a substância devem ser rigorosas”, argumenta o deputado.
Martins classifica como “algo absurdo” o fato de agentes públicos permitirem o amianto em moradias populares. O projeto, inclusive, torna obrigatórias placas indicativas nas obras públicas do estado e nas particulares de uso público, com a seguinte mensagem: "nesta obra não há utilização de amianto ou produtos dele derivados, por serem prejudiciais à saúde". “Se isso acontece em Atibaia, é algo absurdo. As administrações públicas foram as primeiras proibidas de comprar. Hoje, o amianto não pode nem circular para fins comerciais, nem mesmo vir de outros estados. Se a fiscalização, a vigilância sanitária, por exemplo, flagrar um carregamento, pode apreender. É inadmissível que uma prefeitura permita isso. É contra a lei”, observa o parlamentar.
Fora a exposição dos moradores, outros pontos que não parecem considerados pela prefeitura de Atibaia, administrada há nove anos pelo Partido Verde (PV), são os danos à saúde dos trabalhadores envolvidos na construção das casas e a constituição de um problema ambiental devido ao desprendimento das fibras em função do envelhecimento dos materiais, mudanças de temperatura, intempéries e processos de limpeza. Os resíduos não podem ser destruídos e devem ser levados a aterros sanitários apropriados. “Só existem três aterros sanitários em São Paulo que podem receber os resíduos. Estão em Caieiras, São José dos Campos e Tremembé, todos particulares. Além de tudo, até o descarte dos resíduos é péssimo para a sociedade, pois consome muito dinheiro público. Com tantas opções já estudadas e comprovadamente viáveis, usar amianto não é justificável”, critica Martins.
O amianto pode ser substituído por fibra de vidro, polipropileno, polietileno, cerâmicos e até casca de coco. Das cerca de 260 empresas que trabalhavam com o mineral no estado, apenas duas insistem em sua utilização, por meio de liminares, quase dois anos após o STF ter assegurado a validade da lei paulista – a Confibra, de Hortolândia e a Infibra, de Leme. E é justamente a segunda a fornecedora das telhas que cobrirão as casas de madeira do Santa Clara.
Embora a lei proíba a utilização de amianto em todo o território paulista, essas duas empresas se apegaram à interpretação do significado da palavra “uso” no texto. Diante disso, o Centro de Vigilância Sanitária de São Paulo solicitou um parecer à Consultoria Jurídica da Secretaria de Estado da Saúde, que não deixa dúvidas: “seria ilógico imaginar que a lei paulista tivesse proibido o uso do amianto no estado de São Paulo e, ao mesmo tempo, permitido a produção e a comercialização do produto”, considera. E completa: “a lei objetiva, claramente, a proteção da saúde das pessoas expostas ao produto, e tal exposição (...) não ocorre apenas com o “uso” propriamente dito do amianto, pois aqueles que participam das diversas etapas da produção do produto, assim como aqueles que o comercializam também ficam sujeitos a essa exposição”.
A reportagem do Nota de Rodapé enviou uma série de questões à prefeitura de Atibaia, que até o momento da publicação deste texto não foram respondidas. O espaço, no entanto, está à disposição para as explicações do município.
Banido em 57 países
O produto já foi banido de 57 países, incluindo toda a União Europeia, Japão, Austrália, Chile, Argentina e Uruguai. No início deste mês, o senado dos Estados Unidos aprovou, por unanimidade, medidas contrárias ao uso. A resolução 427 torna o período de 1 a 7 de abril “Semana Nacional da Consciência Antiamianto” e ressalta o papel da classe médica no alerta e na educação dos norte-americanos sobre os riscos de contaminação.
Para o senado dos EUA “todo tipo de amianto é cancerígeno ao ser humano”. A resolução indica que, de acordo com a OMS, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), e a Associação Médica Americana, “não há nível seguro para exposição ao mineral (critério 203, publicado pelo International Programme on Chemical Safety, da OMS), e que as fibras do amianto podem provocar mesotelioma, tumor maligno incurável, cem por cento fatal; asbestose, “ou pulmão de pedra”, que também leva à morte; e outros problemas de saúde, como cânceres variados.
O Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica da França (Inserm), também publicou, em 1996, relatório que conclui pela toxicidade do elemento, independentemente da espécie. “Todas as fibras de amianto são cancerígenas, qualquer que seja seu tipo ou origem geológica”, atesta o órgão.
No Brasil, mais de duas dezenas de cidades paulistas e quatro estados, São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pernambuco, adotam posição semelhante para proteger a saúde coletiva. Entretanto, uma decisão de âmbito nacional espera por definição no Congresso.
Diagnóstico difícil, morte certa
Os expostos ao amianto sofrem consequências devastadoras. O período para que as doenças se manifestem é o maior problema no diagnóstico, pois os primeiros sintomas são notados até 50 anos depois da exposição. Em alguns casos, os males causam a morte em, no máximo, dois anos.
A asbestose, fibrose pulmonar ou “pulmão de pedra” ocorre dez anos depois da exposição. Já o câncer de pulmão após 25 e o mesotelioma de pleura (fatal em até dois anos), pode levar até cinco décadas para surgir desde o primeiro contato com a fibra.
O presidente da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), Eliezer João de Souza, trabalhou na extinta fábrica da Eternit, em Osasco, de 1968 a 1981. 14 anos depois, em 1995, descobriu que tinha nódulos na pleura, espaço ao redor do pulmão. “Não tinha a menor ideia. A fábrica havia fechado quando descobri o problema. Tive que passar por cirurgia e tirar vários nódulos. Atualmente, tenho que fazer acompanhamento rígido porque a fibra é muito fina, difícil de detectar e quem foi contaminado por amianto não tem cura, fica pra sempre e pode aparecer outra doença”, explica. Ele descreve que muitos colegas de trabalho morreram ou carregam sequelas, vítimas do contato com amianto. Há registros de câncer na laringe, pulmão, intestino e de pele. “Vários que fundaram ou se associaram a Abrea faleceram. Descobriram as doenças bem depois de terem saído da indústria. Um deles, que foi nosso advogado, morreu 44 anos após ter parado de trabalhar com amianto”, lembra.
Contudo, Eliezer reforça que não somente os trabalhadores relacionados diretamente à substância podem se intoxicar e adquirir doenças mortais: “pra quem pensa que só aqueles que atuam na indústria podem ser contaminados, há uma pesquisa recente da Fundacentro (entidade governamental ligada ao Ministério do Trabalho e Emprego), feita em Osasco, com 300 esposas de funcionários, que apontou que dez delas têm algum problema derivado do amianto. Basta lavarem as roupas dos maridos para ocorrer o contágio. E, tendo em conta o tempo de incubação, podem estar doentes bem mais do que dez. Essa é mais uma prova de que o amianto age não só no trabalhador, mas no ambiente todo”, finaliza.
(Durante a visita ao local a repórter fotográfica Paula Sacchetta fez uma série de imagens exclusivas para o Nota de Rodapé que podem ser acessadas em sua página AQUI.)
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terça-feira, 20 de abril de 2010
Inativos hoje, radioativos amanhã?
Começou em Cochabamba, na Bolívia, a Conferência Mundial dos Povos sobre Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra — CMPCC, na sigla em castelhano. O evento foi convocado pelo presidente Evo Morales poucas semanas após o fracasso da COP-15, em Copenhague, que reuniu os líderes do mundo inteiro mas não chegou a nenhum acordo sobre o combate ao aquecimento global.
Poucos chefes de estado ou governo, porém, assistirão à CMPCC. O presidente boliviano deve receber a visita apenas de seus maiores aliados estratégicos regionais: Hugo Chávez, Rafael Correa, Fernando Lugo e Daniel Ortega. Todos eles integram a Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA), tiveram uma atuação semelhante durante a cúpula da Dinamarca e defendem que nenhuma política para mitigar o aquecimento global será efetiva dentro do capitalismo. Porque, ora bolas, é o próprio sistema que vem destruindo a natureza.
Alguns jornais chamaram a CMPCC de “Woodstock climático”. Eu prefiro fazer um paralelo com o Fórum Social Mundial, que surgiu para contrapor o discurso hegemônico do Fórum Econômico Mundial. Podemos dizer que as Conferências das Partes (COP) promovidas pelas Nações Unidas para discutir a mudança climática é como se fosse uma “Davos ambiental”, enquanto a nova CMPCC é muito mais Porto Alegre.
Na COP se reúnem empresários, lobistas e chefes de estado, que podem até impulsionar acordos para preservar a natureza, mas sempre acabam esbarrando em interesses políticos e econômicos que falam mais alto. Na CMPCC estarão presentes ongs e ativistas — e alguns presidentes, além de representantes de governo — que propõem e defender uma mudança de postura no que diz respeito à catástrofe climática. E já, pra ontem, porque o planeta não pode esperar.
“As coisas estão caminhando numa direção errada. Os governos sabem disso, os cientistas sabem disso, mas nada estão mudando”, disse Pablo Solón, embaixador da Bolívia nas Nações Unidas, em entrevista ao Guardian. “Esse é o único cenário para fazer um balanço entre a pressão que as grandes corporações estão colocando sobre os governantes e a pressão que pode emergir da sociedade civil.”
A CMPCC é uma significativa oportunidade dada aos povos de todo o mundo — sobretudo aqueles cujas opiniões são esquecidas ou ignoradas pelo poder hegemônico — para que se façam ouvir. Os discursos em torno da crise ambiental são, digamos, unidimensionais, na medida em que apenas conseguem conceber saídas ao aquecimento global dentro da ordem política e econômica vigente. É a insistência na manutenção das noções capitalistas de riqueza, crescimento e desenvolvimento que tem produzido abstrações esquizofrênicas para salvar o mundo da tragédia, como o mercado internacional de carbono, que faz cálculos inimagináveis para atribuir valor monetário a algo tão óbvio como a preservação ambiental.
Preservar a natureza, uma atitude gratuita, custa muito dinheiro dentro do capitalismo. Portanto, algo está errado.
É este recado, cuja inspiração parte do mundo indígena, que a CMPCC quer repassar ao mundo, uma vez que os líderes mundiais voltarão a discutir o aquecimento terrestre em dezembro de 2010, no México. Evo Morales também pretende que a Conferência seja o ponto de partida para um plebiscito mundial sobre o aquecimento climático, um instrumento que possa recolher a vontade da sociedade global sobre as políticas que estão — e principalmente as que não estão — sendo adotadas para combater a devastação.
As propostas centrais da CMPCC guardam estreita relação com muitos dos artigos e reportagens publicados aqui em Latitude Sul ao longo desse ano e pouco de atividade. São gritos para que a devastação seja interrompida de uma vez por todas, para que as florestas deixem de ser derrubadas, que os rios deixem de ser poluídos e o ar, contaminado, porque só assim poderemos viver em harmonia com a natureza, e não apartados dela, porque a ela pertencemos. E, caso a economia deixe de crescer por causa disso, então é hora de reinventar nossos padrões de bem-estar e dignidade.
Porque talvez valha mais a pena viajar menos, trabalhar menos e, consequentemente, ter menos conforto para usufruir de um ar com menos partículas pesadas, de uma água sem cloro e de florestas nativas. E, sobretudo, para que o mundo seja menos injusto. É uma escolha.
>> Notícias sobre a CMPCC podem ser acompanhadas, em espanhol, no saite oficial da conferência e também, em inglês, na cobertura do jornal inglês Guardian.
Tadeu Breda é jornalista e colunista do Nota de Rodapé. Também vive em Latitude Sul
Poucos chefes de estado ou governo, porém, assistirão à CMPCC. O presidente boliviano deve receber a visita apenas de seus maiores aliados estratégicos regionais: Hugo Chávez, Rafael Correa, Fernando Lugo e Daniel Ortega. Todos eles integram a Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA), tiveram uma atuação semelhante durante a cúpula da Dinamarca e defendem que nenhuma política para mitigar o aquecimento global será efetiva dentro do capitalismo. Porque, ora bolas, é o próprio sistema que vem destruindo a natureza.
Alguns jornais chamaram a CMPCC de “Woodstock climático”. Eu prefiro fazer um paralelo com o Fórum Social Mundial, que surgiu para contrapor o discurso hegemônico do Fórum Econômico Mundial. Podemos dizer que as Conferências das Partes (COP) promovidas pelas Nações Unidas para discutir a mudança climática é como se fosse uma “Davos ambiental”, enquanto a nova CMPCC é muito mais Porto Alegre.
Na COP se reúnem empresários, lobistas e chefes de estado, que podem até impulsionar acordos para preservar a natureza, mas sempre acabam esbarrando em interesses políticos e econômicos que falam mais alto. Na CMPCC estarão presentes ongs e ativistas — e alguns presidentes, além de representantes de governo — que propõem e defender uma mudança de postura no que diz respeito à catástrofe climática. E já, pra ontem, porque o planeta não pode esperar.
“As coisas estão caminhando numa direção errada. Os governos sabem disso, os cientistas sabem disso, mas nada estão mudando”, disse Pablo Solón, embaixador da Bolívia nas Nações Unidas, em entrevista ao Guardian. “Esse é o único cenário para fazer um balanço entre a pressão que as grandes corporações estão colocando sobre os governantes e a pressão que pode emergir da sociedade civil.”
A CMPCC é uma significativa oportunidade dada aos povos de todo o mundo — sobretudo aqueles cujas opiniões são esquecidas ou ignoradas pelo poder hegemônico — para que se façam ouvir. Os discursos em torno da crise ambiental são, digamos, unidimensionais, na medida em que apenas conseguem conceber saídas ao aquecimento global dentro da ordem política e econômica vigente. É a insistência na manutenção das noções capitalistas de riqueza, crescimento e desenvolvimento que tem produzido abstrações esquizofrênicas para salvar o mundo da tragédia, como o mercado internacional de carbono, que faz cálculos inimagináveis para atribuir valor monetário a algo tão óbvio como a preservação ambiental.
Preservar a natureza, uma atitude gratuita, custa muito dinheiro dentro do capitalismo. Portanto, algo está errado.
É este recado, cuja inspiração parte do mundo indígena, que a CMPCC quer repassar ao mundo, uma vez que os líderes mundiais voltarão a discutir o aquecimento terrestre em dezembro de 2010, no México. Evo Morales também pretende que a Conferência seja o ponto de partida para um plebiscito mundial sobre o aquecimento climático, um instrumento que possa recolher a vontade da sociedade global sobre as políticas que estão — e principalmente as que não estão — sendo adotadas para combater a devastação.
As propostas centrais da CMPCC guardam estreita relação com muitos dos artigos e reportagens publicados aqui em Latitude Sul ao longo desse ano e pouco de atividade. São gritos para que a devastação seja interrompida de uma vez por todas, para que as florestas deixem de ser derrubadas, que os rios deixem de ser poluídos e o ar, contaminado, porque só assim poderemos viver em harmonia com a natureza, e não apartados dela, porque a ela pertencemos. E, caso a economia deixe de crescer por causa disso, então é hora de reinventar nossos padrões de bem-estar e dignidade.
Porque talvez valha mais a pena viajar menos, trabalhar menos e, consequentemente, ter menos conforto para usufruir de um ar com menos partículas pesadas, de uma água sem cloro e de florestas nativas. E, sobretudo, para que o mundo seja menos injusto. É uma escolha.
>> Notícias sobre a CMPCC podem ser acompanhadas, em espanhol, no saite oficial da conferência e também, em inglês, na cobertura do jornal inglês Guardian.
Tadeu Breda é jornalista e colunista do Nota de Rodapé. Também vive em Latitude Sul
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segunda-feira, 19 de abril de 2010
Esquerda extrativista
Eleitos com a promessa de promover um novo capítulo na história da América Latina, os governos de esquerda não tocam no que, para muitos, é o ponto nevrálgico na construção de uma nova realidade: o modelo de desenvolvimento primário-exportador
Uma pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, em Copenhague, constatou que apenas 5% dos brasileiros veem o aquecimento global como o grande problema do mundo. Uma fatia ainda menor da população, em torno de 1%, acredita que a preservação da biodiversidade deve ser priorizada pelas políticas públicas. Urgente mesmo, diz o levantamento, é combater a pobreza, a violência e a fome.
Os resultados da pesquisa refletem o raciocínio que move os governos da chamada esquerda sul-americana na hora de pesar as necessidades aparentemente conflitantes de preservação ambiental e crescimento econômico.
Desde a vitória de Hugo Chávez, em 1998, à de Fernando Lugo, em 2008, a onda eleitoral que conduziu ao poder candidatos de origem popular e ideias socializantes tinha como objetivo colocar um freio às políticas neoliberais. O Estado almejou, assim, reduzir a dependência externa e retomar as rédeas da economia. “Havia esperanças de que a nova esquerda promovesse mudanças substanciais no modelo de desenvolvimento, até então baseado na exportação de produtos primários”, lembra Eduardo Gudynas, pesquisador do Centro Latino-Americano de Ecologia Social (CLAES), em Montevidéu.
Isso não aconteceu. A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) aponta que os produtos primários ainda são responsáveis por mais da metade do volume das vendas externas das nações agora dirigidas por governos ditos progressistas. O destaque fica com os recursos minerais e grandes monocultivos. O país menos dependente das commodities é o Brasil, que, mesmo assim, apoia 51% de sua economia sobre o extrativismo. Já a Venezuela sustenta 89% de sua balança comercial com as rendas do petróleo.
Gudynas acrescenta que os novos governos sul-americanos não apenas reforçaram as atividades primárias como também abriram novos campos de operação extrativista e agroindustrial. “É o caso da mineração no Equador, o apoio a um novo ciclo de exploração do ferro na Bolívia e o forte protagonismo estatal em promover o crescimento mineiro no Brasil e Argentina, enquanto a esquerda uruguaia se aventura na prospecção petroleira”, explica.
O xis da questão
À primeira vista pode ser difícil perceber os efeitos colaterais do negócio primário-exportador. Afinal, se as vendas externas crescem ano a ano, isso se traduz em cada vez mais dólares para a economia. E os países latino-americanos estão sempre necessitando de dinheiro: ninguém duvida que ainda há muito a ser feito em termos de educação, saúde, moradia, geração de empregos etc.
No entanto, de acordo com o economista equatoriano Alberto Acosta, desde a época da colonização as finanças regionais estiveram apoiadas sobre a exploração de produtos primários. E, ao longo dos séculos, esse tipo de atividade não foi capaz de trazer desenvolvimento humano à maioria dos latino-americanos, embora tenha produzido crescimento econômico. O último relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) coloca os países do continente em posições bastante intermediárias no ranking mundial do bem-estar. O Brasil, por exemplo, apesar de estar entre as dez maiores economias do mundo, só aparece na 75a posição.
“Seguimos acreditando, equivocadamente, que desenvolvimento é sinônimo de crescimento, e que a maneira mais fácil de alcançá-lo é através da exportação de recursos naturais”, lamenta Acosta. “Os governantes não devem apenas conseguir equidade social, aprofundar a democracia e superar o Consenso de Washington. Tudo isso é indispensável e fundamental, mas a verdadeira mudança radica em transformar a maneira como olhamos para os recursos naturais.”
O Equador deu passos importantes nesse sentido ao aprovar em 2008 uma Constituição que reconhece direitos à natureza e condiciona o progresso econômico e social a uma relação não-destrutiva com os ecossistemas. A regra é utilizar os recursos provenientes do meio ambiente numa intensidade tal que lhe permita recuperar-se dos danos ocasionados e seguir seus próprios ciclos vitais. O pequeno país andino é o primeiro a enxergar a natureza como um sujeito de direitos e não apenas um objeto de propriedade.
Imbuídos da nobre motivação de combater a pobreza, os governos da nova esquerda latino-americana se encontram às voltas com um dilema. Em tempos de crise ambiental e mudança climática, são moralmente forçados a adotar políticas de preservação da natureza, redução do efeito estufa, contenção do desmatamento e adoção de tecnologias limpas. Ao mesmo tempo, o compromisso histórico assumido durante as campanhas eleitorais obriga a mitigar a pobreza e reduzir o abismo social que separa ricos e pobres no continente mais desigual do planeta.
Antes, a pobreza
A primeira opção parece ter sido o combate à miséria. E, para levá-lo a cabo, o poder público necessita de recursos financeiros, já que o modelo escolhido para aliviar a fome, aplacar o trabalho infantil e reanimar as economias locais descansa sobre programas de transferência de renda. Lula criou o Bolsa Família. Na Bolívia se instaurou o Bônus Juancito Pinto. Os uruguaios contam com o Plano de Assistência Nacional à Emergência Social. No Equador apareceu o Bônus de Desenvolvimento Humano, e a Argentina deu início ao Programa de Famílias. Há também o Chile Solidário.
Como o Estado voltou a assumir um papel mais protagônico na economia, há mais dinheiro em caixa. A Bolívia é um caso exemplar. Quando nacionalizou o gás e o petróleo, em 2006, Evo Morales subiu para 50% a tributação sobre os hidrocarbonetos. A renegociação dos contratos e a reativação da estatal YPFB ajudaram a mudar o quadro econômico. O PIB boliviano foi duplicado e atinge os US$ 19 bilhões, as reservas internacionais se incrementaram, a inflação está controlada e o câmbio, estabilizado. “Deixamos de ser o país mais pobre da América do Sul”, comemora o ministro da Economia, Luis Arce.
Os novos recursos permitem aos governos repassar à parcela mais pobre da população uma parte dos excedentes obtidos com o extrativismo e, assim, remediar os efeitos da pobreza. “O estado busca captar excedentes provenientes do extrativismo e, ao utilizá-los em programas sociais, consegue legitimidade para defender as atividades extrativistas”, analisa Eduardo Gudynas. “As ações sociais necessitam um crescente financiamento e, portanto, os governos se tornam dependentes da exportação primária para captar recursos financeiros.”
O mesmo diferente
As empresas estatais, porém, não agem de maneira muito distinta das companhias estrangeiras quando o assunto é compromisso ambiental. Se as grandes transnacionais da mineração, do petróleo e do agronegócio justificam seus empreendimentos com a promessa de progresso, emprego e bem-estar, os governos latino-americanos seguem o mesmo caminho. A grande diferença é o destino dos lucros, que, agora mais que antes, permanecem no próprio país. Contudo, apesar de ser justificada por novas realidades e argumentos, a devastação continua.
O debate nascido dentro do governo brasileiro entre Dilma Rousseff, ministra da Casa Civil, e Marina Silva, ex-titular do Meio Ambiente, é prova desse embate. Enquanto a coordenadora do PAC advogava pela celeridade das obras de infra-estrutura, a herdeira política de Chico Mendes insistia na importância dos estudos de impacto ambiental. Apoiada por Lula, Dilma venceu a batalha, enquanto Marina preferiu deixar o governo após ficar conhecida como “ministra dos bagres” e ser considerada por muitos uma “trava” ao desenvolvimento.
O resultado dessa batalha viabilizou, entre outros projetos, a construção das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, e Belo Monte, no rio Xingu, que seguem a todo vapor. Juntas, as represas terão capacidade para gerar 18,4 mil megawatts, que irão alimentar a expansão industrial no sudeste e a da mineração na Amazônia.
Atualmente, segundo o geógrafo Arnaldo Carneiro, do Instituto Sócio Ambiental, “metade da capacidade energética instalada na região norte é consumida pela mineração e metalurgia, e 20% de toda eletricidade produzida no país é agregada a produtos destinados ao mercado externo”.
O PAC promete repassar R$ 35 bilhões para investimentos em geração e transmissão de energia na região amazônica. Outros R$ 10,6 bilhões devem permitir a construção e pavimentação de rodovias na floresta. Entre os projetos na área dos transportes, chama a atenção o asfaltamento da BR-163 (Cuiabá-Santarém) e da BR-319 (Manaus-Porto Velho), esta ainda em fase de avaliação ambiental, mas que pode acarretar o desmatamento de 39 milhões de hectares e afetar a mais de 50 povos indígenas, alguns em isolamento voluntário.
Contradições amazônicas
“Como outros projetos de infra-estrutura, as estradas são importantes para estimular a economia, integrar locais distantes e prover acessos a serviços públicos, como escolas e hospitais”, reconhece Arnaldo Carneiro. O geógrafo lembra, entretanto, que as estradas também vêm possibilitando o roubo de madeira, o surgimento de garimpos e a apropriação ilegal de terras indígenas. Basta dizer que, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), cerca de 75% do desmatamento ocorre numa faixa de até 100 quilômetros ao redor das rodovias.
“O Estado brasileiro está presente na Amazônia, mas de forma esquizofrênica”, avalia Carneiro, assinalando que, enquanto o governo se desdobra para reduzir o desmatamento, financia projetos que ajudam a derrubar a floresta. “Precisamos mesmo expandir sobre a Amazônia? Ou, nesse jogo global de economias ambientais, a Amazônia tem uma outra virtude, uma outra utilidade que não seja servir à pecuária e à agricultura?”
Os questionamentos do geógrafo não fazem eco aos projetos da Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), que, com forte apoio do BNDES, também está presente na Amazônia. Pelo menos dois corredores interoceânicos estão em planejamento para ligar a porção brasileira da floresta à cordilheira dos Andes e ao Pacífico, incrementando, assim, o escoamento dos grãos produzidos pelo avanço da fronteira agrícola ao norte do Mato Grosso.
“Devemos procurar um modelo de desenvolvimento que gere emprego e fortalecer um tipo de produção que não destrua a floresta. A Zona Franca de Manaus é um exemplo de indústria que não desmata. Podemos criticá-la de várias maneiras, mas o estado do Amazonas é o que menos desmata e ainda por cima tem um pólo industrial”, opina o físico Luiz Pinguelli Rosa, da UFRJ. “Devemos buscar um tipo de desenvolvimento que não produza tantas emissões e, ao mesmo tempo, dê uma vida digna à população. Não tem cabimento os europeus viverem numa situação confortável e aqui existir gente que sequer tem energia elétrica em casa.”
Tadeu Breda é jornalista e também vive em Latitude Sul
Uma pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, em Copenhague, constatou que apenas 5% dos brasileiros veem o aquecimento global como o grande problema do mundo. Uma fatia ainda menor da população, em torno de 1%, acredita que a preservação da biodiversidade deve ser priorizada pelas políticas públicas. Urgente mesmo, diz o levantamento, é combater a pobreza, a violência e a fome.
Os resultados da pesquisa refletem o raciocínio que move os governos da chamada esquerda sul-americana na hora de pesar as necessidades aparentemente conflitantes de preservação ambiental e crescimento econômico.
Desde a vitória de Hugo Chávez, em 1998, à de Fernando Lugo, em 2008, a onda eleitoral que conduziu ao poder candidatos de origem popular e ideias socializantes tinha como objetivo colocar um freio às políticas neoliberais. O Estado almejou, assim, reduzir a dependência externa e retomar as rédeas da economia. “Havia esperanças de que a nova esquerda promovesse mudanças substanciais no modelo de desenvolvimento, até então baseado na exportação de produtos primários”, lembra Eduardo Gudynas, pesquisador do Centro Latino-Americano de Ecologia Social (CLAES), em Montevidéu.
Isso não aconteceu. A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) aponta que os produtos primários ainda são responsáveis por mais da metade do volume das vendas externas das nações agora dirigidas por governos ditos progressistas. O destaque fica com os recursos minerais e grandes monocultivos. O país menos dependente das commodities é o Brasil, que, mesmo assim, apoia 51% de sua economia sobre o extrativismo. Já a Venezuela sustenta 89% de sua balança comercial com as rendas do petróleo.
Gudynas acrescenta que os novos governos sul-americanos não apenas reforçaram as atividades primárias como também abriram novos campos de operação extrativista e agroindustrial. “É o caso da mineração no Equador, o apoio a um novo ciclo de exploração do ferro na Bolívia e o forte protagonismo estatal em promover o crescimento mineiro no Brasil e Argentina, enquanto a esquerda uruguaia se aventura na prospecção petroleira”, explica.
O xis da questão
À primeira vista pode ser difícil perceber os efeitos colaterais do negócio primário-exportador. Afinal, se as vendas externas crescem ano a ano, isso se traduz em cada vez mais dólares para a economia. E os países latino-americanos estão sempre necessitando de dinheiro: ninguém duvida que ainda há muito a ser feito em termos de educação, saúde, moradia, geração de empregos etc.
No entanto, de acordo com o economista equatoriano Alberto Acosta, desde a época da colonização as finanças regionais estiveram apoiadas sobre a exploração de produtos primários. E, ao longo dos séculos, esse tipo de atividade não foi capaz de trazer desenvolvimento humano à maioria dos latino-americanos, embora tenha produzido crescimento econômico. O último relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) coloca os países do continente em posições bastante intermediárias no ranking mundial do bem-estar. O Brasil, por exemplo, apesar de estar entre as dez maiores economias do mundo, só aparece na 75a posição.
“Seguimos acreditando, equivocadamente, que desenvolvimento é sinônimo de crescimento, e que a maneira mais fácil de alcançá-lo é através da exportação de recursos naturais”, lamenta Acosta. “Os governantes não devem apenas conseguir equidade social, aprofundar a democracia e superar o Consenso de Washington. Tudo isso é indispensável e fundamental, mas a verdadeira mudança radica em transformar a maneira como olhamos para os recursos naturais.”
O Equador deu passos importantes nesse sentido ao aprovar em 2008 uma Constituição que reconhece direitos à natureza e condiciona o progresso econômico e social a uma relação não-destrutiva com os ecossistemas. A regra é utilizar os recursos provenientes do meio ambiente numa intensidade tal que lhe permita recuperar-se dos danos ocasionados e seguir seus próprios ciclos vitais. O pequeno país andino é o primeiro a enxergar a natureza como um sujeito de direitos e não apenas um objeto de propriedade.
Imbuídos da nobre motivação de combater a pobreza, os governos da nova esquerda latino-americana se encontram às voltas com um dilema. Em tempos de crise ambiental e mudança climática, são moralmente forçados a adotar políticas de preservação da natureza, redução do efeito estufa, contenção do desmatamento e adoção de tecnologias limpas. Ao mesmo tempo, o compromisso histórico assumido durante as campanhas eleitorais obriga a mitigar a pobreza e reduzir o abismo social que separa ricos e pobres no continente mais desigual do planeta.
Antes, a pobreza
A primeira opção parece ter sido o combate à miséria. E, para levá-lo a cabo, o poder público necessita de recursos financeiros, já que o modelo escolhido para aliviar a fome, aplacar o trabalho infantil e reanimar as economias locais descansa sobre programas de transferência de renda. Lula criou o Bolsa Família. Na Bolívia se instaurou o Bônus Juancito Pinto. Os uruguaios contam com o Plano de Assistência Nacional à Emergência Social. No Equador apareceu o Bônus de Desenvolvimento Humano, e a Argentina deu início ao Programa de Famílias. Há também o Chile Solidário.
Como o Estado voltou a assumir um papel mais protagônico na economia, há mais dinheiro em caixa. A Bolívia é um caso exemplar. Quando nacionalizou o gás e o petróleo, em 2006, Evo Morales subiu para 50% a tributação sobre os hidrocarbonetos. A renegociação dos contratos e a reativação da estatal YPFB ajudaram a mudar o quadro econômico. O PIB boliviano foi duplicado e atinge os US$ 19 bilhões, as reservas internacionais se incrementaram, a inflação está controlada e o câmbio, estabilizado. “Deixamos de ser o país mais pobre da América do Sul”, comemora o ministro da Economia, Luis Arce.
Os novos recursos permitem aos governos repassar à parcela mais pobre da população uma parte dos excedentes obtidos com o extrativismo e, assim, remediar os efeitos da pobreza. “O estado busca captar excedentes provenientes do extrativismo e, ao utilizá-los em programas sociais, consegue legitimidade para defender as atividades extrativistas”, analisa Eduardo Gudynas. “As ações sociais necessitam um crescente financiamento e, portanto, os governos se tornam dependentes da exportação primária para captar recursos financeiros.”
O mesmo diferente
As empresas estatais, porém, não agem de maneira muito distinta das companhias estrangeiras quando o assunto é compromisso ambiental. Se as grandes transnacionais da mineração, do petróleo e do agronegócio justificam seus empreendimentos com a promessa de progresso, emprego e bem-estar, os governos latino-americanos seguem o mesmo caminho. A grande diferença é o destino dos lucros, que, agora mais que antes, permanecem no próprio país. Contudo, apesar de ser justificada por novas realidades e argumentos, a devastação continua.
O debate nascido dentro do governo brasileiro entre Dilma Rousseff, ministra da Casa Civil, e Marina Silva, ex-titular do Meio Ambiente, é prova desse embate. Enquanto a coordenadora do PAC advogava pela celeridade das obras de infra-estrutura, a herdeira política de Chico Mendes insistia na importância dos estudos de impacto ambiental. Apoiada por Lula, Dilma venceu a batalha, enquanto Marina preferiu deixar o governo após ficar conhecida como “ministra dos bagres” e ser considerada por muitos uma “trava” ao desenvolvimento.
O resultado dessa batalha viabilizou, entre outros projetos, a construção das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, e Belo Monte, no rio Xingu, que seguem a todo vapor. Juntas, as represas terão capacidade para gerar 18,4 mil megawatts, que irão alimentar a expansão industrial no sudeste e a da mineração na Amazônia.
Atualmente, segundo o geógrafo Arnaldo Carneiro, do Instituto Sócio Ambiental, “metade da capacidade energética instalada na região norte é consumida pela mineração e metalurgia, e 20% de toda eletricidade produzida no país é agregada a produtos destinados ao mercado externo”.
O PAC promete repassar R$ 35 bilhões para investimentos em geração e transmissão de energia na região amazônica. Outros R$ 10,6 bilhões devem permitir a construção e pavimentação de rodovias na floresta. Entre os projetos na área dos transportes, chama a atenção o asfaltamento da BR-163 (Cuiabá-Santarém) e da BR-319 (Manaus-Porto Velho), esta ainda em fase de avaliação ambiental, mas que pode acarretar o desmatamento de 39 milhões de hectares e afetar a mais de 50 povos indígenas, alguns em isolamento voluntário.
Contradições amazônicas
“Como outros projetos de infra-estrutura, as estradas são importantes para estimular a economia, integrar locais distantes e prover acessos a serviços públicos, como escolas e hospitais”, reconhece Arnaldo Carneiro. O geógrafo lembra, entretanto, que as estradas também vêm possibilitando o roubo de madeira, o surgimento de garimpos e a apropriação ilegal de terras indígenas. Basta dizer que, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), cerca de 75% do desmatamento ocorre numa faixa de até 100 quilômetros ao redor das rodovias.
“O Estado brasileiro está presente na Amazônia, mas de forma esquizofrênica”, avalia Carneiro, assinalando que, enquanto o governo se desdobra para reduzir o desmatamento, financia projetos que ajudam a derrubar a floresta. “Precisamos mesmo expandir sobre a Amazônia? Ou, nesse jogo global de economias ambientais, a Amazônia tem uma outra virtude, uma outra utilidade que não seja servir à pecuária e à agricultura?”
Os questionamentos do geógrafo não fazem eco aos projetos da Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), que, com forte apoio do BNDES, também está presente na Amazônia. Pelo menos dois corredores interoceânicos estão em planejamento para ligar a porção brasileira da floresta à cordilheira dos Andes e ao Pacífico, incrementando, assim, o escoamento dos grãos produzidos pelo avanço da fronteira agrícola ao norte do Mato Grosso.
“Devemos procurar um modelo de desenvolvimento que gere emprego e fortalecer um tipo de produção que não destrua a floresta. A Zona Franca de Manaus é um exemplo de indústria que não desmata. Podemos criticá-la de várias maneiras, mas o estado do Amazonas é o que menos desmata e ainda por cima tem um pólo industrial”, opina o físico Luiz Pinguelli Rosa, da UFRJ. “Devemos buscar um tipo de desenvolvimento que não produza tantas emissões e, ao mesmo tempo, dê uma vida digna à população. Não tem cabimento os europeus viverem numa situação confortável e aqui existir gente que sequer tem energia elétrica em casa.”
Tadeu Breda é jornalista e também vive em Latitude Sul
domingo, 18 de abril de 2010
Pixo “arte”
O “arte” é com as aspas, por enquanto. Chega ser arriscado palpitar sobre isso. Mas vamos lá. Em 2008 a Bienal chamou a atenção pelo seu vazio em um dos andares, mas também pela invasão de pixadores que “vandalizaram” o lugar.
Na verdade, dentro ou fora da Bienal, o alvo desse movimento é sempre o vazio, a parede branca, a ausência. Essa é a busca. Não sou um especialista desse universo, mas é visível em qualquer rua de São Paulo – talvez o lugar do mundo onde esse grupo se faz mais presente - que se trata de uma forma de expressão e manifestação social para um grupo que se considera sem voz – se é legitima, de qualidade ou não, é outro papo.
Pois é, dois anos depois, quem diria, a nova curadoria anunciou que convidou alguns deles para participar do evento, desta vez com crachá de artista e entrada livre pela porta da frente. E eles vão participar. Logo de cara, é um reconhecimento de que de fato é um movimento. E não é só lá no Ibirapuera, alguns já foram mostrar seus rabiscos na França.
Estariam seguindo o mesmo caminho de reconhecimento do grafite? Não tenho a resposta. Mas o que se pode afirmar é que, enquanto o grafite precisa da rua para existir e se valer em sua proposta, o pixo não só tem esses preceitos como também rejeita o reconhecimento da sociedade – e isso deveria anular qualquer forma “oficial” de pixação. Você não entende o que eles escrevem nos muros? Não é mesmo pra entender, é só pra eles se entenderem.
Mesmo assim, sua entrada em uma Bienal o valida como movimento, torna-se um momento de diálogo com a sociedade. Tudo isso mostra que, se por uma lado é uma demonstração de abertura para outras formas de pensar da Bienal – o que reflete na forma como vemos e fazemos arte no país -, por outro sua legitimação e aceitação como movimento pode ser o início do seu fim enquanto contestação. A partir do momento em que for aceito, deixa de ser “anarquia”, uma provocação à sociedade e às leis e costumes que a regem.
Por isso, não é pra gostar que a pixação vai ter espaço na Bienal, é só pra compreender os motivos pelos quais ela estará lá e pensar a respeito.
Não acha?
O documentário Pixo traz uma visão interessante sobre o tema:
Diogo Ruic é jornalista e editor assistente do Nota de Rodapé
Na verdade, dentro ou fora da Bienal, o alvo desse movimento é sempre o vazio, a parede branca, a ausência. Essa é a busca. Não sou um especialista desse universo, mas é visível em qualquer rua de São Paulo – talvez o lugar do mundo onde esse grupo se faz mais presente - que se trata de uma forma de expressão e manifestação social para um grupo que se considera sem voz – se é legitima, de qualidade ou não, é outro papo.
Pois é, dois anos depois, quem diria, a nova curadoria anunciou que convidou alguns deles para participar do evento, desta vez com crachá de artista e entrada livre pela porta da frente. E eles vão participar. Logo de cara, é um reconhecimento de que de fato é um movimento. E não é só lá no Ibirapuera, alguns já foram mostrar seus rabiscos na França.
Estariam seguindo o mesmo caminho de reconhecimento do grafite? Não tenho a resposta. Mas o que se pode afirmar é que, enquanto o grafite precisa da rua para existir e se valer em sua proposta, o pixo não só tem esses preceitos como também rejeita o reconhecimento da sociedade – e isso deveria anular qualquer forma “oficial” de pixação. Você não entende o que eles escrevem nos muros? Não é mesmo pra entender, é só pra eles se entenderem.
Mesmo assim, sua entrada em uma Bienal o valida como movimento, torna-se um momento de diálogo com a sociedade. Tudo isso mostra que, se por uma lado é uma demonstração de abertura para outras formas de pensar da Bienal – o que reflete na forma como vemos e fazemos arte no país -, por outro sua legitimação e aceitação como movimento pode ser o início do seu fim enquanto contestação. A partir do momento em que for aceito, deixa de ser “anarquia”, uma provocação à sociedade e às leis e costumes que a regem.
Por isso, não é pra gostar que a pixação vai ter espaço na Bienal, é só pra compreender os motivos pelos quais ela estará lá e pensar a respeito.
Não acha?
O documentário Pixo traz uma visão interessante sobre o tema:
Diogo Ruic é jornalista e editor assistente do Nota de Rodapé
Ser um filho de desaparecido na Argentina
A voz dos vencedores calou a todo um povo e junto com ela a história de seus lutadores por longos anos. Boa parte dos fatos da ditadura militar e dos homens e mulheres que deram sua vida por um país melhor virou silêncio de cemitério, algo maldito, ou nos melhores dos casos, mal visto. A única resistência foram a mães da Praça de Maio, consideradas “loucas” na tímida democracia dos anos de 1983.
-Teus país estão viajando.
-E quando eles voltam vó?
-Pronto meu querido, pronto...
Muitos filhos ficaram sem pais e sem respostas. Muitas vezes parentes próximos inventavam mentiras piedosas por não saber o que dizer ou com vergonha por seus netos ou sobrinhos. Uma infância de brincadeiras e ausências.
Cada um deles achava que isso só acontecia com eles, mas não. O terrorismo de estado massacrou na Argentina e 30 mil pessoas. Eles cresceram e as perguntas começaram a quebrar os tijolos da enorme parede. A faculdade, a política, as pessoas, as discussões, os encontros.
Então os murmúrios se fizeram ideias. Criado numa bolha, respirava confundido os jornais, livros, músicas, e então a universidade me recebeu com uma bofetada de realidade. A liberdade, as novas experiências, tudo chegou de uma vez para mim.
Numa classe de filosofia contemporânea me disseram:
-Aquele tá procurando um cara pra rachar um apê.
-Beleza.
-O cara é maneiro.
O nome dele é Camilo Cagni, magro, cabelo comprido, preto, liso, fanático por rock argentino. Foi difícil fazê-lo escutar The Doors, mas curtiu muito depois.
Compartilhamos uma quitinete no centro da cidade de La Plata, capital do estado de Buenos Aires e principal centro universitário da região. Um armário no meio separava as camas de um lado e uma mesa redonda com quatro cadeiras velhas e som do outro. Numa noite, com apenas a luz do abajur acesa, me disse: as única coisa que tenho do meu pai é são fotos e essa borracha escrita por ele que diz FAR (Forças Armadas Revolucionárias). Até os doze eu tinha esperança de que ele e minha mãe voltassem.
No geral uma casa de estudantes não amanhecia até o meio-dia, no entanto a nossa era geograficamente e por desgraça bem localizada. Às nove da manhã um carteiro amigo sempre tocava a campanhia para nos acordar pra fazer tempo. De altura média, olhos verdes, cabelo longo encaracolado, voz grave e energética. Assim é Carlos Rios, mais conhecido como Charly. Foi o primeiro a dizer a Hebe de Bonafini, presidente das Mães da Praça de Maio, que os filhos de desaparecidos tinham que ter sua própria organização de direitos humanos. Como todo jovem teve que ouvir a típica resposta: vocês são muitos jovens, os partidos vão manipular vocês. No entanto, para os anos de 1995 as organizações de filhos de desaparecidos já tinham pipocado pelo país inteiro. E assim como outras organizações de direitos humanos os partidos caíram em cima.
Por este motivo, na minha quitinete se faziam reuniões paralelas com a vanguarda do que se deveria ter feito. Naquele momento, La Plata era a referência a nível nacional da organização. E grandes propostas saíram dali.
-Os assassinos dos nossos pais estão livres e contentes.
-É. Eu vi um deles hoje.
-Onde?
-Aqui mesmo.
-Filho da puta!!!!
-Porra!!! Não pode ficar assim.
-E se a gente juntar todo mundo e marcar o lugar onde ele mora?
Foram poucos na primeira, mas o barulho foi enorme. Não dava mais para ser indiferente. "Senhoras, senhores: o teu vizinho é um assassino e torturador." E cantávamos a viva voz: “Assim como aos nazistas lhes aconteceu, onde vais, nós iremos atrás”. H.I.J.O.S (Filhos e Filhas pela Identidade e a Justiça contra o Esquecimento e o Silencio), acordou a muitos e a mim, inclusive.
Rodrigo Menitto é jornalista, filho de terras argentinas e brasileiras, estreia sua coluna Crônicas do Sul.
-Teus país estão viajando.
-E quando eles voltam vó?
-Pronto meu querido, pronto...
Muitos filhos ficaram sem pais e sem respostas. Muitas vezes parentes próximos inventavam mentiras piedosas por não saber o que dizer ou com vergonha por seus netos ou sobrinhos. Uma infância de brincadeiras e ausências.
Cada um deles achava que isso só acontecia com eles, mas não. O terrorismo de estado massacrou na Argentina e 30 mil pessoas. Eles cresceram e as perguntas começaram a quebrar os tijolos da enorme parede. A faculdade, a política, as pessoas, as discussões, os encontros.
Então os murmúrios se fizeram ideias. Criado numa bolha, respirava confundido os jornais, livros, músicas, e então a universidade me recebeu com uma bofetada de realidade. A liberdade, as novas experiências, tudo chegou de uma vez para mim.
Numa classe de filosofia contemporânea me disseram:
-Aquele tá procurando um cara pra rachar um apê.
-Beleza.
-O cara é maneiro.
"eu tinha esperança
de que ele e minha mãe
voltassem"
Compartilhamos uma quitinete no centro da cidade de La Plata, capital do estado de Buenos Aires e principal centro universitário da região. Um armário no meio separava as camas de um lado e uma mesa redonda com quatro cadeiras velhas e som do outro. Numa noite, com apenas a luz do abajur acesa, me disse: as única coisa que tenho do meu pai é são fotos e essa borracha escrita por ele que diz FAR (Forças Armadas Revolucionárias). Até os doze eu tinha esperança de que ele e minha mãe voltassem.
No geral uma casa de estudantes não amanhecia até o meio-dia, no entanto a nossa era geograficamente e por desgraça bem localizada. Às nove da manhã um carteiro amigo sempre tocava a campanhia para nos acordar pra fazer tempo. De altura média, olhos verdes, cabelo longo encaracolado, voz grave e energética. Assim é Carlos Rios, mais conhecido como Charly. Foi o primeiro a dizer a Hebe de Bonafini, presidente das Mães da Praça de Maio, que os filhos de desaparecidos tinham que ter sua própria organização de direitos humanos. Como todo jovem teve que ouvir a típica resposta: vocês são muitos jovens, os partidos vão manipular vocês. No entanto, para os anos de 1995 as organizações de filhos de desaparecidos já tinham pipocado pelo país inteiro. E assim como outras organizações de direitos humanos os partidos caíram em cima.
Por este motivo, na minha quitinete se faziam reuniões paralelas com a vanguarda do que se deveria ter feito. Naquele momento, La Plata era a referência a nível nacional da organização. E grandes propostas saíram dali.
-Os assassinos dos nossos pais estão livres e contentes.
-É. Eu vi um deles hoje.
-Onde?
-Aqui mesmo.
-Filho da puta!!!!
-Porra!!! Não pode ficar assim.
-E se a gente juntar todo mundo e marcar o lugar onde ele mora?
Foram poucos na primeira, mas o barulho foi enorme. Não dava mais para ser indiferente. "Senhoras, senhores: o teu vizinho é um assassino e torturador." E cantávamos a viva voz: “Assim como aos nazistas lhes aconteceu, onde vais, nós iremos atrás”. H.I.J.O.S (Filhos e Filhas pela Identidade e a Justiça contra o Esquecimento e o Silencio), acordou a muitos e a mim, inclusive.
Rodrigo Menitto é jornalista, filho de terras argentinas e brasileiras, estreia sua coluna Crônicas do Sul.
quinta-feira, 15 de abril de 2010
Manchetes Rejeitadas #18
Tietê Campos ligou à tarde. Estava na lanchonete Amazonense, na rua Clodomoriro Amazonas na Vila Olímpia, em São Paulo, quanto o Costelinha, garçom do boteco, definiu o jogador Washington, atacante do São Paulo:
- Ele lembra um Biruta de posto de gasolina! Magro, alto e só sabe mexer os braços pra lá e pra cá!
quarta-feira, 14 de abril de 2010
O tango, pô, as minas, pá
Nascido no começo do século 20, o tango surgiu nos arrabaldes, na zona mais pobre e perigosa de Buenos Aires. Não era pra “moça de família” e por isso foi dançado entre homens ou tendo como par as prostitutas. Com o passar do tempo a classe média adotou a dança e as mulheres não "pecadoras" puderam participar.
Ainda assim, o papel delas era de submissão, de ser guiada na dança pelo macho.Hoje, esse universo ainda dominado por homens, mas a participação feminina vem ganhando espaço nas últimas décadas - ver uma mulher tocando bandoneón é ainda raro, mas escutar uma ‘mina’ cantá-lo é cada vez mais comum.
‘Mina’ é mulher atraente no lunfardo - dialeto criado em Buenos Aires e que mescla vários idiomas, entre eles o galego (que soa muito parecido ao português). Vem do diminutivo de femmina (italiano) e menina (em galego e português). Sim, hoje falasse em mina no Brasil por influência do lunfardo, que se espalhou também para outros vizinhos.
Na Conexom Latina desta semana apresento três cantoras de tango contemporâneas que merecem ser ouvidas e aplaudidas.
Adriana Varela
Antes de virar cantora profissional (em 1991, com 33 anos), Adriana Varela foi militante do Partido Comunista, esposa, mãe e fonoaudióloga. Um dia resolveu levar a sério a paixão pela música. Foi “adotada” por Polaco Goyeneche, um dos grandes tangueiros, e duas décadas de carreira depois virou uma das mais importantes vozes vivas do tango.
É apontada como uma das responsáveis por fazer nascer nos jovens o gosto por esse tipo de música. A inconfundível voz rouca (resultado dos anos de fumo compulsivo) é sua marca registrada e, também, principal ponto para os críticos, que dizem que ela não canta, mas apenas “conta” ou diz os tangos. Escute e tire tuas conclusões:
Me gustas cuando callas (poema de Pablo Neruda musicado)
Com la frente marchita (uma música de Joaquim Sabina com um arranjo de tango)
Aqui, Adriana Varela canta com Bajofondo Tango Club (um coletivo de músicos do Rio da Prata de quem teremos que falar sobre qualquer hora dessas). A música se chama Perfume e é preciosa.
Dolores Solá
Começou a carreira nos anos 90, cantando tango e pop. Em 1996 fundou junto com mais dos músicos a banda “La Chicana”, ativa e criativa até hoje. O tango predomina no som do grupo, mas há a mistura constante com outros ritmos.
Aqui, Confesión (um tango clássico)
Viaje Astral (vê se descobre qual a música incidental!*)
Sopapa (tango com várias outras influências e uma letra deliciosa)
Pra terminar, uma música linda de Gotan Project (de quem falaremos em breve) chamada Sola e cantada por Cristina Villalonga.
*a música incidental é Smell Like Teen Spirit, do Nirvana
Ricardo Viel é jornalista e mantém a coluna Conexsom Latina neste Nota de Rodapé
Ainda assim, o papel delas era de submissão, de ser guiada na dança pelo macho.Hoje, esse universo ainda dominado por homens, mas a participação feminina vem ganhando espaço nas últimas décadas - ver uma mulher tocando bandoneón é ainda raro, mas escutar uma ‘mina’ cantá-lo é cada vez mais comum.
‘Mina’ é mulher atraente no lunfardo - dialeto criado em Buenos Aires e que mescla vários idiomas, entre eles o galego (que soa muito parecido ao português). Vem do diminutivo de femmina (italiano) e menina (em galego e português). Sim, hoje falasse em mina no Brasil por influência do lunfardo, que se espalhou também para outros vizinhos.
Na Conexom Latina desta semana apresento três cantoras de tango contemporâneas que merecem ser ouvidas e aplaudidas.
Adriana Varela
Antes de virar cantora profissional (em 1991, com 33 anos), Adriana Varela foi militante do Partido Comunista, esposa, mãe e fonoaudióloga. Um dia resolveu levar a sério a paixão pela música. Foi “adotada” por Polaco Goyeneche, um dos grandes tangueiros, e duas décadas de carreira depois virou uma das mais importantes vozes vivas do tango.
É apontada como uma das responsáveis por fazer nascer nos jovens o gosto por esse tipo de música. A inconfundível voz rouca (resultado dos anos de fumo compulsivo) é sua marca registrada e, também, principal ponto para os críticos, que dizem que ela não canta, mas apenas “conta” ou diz os tangos. Escute e tire tuas conclusões:
Me gustas cuando callas (poema de Pablo Neruda musicado)
Com la frente marchita (uma música de Joaquim Sabina com um arranjo de tango)
Aqui, Adriana Varela canta com Bajofondo Tango Club (um coletivo de músicos do Rio da Prata de quem teremos que falar sobre qualquer hora dessas). A música se chama Perfume e é preciosa.
Dolores Solá
Começou a carreira nos anos 90, cantando tango e pop. Em 1996 fundou junto com mais dos músicos a banda “La Chicana”, ativa e criativa até hoje. O tango predomina no som do grupo, mas há a mistura constante com outros ritmos.
Aqui, Confesión (um tango clássico)
Viaje Astral (vê se descobre qual a música incidental!*)
Sopapa (tango com várias outras influências e uma letra deliciosa)
O livro que você não escreveu,Nos tenemos que ir (tango com uma guitarra bem marcada)
Já ninguém vai ler
A árvore que você não plantou,
Já nunca ninguém vai subir
E o filho que você não teve,
Porque quis matá-lo
Pra terminar, uma música linda de Gotan Project (de quem falaremos em breve) chamada Sola e cantada por Cristina Villalonga.
*a música incidental é Smell Like Teen Spirit, do Nirvana
Ricardo Viel é jornalista e mantém a coluna Conexsom Latina neste Nota de Rodapé
terça-feira, 13 de abril de 2010
Médicos e monstros?
Está aberta a temporada de caça ao voto para as próximas eleições presidenciais no Brasil. Cada eleição tem uma história e essa não será diferente. No dia-a-dia dos cidadãos, costuma-se ouvir muita crítica à política e aos políticos, sendo a corrupção o exemplo mais citado por todos.
Gostaria de fazer aqui – daquilo que me é dado perceber – um breve comentário sobre o comportamento coletivo do brasileiro, seu entendimento do que seria a cidadania, por exemplo, e o seu comportamento individual diante das eleições. Comportamento que lembra, em alguns aspectos, a conhecida fábula de Dr. Jekyll e Mr. Hyde.
Grande parte de nós – uns mais outros menos – arranja um jeitinho de sonegar ou, eufemisticamente, pagar menos imposto de renda. Alguns compram trabalhos para o famoso TCC escolar ou mesmo ‘teses’ acadêmicas. Outros avançam o sinal vermelho, param na faixa de pedestres, ignoram os sinais de trânsito. Há os que adulteram gasolina, os que ‘compram’ a sua Carteira Nacional de Habilitação, os que licenciam os carros em outras cidades para não serem multados nas suas, os que compram Notas Fiscais ou registram suas empresas em pequenas cidades para fugir ao ISS da sua grande cidade. Há os comerciantes que pagam regularmente, sem reclamar, aos achaques de fiscais da prefeitura. Há os fiscais da prefeitura que achacam. Os patrões que registram seus empregados por um valor menor em carteira. Os torcedores de futebol ou fãs dos grandes shows musicais que preferem comprar ingressos mais caros dos cambistas do que enfrentar as filas. Os que grilam terras e mandam matar camponeses que querem o seu pedacinho de terra. Os consumidores de drogas pesadas que, com seu vício alimentam o narcotráfico. Os que não respeitam os idosos. Os que molham a mão do guarda no teste do bafômetro. Os que fazem pequenos e grandes contrabandos. O número de pequenos (?) crimes e exemplos dessa natureza seria de citações intermináveis.
Pois bem, essa gente toda (nós) reclama(mos) da corrupção “dos políticos” esquecendo-se (nos) da sua (nossa) própria. Falam(os) aos quatro ventos da sujeira que é a política, mas se (nos) esquecem(os) daquela que praticam(os) às escondidas, protegidos pelo insufilme da moralidade. Um comportamento em público e outro em particular. A coisa se agrava quando você pergunta a uma pessoa em quem ela votou para vereador, deputado ou senador na última eleição e ela responde que não se lembra ou – os que ainda se lembram - de que foi num candidato indicado pelo patrão, pelo colega de trabalho, pelo primo ou pelo (a) namorado (a). Ou seja: milhares e milhares de eleitores nem sabem em quem votaram. E estão reclamando do quê?
Com as transformações por que passa o Brasil, na tentativa que faz o governo do presidente Lula em criar uma nova infraestrutura econômica e social, seria uma boa hora para todos os eleitores refletirem melhor e procurarem se informar sobre programas e candidatos, mudando aquela postura comodista do “só voto porque é obrigatório no Brasil”. Não adianta fugir da política. Ela está presente no dia-a-dia de cada um de nós, queiramos ou não. Para o bem e para o mal. O melhor, então, é enfrentá-la com dignidade, exercendo a cidadania com responsabilidade, fazendo mais e acusando menos. Informemo-nos melhor sobre o que se passa ao nosso lado e combatamos o monopólio do crime organizado da informação, por exemplo. Pois essa é uma das pontas do iceberg.
A atual grande mídia brasileira, seus mais destacados órgãos pelo menos, se transformou em partido político de oposição ao atual governo e, por isso mesmo não é confiável. Mente, inventa, distorce, esconde os fatos positivos, falsifica-os, tudo em nome de uma democracia de privilégios, de uma liberdade de imprensa que só vale para os donos dos veículos de comunicação social, dos quais são donos ou concessionários.
A hipocrisia não é boa conselheira e muito menos uma atitude inteligente e civilizada em qualquer situação, sobretudo quando se trata de eleições. A hipocrisia contribui para a decadência moral do cidadão e da sociedade a que pertence. Ela esconde o que de pior existe dentro de cada um de nós. Voltarei ao tema.
Izaías Almada é escritor, dramaturgo, roteirista e colunista do Nota de Rodapé.
Gostaria de fazer aqui – daquilo que me é dado perceber – um breve comentário sobre o comportamento coletivo do brasileiro, seu entendimento do que seria a cidadania, por exemplo, e o seu comportamento individual diante das eleições. Comportamento que lembra, em alguns aspectos, a conhecida fábula de Dr. Jekyll e Mr. Hyde.
Grande parte de nós – uns mais outros menos – arranja um jeitinho de sonegar ou, eufemisticamente, pagar menos imposto de renda. Alguns compram trabalhos para o famoso TCC escolar ou mesmo ‘teses’ acadêmicas. Outros avançam o sinal vermelho, param na faixa de pedestres, ignoram os sinais de trânsito. Há os que adulteram gasolina, os que ‘compram’ a sua Carteira Nacional de Habilitação, os que licenciam os carros em outras cidades para não serem multados nas suas, os que compram Notas Fiscais ou registram suas empresas em pequenas cidades para fugir ao ISS da sua grande cidade. Há os comerciantes que pagam regularmente, sem reclamar, aos achaques de fiscais da prefeitura. Há os fiscais da prefeitura que achacam. Os patrões que registram seus empregados por um valor menor em carteira. Os torcedores de futebol ou fãs dos grandes shows musicais que preferem comprar ingressos mais caros dos cambistas do que enfrentar as filas. Os que grilam terras e mandam matar camponeses que querem o seu pedacinho de terra. Os consumidores de drogas pesadas que, com seu vício alimentam o narcotráfico. Os que não respeitam os idosos. Os que molham a mão do guarda no teste do bafômetro. Os que fazem pequenos e grandes contrabandos. O número de pequenos (?) crimes e exemplos dessa natureza seria de citações intermináveis.
Pois bem, essa gente toda (nós) reclama(mos) da corrupção “dos políticos” esquecendo-se (nos) da sua (nossa) própria. Falam(os) aos quatro ventos da sujeira que é a política, mas se (nos) esquecem(os) daquela que praticam(os) às escondidas, protegidos pelo insufilme da moralidade. Um comportamento em público e outro em particular. A coisa se agrava quando você pergunta a uma pessoa em quem ela votou para vereador, deputado ou senador na última eleição e ela responde que não se lembra ou – os que ainda se lembram - de que foi num candidato indicado pelo patrão, pelo colega de trabalho, pelo primo ou pelo (a) namorado (a). Ou seja: milhares e milhares de eleitores nem sabem em quem votaram. E estão reclamando do quê?
Com as transformações por que passa o Brasil, na tentativa que faz o governo do presidente Lula em criar uma nova infraestrutura econômica e social, seria uma boa hora para todos os eleitores refletirem melhor e procurarem se informar sobre programas e candidatos, mudando aquela postura comodista do “só voto porque é obrigatório no Brasil”. Não adianta fugir da política. Ela está presente no dia-a-dia de cada um de nós, queiramos ou não. Para o bem e para o mal. O melhor, então, é enfrentá-la com dignidade, exercendo a cidadania com responsabilidade, fazendo mais e acusando menos. Informemo-nos melhor sobre o que se passa ao nosso lado e combatamos o monopólio do crime organizado da informação, por exemplo. Pois essa é uma das pontas do iceberg.
A atual grande mídia brasileira, seus mais destacados órgãos pelo menos, se transformou em partido político de oposição ao atual governo e, por isso mesmo não é confiável. Mente, inventa, distorce, esconde os fatos positivos, falsifica-os, tudo em nome de uma democracia de privilégios, de uma liberdade de imprensa que só vale para os donos dos veículos de comunicação social, dos quais são donos ou concessionários.
A hipocrisia não é boa conselheira e muito menos uma atitude inteligente e civilizada em qualquer situação, sobretudo quando se trata de eleições. A hipocrisia contribui para a decadência moral do cidadão e da sociedade a que pertence. Ela esconde o que de pior existe dentro de cada um de nós. Voltarei ao tema.
Izaías Almada é escritor, dramaturgo, roteirista e colunista do Nota de Rodapé.
Relevamos o Segredo dos seus olhos
Você assistiu o Segredo dos seus olhos, ganhador do Oscar? Se sim, a chance de você ter se apaixonado por Soledad Villamil é enorme. É a atriz principal, aquela que faz o par romântico com Ricardo Darín.
Pois ela também é cantora, e de tango. Assista o vídeo abaixo, onde ela canta Morrir de amor.
Queria morrer agora de amor
para que você soubesse
como e quanto eu te queria
E no final... bom, no final você vai descobrir que o segredo não está nem nos olhos nem na voz, mas no sorriso. Irresistível.
Conexsom Latina de amanhã fala sobre cantoras de tango.
Pois ela também é cantora, e de tango. Assista o vídeo abaixo, onde ela canta Morrir de amor.
Queria morrer agora de amor
para que você soubesse
como e quanto eu te queria
E no final... bom, no final você vai descobrir que o segredo não está nem nos olhos nem na voz, mas no sorriso. Irresistível.
Conexsom Latina de amanhã fala sobre cantoras de tango.
domingo, 11 de abril de 2010
Quando o jornalismo cai na rede da assessoria de imprensa
Um dos trabalhos de uma assessoria é o de “plantar” uma notícia. Um dos trabalhos do jornalismo é o de investigar essa “planta”. Não foi o que aconteceu com a coletiva de imprensa que o Corinthians deu na última quinta (08/04), um dia depois de ser eliminado do campeonato Paulista. No ano de seu centenário, e com os investimentos que fez para a temporada, esse torneio era uma das metas – pela exposição, receita e, claro, o título.
E qual seria o tema dessa coletiva pós-eliminação? Palpito que a própria eliminação, não?
Mas eis que pra essa coletiva o clube designa Ronaldo, sua maior estrela. E eis que Ronaldo, com uma sinceridade incrível, diz isso aqui, deixando claro que estava tentando desviar o foco pela derrota ao falar de convocação para seleção e Libertadores.
E não é que funcionou? Dois dos maiores jornais do país “compraram” a pauta que a assessoria do Corinthians, via Ronaldo, tentou “vender”.
Menos mal que isso foi no caderno de esportes, mas será que o trabalho na editoria de política é menos passivo? Dá pra ver a “compra” da Folha neste link, e a do Estadão neste.
Diogo Ruic é jornalista e editor assistente do Nota de Rodapé
E qual seria o tema dessa coletiva pós-eliminação? Palpito que a própria eliminação, não?
Mas eis que pra essa coletiva o clube designa Ronaldo, sua maior estrela. E eis que Ronaldo, com uma sinceridade incrível, diz isso aqui, deixando claro que estava tentando desviar o foco pela derrota ao falar de convocação para seleção e Libertadores.
E não é que funcionou? Dois dos maiores jornais do país “compraram” a pauta que a assessoria do Corinthians, via Ronaldo, tentou “vender”.
Menos mal que isso foi no caderno de esportes, mas será que o trabalho na editoria de política é menos passivo? Dá pra ver a “compra” da Folha neste link, e a do Estadão neste.
Diogo Ruic é jornalista e editor assistente do Nota de Rodapé
De Super Homem e mostrando a bunda em público Mockus pode mudar a Colômbia
A história recente de Bogotá e da incrível mudança por que passou a capital colombiana se deve, em boa parte, a um ato impensado de Antanas Mockus, um filósofo e matemático que foi reitor da Universidade Nacional de Bogotá de 1990 a 1993. Acossado durante meses por estudantes partidários às Farcs, Mockus respondeu com a bunda (mostrando ela) as vaias que recebia durante um ato no auditório da universidade. Foi forçado a renunciar, mas começou a ganhar a simpatia da população, farta do mais do mesmo.
A popularidade levou o acadêmico a concorrer às eleições para prefeito. Suas estratégias pouco ortodoxas (como vestir-se de Super Homem, por exemplo), somado ao descrédito dos bogotanos nos políticos tradicionais, colocaram, pela primeira vez na história, um político independente na comando da cidade. Não é exagero dizer que Mockus mudou Bogotá, e fez isso a partir da micro revolução. Em três anos Bogotá deixou de ser uma cidade extremamente violenta e mergulhada na corrupção, para ser um lugar bom de morar. O ex-reitor pregou a mudança do cidadão, do convívio, do amor à cidade, do respeito à lei, e fez isso com bom humor (e até certa inocência); se cercou de acadêmicos sem experiência política e apostou na intuição para governar. Colocou mímicos para ensinar as pessoas a respeitar o trânsito, investiu no transporte público, em parques (em dez anos a cidade ganhou 1.100 áreas públicas) e em bibliotecas.
Impedido de se reeleger, Mockus saiu de cena (o candidato que venceu seguiu seus passos) e voltou em 2001. Em 2002 usou um colete à prova de balas com um buraco em forma de coração, para protestar contra a ameaça das Farcs de matar quem não renunciasse.
Agora Mockus é candidato, pelo Partido Verde, à presidência. Largou em quarto nas pesquisas e hoje já é o primeiro – o pleito acontece no final de maio. É a alternativa ao continuísmo de Uribe (que não pode se candidatar, mas continuará mandando se Juan Manuel Santos chegar ao poder).
O atual presidente da Colômbia tem no combate às guerrilhas sua principal plataforma e usa o discurso criado por Bush (“guerra ao terror”) para justificar o atropelo aos direitos humanos.
Nas redes sociais a campanha pelo ex-reitor para presidência é forte. Uma delas diz: "Eu mostraria a bunda por Mockus".
Para quem se interessa pelo assunto recomendo o excelente documentário “Bogotá cambió” (Bogotá mudou), uma produção europeia que conta sobre Mockus e a mudança que o hoje candidato promoveu na capital (está meio em espanhol e meio em inglês, com legenda). Sugestão de Álvaro Cuellar, um grande amigo da Colômbia que está eufórico com a possibilidade Mockus ser o novo presidente.
Na sexta-feira passada, dia 9, se tornou público que Mockus sofre de Parkinson. É cedo para dizer o quanto isso pode atrapalhar sua chegada ao poder.
Ricardo Viel é jornalista
A popularidade levou o acadêmico a concorrer às eleições para prefeito. Suas estratégias pouco ortodoxas (como vestir-se de Super Homem, por exemplo), somado ao descrédito dos bogotanos nos políticos tradicionais, colocaram, pela primeira vez na história, um político independente na comando da cidade. Não é exagero dizer que Mockus mudou Bogotá, e fez isso a partir da micro revolução. Em três anos Bogotá deixou de ser uma cidade extremamente violenta e mergulhada na corrupção, para ser um lugar bom de morar. O ex-reitor pregou a mudança do cidadão, do convívio, do amor à cidade, do respeito à lei, e fez isso com bom humor (e até certa inocência); se cercou de acadêmicos sem experiência política e apostou na intuição para governar. Colocou mímicos para ensinar as pessoas a respeitar o trânsito, investiu no transporte público, em parques (em dez anos a cidade ganhou 1.100 áreas públicas) e em bibliotecas.
Impedido de se reeleger, Mockus saiu de cena (o candidato que venceu seguiu seus passos) e voltou em 2001. Em 2002 usou um colete à prova de balas com um buraco em forma de coração, para protestar contra a ameaça das Farcs de matar quem não renunciasse.
Agora Mockus é candidato, pelo Partido Verde, à presidência. Largou em quarto nas pesquisas e hoje já é o primeiro – o pleito acontece no final de maio. É a alternativa ao continuísmo de Uribe (que não pode se candidatar, mas continuará mandando se Juan Manuel Santos chegar ao poder).
O atual presidente da Colômbia tem no combate às guerrilhas sua principal plataforma e usa o discurso criado por Bush (“guerra ao terror”) para justificar o atropelo aos direitos humanos.
Nas redes sociais a campanha pelo ex-reitor para presidência é forte. Uma delas diz: "Eu mostraria a bunda por Mockus".
Para quem se interessa pelo assunto recomendo o excelente documentário “Bogotá cambió” (Bogotá mudou), uma produção europeia que conta sobre Mockus e a mudança que o hoje candidato promoveu na capital (está meio em espanhol e meio em inglês, com legenda). Sugestão de Álvaro Cuellar, um grande amigo da Colômbia que está eufórico com a possibilidade Mockus ser o novo presidente.
Na sexta-feira passada, dia 9, se tornou público que Mockus sofre de Parkinson. É cedo para dizer o quanto isso pode atrapalhar sua chegada ao poder.
Ricardo Viel é jornalista
… PAPARU PAPA EU EOOOO… (La banda sonora del mexicano)
Sentí por primera vez el vértigo que produce sólo poder moverse hacía donde la multitud -inspirada por la música- decide sacudirse. Una formada por 175 mil personas . Todas en la plancha del Zócalo, en el D.F; ahí en donde 4 años después, 18 mil se desnudaran para Spencer Tunick , frente a la Catedral, el Palacio Nacional y bajo la monumental bandera de México.
En junio de 2005 estuve ahí y viví a Café Tacvba. Las líneas del metro, próximas al Centro Histórico (Bellas Artes, Allende, Pino Suárez, Zócalo) fueron cerradas. Aunque sea gastada la analogía, eran “ríos de gente” caminando, convocados por 4 músicos que pareciera que tocaran siempre, sólo por el prohibido placer de disfrutar.
Nacen hace 21 años en Ciudad Satélite, una colonia fresa al norte del D.F. primer intento por construir un complejo residencial agringado que por fortuna tuvo la participación de gran Marío Pani y el maestro Luis Barragán . Su nombre lo deben a un restaurancito en el Centro de la Ciudad de México al que algunos de los integrantes solían acudir . En cada disco su vocalista (Rubén Albarrán) cambia de nombre y muy pocos mexicanos de 32 años hacía abajo, no tienen al menos un recuerdo con alguna de las rolas (canción en mexicano) de Cafeta.
Bailé con Mariana “Las Batallas” , una innumerable cantidad de veces. Le pusieron música a la novela breve mexicana más hermosa, escrita por el único niño-viejo del País, José Emilio Pacheco . Rescataron el homenaje a la “ch” de Jaime López , un roquero sesentero, y mostraron al mundo el colorido de México hasta para hablar. Aunque resulta ocioso decirlo, los escuchan los fresas y la banda. Y lo mejor, lo cantan, bailan, lloran y lo disfrutan igual.
Pienso en un antiguo amor chilango cada vez que escucho “Aviéntame”, y también me llegan a la memoria imágenes de Amores Perros , de Guillermo Arriaga (guión) y Alejandro Iñárritu (dirección), revelación narrativa del cine en este país.
Pueden hacer una canción de las que exige la vorágine ambición de la millonaria industria discográfica , popularizar un son jarocho con la canción de un dominicano , hacer proliferar en los conciertos la imbécil máscara de una gallina y un extraño baile con la canción chilena de Los Tres .
Un amigo me dijo que hay un artículo de un osado que los nombró, “Los Beatles latinos ”.
Ellos muestran el agridulcemexicano, -“Ingrata, no me digas que me quieres”… - son un cántico de fiesta que suena “paparupapa euuuu eoooo” , y efectivamente, “la vida es un gran baile y el mundo su salón”.
No fijan postura política, es, mejordicho, de clases . La dignificación de los pueblos indígenas , los movimientos ecológicos , la apropiación de la ciudad, el rescate de lo más antiguo y lo más moderno de nuestros ruidos, esos son sus temas.
En 21 años de existir (desde 1989), cada uno de los integrantes de Café Tacvba -Rubén Albarrán (voz), Enrique Rangel (bajo), Emmanuel del Real (teclados y secuencias), Joselo Rangel (guitarra)- han generado, además de la música más versátil y original de las últimas 2 décadas en México, los más intensos recuerdos para toda una generación que necesitaba, -de manera urgente-, musicalizar sus vidas con una banda sonara, pero en “mexicano”.
***
Alguien gritaba, “¡hay un niño herido!” y la marea de gente abría paso. Después el camino, como azúcar llenando un recipiente, volvía a inundase de cuerpos. Eran 175 mil humanos en un espacio de 46 mil 800 m² (195 m x 240 m) y ella quería llegar hasta el asta de la bandera. Imposible. Desistimos y de pronto, en medio de un “mar picado” de personas, nos dedicamos al prohibido placer de disfrutar (de fondo Café Tacvba, a todo lo que da).
Luis Miguel López (periodista en México, especial para Conexsom latina por Ricardo Viel)
En junio de 2005 estuve ahí y viví a Café Tacvba. Las líneas del metro, próximas al Centro Histórico (Bellas Artes, Allende, Pino Suárez, Zócalo) fueron cerradas. Aunque sea gastada la analogía, eran “ríos de gente” caminando, convocados por 4 músicos que pareciera que tocaran siempre, sólo por el prohibido placer de disfrutar.
Nacen hace 21 años en Ciudad Satélite, una colonia fresa al norte del D.F. primer intento por construir un complejo residencial agringado que por fortuna tuvo la participación de gran Marío Pani y el maestro Luis Barragán . Su nombre lo deben a un restaurancito en el Centro de la Ciudad de México al que algunos de los integrantes solían acudir . En cada disco su vocalista (Rubén Albarrán) cambia de nombre y muy pocos mexicanos de 32 años hacía abajo, no tienen al menos un recuerdo con alguna de las rolas (canción en mexicano) de Cafeta.
Bailé con Mariana “Las Batallas” , una innumerable cantidad de veces. Le pusieron música a la novela breve mexicana más hermosa, escrita por el único niño-viejo del País, José Emilio Pacheco . Rescataron el homenaje a la “ch” de Jaime López , un roquero sesentero, y mostraron al mundo el colorido de México hasta para hablar. Aunque resulta ocioso decirlo, los escuchan los fresas y la banda. Y lo mejor, lo cantan, bailan, lloran y lo disfrutan igual.
Pienso en un antiguo amor chilango cada vez que escucho “Aviéntame”, y también me llegan a la memoria imágenes de Amores Perros , de Guillermo Arriaga (guión) y Alejandro Iñárritu (dirección), revelación narrativa del cine en este país.
Pueden hacer una canción de las que exige la vorágine ambición de la millonaria industria discográfica , popularizar un son jarocho con la canción de un dominicano , hacer proliferar en los conciertos la imbécil máscara de una gallina y un extraño baile con la canción chilena de Los Tres .
Un amigo me dijo que hay un artículo de un osado que los nombró, “Los Beatles latinos ”.
Ellos muestran el agridulcemexicano, -“Ingrata, no me digas que me quieres”… - son un cántico de fiesta que suena “paparupapa euuuu eoooo” , y efectivamente, “la vida es un gran baile y el mundo su salón”.
No fijan postura política, es, mejordicho, de clases . La dignificación de los pueblos indígenas , los movimientos ecológicos , la apropiación de la ciudad, el rescate de lo más antiguo y lo más moderno de nuestros ruidos, esos son sus temas.
En 21 años de existir (desde 1989), cada uno de los integrantes de Café Tacvba -Rubén Albarrán (voz), Enrique Rangel (bajo), Emmanuel del Real (teclados y secuencias), Joselo Rangel (guitarra)- han generado, además de la música más versátil y original de las últimas 2 décadas en México, los más intensos recuerdos para toda una generación que necesitaba, -de manera urgente-, musicalizar sus vidas con una banda sonara, pero en “mexicano”.
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Alguien gritaba, “¡hay un niño herido!” y la marea de gente abría paso. Después el camino, como azúcar llenando un recipiente, volvía a inundase de cuerpos. Eran 175 mil humanos en un espacio de 46 mil 800 m² (195 m x 240 m) y ella quería llegar hasta el asta de la bandera. Imposible. Desistimos y de pronto, en medio de un “mar picado” de personas, nos dedicamos al prohibido placer de disfrutar (de fondo Café Tacvba, a todo lo que da).
Luis Miguel López (periodista en México, especial para Conexsom latina por Ricardo Viel)
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